A análise marxista da história – isto é, a análise dialética e materialista da história – explica que a principal força motriz da história é a necessidade da sociedade desenvolver as forças produtivas: aumentar nosso conhecimento e domínio sobre a natureza; reduzir o tempo de trabalho socialmente necessário para produzir e reproduzir as condições de vida; melhorar o estilo e os padrões de vida.
A análise marxista da história – isto é, a análise dialética e materialista da história – explica que a principal força motriz da história é a necessidade da sociedade desenvolver as forças produtivas: aumentar nosso conhecimento e domínio sobre a natureza; reduzir o tempo de trabalho socialmente necessário para produzir e reproduzir as condições de vida; melhorar o estilo e os padrões de vida.
O próprio Marx escreve em seu prefácio a Uma Contribuição à Crítica da Economia Política:
“Na produção social de sua vida, os homens entram em determinadas relações, necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a uma determinada etapa de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A totalidade destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se ergue uma superestrutura jurídica e política, e à qual correspondem determinadas formas da consciência social.
“O modo de produção da vida material é que condiciona o processo da vida social, política e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, inversamente, é o seu ser social que determina sua consciência”.
Marx continua para explicar que é precisamente nesses períodos quando a sociedade não pode mais desenvolver as forças produtivas – quando a ciência, a tecnologia e a indústria estagnam; quando o crescimento econômico, o emprego e a elevação dos padrões de vida não podem ser garantidos – que as revoluções ocorrem, a fim de remover as barreiras que impedem o caminho do progresso:
“Numa certa etapa do seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou, o que é apenas uma expressão jurídica delas, com as relações de propriedade no seio das quais se tinham movido até então. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se em grilhões das mesmas. Ocorre então uma época de revolução social”.
A época de revolução social claramente chegou: da revolução bolivariana na Venezuela às revoluções árabes e aos maravilhosos movimentos das massas na Espanha, Grécia, Brasil e Turquia; todos estes são um claro sintoma da crise atual e da incapacidade do capitalismo de proporcionar um futuro para a grande maioria dos trabalhadores e da juventude em todo o mundo.
Mas agora a burguesia mais séria está preocupada; não só por causa da agitação social causada pela crise, que ameaça crescentemente sua própria posição privilegiada dentro deste sistema, mas também por causa de se ter evidenciado a incapacidade no longo prazo deste mesmo sistema de gerar crescimento, postos de trabalho e padrões decentes de vida – isto é, de desenvolver as forças produtivas.
“Pessimismo em relação à inovação”
Um número crescente dos principais comentaristas está agora questionando seriamente se nossa capacidade de inovar – de desenvolver a ciência e novas tecnologias – abrandou finalmente. Exemplificando este “pessimismo em relação à inovação”, está o artigo de primeira página de The Economist (12 de janeiro de 2013), sob o título “Quebrou-se a máquina das ideias?”, onde afirma que, “um pequeno, mas crescente, grupo de economistas calcula que o impacto das inovações atualmente pode empalidecer em comparação com o passado”.
Esses comentaristas afirmam que por trás da evidente e relativamente recente “Grande Recessão” encontra-se um menos óbvio declínio no longo prazo da contribuição do progresso tecnológico e da inovação para o crescimento econômico – a chamada “Grande Estagnação”. De fato, as evidências fornecidas no artigo de The Economist revelam que houve uma desaceleração no crescimento da produtividade – isto é, na produção econômica produtiva por cada pessoa – que veio antes da crise e se remonta há várias décadas, aos anos 1970.
Em seu artigo, The Economist explica como o crescimento econômico pode ser dividido basicamente em duas categorias: extensivo e intensivo. O crescimento extensivo se refere ao aumento da produção devido a um aumento dos fatores de produção; por exemplo, através da expansão da força de trabalho – como tem acontecido em muitos períodos na história do capitalismo através do crescimento da população, do uso da mão-de-obra migrante, da introdução da mulher nos locais de trabalho ou, modernamente, através do aumento da idade da reforma – e aumentando a quantidade de capital (por exemplo, máquinas e fábricas) em proporção a esta força de trabalho expandida.
O crescimento intensivo, em contraste, é o aumento da produção para uma determinada quantidade de força de trabalho. Isso reflete um aumento na produtividade ou na intensidade do trabalho – ao qual Marx se refere com um aumento na “mais-valia relativa” em termos de capitalismo. A diferença entre crescimento “extensivo” e “intensivo”, dessa forma, é uma diferença de quantidade e qualidade: o crescimento extensivo meramente aumenta a quantidade das forças produtivas; o crescimento intensivo a eleva qualitativamente.
Capitalismo e crescimento
Marx explicou como o capitalismo, em sua fase inicial, progressista, deu um gigantesco impulso ao desenvolvimento das forças produtivas. A concorrência entre diferentes capitalistas, na busca de maiores lucros e maiores mercados, levou não somente ao crescimento extensivo – através da acumulação e da reprodução – como também ao crescimento intensivo, quando os capitalistas reinvestiram os lucros no desenvolvimento de nova maquinaria, tecnologias e técnicas produtivas. Aqueles que não podiam se manter com a aplicação da técnica e da tecnologia de ponta produzidas a custos mais altos, foram prejudicados por seus concorrentes. O fraco faliu e foi consumido pelo forte, levando ao longo do tempo a uma concentração e centralização do capital nas mãos de poucos, como Marx descreve em O Capital:
“De mãos dadas com esta centralização, ou esta expropriação de muitos capitalistas por poucos, outros desenvolvimentos ocorrem em escala cada vez maior, como o crescimento da forma cooperativa do processo do trabalho, a aplicação técnica consciente da ciência, a exploração planificada do solo, a transformação dos meios de trabalho em formas em que podem ser usados em comum, a economia de todos os meios de produção por seu uso como meios de produção do trabalho combinado, socializado, a incorporação de todos os povos na rede do mercado mundial e, com isso, o crescimento do caráter internacional do regime capitalista” (O Capital, Livro I, Capítulo 25).
Foi este, então, o papel histórico do capitalismo: concentrar os meios de produção anteriormente dispersos em empresas monopolísticas gigantes; estabelecer um mercado mundial interconectado; desenvolver os meios de produção e, dessa forma, lançar as bases materiais do socialismo – ou seja, a criação de uma sociedade não da escassez, mas da superabundância.
