Nenhum acordo com os fascistas! A unidade e a mobilização independente dos operários e camponeses pode derrotar o fascismo e abrir caminho para o socialismo.
Os fascistas da “Meia-Lua” na Bolívia, valentes com as reuniões e o apoio do embaixador dos EUA, organizaram um levante tomando prédios públicos, destruindo repartições, sabotando gasodutos, tomando aeroportos, perseguindo, humilhando, golpeando e assassinando indígenas camponeses e trabalhadores. Em Pando organizaram um verdadeiro massacre com dezenas de mortos.
Este movimento fascista, organizado e articulado pelos governadores da região dita “Meia Lua” se baseia na pequena burguesia local manipulada e instigada por supostas defesas das riquezas da região que estariam sendo “sugadas” pela Bolívia pobre e indígena assim como na defesa da etnia “Camba” (descendentes de espanhóis e guaranis da região) contra qualquer mistura ou “invasão” dos “Collas” (descendentes dos Aymarás e Queshuas) do altiplano. Tem seu ponto mais avançado na União Juvenil Crucenha (de Santa Cruz), organização armada abertamente racista e violenta. E deve ser caracterizado como fascista, não por suas ações violentas e pela quantidade de ataques que organiza, mas fundamentalmente por seu objetivo de destruir as organizações operárias e camponesas. É isto a alma do fascismo, e por isso é inútil toda tentativa de acordo com eles. O MAS é uma organização pequeno-burguesa de tipo “parlamentar-democrática”. Já o fascismo não pode consolidar seu poder senão destruindo as organizações operárias e camponesas e o próprio “parlamento-democrático”. O fascismo surge exatamente porque a burguesia boliviana foi incapaz de controlar e reverter a revolução até agora por meios policiais e repressivos “normais”.
Seu objetivo central é derrubar o governo de Evo Morales, revogar todas as nacionalizações feitas, e em curso no país, e afogar em sangue a revolução boliviana. O que eles temem é que a revolução se desenvolva e venha a liquidar o regime da propriedade privada dos grandes meios de produção.
A responsabilidade maior de todos os socialistas é neste momento organizar e ajudar a constituição da unidade das forças operárias e camponesas para combater a ameaça fascista e derrotá-la através da mobilização. Sem comprometer-se com a política de Evo Morales a tarefa dos revolucionários é defender as nacionalizações, as conquistas e o aprofundamento da revolução boliviana, único meio de combater realmente a burguesia fascista a serviço do imperialismo. Mobilizações e atividades precisam ser organizadas em todos os países mostrando que o povo boliviano e sua revolução não estão sozinhos, mas que sua luta é a luta de todos os trabalhadores pelo fim de toda opressão e exploração.
A defesa do governo de Evo contra a ameaça fascista não se confunde, porém, e não pode ser confundida pelos marxistas, com a defesa das instituições do estado burguês em crise na Bolívia. Contra a ameaça fascista é preciso responder com os métodos da classe trabalhadora, com unidade, organização e mobilização enfrentando os fascistas onde tudo se decide: nas ruas. Os únicos métodos eficazes para derrotar o fascismo são os métodos da revolução proletária e a classe operária não pode cair na arapuca tradicional de stalinistas e reformistas de “defender a república” contra o fascismo. Como explicava Trotsky sobre a revolução espanhola: “A aliança política dos dirigentes operários com a burguesia se cobre com o pretexto da defesa da ‘república’. A experiência espanhola demonstra claramente em que consiste esta defesa. A palavra ‘republicano’ assim como a palavra ‘democracia’ revela o palavrório consciente que serve para dissimular as contradições de classe.” (Trotsky, “Defesa da república ou revolução proletária”). A única orientação revolucionária conseqüente é combater o fascismo lutando pela revolução proletária, o que significa neste momento a mobilização armada e a auto-organização das massas proletárias bolivianas.
A origem da crise atual
As insurreições de 2003 e 2005 desmantelaram o estado burguês na Bolívia. Nestas duas ocasiões os mineiros e a COB (central sindical) tiveram o poder ao alcance da mão, mas não concretizaram este movimento porque não havia na direção da insurreição um partido marxista, bolchevique. O resultado é que o corpo do estado burguês decapitado não foi enterrado e assim ainda teve a capacidade, ajudado por todo tipo de pequeno-burgueses, de lançar uma corda de salvação convocando eleições.
