A “Dívida Pública” e o domínio imperialista
Na prática, a chamada Dívida Pública é um mecanismo de transferência de dinheiro para os banqueiros e investidores. Em 2019, por exemplo, o valor destinado para pagamento dos juros e amortizações da “dívida” chegou a mais de R$ 1 trilhão, ou seja, cerca de 40% de todo o orçamento federal que totalizou aproximadamente de R$ 2,7 trilhões. Se somarmos as verbas destinadas para áreas de interesse da classe trabalhadora, tais como educação, saúde, cultura e assistência social, a quantidade de investimento público destinada a essas áreas juntas fica em cerca de 11% do orçamento. A classe trabalhadora pode perceber diariamente, na prática, como o investimento nos serviços públicos é insuficiente para todas nossas demandas.
A Dívida Pública é composta, principalmente, pela chamada “Dívida Interna”, que está em aproximadamente R$ 5,9 trilhões e a dita “Dívida Externa” em cerca de R$ 574 bilhões. Para se ter ideia, em 2019 o PIB brasileiro alcançou R$ 7,3 trilhões, enquanto a dívida estava em torno de R$ 6,4 trilhões. Ou seja, no ano passado, a Dívida Pública chegou a quase 90% de todas as riquezas produzidas no país! Esses números apenas demonstram qual o fundo político para que serve essa “dívida”: tornar o país dependente dos banqueiros e investidores milionários. Mesmo a “Dívida Interna”, na verdade, é adquirida pelos banqueiros e investidores estrangeiros.
Essa receita de endividamento é um mecanismo da burguesia imperialista para manter o controle dos países atrasados ao mesmo tempo que suga todas as riquezas produzidas pela classe trabalhadora. Em alguns países como o Líbano, a Dívida Pública corresponde a 140% de seu PIB; no Sudão é 120% de seu PIB. A América Latina continua absolutamente endividada. Somente para a Dívida Externa, por exemplo, Brasil, Argentina, Chile e Venezuela destinaram entre 2018 e 2019, US$ 377 milhões, US$ 59 milhões, US$ 38 milhões e US$ 8 milhões devendo no total US$ 555 bilhões, US$ 209 bilhões, US$ 168 bilhões e US$ 103 bilhões, respectivamente. Na verdade, a “Dívida Pública” é uma dívida eterna e impagável!
Mesmo hoje nos países economicamente dominantes como EUA e Grã-Bretanha, existe um crescimento do endividamento devido às últimas crises econômicas do capitalismo, que levou esses países a se endividarem buscando não paralisar a economia. Mas essa paralisação é inevitável, visto que o valor real dos salários vêm sendo deteriorada em todo o mundo. Antes essa queda no consumo era “evitada” pelo endividamento massivo dos trabalhadores, agora, essa opção não está mais disponível para a burguesia, visto a situação alarmante do crescente endividamento mesmo nos países economicamente dominantes e a profunda crise econômica mundial deflagrada desde 2008, com a mais lenta tentativa de recuperação da história! Digamos “tentativa de recuperação” já que, de fato, a economia mundial não mostra nenhum sinal de melhora e a burguesia demonstra toda sua fragilidade e desespero.
Já há muito tempo, o revolucionário marxista Lenin explicava a nova fase que o capitalismo alcançou na virada do século 19 para o 20: o imperialismo. Nessa fase, a livre concorrência foi substituída pelos grandes monopólios, reforçando o domínio de um punhado de países sobre o restante do mundo. Além disso, houve também uma mudança no papel dos bancos, que antes era focado na intermediação de pagamentos. Tendo a sua disposição uma grande quantidade de dinheiro a partir de depósitos e operações financeiras, os bancos podiam emprestar quantias à classe capitalista recebendo um retorno em juros. Esse era – e ainda é – o principal meio que os bancos transformam dinheiro em capital. Tais operações, que se tornavam cada vez mais complexas ao longo da história, permitiram aos bancos conhecer a situação financeira de cada capitalista individual e, posteriormente, controlá-la cedendo ou privando esse ou aquele de capital, cobrando mais ou menos juros etc. Portanto, há um salto no papel dos bancos: de simples operadores técnicos para controladores da situação financeira dos capitalistas individuais. Essa mudança qualitativa veio acompanhada da fusão do capital financeiro ao capital industrial, com os grandes bancos investindo diretamente em ramos da produção.
A união entre grandes bancos e indústrias é selada com a participação direta dos capitalistas e suas “sociedades anônimas” nos diferentes governos burgueses. Hoje não é incomum encontrar algum banqueiro, investidor ou capitalista industrial no governo, como é o caso do ministro da economia Paulo Guedes, co-fundador do Banco BTG Pactual, um banco de investimentos brasileiro.