As leis do capitalismo, em seu auge, foram uma poderosa força no desenvolvimento da inovação e da indústria. Os próprios Marx e Engels falaram em O Manifesto Comunista de como o capitalismo “realizou maravilhas maiores que as pirâmides egípcias, os aquedutos romanos e as catedrais góticas”. A invenção e aplicação da máquina a vapor foi, sem exagero, uma “revolução industrial”.
Muitos outros saltos qualitativos foram dados sob o capitalismo, da invenção dos trens e dos telegramas à geração e aplicação da eletricidade. Mas, no início do século XX, esses saltos foram poucos e distantes entre si. Nesta fase, as forças produtivas tinham ultrapassado em muito o mercado; as nações imperialistas não podiam mais se expandir sem voltar a dividir o mundo. Assim começou um período que teve duas guerras mundiais, com uma Grande Depressão no meio.
O impulso da guerra
É notável que o principal desenvolvimento na tecnologia e na inovação a partir deste período não tenha vindo do capitalismo e da concorrência do mercado livre, mas a partir do controle estatal sobre a indústria e da planificação que as nações capitalistas foram obrigadas a adotar para fins de guerra. A nacionalização e o controle público de setores-chave da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) foram introduzidos nos países capitalistas avançados durante a II Guerra Mundial a fim de inovar e desenvolver novas tecnologias. Aviões, plásticos, borracha sintética, medicamentos, telecomunicações, energia nuclear etc., todas essas tecnologias e muitas outras mais foram ou inventadas ou fortemente impulsionadas devido à II Guerra Mundial, ao lado de um desenvolvimento geral da indústria e da introdução de novas técnicas de produção para fins de guerra.
Este rápido período de desenvolvimento em termos da pesquisa e aplicação de novas tecnologias e técnicas, junto à destruição causada durante a própria guerra e à expansão do comércio mundial que se seguiu, por sua vez levou ao boom do pós-guerra – a assim chamada “Idade de Ouro” do capitalismo. De repente, nações inteiras, cuja base industrial tinha sido destruída durante a guerra, receberam ajuda através do Plano Marshall proporcionada pelos EUA – que saíram da guerra muito fortalecidos e com sua indústria e economia quase intocadas – e se tornaram capazes de importar e assimilar os mais modernos métodos industriais, o que proporcionou um grande salto a frente em termos de produtividade.
O verdadeiro segredo do boom do pós-guerra não foram as políticas keynesianas dos reformistas, mas o tremendo desenvolvimento qualitativo das forças produtivas como consequência da planificação e controle estatal durante a guerra. Desde a guerra, o complexo industrial-militar – tanto em termos da maquinaria de guerra e do programa Apollo – continuaram a desempenhar um importante papel; atualmente, o gasto militar global (de quase 1,8 trilhões de dólares), supera as estimativas para o gasto total em P&D (entre 1,0 e 1,4 trilhões). Isto, para não mencionar a importante pesquisa que ocorre nas universidades – publicamente e nominalmente financiada para fins não lucrativos, embora as grandes empresas estejam cada vez mais ditando a agenda da pesquisa.
Durante o mesmo período entre guerras, enquanto o capitalismo estava experimentando sua maior crise na história, a economia planificada da União Soviética, apesar de todas as deformações introduzidas pelo grilhão canceroso da burocracia estalinista, estava se desenvolvendo a velocidade da luz, ultrapassando o atraso de uma economia baseada principalmente no campesinato, antes da revolução de 1917, para colocar o primeiro homem no espaço 44 anos mais tarde.
O que tudo isto demonstra é que, durante quase um século, a força motriz da inovação não foi a concorrência capitalista, mas o planejamento e a propriedade pública. O capitalismo, longe de desenvolver a ciência e a tecnologia, se tornou um enorme entrave ao desenvolvimento das forças produtivas. A propriedade privada dos meios de produção se tornou uma barreira gigantesca à inovação e à criatividade e deve ser substituída pelo plano de produção sob o controle democrático da própria sociedade.
Estagnação e declínio
Em seu auge do pós-guerra, a produção econômica por pessoa – uma medida da produtividade – na América esteve crescendo a mais de 3% ao ano. Nos anos 1970, quando o boom entrou em colapso, este indicador caiu para cerca de 2%, e atualmente se encontra abaixo de 1%. Toda esta desaceleração da produtividade ocorreu apesar dos tremendos avanços tecnológicos, principalmente a introdução de computadores pessoais, telefones celulares e internet. Daí, a atual conversa sobre “pessimismo em relação à inovação” dos comentaristas burgueses.
The Economist observa enfaticamente que há uma diferença entre inovação e tecnologia: inovação é o real desenvolvimento da ciência e do “know-how”; tecnologia é a aplicação deste “know-how” em termos de produção e sociedade. É a última que importa quando se trata de aumentos reais de produtividade e crescimento econômico. Hoje há inovação em todos os lugares, mas o impacto disto na sociedade não é decisivo.
Como The Economist aponta, enquanto grandes avanços são obtidos em algumas áreas, em muitos aspectos a sociedade ainda se encontra como ela era há 40 anos: os estilos da vida doméstica praticamente não se alteraram; ainda utilizamos os mesmos trens, aviões e automóveis; e a expectativa de vida nos EUA aumentou menos de cinco anos a partir desde 1980, comparada à elevação de 25 anos entre a virada do século XX e 1980. Há mais pessoas hoje envolvidas em P&D do que nunca, e ainda assim estima-se que a tecnologia e a inovação contribuem sete vezes menos para o crescimento do que em 1950.
Mais uma vez é a existência da propriedade privada, não apenas sobre os meios materiais de produção, como também sobre as ideias e o conhecimento gerado pela sociedade (isto é, as patentes e a propriedade intelectual), que está sufocando o real desenvolvimento e absorção da tecnologia. Ao invés de cooperar e compartilhar o conhecimento para produzir o melhor telefone possível, empresas como Apple e Samsung se envolvem numa série interminável de processos judiciais sobre a violação de várias patentes. Em vez de investir na educação e na aplicação das técnicas mais modernas nos países industriais mais avançados, os capitalistas aproveitam a vantagem do suprimento abundante de mão-de-obra barata na Ásia e em outros lugares, ou simplesmente escolhem especular parasitariamente nos mercados financeiros. E em vez de empregar as técnicas de produção mais avançadas, como as impressoras 3D, que têm o potencial de desencadear outra revolução industrial, essas técnicas são retidas por medo de exacerbarem o já existente excesso de capacidade – isto é, de superprodução – no sistema e gerar ainda mais desemprego pela substituição de trabalhadores por máquinas.
