Oito anos depois do início das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), não há nada para se comemorar.
Em novembro completam oito anos de Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Porém não há nada para se comemorar!
Se, no início, algumas pessoas abriam a boca pra elogiar esse projeto, hoje, está mais que comprovado que a UPP apenas causou morte e sofrimento para os moradores e desmoralização para a polícia e governantes. Atualmente, mesmo a imprensa burguesa é obrigada a relatar os casos escandalosos das operações policiais dentro de áreas ditas “pacificadas”.
A verdade é que o número de casos de crimes aumentou, a violência intensificou, a polícia está ainda mais desmoralizada e o tráfico de drogas e o crime organizado segue a todo vapor. Se alguém ainda tem esperanças na UPP, ou não está de olhos aberto para a realidade ou está tão apaixonado pelo capitalismo que não consegue enxergar um palmo à frente. Há também o caso daqueles que enxergam muito bem, mas como são financiados pelo Estado burguês são obrigados a continuar afirmando que os milhares de casos de assassinato, violência e racismo são apenas “casos isolados”, mas que a UPP tem seu potencial.
Não haveria espaço pra relatar aqui todos os “abusos” policiais na cidade: Mulher que é arrastada por carro da polícia; criança é morta porque policiais confundem pipoca com drogas; criança de 10 anos é morta na porta de casa; trabalhadores que “desaparecem”; e tantos outros crimes que nós moradores de favela somos obrigados a engolir.
Qual a missão da UPP?
O próprio site de apresentação da UPP nunca mentiu sobre a sua função: “retomar territórios antes dominados por grupos criminosos ostensivamente armados e estabelecer o Estado Democrático de Direito.” Em outras palavras: a intenção da Polícia Pacificadora nunca foi eliminar as verdadeiras causas da criminalidade e muito menos trazer paz para os moradores das favelas. O Estado burguês não quer mais terceirizar a repressão da classe trabalhadora para o crime organizado, agora ele quer ter exclusividade nas chicotadas que são dadas em nossas costas, através de seu braço armado que é a polícia. Ou seja, vai tirar os “criminosos ostensivamente armados” do tráfico e colocar os criminosos ostensivamente armados da polícia. Para os pobres é só o chicote que mudou de mão, mas a chicotada tem o mesmo objetivo: oprimir e explorar. Muda o nome dos “senhores” das favelas, mas a vida dos pobres continua a mesma.
Essa sempre foi a função da polícia, e o Estado burguês nunca fez questão de esconder sua função. Uma das provas é o brasão da Polícia Militar do Rio de Janeiro, onde duas armas de fogo entrecruzadas defendem um pé de cana e um pé de café (símbolos dos latifundiários da época) e acima de todos a Coroa portuguesa, pra mostrar a serviço de quem estas armas estão.
Essa é a polícia que vai trazer a paz? Só se for a paz para a Casa Grande, porque para o pobre, para a classe trabalhadora, polícia é sinônimo de medo, corrupção e repressão.
Então se enganou quem pensou que a polícia tinha intenção de acabar com o tráfico de drogas (a chamada “guerra às drogas”). A polícia não tem a menor condição de acabar com o tráfico de drogas, e o próprio secretário de segurança do Estado, José Mariano Beltrame, sempre deixou isso claro. Essa nunca foi a função da UPP. E muito menos é o interesse do Estado.
Quem mais lucra com a venda das drogas?
Se hoje há tráfico de drogas, isso ocorre com a permissão do Estado e de toda a burguesia, pois essa ainda é a forma mais lucrativa de vender drogas, armas e prostituição. Se um dia a legalização gerar mais lucro que o tráfico, certamente a burguesia do ramo vai mudar o modo de venda das drogas, como já tem feito em alguns lugares. Não é à toa que Beltrame, desde 2015, integrou o grupo dos aliados da burguesia que defendem a legalização (fazendo coro com Fernando Henrique Cardozo, intelectual burguês exemplar).