Cortes de direitos, privatizações e terceirização
Com a chegada de Bolsonaro ao governo federal, os cortes de direitos e as privatizações estão a toda velocidade. Essa política não é nenhuma novidade, mesmo Lula e Dilma do PT – partido que se reivindica da classe trabalhadora – aplicaram a mesma política que foi continuada pelo vice de Dilma, Michel Temer (MDB), após o impeachment da presidente petista.
A crise econômica que se iniciou em 2008 levou a burguesia em todo o mundo a buscar “ajustar as contas”, ou seja, jogar o peso da crise sobre a classe trabalhadora para voltar a arrancar altas taxas de lucros. Por isso, em todo o mundo a classe dominante busca reduzir direitos trabalhistas, aumentar ou criar impostos, acabar com a aposentadoria e demitir massivamente. É evidente que esse caminho é seguido de diferentes formas nos países, mas a fórmula é retirar da classe trabalhadora para continuar enriquecendo os banqueiros, investidores e grandes empresários. Por outro lado, a classe dominante tem enfrentado uma resistência exemplar da classe trabalhadora e da juventude em todo o mundo, foi o que vimos recentemente em alguns países como Chile, França, Líbano, Equador, Venezuela e muitos outros. Fato é que ao tentar “equilibrar as contas” a burguesia aumenta a indignação popular, o que leva a explosões sociais por toda a parte.
Essas medidas de cortes e “reformas” são recomendadas pelas instituições burguesas, como o Banco Mundial e o FMI (Fundo Monetário Internacional) para a economia “voltar a crescer”. Mas mesmo nos países onde essas medidas estão sendo aplicadas, a própria burguesia se prepara para uma crise econômica ainda maior que a de 2008. Agora, a classe dominante usa a disseminação do Coronavírus – como ficou conhecido a Covid-19 – para justificar a próxima recessão que está por vir. Existe a previsão de que a China tenha uma contração em sua economia, algo que não ocorre desde 1976. O governo Bolsonaro também já avisa que o crescimento do PIB não chegará a 2% em 2020, completando seu anúncio dizendo que o Brasil não tem dinheiro para injetar em setores que podem sofrer com a crise, reforçando o pedido do ministro Paulo Guedes para salvar a economia brasileira: Privatizar! Privatizar! Privatizar!
Evidentemente, a Covid-19 não pode ser o responsável pela próxima crise econômica que se aproxima. A economia mundial já dava sinais de uma recuperação fraca e mais lenta que a da Grande Depressão, como ficou conhecida a profunda crise econômica de 1929, que só acabou com a Segunda Guerra Mundial. Inclusive, a própria burguesia não consegue conter o avanço do vírus justamente pela falta de interesse político, pois medidas que de fato poderiam ajudar a resolver esse problema poderiam mexer na estrutura do sistema capitalista. Para se ter ideia, as mesmas medidas que a burguesia impôs no combate à Gripe Espanhola foram repetidamente utilizadas ao longo da história e isso se aplica à Covid-19. Porém, a Gripe Espanhola causou milhões de mortes no mundo todo, enquanto a taxa de mortalidade da Covid-19 é relativamente baixa e ataca principalmente idosos ou pessoas com problemas de saúde anteriores. Nos EUA, onde o sistema de saúde é totalmente privatizado e o mais caro do mundo, a Covid-19 tem tido um sucesso tremendo em avançar contra população trabalhadora que não tem acesso ao tratamento adequado sem desembolsar rios de dinheiro: cerca de 27 milhões de pessoas não têm acesso a planos de saúde e outros 44 milhões possuem planos em sistema de coparticipação, desembolsando parte do dinheiro para realizar exames e tratamentos junto da seguradora (Leia mais sobre a Covid-19).
Toda essa situação social piora e muito graças ao sistema capitalista, que impõe o desemprego para 11,9 milhões de trabalhadores, sem falar na informalidade que atinge 38,3 milhões e nos trabalhadores que desistiram de procurar emprego, cerca de 65,7 milhões no Brasil. Esses dados escondem ainda que dos trabalhadores formais (com carteira de trabalho), 22% eram terceirizados em 2018 e a perspectiva era que em 2019 a terceirização aumentasse e atingisse 4 milhões de pessoas. Em 2020, a projeção é que a terceirização continue aumentando, principalmente porque um trabalhador terceirizado recebe aproximadamente 20% ou 30% menos. Foi em 2017, durante o governo Temer que a terceirização passou a ser aceita irrestritamente, junto da “reforma” trabalhista, que na prática cortou uma série de direitos da classe trabalhadora.
Acontece que a burguesia brasileira, sendo extremamente dependente da burguesia imperialista, só tem a oferecer um custo de trabalho baixo para atrair o capital dos grandes banqueiros, investidores e grandes empresários.
Tratando da terceirização dos serviços (educação, saúde, cultura, assistência social etc.) podemos compreender que a finalidade é acabar com os serviços públicos, precarizar as condições de trabalho e atendimento, entregando tudo para a iniciativa privada e destinando verba pública diretamente para ONGs (Organizações não-governamentais), OSCs (Organizações da Sociedade Civil), OSs (Organizações Sociais), organizações religiosas e filantrópicas etc.