Por que investir na produção real quando já existe capacidade excedente e quando se podem amealhar bilhões na bolsa de valores ou, em vez disso, em vários derivativos financeiros? Por que gastar em P&D na Grã-Bretanha e nos EUA quando se podem empregar simplesmente milhares de trabalhadores com baixos salários na China? Note-se que durante muitos anos, o crescimento na China foi de um tipo largamente extensivo, alimentado pela transição da agricultura à indústria, com milhões de migrantes do campo à cidade, e através da importação de modernas técnicas de produção do exterior via joint-ventures entre empresas estatais chinesas e empresas multinacionais. Atualmente, tem havido uma genuína inovação na China (pensemos em empresas como Huawei e Lenovo) e investimentos em maior automação, enquanto os trabalhadores chineses se tornam cada vez mais militantes e mais organizados, exigindo e ganhando aumentos salariais e melhores condições.
A natureza cada vez mais parasitária do capitalismo e o uso da deslocação [off-shoring] em termos de indústria não ajudaram à inovação e à tecnologia. Por um lado, criaram maior desigualdade em todos os lugares, com lucros se acumulando nas mãos das grandes multinacionais em uma das extremidades e com um ainda maior empobrecimento da classe trabalhadora, na outra. Mas, por outro lado, ajudaram a criar a maior e mais interligada classe trabalhadora que já existiu.
“Corrida contra a máquina”
Ao lado do “pessimismo em relação à inovação”, existe entre outros comentaristas burgueses a tendência oposta: o medo de que este rápido progresso tecnológico da era moderna pode potencialmente levar ao desemprego em massa, com máquinas substituindo trabalhadores em uma vasta gama de empregos, tanto em termos de trabalho manual quanto intelectual, particularmente com o advento das técnicas de computação avançadas, tais como máquinas que aprendem e reconhecem a voz. Como comenta The Economist de 25 de maio de 2013:
“Há uma boa chance de que a tecnologia possa destruir mais empregos do que cria. Há uma chance ainda maior de que ela continuará a aumentar as desigualdades. A tecnologia está criando cada vez mais mercados nos quais os inovadores, investidores e consumidores – e não os trabalhadores – obtêm a maior parte dos ganhos”.
Não é como muitos da direita querem nos fazer acreditar, que os estrangeiros e imigrantes estão tomando nossos empregos – o que faz isto são as máquinas!
O temor do desemprego em massa devido ao progresso tecnológico, no entanto, não é nada novo, como o economista Michael Stewart em 1985 registrou mais uma vez:
“Nos anos 1830, os tecelões manuais de Lancashire foram afastados de sua atividade pelos novos teares. Da mesma forma, nos anos 1980, os trabalhadores semiespecializados da indústria automobilística estão sendo afastados da atividade por robôs…
“Devido ao alcance do deslocamento da mão-de-obra pelo chip [microchip de computador] ser tão vasto, e ao ritmo da mudança ser tão grande, é difícil ver que tipo de empregos em grande escala para trabalhadores semiqualificados e não qualificados vai ser necessário” (Keynes e depois, Michael Stewart).
Enquanto isto, John Maynard Keynes, o famoso economista britânico, comentou em um artigo em 1930 que:
“Estamos sendo acometidos por uma nova doença que alguns leitores podem ainda não terem ouvido falar, mas que vão ouvir muito nos próximos anos – no caso, o desemprego tecnológico. Isto significa desemprego devido a nossa descoberta de meios de economizar o uso de trabalho que ultrapassa o ritmo em que podemos encontrar novos usos para o trabalho” (Possibilidades Econômicas para os Nossos Netos, John Maynard Keynes).
Hoje, esta tendência se expressa em livros recentes como “Corrida contra as Máquinas” de dois acadêmicos da Sloan Business School da Universidade MIT. Os autores, Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee declaram:
“Os estagnacionistas [aqueles que argumentam que a inovação e a produtividade estão estagnando há várias décadas] apontam corretamente que a renda mediana e outros importantes indicadores da saúde da economia americana pararam de crescer de forma robusta há algum tempo, mas não estamos de acordo com eles sobre porque isto aconteceu. Eles acham que foi porque o ritmo da inovação tecnológica abrandou. Pensamos que foi porque o ritmo se acelerou tanto que deixou um monte de gente para trás. Muitos trabalhadores, em suma, estão perdendo na corrida contra a máquina…
“Pode parecer paradoxal que o progresso mais rápido pode prejudicar os salários e os empregos de milhões de pessoas, mas argumentamos que é isto o que está acontecendo…
“Como podem tanta criação de valor e tanta desgraça econômica coexistirem? Como podem as tecnologias acelerar enquanto a renda estagna?” (Race Against the Machine, Brynjolfsson e McAfee).
Em outras palavras, a melhoria na tecnologia e o aumento da produtividade, em vez de elevarem os padrões de vida, realmente os reduziram para a grande maioria, criando salários estagnados e desemprego estrutural permanente. Como Brynjolfsson e McAfee destacam:
“Trilhões de dólares de riqueza foram criados nas décadas recentes [na economia americana], mas a maior parte desta riqueza foi para uma parcela relativamente pequena da população… Mais de 100% de toda a riqueza criada na América entre 1983 e 2009 foi acumulada nas famílias do topo da sociedade (cerca de 20% da população). Os outros quatro quintos da população viram uma redução líquida de riqueza ao longo dos últimos 30 anos…
“Não houve estagnação no progresso tecnológico ou na criação da riqueza agregada, como às vezes se alega. Em vez disso, a estagnação da renda média reflete, principalmente, uma mudança fundamental na forma como a economia distribui renda e riqueza. O trabalhador médio está perdendo a corrida contra a máquina”.
Os autores de “Race Against the Machine”, no entanto, estão apenas parcialmente corretos quando argumentam que o desenvolvimento tecnológico é responsável pelo desemprego e pela desigualdade. O problema não é a tecnologia, mas a aplicação da tecnologia sob o capitalismo.