Era tal a desmoralização e a incapacidade da burguesia de apresentar-se como saída para a crise que o deputado do MAS, Evo Morales, se lança e conquista a presidência apoiado pelas amplas massas trabalhadoras do campo e da cidade. A COB que havia sido incapaz de tomar o poder depois de ter desmontado o estado burguês, agora aprofunda o erro e boicota a eleição em nome da independência de classe. Mas, sua consigna não foi seguida nem mesmo pelos mineiros que em sua ampla maioria votou Evo.
Evo se apresenta, no governo, como candidato a reconstruir o estado burguês e “fazer as instituições funcionarem”. Para este fim convoca uma Constituinte justamente no momento que o conjunto das organizações ligadas à COB, retomando a experiência de 1971, havia aprovado a convocatória de Assembléias Populares “para estabelecer o poder originário”. A Constituinte de Evo, as hesitações da COB, aliadas aos seus erros anteriores, esvazia as Assembléias Populares que acontecem apenas em alguns poucos lugares e sem força. Assim a crise que continua foi sendo transferida para dentro da Constituinte com uma agudização dos enfrentamentos entre a maioria do MAS, sob pressão das massas, e a oposição burguesa. Quando os meios parlamentares fracassaram surgiu com força a solução fascista pela mão dos governadores da “Meia Lua” apoiados e empurrados pela embaixada dos EUA.
Esta é uma diferença muito importante entre Evo e Chávez. Evo chega ao governo com o estado burguês desmantelado quando o único poder real no país havia estado nas mãos da COB e se empenha na reconstrução do estado capitalista. Se Evo vai conseguir é outra coisa.
Já Chávez chega ao governo de um estado burguês, em crise, mas “funcionando normalmente” e com suas ações provoca e amplia sem cessar a crise do Estado burguês na Venezuela até o ponto de fraturá-lo profundamente. Por isso, Chávez é um elemento de avanço da revolução na Venezuela, enquanto Evo é um elemento permanente de obstáculo à revolução na Bolívia, até este momento.
Mas, isso pode mudar. Foi sobre pressão das massas que Evo anunciou as primeiras nacionalizações, e como foi inviabilizado um acordo com a oposição burguesa no parlamento, não lhe restará muito espaço para manobrar. Sua única salvação é apoiar-se nas massas proletárias da Bolívia e avançar.
Os fascistas só chegaram até aqui por responsabilidade central de Evo Morales e sua política pequeno-burguesa de divisão da nação propondo transformar a república boliviana em uma federação de etnias. Evo pretende estabelecer uma espécie de descentralização do país, chegando ao cúmulo de propor a instituição de “justiças regionais baseadas nas tradições indígenas” e outros tantos absurdos, que só podem provocar o esfacelamento e destruição da república boliviana.
Uma política pequeno-burguesa não leva ao socialismo
A política fundamental de Evo é o desenvolvimento do “capitalismo andino” teorizado e divulgado por seu vice-presidente, o ex-guerrilheiro Álvaro Linera, convertido à socialdemocracia, ou seja, ao capitalismo em sua fase imperialista.
E não se pode esquecer que Evo Morales, que era sindicalista, foi expulso da COB, em 2004, por trair a luta pela nacionalização do petróleo e do gás. Como deputado nacional, Evo apoiou o acordo de exportação de gás para a Argentina, através da Repsol e Pluspetrol, feito pelo governo boliviano, ao preço “solidário” de US$ 0,98 o milhar de pés cúbicos de gás, enquanto o Brasil estava pagando US$ 2,30.
As nacionalizações realizadas durante o governo Evo Morales foram fruto direto das lutas dos mineiros e dos trabalhadores através da FSTMB (Federação Sindical dos Trabalhadores Mineiros da Bolívia) e da COB. Só tomou medidas sob intensa pressão e quando não havia outra maneira de manter-se no governo. Odiado pela burguesia porque seu governo nasce como subproduto das insurreições de 2003 e 2005 que destroçaram o estado burguês na Bolívia, Evo não tem a menor possibilidade de governar sem o apoio do movimento operário e camponês e suas organizações. Mas, sua política permanente é de reconstrução do estado burguês e de recomposição das instituições reacionárias do capital.