A terceirização de serviços da saúde vem crescendo desde 2014. Hoje existem mais de 3.000 estabelecimentos municipais de saúde que estão terceirizados em todo o Brasil. Na cidade de São Paulo, das 466 Unidades Básicas de Saúde (UBS), 396 são geridas por OSs. Os governos a favor do capital como o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), afirmam que essas medidas buscam melhorar os serviços, mas sabemos que os exames são demorados, as filas enormes e o atendimento é péssimo. Além disso, essa política de terceirização dos serviços públicos acaba saindo mais cara que a administração direta e não possui nenhuma transparência. Ano após ano, Covas vem diminuindo o investimento em saúde em relação à arrecadação da cidade: 22,17% em 2017, 20,75% em 2018 e 19,37% em 2019. Os profissionais de saúde terceirizados pelas Organizações acabam tendo piores condições de trabalho e piores salários, como já se espera, enquanto o dinheiro para manter os serviços continua saindo da verba pública. Um bom negócio para os empresários que se disfarçam de filantropos e “bem feitores” sociais! Depois quem “mama nas tetas do Estado” são os funcionários públicos!
Em outros momentos, nos debruçamos sobre essa situação na assistência social. Na educação a situação não é muito diferente… Aliás, tanto Bolsonaro quanto Guedes estão de olho, sorrateiramente buscando entregar todo o sistema de educação pública diretamente nas mãos dos grandes empresários e investidores, pois essa área pode ser muito lucrativa como já foi mostrado pelo gigantesco crescimento dos tubarões do ensino (Kroton, Laureate e Cruzeiro do Sul Educacional).
Esse é o cenário que se desenha após a crise econômica mundial de 2008, na qual mal o capitalismo pôde realmente apresentar recuperação e uma nova crise aponta no horizonte. O capitalismo é a verdadeira doença que está em todo o globo.
A classe trabalhadora e a juventude mostram como acabar com esse mal
Desde o início do ano passado, a Esquerda Marxista impulsiona o “Fora Bolsonaro”, explicando que o momento não era de desarticulação e reacionarismo da classe trabalhadora, como muitas organizações de esquerda apontavam. Pelo contrário, tanto no Brasil quanto no mundo a classe trabalhadora tem demonstrado sua disposição de lutar contra os ataques orquestrados pela burguesia. Hoje, o “Fora Bolsonaro!” está mais do que amplamente difundido entre a classe trabalhadora e a juventude.
Precisamos também nos desvencilhar das organizações reformistas e oportunistas, que agora agarram o “Fora Bolsonaro!” para desviar o ódio popular para as vias institucionais e seguras da classe dominante, apelando ao “impeachment”, à eleições gerais e à conciliação de classes. Reafirmamos que não adianta simplesmente tirar Bolsonaro e buscar colocar outro representante da burguesia para continuar explorando nossa classe e destruindo o futuro dos jovens! Está mais do que na hora de organizarmos comitês de luta próprios, em torno da linha política de Fora Bolsonaro! Por um governo dos trabalhadores, sem generais, nem patrões!
Nesses comitês devemos levantar as bandeiras de interesse da classe trabalhadora e da juventude contra a burguesa e o capital. Não vamos mais aceitar que nossas condições de vida e de trabalho fiquem cada dia mais precárias, enquanto os bancos batem recordes de lucro! Para isso, somente a organização de nossa classe pode dar fim ao mundo de miséria, exploração e morte que a burguesia nos oferece.
A crise social aberta pela disseminação da Covid-19 em todo o mundo vai provocar intensos choques entre a classe trabalhadora, que busca sobreviver a essa crise e a burguesia, que propõe medidas contraditórias em relação ao coronavírus ao exigir uma “quarentena”, mas não permitindo que os trabalhadores não essenciais parem. Mas classe a trabalhadora tem dado exemplos de resistência, como foi o caso da Espanha. A única saída que realmente permite aos trabalhadorespoder proteger sua saúde e de suas famílias é a sua própria organização. Defendemos aqui bandeiras que podem ser amplamente difundidas para ajudar nossa classe a se unificar em um eixo comum de lutas:
- Serviços públicos, gratuitos e para todos!
- Fim do pagamento da “Dívida Pública”! Todo investimento necessário em saúde, educação, cultura e seguridade social!
- Revogação imediata da EC 95 do Teto dos Gastos! Abaixo todas as “reformas” trabalhistas e “reformas” da previdência!
- Estatização de todos os serviços públicos terceirizados e privatizados!
- Contratação imediata e direta de todos os trabalhadores terceirizados! Garantia de boas condições de trabalho e estabilidade no emprego!
- Fora Bolsonaro! Por um governo dos trabalhadores, sem generais, nem patrões!