População excedente artificial
Marx explicou como as leis do capitalismo – a competição anárquica entre capitalistas por maiores lucros – forçam cada capitalista a tentar e reduzir seus custos, para vender a preços mais baixos, aumentando a produtividade através da substituição do trabalho por máquinas. Isto, por sua vez, cria uma “população excedente artificial” de desempregados.
“A queda nos preços e a luta competitiva, por outro lado, impelem cada capitalista a reduzir o valor individual de seu produto total abaixo de seu valor geral, empregando nova maquinaria, novos e melhores métodos de trabalho e novas formas de associação. Ou seja, impelem-no a elevar a produtividade de uma dada quantidade de trabalho, para reduzir a proporção do capital variável [salários] em relação ao constante [maquinaria, ferramentas, equipamento, matérias-primas etc.] e, assim, demitir trabalhadores; em suma, criar um excedente artificial de população…
“As mesmas causas que elevaram a produtividade do trabalho, o aumento da massa de produtos mercantis, mercados ampliados, acumulação acelerada de capital, em termos tanto de massa quanto de valor, e a baixa da taxa de lucro, essas mesmas causas produziram, e continuam constantemente a produzir, uma população excedente relativa, uma população excedente de trabalhadores que não são empregados devido a esse excesso de capital por conta do baixo nível de exploração do trabalho em que teriam de ser empregados, ou, pelo menos, por conta da baixa taxa de lucro que resultaria de uma dada taxa de exploração” (O Capital, Livro III, Capítulo 15).
E novamente:
“É a própria acumulação capitalista que produz constantemente, e produz de fato em relação direta com sua própria força e extensão uma relativamente redundante população trabalhadora, isto é, uma população que é supérflua aos requerimentos médios do capital para sua própria valorização, e é, dessa forma, uma população excedente” (O Capital, Livro I, Capítulo 25).
Não é, portanto, a tecnologia em si, mas o uso da tecnologia sob o capitalismo, introduzida de forma anárquica e sem planejamento, que leva ao desemprego em massa, e que, por sua vez, coloca pressão sobre os que ainda trabalham a aceitar salários mais baixos, enquanto a concorrência para os empregos remanescentes aumenta.
Junto à criação de uma “população excedente artificial”, portanto, existe também uma super-exploração dos que permanecem no trabalho, mais uma vez em nome de aumentar os lucros dos capitalistas. Assim, surge a contradição em que o desemprego em massa ocorre lado a lado com milhões que devem trabalhar 50-60 horas por semana ou ter vários empregos apenas com o intuito de ir levando a vida:
“O excesso de trabalho da parte empregada da classe trabalhadora incha as fileiras de sua reserva, enquanto, inversamente, a maior pressão que a reserva, por sua competição, exerce sobre os trabalhadores empregados força-os a se submeter ao excesso de trabalho e submete-os aos ditados do capital. A condenação de uma parte da classe trabalhadora à ociosidade forçada devido ao excesso de trabalho da outra parte, e vice-versa, torna-se um meio de enriquecimento dos capitalistas individuais, e acelera ao mesmo tempo a produção do exército industrial de reserva em escala correspondente ao progresso da acumulação social” (Ibid.).
A existência de tal contradição enfatiza o fato de que essa população excedente é inteiramente “artificial”. Os que estão desempregados não são “excedentes” para as necessidades da sociedade, mas “excedentes” apenas para as necessidades do capital. O capitalismo é incapaz de usar os recursos humanos disponíveis e, em vez disso, condena milhões à ociosidade forçada. As grandes empresas se recusam a investir e fábricas, lojas e escritórios estão vazios, tudo por causa do já existente excesso de capacidade – ou seja, da superprodução. As forças produtivas superam a “demanda efetiva” do mercado; mercadorias não podem ser vendidas com lucro, ou mesmo sequer ser vendidas; a economia sofre uma parada, não por qualquer falta de “necessidades” da sociedade, mas simplesmente porque não há nenhum lucro a ser realizado pelos capitalistas.
Adicionalmente, o capitalismo não pode nem mesmo usar o conhecimento e a tecnologia que a sociedade descobriu e inventou ao longo de milênios de história: a inovação não é empregada em nenhuma aplicação prática devido à propriedade privada sobre as próprias ideias, enquanto as novas tecnologias não são introduzidas por temor a mais excesso de capacidade, desemprego e queda na demanda que poderiam gerar.
Sob o capitalismo, os capitalistas individuais introduzem tecnologia e melhoram a produtividade para aumentar seu próprio lucro individual, sem qualquer consideração pelos padrões de vida dos trabalhadores ou pelas necessidades da sociedade. Daí, o receio dos comentaristas burgueses, como os autores de “Race Against the Machine”, de que é a tecnologia que é a responsável pelo desemprego e desigualdade.
Sob o socialismo, a anarquia da concorrência e do mercado seria substituída por um plano racional de produção, permitindo a introdução da tecnologia e a elevação da produtividade. O homem e a máquina poderiam coexistir em harmonia e não em concorrência. Ao invés de gerar a contradição do desemprego ao lado da fadiga extrema, o trabalho seria compartilhado de forma igual e as horas da jornada de trabalho poderiam ser reduzidas para todos, com mais investimentos e melhorias levando a uma quantidade cada vez maior de tempo de lazer.
Vemos, mais uma vez, que não é a tecnologia que é a fonte dos males sociais, mas o próprio sistema capitalista, e a enorme barreira ao progresso que este sistema impõe, devido à propriedade privada e à produção para o lucro.
Os dois lados da mesma moeda
Mas como podem estas duas tendências separadas entre os economistas e os comentaristas burgueses existirem lado a lado? Como pode haver ao mesmo tempo muita inovação e tecnologia, e, no entanto, isto ser aparentemente também muito pouco?
Esta contradição entre “pessimismo em relação à inovação” e “corrida contra as máquinas” é um reflexo das contradições do próprio capitalismo: a barreira da propriedade privada; a tendência das forças produtivas a superar o mercado; e a justaposição entre o planejamento extremo dentro das empresas junto à anarquia entre as empresas.
O paradoxo de muita e pouca inovação ao mesmo tempo simplesmente expressa as leis dialéticas do capitalismo – leis baseadas na busca “racional” do lucro pelo capitalista individual, que por sua vez leva a um resultado que é totalmente irracional para a classe capitalista como um todo.