Como expressão da pequena burguesia desesperada em meio a uma situação revolucionária, Evo Morales utiliza a legítima vontade dos camponeses de sair da miséria tenebrosa a que foram submetidos sempre pelas classes dominantes para tentar lançá-los contra o movimento da classe operária e esgrima uma “política moderna” de divisão das classes trabalhadoras da Bolívia através da política de divisão étnica do povo trabalhador. Seu programa político é uma árvore de natal de ONGs, de propostas de políticas compensatórias do Banco Mundial, das propostas “antiglobalização” e de defesa do capital.
A nomeação do chefe das cooperativas reacionárias de mineiros, manipuladas e de fato controladas pelas multinacionais, como Ministro das Minas provocou e permitiu enfrentamentos sangrentos daqueles contra os mineiros assalariados que defendem a estatização e o controle operário das minas. O ataque dos cooperados contra Huanuni (a maior mina estatal), em 2006, para tentar tomá-la na base da bala e da dinamite causou dezenas de mortos e feridos. Durante semanas o governo a tudo assistia passivamente. Evo só agiu quando o massacre se intensificou, a resistência também ameaçando se estender em manifestações em todo o país e se tornou um escândalo público internacional.
Acontece que em situações de guerra, catástrofe econômica ou revolução, mesmo os partidos pequeno-burgueses podem ser levados muito mais longe do que pretendiam e serem obrigados a uma ruptura, que não desejam, com a burguesia. Assim, Evo, pressionado, foi muito mais longe do que pretendia com as nacionalizações de gás e petróleo e isto realimentou o movimento da classe trabalhadora que se sente ainda mais forte. Mas, continuou insistindo em sua política de defesa das instituições burguesas e de divisão étnica da Bolívia. E agora está provando de seu próprio veneno.
Xenófobos, racistas e fascistas
O movimento da burguesia de Santa Cruz, Pando, Tarija e Beni (chamados estados [departamentos] da “meia-lua”, ou do “oriente”) tem como objetivo esmagar a revolução. Eles estiveram no governo por décadas e jamais falaram em autonomia e separação da “Meia-Lua”. O que agora organizam de fato é uma tentativa de golpe de estado, utilizando e manipulando setores da pequena burguesia com políticas racistas e xenófobas. Instigam o ódio contra os “collas” (indígenas Aymarás e Quechuas do altiplano) e se reivindicam “cambas” (mestiços dos brancos espanhóis com os índios Guaranis).
O Movimento Nação Camba, baseado em Santa Cruz de La Sierra, explica sua posição: “Em geral, se conhece a Bolívia como um país fundamentalmente andino, encerrado em suas montanhas, uma espécie de Tibet Sul-americano constituído majoritariamente pelas etnias aymará-queschua, atrasado e miserável, onde prevalece a cultura do conflito, comunalista, pré-republicana, não-liberal, sindicalista, conservadora, e cujo centro burocrático (La Paz) pratica um execrável centralismo colonial de Estado que explora suas colônias internas, se apropria de nossos excedentes econômicos e nos impõe a cultura do subdesenvolvimento, sua cultura.”… “Esta ‘outra Nação’ constitui ‘a outra versão’ da Bolívia e cujo Movimento aspira conquistar a autonomia radical desta nação oprimida.” (http://www.nacioncamba.net/index2.htm).
A política de federação de etnias e de descentralização entra como uma luva para alimentar este tipo de lixo político.
A burguesia é republicana enquanto a república defenda a propriedade privada
Apesar de ter sido reafirmado por 67% dos votos no referendo de 10 de Agosto, Evo faz o contrário do que lhe pedia o povo, na praça, no dia da vitória, aos gritos de “Mano Dura! Mano dura!”. Ele insiste num impossível dialogo nacional com os fascistas. A oposição burguesa entende sua fraqueza política, sua hesitação e paralisia e responde cercando o presidente em aeroportos, fazendo-o retirar-se de cidades e até mesmo tendo que por algumas horas refugiar-se numa base aérea brasileira. Os dirigentes da União Juvenil Crucenha recorrem o país tentando organizar e armando bandos para derrubar o governo. Como ele não reage, nem mesmo perseguido fisicamente, os grupos fascistas, encorajados pelo governo EUA, organizam o levante fascista.
Evo já não sabe o que fazer. Apela à ordem e legalidade. Tenta dar ordens ao exército para retomar o controle, mas o exército se faz de desentendido. E nos locais onde havia tropas, os grupos fascistas destroem os prédios públicos e empresas estatais assistidos passivamente pelos soldados. É isto que leva Chávez a declarar que o exército boliviano estava em greve contra Evo.
