Como hoje se coloca no Brasil a questão da Assembléia Nacional Constituinte para os marxistas.
Trotsky nos explica no “Programa de Transição” a necessidade de ajudar as massas dos países atrasados a superar sua própria ilusão na democracia burguesa levando a luta pela democracia até a sua exaustão. Assim podemos ajudar as massas a constituir instituições mais avançadas, revolucionárias, como os sovietes.
E na luta pela democracia, sua mais alta expressão, nos limites em que a luta democrática pode se converter em luta abertamente revolucionária, é a luta pela Assembléia Constituinte.
A questão da Constituinte e a revolução na América Latina
No último período assistimos em diversos países exatamente o processo descrito por Trotsky no Programa de Transição.
A crise da direção revolucionária permitiu o surgimento de processos confusos e contraditórios como os da Venezuela, Bolívia e Equador. A expressão mais clara desta situação é a abertura de uma situação revolucionária em Honduras a partir da proposta de Zelaya de convocar uma Constituinte.
Homem da burguesia, líder do principal partido reacionário do país, Zelaya é levado a provocar o surgimento de uma situação que nem ele mesmo controla. O medo da burguesia hondurenha de que as massas resolvessem utilizar a Assembléia Constituinte para iniciar um processo como o da Venezuela levou ao golpe e ao estabelecimento da ditadura.
Entretanto, como o chicote da contra-revolução acaba fazendo avançar a revolução, se desenvolveu em Honduras uma situação revolucionária com caráter de insurreição popular antiimperialista.
Bolívia: Quando a Constituinte é usada para frear o movimento
No passado recente da Bolívia vimos como a palavra de ordem de Assembléia Constituinte foi utilizada contra a revolução pela direção do MAS e Evo Morales. Entre 2003 e 2005, a luta dos mineiros e dos camponeses derrubou governos e dividiu o aparato de Estado na Bolívia. Mas na ausência de um partido revolucionário o proletariado não tomou o poder.
O proletariado boliviano demonstrou um nível político formidável, derrubando todos os presidentes eleitos “democraticamente” que continuavam entregando as riquezas do país aos interesses do imperialismo e da oligarquia local, mantendo o povo na miséria.
Durante semanas ou meses não havia poder na Bolívia que não fosse o povo em armas e mobilizado. Mas, a recusa da direção da COB (Central Obrera Boliviana), que dirigia as mobilizações, em tomar o poder, abriu caminho para Evo Morales chegar à presidência. Quando a COB resolve convocar a realização de Assembléias Populares em todo o país e sua centralização nacional em La Paz, já era tarde. Evo, com a autoridade de presidente eleito pelas massas contra as classes dominantes, convoca uma Assembléia Constituinte. Neste momento defender a Constituinte era efetivamente estrangular a revolução. E foi o que tentou Evo Morales para reconstruir o Estado burguês na Bolívia. A única via de fato revolucionária era apoiar as Assembléias Populares contra a farsa da Constituinte de Evo Morales. Se esta via não se desenvolveu isto se deveu aos vacilos e fragilidade da direção da COB e à ação de Evo Morales fortalecido por sua vitória nas eleições.
É preciso estar atento sempre ao movimento real das massas, à sua consciência em cada momento e à situação política em desenvolvimento. Uma palavra de ordem utilizada em dado momento pode não servir e mesmo ter um efeito contrário ao pretendido em outra situação. A prova da necessidade de total flexibilidade tática foi dada por Lênin durante o ano de 1917 das Teses de Abril até a insurreição de Outubro.
Lula deve romper a coalizão com a burguesia e convocar uma Constituinte
Quando nos colocamos contra as alianças espúrias do Governo, a resposta do aparato, reproduzida por militantes operários com ilusão em Lula e na direção do PT, é de que o governo de coalizão com a burguesia está justificado pela necessidade da “governabilidade”, ou seja, para que o governo tenha uma maioria parlamentar para poder governar.
Aos marxistas cabe a tarefa de ajudar as massas, e em primeiro lugar os militantes operários, a superar suas ilusões. É por isso que usamos como argumentos, no combate pela ruptura do PT com a burguesia, o direito de Lula se recandidatar quantas vezes o partido decidir e o povo eleger, assim como a necessidade de uma Assembléia Constituinte para varrer esse Congresso e constituir uma maioria em sintonia com o desejo do povo. É nesse sentido que toma importância a palavra de ordem de convocação de uma Assembléia Constituinte Democrática, Livre e Soberana para realizar a Reforma Agrária, re-estatizar as empresas privatizadas, restabelecer o monopólio estatal do petróleo (incluindo aí o Pré-Sal), elevar o salário mínimo ao piso do Dieese, revogar a reforma da Previdência, garantir Saúde e Educação Públicas e Gratuitas de qualidade para todos em todos os níveis, enfim, realizar as mais sentidas aspirações populares e nacionais.
Essa Constituinte não pode ser convocada e organizada pelas atuais instituições podres, nem pelas regras eleitorais feitas sob medida para impedir o povo de se expressar, mas deve ser convocada e realizada pelo governo do PT apoiado nas organizações populares e na mobilização revolucionária das massas trabalhadoras. Essa Assembléia Constituinte Democrática, Livre e Soberana é convocada contra o atual Congresso corrupto e contra as leis que impedem a soberania popular. Ela deve nascer com a forma e o conteúdo que serão forjados nas lutas que o povo trabalhador travar. Essa Constituinte deve ter como objetivo colocar em sintonia a vontade popular que elegeu Lula com uma maioria de representantes do povo que reconstrua o Brasil com base na soberania do povo trabalhador.
A exigência de uma Constituinte não é de reformar ou consolidar a democracia burguesa. Mas, compreendendo o que ensina a Teoria da Revolução Permanente nós sabemos que só o proletariado e a revolução podem realizar as tarefas democráticas e nacionais que a burguesia nunca realizou em países como o Brasil.
Nosso combate pela democracia é o combate pela revolução socialista. Nada temos a ver com as concepções adaptadas que se contentam em buscar parecer os mais democratas e mais nacionalistas dentro do movimento operário. Nós combatemos pelas liberdades democráticas (e a mais alta expressão disso é uma Assembléia Constituinte Democrática, Livre e Soberana) levantando bem alto as bandeiras do socialismo e numa linha de Frente Única exigindo a ruptura dos dirigentes das massas com o semi-cadáver da burguesia.