O capitalista individual investe em pesquisa e tecnologia para melhorar a produtividade de sua empresa e minar seus rivais, reduzindo salários e substituindo trabalhadores por maquinaria no processo. Mas cada capitalista está perseguindo o mesmo objetivo “racional”, e, ao fazê-lo, a classe capitalista como um todo corta no próprio mercado onde está tentando vender. Com mercadorias invendáveis, a crise de superprodução se revela e a produção para. O capitalista individual se beneficia da inovação tecnológica no curto prazo; mas a classe capitalista como um todo termina gerando desemprego e crise.
Com um monte de excesso de capacidade no sistema e nenhuma demanda efetiva por mais mercadorias e serviços, não há nenhum incentivo para qualquer capitalista investir no desenvolvimento e absorção de novas tecnologias. Portanto, as inovações e a produtividade, por sua vez, também diminuem. O capitalismo, em outras palavras, corta o próprio galho em que está sentado: a concorrência impulsiona o investimento; o investimento cria o desemprego; e o desemprego leva ao ciclo vicioso de nenhuma demanda, nenhum investimento e mais desemprego.
O capitalismo, enquanto cria desemprego em massa, por um lado, é incapaz de criar as condições para a inovação, por outro. A inovação não é um maná caído do céu; ela não cai simplesmente do céu. A inovação requer certas condições materiais, acima de tudo, a capacidade de o sistema estar apto para alocar e dedicar trabalho à ciência e à pesquisa e desenvolvimento.
A este respeito, podemos ver como a crise força o capitalismo a corroer a própria fonte de seu crescimento. Por exemplo, nos países capitalistas avançados, os gastos com a educação superior estão sendo cortados e os estudantes estão sendo convidados a assumir um enorme fardo de dívidas, tudo por causa da crise, que forçou governos a cortar gastos públicos. Enquanto isso, esses mesmos governos estão tendo de cortar os orçamentos militares de “defesa”, outra fonte tradicional de inovação sob o capitalismo.
Além disso, a aplicação da tecnologia também requer certas condições materiais em termos do sistema socioeconômico existente e da capacidade da nova tecnologia em atender aos interesses da classe dominante de um dado sistema. Por exemplo, o conceito de energia a vapor era conhecido pelos gregos antigos e, ainda assim, esta tecnologia potencialmente revolucionária não foi absorvida, visto que a economia se baseava sobre o trabalho da abundante oferta de escravos baratos. A maquinaria poupadora de trabalho era, dessa forma, de pouco uso. Similarmente, havia pequenos incentivos para o desenvolvimento da tecnologia sob o feudalismo, um sistema baseado no trabalho dos servos que estavam ligados à terra de seus senhores.
É somente com o capitalismo, um sistema no qual a competição e a motivação do lucro proporcionam um incentivo para investir em nova maquinaria e tecnologia, que vemos a Revolução Industrial e o desenvolvimento e aplicação da força do vapor em escala massiva. De repente, à sociedade é dado um enorme impulso e as forças produtivas são rapidamente desenvolvidas, quando a tecnologia poupadora de trabalho é descoberta e usada.
Mas, agora, essas mesmas forças, antes progressistas, transformaram-se em seu contrário. Que incentivos há para os capitalistas investirem em tecnologia poupadora de trabalho quando há uma abundância de trabalho barato por todo o globo? Por que desenvolver e aplicar tecnologia para aumentar a produtividade quando há já excesso de capacidade e pilhas de mercadorias invendáveis? Por que gastariam as empresas privadas em P&D quando elas podem tomar carona no êxito da pesquisa financiada publicamente?
Longe de ser um “incentivo”, portanto, a concorrência e a motivação do lucro – que surgem devido à propriedade privada da produção – tornaram-se uma enorme barreira ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia. A necessidade de se transformar a sociedade e de se derrubar as apodrecidas relações sociais do capitalismo nunca foram mais evidentes.
Destruição criativa
Vemos, dessa forma, que o “pessimismo em relação à inovação” e a “corrida contra as máquinas” são os dois lados da mesma moeda, uma unidade dialética de opostos que reflete a natureza contraditória, anárquica e irracional do capitalismo – um sistema em que o progresso e o desenvolvimento das forças produtivas somente podem ocorrer de forma extremamente caótica e destrutiva.
De forma incomum, os capitalistas não negam o poder de destruição de seu sistema – até mesmo se deleitam com ele, cunhando frases como “destruição criativa” para fazer o ciclo de booms e recessões do capitalismo parecer não somente necessário, mas desejável. De acordo com essas teorias, as crises são necessárias para livrar a sociedade de velhas indústrias e empregos obsoletos, que devem ser primeiro destruídos antes que novas e melhores indústrias – isto é, mais eficientes e produtivas – possam ser criadas.
A este respeito, a classe dominante – e em particular a ala monetarista e neoliberal dos capitalistas – consistentemente pressiona por medidas “do lado da oferta”, por exemplo, a abolição dos sindicatos, a eliminação do salário-mínimo, a “flexibilização do mercado de trabalho” etc. De acordo com essa teoria monetarista, essas medidas são requeridas para assegurar o livre movimento do trabalho e encorajar os trabalhadores ao treinamento em busca de empregos mais produtivos. A verdade, no entanto, é que a “flexibilização do mercado de trabalho” é simplesmente um eufemismo para a “flexibilização da exploração” e uma desculpa para o desemprego em massa que o capitalismo cria.
É importante ressaltar: os “missionários” desse dogma deveriam checar suas teorias ante a realidade! Pode-se ver muito da destruição das políticas “do lado da oferta” de Thatcher, Reagan, do FMI etc., mas onde está a criação? E onde a destruição pavimentou o caminho para o crescimento, como discutido anteriormente em termos da II Guerra Mundial e do subsequente boom do pós-guerra, a criação de novas e mais produtivas tecnologias não foi conduzida pelo setor privado, mas pelo Estado, que tomou o controle das principais alavancas da pesquisa e do desenvolvimento científico.
