Imagem: Andes

Chegou ao fim a greve dos servidores federais da educação

O movimento grevista dos servidores federais da educação iniciou em datas diferentes e de maneira desarticulada entre as direções dos sindicatos, apesar das mesas de negociação com o governo terem iniciado ainda em julho de 2023. A Fasubra (Federação de Sindicatos de Técnico-Administrativos em Instituições Públicas de Ensino Superior) iniciou a greve no dia 11 de março pela sua base de técnicos-administrativos, o Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica) deflagrou a greve para o dia 3 de abril e o Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior) para o dia 15, do mesmo mês.

As pautas de reivindicação do movimento grevista foram a reestruturação das carreiras de técnicos-administrativos e docentes, recomposição salarial, revogação de todas as normas que prejudicam a educação federal, aprovadas nos governos Temer e Bolsonaro, a recomposição do orçamento e reajuste imediato dos auxílios e bolsas dos estudantes.  Referente à recomposição salarial, a proposta parcelada, apresentada para o governo no início do movimento, já havia sido rebaixada pelas mesas de negociação anteriores à greve: 22,71% para os docentes (7,06% em 2024, 2025 e 2026) e 34,32% para os TAEs (10,34% em 2024, 2025 e 2026). Essa proposta já não atendia as perdas salariais para o período de 2010 a 2023, calculadas pelo Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe), de 39% no caso dos docentes e 53% no caso dos TAEs, acumuladas nos últimos anos.

A degradação contínua das condições de trabalho e corrosão dos salários dos últimos anos geraram um grande descontentamento com as carreiras na educação pública federal. Na Fasubra, a inclinação para greve já era forte nas bases e bastou o estopim com a proposta do governo, do dia 28 de fevereiro, para que se mobilizassem para o estado de greve. Nesse dia, durante a 7ª rodada da mesa geral de negociação das carreiras do Executivo, o governo fez uma proposta ultrarrebaixada, que as categorias rechaçaram por completo, culminando na deflagração da greve nas assembleias de base, a despeito da vontade de boa parcela das direções sindicais.

Em algumas bases sindicais, muitos servidores relataram não terem conhecimento das paralisações ocorridas no ano de 2023 e foram surpreendidos com a notícia de possibilidade de greve para 2024, o que reflete o descompromisso das direções dos sindicatos em unir e construir uma verdadeira mobilização em preparação para a greve. A exemplo disso, após a pandemia, algumas seções do Sinasefe mantiveram assembleias online e pouco se preocuparam em visitar os locais de trabalho para construir a luta junto à categoria.

Apesar disso, a adesão dos servidores foi impulsionada pelas insatisfações acumuladas ao longo dos anos sem lutas organizadas, observando além do enfraquecimento de suas carreiras, a precarização das instituições e a consolidação incompleta dos campi mais novos, onde falta infraestrutura básica, como bibliotecas, laboratórios, ginásios e refeitórios. No entanto, faltou direcionamento para que os servidores pudessem utilizar todo o seu poder de união e pressão sobre o governo.

Em 10 de abril deste ano, o Governo Federal provocou incerteza sobre a concessão dos auxílios anunciados oficialmente em dezembro passado, cujos recursos já estavam reservados, condicionando sua liberação à assinatura de um termo que restringia o direito à greve. A base reagiu negativamente à notícia deste acordo, o que fez o governo voltar atrás substituindo a cláusula que ameaçava diretamente os servidores por outra mais subjetiva. As lideranças sindicais, então, decidiram assinar o acordo sem mais contestações, assumindo o risco de uma potencial disputa judicial sobre a greve, conforme explicado no texto publicado anteriormente.

As mesas de negociação específicas para cada categoria iniciaram ainda em 2023 e, como explicamos, ainda que existam especificidades em cada carreira a divisão da negociação em duas mesas não deveria ter sido admitida pelas direções sindicais, pois enfraquece o poder de luta e união dos servidores. 

Em 19 de abril deste ano, pela primeira vez, após Sinasefe e Andes se juntarem à Fasubra, aconteceram as mesas de negociação salarial para técnicos e professores, separadamente, e teve como resultado uma proposta do governo muito distante às reivindicações das duas categorias. Com a rejeição dos servidores, a nova data para negociação foi marcada somente para o dia 15 de maio para docentes e 21 de maio para os TAEs, mais de um mês depois da mesa anterior. Essa espera despreocupada conduzida pelas direções sindicais, gerou um sentimento de angústia nos servidores que viam os dias passarem sem sinalização de nova reunião. Ao final desta rodada de negociação alguns dirigentes sindicais publicaram nas redes sociais falas derrotistas em um tom de conformismo, que gerou revolta e mostrou aos servidores a real disposição dos representantes sindicais que estavam negociando com o governo. Esses fatos contribuíram muito para o desgaste e o desfecho da greve que viria mais adiante. 

Após essas duas mesas de negociação, os sindicatos tiveram como prazo o dia 27 de maio para levar a proposta para a base e assinar o acordo, se fosse o caso. Apesar do Ministério da Gestão e da Inovação (MGI) alegar que as negociações com os docentes estavam finalizadas com a proposta do dia 15 de maio, docentes e TAEs votaram em assembleia pela não aceitação e apresentação de uma contraproposta. Sob pressão da base, o governo agendou nova data para apresentação da contraproposta elaborada pelo Andes, Fasubra e Sinasefe, apesar de ter declarado que na nova reunião agendada para 3 de junho, o governo apenas “reafirmaria a proposta já apresentada”. No mesmo dia 27 de maio, em “reunião secreta”, o Proifes assinou o acordo com o governo, desconsiderando as manifestações das bases. 