É neste momento de crise aguda, crucial, que o Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, em 9/9/2008, declara:
“Estamos analisando a forma como o governo boliviano poderá garantir a integridade da rede de gasodutos” e acrescentou que o governo brasileiro está disposto a “abrir os contatos diretos com os governadores do Oriente, se necessário.” (Washington Post, 9/9/2008). Ou seja, encorajando e “reconhecendo” a autonomia e separação de fato destes estados da Bolívia.
A burguesia de todo o continente esfrega as mãos e festeja a queda iminente do governo de Evo. A sabotagem e explosão de gasodutos, o lockout dos setores patronais divisionistas, a ocupação de edifícios e empresas públicas, tudo foi saudado pelos mesmos que esbravejam contra qualquer manifestação operária. Tivemos neste momento uma prova absoluta que quando os interesses dos poderosos são tocados ou ameaçados eles não recuam frente a nenhuma consideração “democrática”.
As leis, as ditas instituições democráticas, não têm a menor importância para a burguesia quando se trata de salvar seus interesses fundamentais. Para eles, constituição, leis, etc., é somente papel. As leis servem para enredar os explorados, mas nunca para conter o instinto de sobrevivência os exploradores.
O jornal “O Estado de SP” declara cinicamente em editorial: “Nos últimos dois anos, na Bolívia não há lei a respeitar nem instituições que funcionem regularmente. O país está à mercê do arbítrio de um presidente que insiste em instituir uma forma de governo sui generis, baseado numa ideologia nacional-indigenista anacrônica e irresponsável, e um regime autoritário, à semelhança do que seu mentor Hugo Chávez vem praticando na Venezuela. A oposição, por sua vez, não tendo instituições às quais apelar, está compreensivelmente reagindo nos termos em que Evo Morales colocou a disputa: com atos de arbítrio, a mobilização dos movimentos cívicos e políticas de fatos consumados.” (OESP, 10/9/2008, grifos nossos).
Esta é a burguesia “democrática” brasileira, que para defender seus interesses não hesita em rasgar as leis, desconhecer suas próprias instituições e agir de armas na mão.
A reação das massas começa a virar o jogo
Ameaçado diretamente Evo, finalmente, expulsa o conspirador Philip Goldberg da embaixada dos EUA na Bolívia. Chávez faz o mesmo na Venezuela em solidariedade. O embaixador dos EUA, Philip Goldberg, girava pelo país conspirando. Em 10/9/2008, reuniu-se com a prefeita de Chuquisaca, Savina Cuellar, em Sucre, e com a organização ultra-racista Comitê Interinstitucional, que em 24 de Maio humilhou vários camponeses desnudando-os e fazendo-os pedir perdão de joelhos na praça principal da cidade. Dias antes este embaixador dos EUA se reuniu em Santa Cruz com o prefeito Rubén Costas, o chefe público da conspiração reacionária e fascista. Assim, teve toda razão Evo Morales em expulsar o chefe da conspiração, o embaixador Philip Goldberg.
As mobilizações de camponeses e de trabalhadores urbanos começam a se espalhar contra o golpe. Milhares de camponeses e trabalhadores marcham em direção a Santa Cruz e bloqueiam as entradas e saídas da cidade provocando desabastecimento e pondo em pânico os “valentes” bandidos pequeno-burgueses organizados pelos governadores. As organizações populares começam a se articular em frentes únicas para enfrentar os fascistas e outros milhares de camponeses decidem marchar até o centro de Santa Cruz. Nem mesmo Evo pode controlar a radicalização deste movimento. É o látego da contra-revolução fazendo avançar a revolução.
O medo começa a tomar conta dos fascistas e o governador de Tarija “responde” ao apelo ao diálogo aplainando o caminho para um grande pacto entre Evo e os governadores de oposição. É preciso a todo custo parar o movimento das massas que não se deterá em recuperar os edifícios públicos, mas vai castigar os culpados e fazer avançar com “Mano Dura” a revolução.
Entra em ação o governo Lula, agora para “buscar o diálogo entre as partes e garantir as instituições da democracia”, ou seja, o estado burguês na Bolívia. E como tentou fazer com a Venezuela no passado tratou de montar a nova versão dos “Amigos da Bolívia” reunindo a União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) para fazer pesar sobre as partes (Evo e governadores) a responsabilidade de salvar as instituições combalidas. Os irresponsáveis governadores despertaram um monstro que não vão conseguir derrotar e Evo não está fazendo o suficiente para levar o monstro de volta para a caverna.