A chamada “destruição criativa” do thatcherismo na Grã-Bretanha destruiu a indústria e desequilibrou a economia em favor de uma dependência da especulação, do jogo financeiro, do crescimento alimentado pelo crédito, que destruiu habilidades vitais, mas não forneceu nenhum treinamento a fim de ajudar as pessoas a desenvolverem novas habilidades, deixando milhões de pessoas sem qualquer esperança de um emprego. Como disse Marx:
“O capital demanda trabalhadores mais jovens, e menos adultos. Esta contradição não é mais gritante que outra contradição, ou seja, que a falta de “mãos” é invocada, enquanto, ao mesmo tempo, muitos milhares estão sem trabalho, porque a divisão do trabalho os encadeia a um ramo particular da indústria” (Ibid.).
Hoje, essas queixas são mais comuns que antes, com os porta-vozes da indústria e seus porta-vozes burgueses constantemente falando da necessidade de mais engenheiros, mais cientistas, mais programadores de computador etc. Mas o que essas mesmas damas e cavalheiros fazem quanto a tal escassez? Treinam os que já estão desempregados? Fornecem mais dinheiro para o ensino superior? Não – exatamente o oposto! O desemprego aumenta, os que têm educação superior estão empilhados nas prateleiras; e aos que procuram um futuro é negada uma educação devido aos maiores cortes e às taxas mais elevadas.
Devido a sua natureza anárquica, o capitalismo, baseado na concorrência e na busca individual do lucro, é inerentemente incapaz de introduzir novas tecnologias e métodos inovadores, exceto de forma não planejada, caótica e destrutiva, em que novas condições de produção e de vida são impostas à sociedade, como uma força a partir do alto. Sob o socialismo, um sistema baseado em um plano de produção racional e democrático, a sociedade pode realizar uma transição harmoniosa e suave às novas tecnologias e técnicas, com educação e treinamento disponíveis para todos ao longo da vida, e com os mais recentes métodos de economia do trabalho usados para criar não mais ociosidade forçada, mas lazer voluntário.
Escravizando em vez de libertar
Os marxistas não somos contra o progresso tecnológico; não somos luddites [Luddite, membro de organizações trabalhadoras na Inglaterra do século 19 que se opunham à revolução industrial e destruíram máquinas que na opinião deles estavam acabando com o seu meio de sustento] que acreditam na falácia do trabalho fatiado – isto é, que há uma dada quantidade de trabalho na sociedade e que a aplicação da tecnologia poupadora de trabalho deve necessariamente resultar em desemprego. Os marxistas estão plenamente a favor da inovação e da tecnologia – de fato, somos os mais consistentes e ardentes adeptos das novas tecnologias, que são vitais para o desenvolvimento das forças produtivas e, dessa forma, da sociedade em geral.
O problema é que sob o capitalismo, esse desenvolvimento tecnológico está repleto de contradições. O resultado é que a vasta maioria é alienada dos frutos da inovação na sociedade. A tecnologia, longe de nos libertar, é usada para nos escravizar. O desemprego em massa coexiste com aqueles que trabalham 50-60 horas na semana; enquanto o rico fica mais rico. A desigualdade aumenta, com uma maior acumulação de lucros em uma extremidade e aumentando a miséria e a labuta na outra.
“Dentro do sistema capitalista, todos os métodos para elevar a produtividade social do trabalho entraram em vigor à custa do trabalhador individual; todos os meios para o desenvolvimento da produção sofrem uma inversão dialética de modo que eles se tornam meios de dominação e exploração dos produtores; eles transformam o trabalhador em um fragmento humano; degradam-no ao nível de um apêndice de uma máquina; destroem o contato real de seu trabalho transformando-o em um tormento; alienam dele as potencialidades intelectuais do processo do trabalho na mesma proporção em que a ciência é incorporada como um poder independente; deformam as condições sob as quais ele trabalha; submetem-no durante o processo de trabalho a um despotismo dos mais odiosos por sua mesquinhez; transformam seu tempo de vida em tempo de trabalho e arrastam sua esposa e filhos sob as rodas da Juggernaut [Força Destruidora] do capital. Mas todos os métodos para a produção de mais-valia são ao mesmo tempo métodos de acumulação, e cada extensão da acumulação se torna, por outro lado, um meio para o desenvolvimento daqueles métodos. Segue-se, portanto, que na proporção em que o capital se acumula, a situação do trabalhador, seja seu pagamento alto ou baixo, deve piorar. Finalmente, a lei que sempre mantém a superpopulação relativa ou exército industrial de reserva em equilíbrio com a extensão e energia da acumulação solda o trabalhador ao capital mais firmemente do que as cunhas de Hefesto a Prometeu na rocha. Fazem do acúmulo da miséria uma condição necessária, correspondendo à acumulação de riqueza. Acumulação de riqueza em um polo é, portanto, ao mesmo tempo, acumulação de miséria, tormento de trabalho, escravidão, ignorância, brutalidade e degradação moral no polo oposto, isto é, no lado da classe que produz seu próprio produto como capital” (Ibid.).
Esta crescente desigualdade é amplamente demonstrada no gráfico abaixo, que mostra a mudança da renda das famílias e do PIB por pessoa para os EUA, com 1975 como ano-base de referência:
Este gráfico mostra a enorme divergência entre a riqueza criada na sociedade, devido à crescente produtividade, e o benefício (ou falta de benefício) que as famílias trabalhadoras normais ganharam com isso. Vemos que, enquanto a produção por pessoa quase dobrou nas três décadas entre 1975 e 2005, a renda familiar permaneceu relativamente estagnada. Os autores de “Race Against the Machine” sublinham este crescimento desigual também, afirmando que “os lucros das empresas como proporção do PIB atingiram o máximo nos últimos cinquenta anos. Enquanto que a remuneração para o trabalho em todas as suas formas, incluindo salários e benefícios, atingiram o mínimo no mesmo período”.
Na passagem acima de O Capital, Marx se refere ao “exército industrial de reserva” – os trabalhadores desempregados, cujas fileiras inflam ou desinflam nos ciclos de boom-recessão do capitalismo. Mas, com a Grande Depressão dos anos 1930 e ainda mais na crise atual, vemos um novo fenômeno: não mais aquele exército de reserva de mão-de-obra, mas o desemprego em massa permanente devido à crise orgânica do capitalismo.
