Como foi o Congresso Mundial que aprovou a filiação da Esquerda Marxista!
O Congresso Mundial da Corrente Marxista Internacional foi celebrado em Barcelona no final do mês de Julho. É difícil expressar o clima em cada uma das sessões do congresso. Não se trata de apenas mais uma reunião de ativistas de esquerda em busca de respostas. Todos os 350 delegados e convidados puderam sentir que estes anos de preparação, após décadas de defesa das idéias do marxismo contra os ataques da burguesia, dos reformistas, revisionistas e sectários, estas idéias são agora reivindicadas pelos acontecimentos. Todas as reuniões anteriores da CMI pareciam o preparativo para este congresso mundial, um congresso que prepara o terreno para o avanço internacional do marxismo.
Compareceram ao congresso revolucionários de 27 países. E como pudemos ver, o maior avanço se deu na América Latina. Em 1992, durante o congresso de refundação da Internacional, o México era o único representante da América. Agora além da forte seção mexicana que desempenhou um importante papel na luta contra a fraude eleitoral de 2006, havia delegados e representantes e observadores do Canadá, EUA, Cuba, El Salvador, Bolívia, Venezuela, Argentina e Brasil, nove países do continente americano. Além destes, enviaram saudações Honduras, Guatemala e Peru que não puderam estar presentes.
Uma vez mais, devido a problemas com vistos de entrada, os companheiros de Marrocos e da Nigéria não puderam estar presentes, mas enviaram ao congresso mensagens de solidariedade. Também estavam presentes importantes delegações do Irã e do Paquistão. Tentou-se que um observador oficial da delegação do PRP indonésio pudesse assistir ao congresso, mas como nos casos de Marrocos e Nigéria, este não conseguiu seu visto de entrada e enviou sua saudação ao congresso.
Estava representada a maioria dos países europeus, e a Europa do Leste como uma região de crescimento significativo. Jovens ativistas da Polônia, Rússia, Eslováquia e da antiga Iugoslávia (Sérvia) estão decididos a se reunir novamente e voltar a forjar a tradição do genuíno marxismo na Europa do Leste. Isto acontece em um momento em que a classe trabalhadora destes países começa a levantar a cabeça depois das derrotas do passado. Agora existe uma nova classe trabalhadora na Europa do Leste que já passou pela experiência da degeneração do stalinismo e busca uma saída.
Outros países representados foram a Grécia, Itália, Espanha, França, Grã-Bretanha, Suécia, Dinamarca, Bélgica, Alemanha, Áustria, Suíça, além de um representante oficial da ala de esquerda do movimento republicano irlandês éirígí que está disposto a construir vínculos internacionais. Este ano o IRSP (Partido Socialista da Irlanda) não pôde enviar uma delegação.
Paquistão, a maior seção da CMI, estava representado muito aquém de suas possibilidades, e uma vez mais devido a sérios problemas de vistos de entrada. Apesar disto, o dirigente marxista Lal Khan pôde dar um informe da crise do Estado paquistanês e o papel da corrente marxista na luta de classe deste país. O Congresso Mundial de 2008 foi a maior reunião e a mais representativa que a Corrente Marxista Internacional já celebrou desde sua fundação.
A sessão de abertura do congresso foi sobre perspectivas mundiais, apresentada por Alan Woods. Publicaremos um informe separado sobre isso, mas o que pôde ser visto claramente na discussão é que da Venezuela ao Paquistão, do México ao Brasil, da Itália à Espanha, os marxistas começam a desempenhar um papel na política de seus países. O congresso discutiu em detalhes a situação nestes e em outros países; e as discussões foram intensas porque os ali presentes não se encontravam à margem como comentaristas, e sim como verdadeiros participantes na linha de frente da luta de classes. Da discussão também se desprendeu que em cada país nos encontramos em uma situação similar, sob os mesmos ataques contra a classe trabalhadora, e também a uma crescente radicalização dentro do movimento operário e na juventude. Já não é uma questão deste ou daquele movimento em um ou dois países, mas sim de um movimento mundial que está se desenvolvendo na nossa frente.
As idéias e decisões do congresso estavam autorizadas pela compreensão que seriam postas à prova pelo movimento operário de massas e que, em última instância, estas idéias marcariam a diferença entre a derrota e a vitória.
Entre as ótimas intervenções feitas na discussão de Perspectivas Mundiais destacou-se a de Pepe da Bolívia. Ressaltou o quão próximo estiveram os trabalhadores bolivianos da tomada do poder. “O proletariado boliviano está enviando ao mundo uma mensagem: se tens uma oportunidade e não a aproveitas, poderás lamentá-lo durante o resto de vossas vidas”. O Congresso se entusiasmou ao escutar os eventos da Bolívia e as atividades de El Militante no país. Pepe concluiu apontando para o banner que estava a suas costas durante a intervenção que continha uma foto de um mineiro indígena boliviano: “logo, logo teremos um mineiro como este, que enfrenta a morte todo santo dia, em nosso congresso. Eles gritarão “JALLALLA! [ha-ya-ya, viva], JALLALLA uma América socialista! JALLALLA revolução! JALLALLA a CMI”! O que provocou fervorosos aplausos.