A UNASUL unanimemente respalda o “governo legal” de Evo e se pronuncia contra qualquer golpe civil contra ele e em defesa das “instituições democráticas”.
Concessões aos fascistas ameaçam a revolução
Mas, Evo precisa do apoio do movimento operário e vai buscar o acordo da COB para um pacto de defesa da democracia. Assina um “Pacto de Unidade” com a COB cujo centro está nos pontos 2 e 3 do documento:
2. “Defender a democracia que custou luto e sangue aos trabalhadores e ao povo em geral, pois esta conquista está sendo ameaçada por terroristas e fascistas que atentam contra a institucionalidade e a vida dos bolivianos.
3. Respaldamos e defendemos este processo revolucionário de mudanças em busca da equidade, igualdade e justiça social que é liderado por nosso irmão, presidente Evo Morales Ayma, para construir uma pátria nova com a aprovação de uma nova Constituição Política do Estado”.
Assim, alguns dos principais dirigentes da COB, sem consultar nenhum sindicato, assinam a defesa da “democracia” e da “institucionalidade”, reconhecem a “liderança” de Evo Morales e aprovam a nova Constituição que ao fim e ao cabo destroçará a Bolívia como nação e vai balcanizá-la para impedir a revolução. O Estado burguês foi destruído nas insurreições de 2003 e 2005. Todo esforço de Evo é no sentido de reconstruí-lo, mas é incapaz de fazer isso se não tiver antes a capitulação dos dirigentes do movimento operário.
Assinado o pacto com a COB, Evo pode então capitular abertamente e assinar um documento de pacto com os governadores. Neste documento Evo aceita todas as exigências dos governadores fascistas e ainda se compromete a desmontar as mobilizações que cercavam Santa Cruz e ameaçavam os fascistas. A seguir os principais pontos do documento:
“Depois de sessões sucessivas de trabalho iniciadas no dia 12 de Setembro, Sexta-Feira, destinadas a desenhar um processo de diálogo, lembram-se as seguintes bases para atingir um ‘Grande Acordo Nacional’:
– O Governo Nacional reconhece, conforme as leis vigentes, o direito dos departamentos a receber o Imposto Direto aos Hidrocarbonetos (IDH);
– O Governo Nacional expressa seu respeito ao direito à autonomia departamental de Pando, Beni, Tarija e Santa Cruz;
– O processo de diálogo contará com o acompanhamento de facilitadores e testemunhas. Lembra-se convidar como tais a Unasul, Igreja Católica, União Européia, OEA e ONU;
– Restituição imediata dos escritórios públicos e instalações petroleiras ocupadas à raiz do conflito por pessoas alheias às mesmas, a fim de restabelecer os serviços públicos;
– Iniciar conversas sobre a nova administração territorial das instituições, considerando a implementação constitucional da autonomia departamental;
– Lembra-se também o levantamento de todos os bloqueios de caminhos no território nacional;
– As partes deverão iniciar o processo de pacificação do país, restabelecendo plenamente a convivência pacífica entre os bolivianos e fazendo os esforços necessários para frear de maneira imediata a violência em todo o território nacional;
– Esclarecer os fatos ocorridos no departamento de Pando, através de organismos nacionais e internacionais imparciais e uma comissão congressual que se deslocará de imediato ao local dos fatos;
– Em caso que os mencionados organismos estabeleçam indícios de responsabilidade, garante-se o direito ao devido processo. Garante-se também a integridade pessoal de autoridades, dirigentes cívicos e sociais de Pando;
– Não impulsionar ações judiciais que tenham conotação política contra dirigentes cívicos, sociais e autoridades dos departamentos mobilizados que tenham atuado pelas reivindicações departamentais e sociais que precederam a este Acordo; como também paralisar a campanha midiática de desprestigio de autoridades, atores cívicos e sociais.”
A classe operária reage para salvar a revolução e a COB
Mas, isto provoca uma reação imediata dos mineiros assalariados da FSTMB. Assembléias são realizadas e os mineiros rejeitam o acordo assinado pela COB condenando seus dirigentes. A FSTMB solta uma declaração condenando a assinatura do pacto e se insurge contra ele.