Em particular a juventude de hoje tem sofrido com a crise. The Economist (27/abril/2013) estima que “Em todo o mundo quase 300 milhões de pessoas entre 15-24 anos de idade não estão trabalhando… quase um quarto da juventude do planeta”, com os países capitalistas avançados como Espanha e Grécia vendo as taxas de mais de 60 de desemprego juvenil.
The Economist reconhece a crise como sendo um fator deste alto desemprego juvenil, mas novamente aponta para “os problemas do lado da oferta”, reclamando acerca do “descompasso entre as habilidades que a juventude oferece e as habilidades que os empregadores necessitam”. Mas a pergunta deve ser feita: quem está fornecendo treinamento? Que governos estão aumentando os fundos para a educação? E que problemas existem em termos de “flexibilização do trabalho”? Na Grã-Bretanha, onde a taxa de desemprego juvenil está acima de 20%, mais do dobro da média nacional em todos os grupos etários, os salários reais têm permanecido na melhor das hipóteses estagnados e até mesmo nas empresas líderes do estado em que o país tem um dos mercados de trabalho mais flexíveis.
A realidade é que o capitalismo não tem nada a oferecer à juventude atual exceto um futuro, como disse Marx, de “miséria, tormento de trabalho, escravidão, ignorância, brutalidade e degradação moral”. Um sistema que não pode fornecer um futuro aos jovens é um sistema que sobreviveu a si mesmo, um sistema que precisa ser derrubado.
Fluxos e refluxos
A inovação e o progresso tecnológico não fazem uma marcha linear de baixo para cima. Como todo desenvolvimento na história, o desenvolvimento das forças produtivas – da ciência, indústria e técnica – se move em fluxos e refluxos.
Em certos períodos, o progresso tecnológico e o crescimento econômico podem retroalimentar um ao outro para criar um ciclo virtuoso de desenvolvimento: o crescimento econômico alimenta a demanda por trabalho, absorvendo a “população excedente”; a demanda por trabalho fortalece a classe trabalhadora e suas exigências de melhores salários; o aumento do custo do trabalho cria um maior incentivo por técnicas poupadoras de trabalho; e a nova maquinaria aumenta a produtividade e, dessa forma, também o crescimento econômico.
Mas, como já explicado anteriormente, essas mesmas forças que impulsionam o avanço econômico em um período podem se transformar em seu contrário e fazer com que o ciclo virtuoso se torne em vicioso: o investimento em tecnologias poupadoras de trabalho cria desemprego, pressionando os salários para baixo; a demanda efetiva é cortada; a taxa de lucro declina; o sistema, dirigindo com o pé no acelerador, arremessa-se de um penhasco. Portanto, crescimento e progresso sob o capitalismo somente podem ocorrer de forma anárquica e contraditória.
Nos períodos de maré baixa na história, é típico se expressarem nas ideias da classe dominante todos os tipos de pessimismo. Em tais períodos, o conceito de progresso é negado e a possibilidade de um desenvolvimento ulterior é refutada sob a alegação desta ou daquela barreira intransponível.
O “pessimismo em relação à inovação” de certos economistas burgueses é um reflexo disto: em vez de ver o abrandamento na inovação como um fenômeno temporário decorrente dos limites das atuais relações sociais – isto é, da propriedade privada dos meios de produção –, a falta de progresso tecnológico é pintada como o resultado inevitável de se ter alcançado um certo nível de desenvolvimento, de se ter “recolhido toda a fruta madura”. Mas essa desaceleração na inovação só é “inevitável” dentro dos confins do capitalismo, que, tendo alcançado certo nível de desenvolvimento das forças produtivas, não mais é capaz de utilizar essas mesmas forças produtivas que criou.
O atual pessimismo dessa tendência dentro da burguesia é idealista, imaginando que a inovação simplesmente cai do céu, sem ver as bases materiais e econômicas requeridas para o progresso tecnológico. A presente falta de progresso, como todo recuo na história, reflete o fato de que as forças de produção entraram em contradição com as relações de produção – em outras palavras, a capacidade da sociedade de produzir entrou em conflito com as leis da própria produção, isto é, da propriedade privada e da produção para o lucro.
Mas como todos os refluxos anteriores, as barreiras para o desenvolvimento das forças produtivas podem ser removidas e serão removidas. Este é o sentido da revolução social. E, como em todos os períodos prévios, essa revolução será acompanhada de grandes avanços, não apenas na ciência e na tecnologia, mas em todas as áreas da vida – nas ideias, na arte e na cultura – que estão presentemente bloqueadas pelo freio absoluto do capitalismo.
Longe de ter “colhido todos os frutos maduros”, há todo um mundo de possibilidades e de potencial aguardando a humanidade. Nesse sentido, o socialismo não será o fim da história, mas simplesmente o seu começo. Basta pensar em todos os potenciais Einsteins, Picassos e Beethovens que, atualmente, são obrigados a uma vida de escravidão em fábricas e campos, para se imaginar o potencial para a ciência, a arte e a cultura sob o socialismo, uma sociedade em que bilhões de pessoas seriam, pela primeira vez, capazes de desenvolver e aplicar sua criatividade individual ao máximo. Como explica Engels:
“Ao apossar-se a sociedade dos meios de produção cessa a produção de mercadorias e, com ela, o domínio do produto sobre os produtores. A anarquia reinante no seio da produção social cede o lugar a uma organização planejada e consciente. Cessa a luta pela existência individual e, assim, em certo sentido, o homem sai definitivamente do reino animal e se sobrepõe às condições animais de existência, para se submeter a condições de vida verdadeiramente humanas. As condições que cercam o homem e que até agora o dominam, colocam-se, a partir desse instante, sob seu domínio e seu comando e o homem, ao se tornar dono e senhor de suas próprias relações sociais, se converte, pela primeira vez, em senhor consciente e efetivo da natureza. As leis de sua própria atividade social, que até agora se erguiam frente ao homem como leis naturais, como poderes estranhos que o submetiam a seu império, são agora aplicadas por ele com pleno conhecimento de causa e, portanto, submetidas a seu poderio. A própria existência social do homem, que até aqui era enfrentada como algo imposto pela natureza e pela história, é de agora em diante obra livre sua. Os poderes objetivos e estranhos que até aqui vinham imperando na história se colocam sob o controle do próprio homem. Só a partir de então, ele começa a traçar a sua história com plena consciência do que faz. E só daí em diante as causas sociais postas em ação por ele começam a produzir predominantemente, e cada vez em maior medida, os efeitos desejados. É o salto da humanidade do reino da necessidade ao reino da liberdade” (Engels, Do Socialismo Utópico ao Científico).