Em certo momento da discussão Alan Woods interrompeu a sessão para anunciar a chegada de um convidado especial. Durante o giro de apresentação do livro Reformismo ou Revolução, um dos atos mais intensos aconteceu no estado natal de Chávez, Barinas. Uma das pessoas que ajudou a organizar este ato foi o membro da Assembléia Nacional por esta região, embora preferisse ser conhecido apenas como o companheiro Geovanni Peña. O companheiro Peña agradeceu, saudou o congresso e fez uma breve intervenção onde explicou que “precisamos aprofundar nosso uso do marxismo”, acrescentando que o povo da Venezuela votou pelo socialismo nas últimas eleições. A presença do companheiro Peña, junto com a maior delegação que já tivemos, até então, de companheiros venezuelanos (que incluía trabalhadores das fábricas ocupadas, jovens companheiros que participam da criação das juventudes do PSUV, membros da direção regional do PSUV, etc.) confirmavam a crescente influência da Corrente Marxista Internacional neste país crucial para a revolução mundial.
Os dias seguintes do congresso foram dedicados a profundas discussões sobre países específicos: Paquistão, Venezuela, Itália, Espanha e Brasil. O proeminente marxista paquistanês Lal Khan explicou os recentes acontecimentos deste país. Depois se seguiu uma discussão sobre o trabalho na Venezuela e foi aprovada uma resolução de apoio à nacionalização do Banco de Venezuela. Houve comissões sobre a Itália, Espanha e Brasil. Os marxistas italianos chegaram ao congresso depois de um árduo período de dois meses onde participaram de aproximadamente 1.500 agrupamentos e reuniões para o congresso do PRC (Partido da Refundação Comunista). Embora ainda seja uma tendência numericamente pequena, desempenharam um papel importante na derrota da ala de direita encabeçada por Bertinotti/Vendola. Também conseguiram apoio em muitas regiões novas e significativamente entre os trabalhadores do partido.
No transcurso do congresso foram aprovadas várias resoluções. Uma para apoiar os “cinco heróis cubanos” e outra para apoiar a derrota da oligarquia no referendo revogatório da Bolívia. Organizou-se também, para os delegados, uma comissão noturna sobre o Irã.
Depois houve um informe organizativo geral sobre o desenvolvimento da CMI no mundo e uma sessão importante sobre finanças. Mais adiante publicaremos um resumo, mas a imagem que se viu foi a de uma Corrente Marxista Internacional dando grandes passos adiante no período recente, tanto em termos de crescimento numérico das sessões individualmente, sua crescente influência dentro do movimento operário em vários países chave e a chegada à corrente de novos grupos.
A filiação do grupo brasileiro Esquerda Marxista
A intervenção de Serge Goulart do grupo brasileiro Esquerda Marxista foi um dos pontos álgidos da discussão. Os companheiros desempenham um papel dirigente no movimento de fábricas ocupadas; um indicador do ambiente é que muitos outros trabalhadores disseram que adotariam as mesmas táticas se sua fábrica fosse fechada pelo empresário. Explicou que Lula tenta estrangular a revolução latino-americana. A posição de Lula de que a crise mundial não alcançará o Brasil é o mesmo que dizer que é possível existir capitalismo em um país isolado! Serge concluiu que neste período de crise econômica mundial e depois do colapso do stalinismo, é quando vemos os avanços da CMI no Paquistão e internacionalmente. “Sabemos que aqui na CMI encontramos o nosso pessoal”!
O sentimento entre os companheiros era mútuo. No final da semana foi ratificada a filiação do grupo Esquerda Marxista como a seção da CMI no Brasil e está claro que os companheiros não estarão na periferia da Internacional. A seção brasileira traz consigo um número significativo de quadros experimentados ativos no movimento de fábricas ocupadas, no movimento negro socialista e na juventude. Em certo sentido era uma reminiscência do regresso de Trotski aos bolcheviques em 1917. Raskolnikov recordava: “Desde sua primeira intervenção pública todos nós leninistas sentimos que Trotski era um dos nossos”. Neste congresso muitos ativistas experimentados da CMI sentiram o mesmo com relação à Esquerda Marxista.
A votação da filiação da Esquerda Marxista foi unânime e uma vez anunciada oficialmente “agora temos a seção brasileira”, a delegação brasileira subiu ao palco e todos os delegados e convidados se puseram de pé em meio a um estrondoso aplauso e vivas. É difícil explicar o ambiente do congresso neste momento, mas as emoções transbordaram quando os companheiros subiram ao palco e levantaram seus punhos. Serge Goulart e os demais companheiros brasileiros gritaram: “Viva o socialismo e a revolução! Viva o proletariado internacional! Venceremos”!
Os companheiros brasileiros fizeram um grande esforço econômico com oito companheiros presentes ao congresso. Explicaram que a fusão da Esquerda Marxista com a CMI foi muito importante para eles e todos seus companheiros no Brasil esperavam com ansiedade o informe da fusão oficial das duas organizações.