No entanto, em 29 de maio, a 3ª Vara de Sergipe anulou a assinatura do documento, por meio da ação movida pela seção do Andes, o ADUFS (Associação dos Docentes da Universidade Federal de Sergipe). O principal argumento utilizado pelas direções sindicais do Andes e Sinasefe para combater o golpe do Proifes foi o questionamento da legalidade da federação pela ausência de carta sindical. Este documento é emitido pelo Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE) reconhecendo a existência e a representatividade de um sindicato, ou seja, se era a carta sindical que faltava para um sindicato que atua para desmobilizar a categoria, este documento foi concedido pelo próprio governo.

Ao invés de repudiar a tutela do Estado e outros princípios que permanecem no sindicalismo brasileiro desde a época de Getúlio Vargas, as direções sindicais se adaptam usando um discurso de ilegalidade do Proifes e recorrendo à justiça para invalidar o acordo assinado pela federação. Sabe-se que a Justiça burguesa raramente intervém em favor dos trabalhadores e não se pode contar com ela.

Por fim, as últimas mesas de negociação salarial ocorreram em junho, nos dias 11, para TAEs e 12 para docentes; Novamente, nestas reuniões os dirigentes dos sindicatos não conseguiram arrancar do governo uma proposta mais satisfatória para os servidores. Apesar da proposta do governo ainda estar aquém das reivindicações dos servidores, a maioria das duas categorias votou por aceitar o acordo com o governo, o qual foi assinado em 27 de junho.

Dentro da categoria circulam diferentes avaliações sobre o movimento grevista. Por um lado, as direções anunciam o resultado da greve como uma grande vitória, em que houve grandes conquistas alcançadas pela categoria. Por outro lado, setores de oposição à direção nacional avaliam como uma grande derrota, visto que os avanços nas negociações ficaram distantes da defasagem salarial, dos cortes na educação e dos retrocessos acumulados nos últimos anos.

A última greve dos servidores federais em educação ocorreu em 2016, e por conta de uma série de fatores, desde o freio das direções sindicais até a pandemia, a categoria se colocou em movimento este ano. Ao se mobilizar no movimento de greve, os trabalhadores puderam dialogar e se organizar pelas reivindicações não só nacionais, mas de cada instituto federal e universidade federal e cada campus. Entre a categoria não há um sentimento de derrota. O que se percebe é uma serenidade de perceber que o momento não é de comemoração, mas tampouco de derrotismo e desmobilização.

A greve foi vitoriosa no sentido de elevação da consciência política da categoria. O movimento contou com uma grande parcela de servidores recém-ingressados no serviço público federal, muitos destes ainda estão no estágio probatório, que tiveram a experiência de greve em uma instituição federal pela primeira vez. Ficou evidente para os que aderiram à greve que, apesar de as conquistas estarem longe da pauta reivindicada, elas só foram arrancadas a partir da mobilização, e que se não houvesse greve, nem isso a categoria iria garantir. 

O governo Lula-Alckmin demonstra mais uma vez o compromisso com os empresários e banqueiros ao endurecer a conversa com os servidores federais em educação. Além de jogar na tática de cansar a categoria, ao marcar mesas de negociações distantes uma da outra, afirma que “não irá negociar com quem entrar em greve”, em uma ameaça direta a outras categorias do serviço público federal, e assina acordos de negociação às escondidas com o Proifes, tentando desmobilizar a greve.

Não só isso, mesmo após o movimento de greve, o governo anuncia o “congelamento de gastos” (eufemismo para corte de recursos) na cifra de R$ 15 bilhões, sendo que R$ 4,4 bilhões são da saúde e R$ 1,2 bilhão. É nítida a tentativa de agradar o mercado financeiro, cortando a verba dos serviços públicos direcionados à população e garantido o caixa para o pagamento da dívida pública.

A União Nacional dos Estudantes (UNE), a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) convocaram manifestação para dia 14 de agosto, cuja chamada foi “Ocupar as ruas por menos juros e mais investimentos na educação”.

Essas entidades ficaram em silêncio durante a greve dos servidores federais em educação, e agora pautam a redução de juros como forma de garantir as verbas para a educação. Estivemos nas ruas no dia 14 de agosto, mas defendendo as palavras de ordem que realmente tocam nos interesses da juventude e dos trabalhadores. Queremos a revogação do NEM, queremos todo o investimento necessário na educação e o fim do pagamento da dívida pública. Queremos educação pública, gratuita e para todos.

Como mencionado anteriormente as reivindicações dos servidores dos institutos e universidades federais vão além das pautas da greve, que não foram completamente atendidas. São exigências por melhores condições de trabalho, pela consolidação e ampliação da infraestrutura, por concursos com códigos de vagas que realmente atendam a necessidade das instituições e por mais investimentos na educação de uma maneira geral. 

Os comunistas sabem que a classe trabalhadora é capaz de muitas conquistas se organizada de maneira unificada e combativa. É essencial começar desde já a preparação para os próximos combates, o que requer um trabalho de base e diálogo direto com os trabalhadores nos locais de trabalho, incentivando-os a pressionar ou substituir as lideranças sindicais que não têm se preocupado em fazer a sua tarefa.