Uma sociedade de superabundância
Os marxistas são totalmente a favor do desenvolvimento da tecnologia: substituindo trabalho por maquinaria; produzindo riqueza para a sociedade com menos trabalho e reduzindo as horas da jornada de trabalho. Na ficção científica do passado – influenciada pela ascensão da automação na produção no início do século XX – escritores imaginaram um futuro utópico no qual o maior problema enfrentado pela humanidade seria o que fazer com todo o tempo de lazer enquanto as máquinas faziam todo o trabalho!
Tal sociedade se tornou totalmente possível através do capitalismo, que desempenhou um papel mais revolucionário e progressista no passado em termos de seu desenvolvimento das forças produtivas. Mas agora o capitalismo é incapaz de usar essas forças produtivas e se transformou em um entrave absoluto ao progresso posterior. Ao invés de realizar o sonho de uma vida de lazer para todos, milhões estão destinados à ociosidade forçada por um sistema que não pode criar empregos, enquanto milhões de outros trabalham dia e noite para alimentar a si mesmos e suas famílias.
Além do mais, esses aumentos nos padrões de vida que se viram sob o capitalismo – de melhor renda e aumento do tempo de lazer – não foram concedidos benevolamente pela classe dominante, foram conquistadas na luta pelas massas. O estado do bem-estar e o salário mínimo; o fim de semana e o dia de trabalho de oito horas; a saúde e a educação: tudo isso foi conquistado na luta pela classe trabalhadora, e estão agora sob ataque da classe dominante, devido à crise de seu sistema.
O potencial para uma sociedade de superabundância é mais real agora do que nunca. Basta olhar para as estatísticas econômicas oficiais da burguesia para se ver o que seria possível com um plano socialista de produção. O gráfico abaixo mostra a “utilização da capacidade” na Grã-Bretanha – isto é, a percentagem das forças produtivas que são utilizadas em qualquer momento. Pode-se observar que até mesmo nos melhores tempos dos últimos cinco anos somente 76% da capacidade produtiva foram usados. Nos piores períodos, isto cai para 50%. Em outras palavras, o capitalismo só é capaz de produzir metade do que poderia!
Colocando em perspectiva, o PIB do Reino Unido é atualmente em torno de 1,5 trilhões de libras. Assumindo que isto representa, em média, somente em torno de 60% da capacidade de utilização, isto significa que sob um plano socialista de produção, onde a capacidade da sociedade para usar as forças produtivas não é bloqueada pela necessidade de somente produzir para o lucro, e onde agora 100% da capacidade de utilização seriam possíveis, poderíamos do dia para a noite aumentar a produção econômica nacional para 2,5 trilhões de libras.
O que não poderíamos fazer com um extra de 1 trilhão de libras? Para colocar isto em um contexto, 1 trilhão de libras é o dobro do montante combinado que o governo do Reino Unido gasta com pensões (130 bilhões de libras), saúde (121 bilhões de libras), educação (87 bilhões de libras), previdência (144 bilhões de libras), transporte (20 bilhões de libras) e outros serviços públicos (47 bilhões de libras). Em outras palavras, poderíamos dobrar as pensões para os idosos, dobrar o gasto em hospitais e escolas, e dobrar o orçamento para infraestrutura etc., da noite para o dia através da adoção de um plano racional de produção e de utilização da plena capacidade produtiva da sociedade.
De repente, o chamado “problema” da velhice desapareceria. Nunca mais o idoso seria pintado como um peso para a sociedade. Poderiam ser fornecidos cuidados e pensões decentes para todos. Um programa massivo de construção poderia ser realizado imediatamente para construir casas de habitação sociais e para melhorar a infraestrutura envelhecida do país. Escolas e hospitais, em vez de serem fechados e privatizados, poderiam ser construídos e reformados. E energia verde poderia ser espalhada por todo o país para fornecer um meio ambiente limpo para as futuras gerações.
Os valores acima de fato subestimam o potencial real, como na realidade os desempregados poderiam agora ser capazes de encontrar trabalho; a lei do bem-estar seria assim lançada, e todas essas mãos extras de trabalho poderiam criar mais riqueza para a sociedade. E com um plano de produção no lugar, o excedente social poderia ser reinvestido em mais produção; por exemplo, o valor de 800 bilhões de libras em dinheiro acumulado, que atualmente descansa nas contas bancárias das grandes empresas na Grã-Bretanha – riqueza que está inativa devido ao “excesso de capacidade” que existe sob o capitalismo – poderia ser agora utilizado e investido em nova indústria e infraestrutura.
Colocando esses números em um contexto diferente, com o acréscimo da capacidade de utilização de 60% a 100%, a sociedade poderia produzir a mesma quantidade de riqueza usando menos que dois terços da quantidade de trabalho. Isto significa que a jornada de trabalho poderia ser reduzida de (uma medida de tempo nominal) de oito horas para menos de cinco horas, criando uma enorme quantidade de tempo de lazer para todos. Adicionalmente, sob um plano racional de produção, o trabalho seria compartilhado igualmente, eliminando o desemprego e reduzindo a jornada de trabalho ainda mais. Enquanto isso, mais investimentos em pesquisa, tecnologia e produtividade, mais métodos poupadores de trabalho poderiam ser aplicados, reduzindo as horas da jornada de trabalho ainda mais.
Pela primeira vez, a vasta maioria da população teria tempo, não somente para se desenvolver educacionalmente e criativamente, como também para participar política e economicamente de forma ativa na administração democrática da sociedade. Assim, é definida a base material da genuína democracia – a criação de tempo livre; tempo que não mais deve ser gasto em satisfazer as demandas imediatas da vida.
O socialismo, depois de ter acabado com a sociedade de classes – isto é, com a exploração da maioria pela minoria – com o tempo acabaria completamente com a classe trabalhadora, acabaria com o próprio trabalho. Tal futuro não é mais um simples sonho de ficção científica, mas uma possibilidade genuína. A tarefa diante de nós é lutar conscientemente por este futuro e torná-lo uma realidade.
Traduzido por Fabiano Adalberto