A filiação da Esquerda Marxista fortalece enormemente a CMI na América Latina. Estes companheiros não somente dirigem o Movimento de Fábricas Ocupadas no Brasil, também são os promotores do Movimento Negro Socialista, têm um número significativo de dirigentes sindicais, um grupo de jovens revolucionários e uma presença importante no PT. Na realidade, entre seus militantes existem fundadores do PT. Já possuem anos de militância e têm vínculos importantes com ativistas revolucionários em muitos outros países latino-americanos, como Bolívia, Uruguai, Paraguai e outros. Também possuem um grupo de filiados na Venezuela que já haviam se fusionado com a CMR, a seção venezuelana da CMI. Com seu trabalho no Movimento Negro Socialista também conseguiram contatos significativos com ativistas de vários países africanos. A Esquerda Marxista está destinada a desempenhar um papel importante na construção e desenvolvimento da CMI na América Latina e mais além.
Crescimento da CMI
A segunda metade do congresso, de fato, foi a discussão sobre o crescimento das seções da CMI no mundo e a filiação de quatro novas seções à Internacional. O Brasil foi o primeiro. Na sessão seguinte foi votada a filiação da Suíça. Os delegados puderam ver os jovens trabalhadores e estudantes da nova seção suíça que surpreenderam a todos com seu crescimento, sua atividade e combatividade.
Outro grupo muito importante que passou a fazer parte da CMI foi a Liga Socialista Revolucionária Iraniana, que tem companheiros no exílio e dentro da República islâmica, sua entrada foi aprovada com muito entusiasmo. Entendendo que os companheiros enfrentam enormes tarefas devido às fissuras que estão aparecendo no regime, a internacional decidiu dar aos companheiros toda a ajuda possível para defender a classe trabalhadora iraniana contra a repressão e para estender as idéias do marxismo no Irã.
O último grupo a se filiar foi o BPJ (Bloque Popular Juvenil) de El Salvador. Os companheiros são membros do FMLN e têm enfrentado ataques orquestrados por parte das forças do Estado, incluindo prisões e inclusive desaparecimentos. Uma prova do poder das idéias marxistas é que a força da reação reconhece que as seções da CMI representam uma verdadeira ameaça a seu governo e atuam em conseqüência. Da mesma forma, os melhores setores do movimento operário são atraídos a CMI como internacional que une verdadeiramente os revolucionários que querem avançar na luta.
Os delegados foram informados que as filiações à CMI não param por aqui. Nos próximos meses e anos esperamos que distintos grupos unam-se à Internacional. Os próximos da lista são Polônia, Marrocos e Bolívia onde já existem grupos, embora não existam seções oficiais. Eles estão preparando seus congressos para o próximo período onde formalizarão sua posição e pedirão a filiação. Mas existem muitos outros grupos em diferentes países que buscam a união com a CMI.
Coleta recorde
Durante o congresso foi feito um apelo por recursos econômicos e humanos que permitissem a realização de visitas necessárias para construir a internacional em cada país onde haja revolucionários se dirigindo às idéias da CMI. Muitos companheiros comentaram que esperavam com impaciência a coleta. Fred Weston fez o chamado, com um toque de humor, à coleta, que sempre é parte muito séria do congresso. De acordo com o desenvolvimento geral da CMI a coleta deste ano arrecadou uma soma recorde, mais de 34.800 euros. Os companheiros brasileiros comentaram que se tratava de uma coleta muito elevada que refletia o entusiasmo verdadeiro de todos os companheiros com a Internacional.
Depois de seis longos dias de discussão o congresso terminou. Alan Woods mais uma vez se dirigiu aos delegados para o encerramento. “Este foi um congresso extraordinário”, começou Alan, “nos dá confiança, confiança no poder das idéias. Devemos dizer aos jovens: estudem as idéias do marxismo. Há algo de diferente neste congresso, um sentimento de que a internacional avança. Todas as demais tendências estão em declive, da burguesia aos imperialistas, dos reformistas aos stalinistas, e até a última seita. Camaradas, o caminho está aberto à nossa frente. Recebemos na Internacional quatro novas seções, é uma grande vitória. Os companheiros suíços surpreenderam a todos nós, são jovens trabalhadores entusiasmados. Temos um grupo maravilhoso na Polônia. O trabalho paciente de anos e décadas começa a dar frutos. Estamos apoiados nos ombros de gigantes: Marx, Engels, Lênin, Trotski, Rosa Luxemburgo, James Connolly e o camarada Ted Grant que já não está conosco. Mas suas idéias e métodos estão presentes em tudo que fazemos”.
Alan concluiu com as palavras finais de Leon Trotski: “Estou convencido do triunfo da IV Internacional. Adiante!” O congresso se pôs de pé e cantou A Internacional em diversos idiomas diferentes, seguido pelo canto espontâneo da italiana Bandiera Rossa. Todos os companheiros que participaram do congresso retornaram a seus países com uma idéia: construir a corrente marxista e prover ao movimento operário as idéias, métodos e táticas necessárias para construir partidos revolucionários de massa em todos os países e preparar o terreno para derrubar o apodrecido sistema capitalista de uma vez por todas e para sempre, e assim abrir uma nova época para a humanidade.