Foto: Marcos Santos, USP Imagens

Destruição de empregos e direitos: aprofundamento da crise e o papel nefasto das direções

Artigo publicado no jornal Foice&Martelo Especial nº 07, de 28 de maio de 2020. Confira a edição completa

A atual crise do sistema capitalista, escancarada pela disseminação global do novo coronavírus, tem efeitos econômicos devastadores para a classe trabalhadora. E isso já é evidenciado nos primeiros dados sobre a questão.

O número de brasileiros com idade para trabalhar hoje, mesmo que como aprendiz (idade mínima de 14 anos), é de 172 milhões de pessoas de um total de 209,5 milhões habitantes. O IBGE considera que, destes, a força de trabalho no país hoje é composta por 106,1 milhões de pessoas. Destas, 93,7 milhões estão ocupadas e outras 12,3 milhões, desocupadas. Assim, o total de pessoas fora do mercado de trabalho está hoje na casa dos 65 milhões de pessoas! (1)

Temos, nesse bojo dos 65 milhões, jovens de 14 a 18 anos que dificilmente conseguem um trabalho com carteira assinada, mas também temos os desalentados (trabalhadores que deixaram de procurar emprego), os subocupados (trabalham menos de 40h por semana mesmo tentando trabalhar mais), e a força de trabalho em potencial (pessoas que procuraram emprego, mas não puderam assumir as vagas por problemas como cuidar de crianças ou idosos). (2)

Somando os desempregados, mais os desalentados, os subocupados e a força de trabalho potencial, o país soma mais de 26 milhões de pessoas na situação de subutilizados. E isso vai piorar. De acordo com o levantamento apresentado pelo IBGE em abril, mais 1,2 milhões de pessoas passaram a procurar emprego no 1º trimestre de 2020, em relação ao período anterior. (3)

Para falar em desempregados, também precisamos melhor entender o que são os trabalhadores ocupados. Dos 93,7 milhões de trabalhadores considerados “ocupados”, quase 40 milhões são informais, 33,7 milhões são empregados com carteira assinada no setor privado, 11,6 milhões são ocupados sem carteira e 11,4 milhões são efetivos no serviço público. (1)

Em uma conta rápida, podemos ver a receita perfeita para uma tragédia social: considerando que somente os trabalhadores com carteira assinada e os servidores têm algum tipo de segurança no emprego (45,1 milhões), temos 48,6 milhões que ou já foram ou ainda serão demitidos, sem qualquer direito trabalhista, por conta desta pandemia. Ou mesmo que estão sendo diretamente afetados pela quarentena, como os vendedores ambulantes.

Como vemos, por detrás de siglas como “ocupados”, temos dezenas de milhões de trabalhadores em uma situação de absoluta fragilidade social, agora exposta de modo cruel a toda a sociedade. Juntando os trabalhadores subutilizados, com aqueles que compõem a força de trabalho total e os “ocupados” sem direitos, é fácil compreender por que tivemos quase 100 milhões de pedidos por auxílio emergencial. E mesmo com o governo reconhecendo que terá que disponibilizar o auxílio a pelo menos 92 milhões de brasileiros (4), ele já negou essa verba a quase metade dos requerentes.

Vemos que a situação está no limite para dezenas de milhões de brasileiros. E mesmo aqueles que mantêm alguns direitos por conta da carteira assinada, com a MP draconiana de Bolsonaro, estão tendo seus contratos suspensos e salários significativamente reduzidos. Dos quase 34 milhões de trabalhadores com carteira assinada no país, 7,2 milhões já tiveram seus contratos suspensos ou redução salarial considerável. Desses, mais de 54% tiveram a suspensão contratual por pelo menos dois meses. Dos praticamente 46% restantes, a redução salarial vai de 50 a 70% dos rendimentos de cada trabalhador! (5)

 

O papel das direções

Enquanto a classe trabalhadora sofre, a CUT, principal central sindical brasileira, se mantém mais oportunista do que nunca. A defesa do emprego, das remunerações, não passaram de bandeiras rapidamente deixadas para trás. Isso logo após o primeiro mês da pandemia.

Ao visitarmos o site da CUT, a principal notícia é sobre como garantir o miserável auxílio de R$ 600 oferecido pelo governo federal. Nada sobre a luta pela estabilidade no emprego ou pela manutenção dos salários. Nenhuma campanha ou iniciativa nesse sentido. Um silêncio  mesmo sobre a necessidade, mínima, de aumentar o auxílio para um salário mínimo ao menos a todos sem renda.

A vergonhosa pauta da entidade, hoje, pode ser exemplificada na proposta de “combate” à Covid-19 que entregaram a Dória, junto a outras centrais sindicais:

  1. Critérios para a flexibilização do isolamento social: 14 dias seguidos de redução na taxa de mortalidade e infecção. Isso significa que, se as mortes continuarem em um patamar alto (média de 900 mortes por dia), reduzindo minimamente seus índices em 14 dias (para 700), as entidades concordarão com a flexibilização;
  2. Mínimo de dois metros de distanciamento entre os trabalhadores, como se o simples fato de terem que sair de casa para trabalhar já não inviabilizasse essa proposta;
  3. Instalação de cabines de desinfecção e entrada escalonada, ignorando que a segurança do trabalho nunca foi prioridade para a burguesia. Em especial agora, o que veremos é a maior flexibilização de qualquer medida de proteção aos trabalhadores frente à sede de lucro capitalista;
  4. Garantia de que as pessoas do setor de risco fiquem em casa, o que mesmo Bolsonaro reconhece desde no princípio da pandemia, sendo mais uma proposta inócua. (6)

O nível do rebaixamento político da CUT salta aos olhos. Conseguiu sair da demagogia barata para uma plataforma pró-burguesa de “enfrentamento” à disseminação do coronavírus. Nenhuma palavra sobre os pontos centrais que interessam à classe trabalhadora: defesa do emprego e dos salários; fechamentos dos serviços e setores não essenciais da economia; estatização de todo o sistema de saúde; fim do pagamento da dívida pública; estatização do Sistema Financeiro etc. Em resumo, a CUT se recusa a pautar ou a colocar em prática qualquer bandeira que represente uma saída real à classe trabalhadora. Deixam a avenida livre para a burguesia atacar os direitos mais básicos da classe trabalhadora.

O governo e as direções seguem perdidos frente a uma das mais brutais crises do sistema capitalista. De um lado, ataques, de outro, a total inação. Enquanto isso, segue a classe trabalhadora em sua busca pela sobrevivência. Como escreveu Lenin: “o capitalismo é um horror sem fim”!

Fontes:

1 –  https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-03/informalidade-cai-mas-atinge-38-milhoes-de-trabalhadores

2 –https://oglobo.globo.com/economia/desalentado-subutilizado-entenda-pesquisa-de-emprego-do-ibge-22426179

3-  https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/04/30/O-que-diz-o-primeiro-dado-de-desemprego-na-pandemia

4-https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2020/04/17/internas_economia,845458/auxilio-emergencial-de-r-600-deve-beneficiar-ate-92-milhoes-de-pessoa.shtml

5 –https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2020/05/12/internas_economia,854051/7-2-milhoes-de-trabalhadores-ja-tiveram-salario-reduzido-na-pandemia.shtml

6– https://www.cut.org.br/noticias/centrais-entregam-a-doria-proposta-de-enfrentamento-a-crise-do-coronavirus-2a26)