Guido Mitma, secretário executivo da combativa Federação dos Mineiros (FSTMB), declara que a ação da direção da COB foi “unilateral e inorgânica” e que “compromete a independência política dos trabalhadores e seu ideário socialista”.
Nas assembléias de Huanuni, os mineiros e a FSTMB proclamaram:
“As minorias esmagadas em 2003 e 2005 devem definitivamente ser eliminadas porque são as financiadoras deste estado de anarquia e ilegalidade montado sobre o grande show das autonomias.
Nossa luta deve ser dirigida a arrebatar a fonte do poder econômico desta minoria oligárquica e latifundiária. Isso significa lutar pelo cumprimento das Agendas de 2003 e 2005 nacionalizando as empresas multinacionais e recuperando as empresas privatizadas. Assim ferimos de morte os ‘gamonales’ (oligarcas), freamos o saque, geramos fontes de trabalho e superamos nos fatos a pobreza ancestral a que nos há submetido o capitalismo e o neoliberalismo.
O governo já não pode contornar irresponsavelmente este caminho. Basta de conciliar com os conspiradores e sabotadores do verdadeiro processo de mudanças. A mudança não deve ser frase oca, mas mudança estrutural para recuperar nossos recursos naturais e explorá-los através do Estado sob controle social. Nacionalizar e industrializar nossas riquezas deve ser o objetivo imediato. A experiência demonstrou que só o povo através do Estado pode fazê-lo.”
Esta sim é uma resposta revolucionária às ações dos fascistas e reacionários. Honra e glória aos mineiros assalariados da Bolívia organizados na FSTMB! Eles constituíram sua Federação em 1944, criaram a COB e fizeram a revolução de 1952 – a primeira revolução proletária das Américas. Levantaram o povo oprimido e derrubaram vários governos assassinos e entreguistas como Sanches de Losada (Goni) e outros. Agora eles apontam o caminho para uma saída positiva da espantosa crise em que se encontra a Bolívia.
Sua reação foi tão forte e tão sentida que em seguida a direção da COB teve que sair a público condenando o diálogo de Evo com os governadores e rejeitando qualquer acordo com os fascistas. A COB retoma assim sua independência política. Agora deve dar conseqüência a isto mobilizando as massas para liquidar o fascismo.
Situação e perspectivas
A vida vai fazer Evo escolher definitivamente seu caminho. Mas de uma coisa é certa: Sem o movimento operário Evo não sobreviverá aos ataques dos fascistas a serviço do imperialismo. E para ficar com as massas vai ter que romper esta tentativa ignóbil de pacto nacional com os golpistas e romper com o capital, entrando na via do socialismo. Se escolher outro caminho, junto com os oligarcas e contra as massas, Evo não sobreviverá e o caminho será muito mais doloroso para as massas e para toda Bolívia.
Os golpistas não recuarão e cada vez vão exigir mais. Vão exigir o que Evo não pode dar e ele será levado à parede.
Todas as forças estão tensionadas ao máximo. Em 22/9/2008, as organizações populares bolivianas decidiram reforçar os bloqueios e o cerco a Santa Cruz de la Sierra com cerca de 50 mil camponeses e trabalhadores demonstrando que sabem que só sua mobilização independente pode conduzir à vitória. Enquanto isso o governo brasileiro abriga em hotéis do Acre cerca de 100 fascistas assassinos de camponeses que se refugiaram no Brasil escapando do castigo pelo massacre cometido em Pando. E Bachelet, do Chile, convoca nova reunião da Unasul, desta vez em Nova York (!), para ampliar a pressão sobre Evo.
As mobilizações internacionais em defesa da revolução boliviana mal começaram. E devem se estender o mais amplamente possível a exemplo da que foi realizada em São Paulo em 18/9/08, com cerca de 300 presentes.
Na Bolívia é preciso ajudar a organizar e mobilizar as massas proletárias sob a direção dos mineiros, ajudando-os a se constituir em partido político e se dotar de uma direção marxista bolchevique. Esta tarefa tem que ser realizada no meio da atual tempestade lutando para constituir as organizações de unidade e de combate das massas, retomando o fio de continuidade das Assembléias Populares de 1971, esmagando a reação fascista com os métodos do proletariado e preparando a tomada do poder pela classe trabalhadora. Não há outra saída para os trabalhadores do campo e da cidade deste extraordinário país que é a Bolívia a não ser o caminho do socialismo.