Isso ocorre não porque Beltrame, FHC e outros burgueses e seus aliados se compadecem da juventude negra que está sendo massacrada nas favelas, obviamente que não. Isso ocorre por dois motivos centrais: o primeiro é a disputa que está havendo entre os empresários das drogas para saber quem vai dominar esse nicho do mercado e o outro motivo é porque pega muito mal, em pleno século XXI, haver cerca de 82 jovens assassinados por dia, destes, 77% negros. Trinta mil jovens assassinados por ano, de um total de 56 mil pessoas, segundo o Mapa da Violência de 2014 da Unesco. Frente a esse número escandaloso a burguesia precisa tomar alguma atitude pra maquiar as mortes que seu sistema provoca, e a melhor forma é retirando as armas das mãos dos traficantes, sobretudo em época de Copa do Mundo (2014) e Olimpíadas (2016).
É como diz a música “Vapor Barato” da Banda O Rappa:
“Estou vendendo ervas que curam e acalmam./ Mas eu não sou autorizado quando o Rapa chega eu quase sempre escapo./ Quem me fornece é quem ganha mais, A clientela é vasta, eu sei./ Porque os remédios normais nem sempre amenizam a pressão.”
A lógica é simples: os grandes produtores de drogas vendem as drogas para as facções criminosas, essas, por suas vez, precisam “proteger” seus pontos de vendas dos ataques da polícia e dos ataques das facções rivais. Assim, elas necessitam comprar armas e munição para garantir os pontos de vendas. No final, lucram os grandes produtores de drogas, os fabricantes de armas e alguns de seus administradores. Enquanto o pobre continua cada vez mais humilhado, explorado, esculachado. Muitas vezes encontrando no tráfico a solução pra amenizar as pressões do mundo capitalista. Seja na condição de funcionário do tráfico, seja na condição de cliente. Na maioria das vezes, em ambas.
Portanto, não existe guerra ao tráfico e muito menos guerra às drogas. As drogas são uma das principais políticas de destruição das mentes e corpos da população negra e pobre. O que existe é uma guerra contra a classe trabalhadora que, em sua maioria, no Rio de Janeiro, é negra e jovem. E o Estado não pode permitir que armas circulem livremente em áreas que podem explodir em uma revolta popular a qualquer momento, onde não dispõe de nenhum serviço publico decente. Para isso, para conter essa “bomba-relógio”, é preciso ter certeza que aqueles que possuem as armas estão sob o controle do Estado. Essa é a melhor forma de garantir a manutenção da propriedade privada dos grandes meios de produção.
Não é à toa que um dos apoiadores da UPP são “renomados” milionários e empresas, tais como Coca-Cola, Odebrecht, CBF, Consulado dos EUA entre outros apoiadores que podem ser visto na página da UPP. A EBX, empresa do famoso Eike Batista, é citada com orgulho como um dos apoiadores, destinando 20 milhões por ano, para esse projeto de assassinato de preto/pobre em alta escala.
“É melhor prevenir do que remediar”
Parece que o Estado Burguês não conhece essa máxima popular. Tanto que em 2015, segundo o portal da Transparência, o valor gasto com segurança no Estado do Rio de Janeiro foi de R$ 9,8 bilhões, enquanto que o valor gasto com educação foi de R$ 6,9 bilhões. Ou seja, gastou-se quase três bilhões de reais a mais com segurança do que com educação. Se comparada com saúde essa diferença pula para quatro bilhões e meio.
Pra este ano (2016) a situação é ainda pior, em virtude da crise que o Estado sofre, ao ponto do Governador em Exercício, Francisco Dornelles, ter decretado Estado de Calamidade Pública. Professores, profissionais da saúde e de segurança não têm certeza quando receberão salários e se é que irrão receber.
Este é o Estado democrático de direito que a burguesia quer pacificar, investindo mais em repressão que em educação, saúde, transporte e cultura. Depois se perguntam por que, apesar de toda repressão, a criminalidade continua aumentando.
O problema da criminalidade do Rio de janeiro é o problema da criminalidade no mundo inteiro, e sua solução definitiva apenas se encontra no fim do capitalismo, pois é ele a raiz de todas as mazelas sociais. Enquanto tratarmos os sintomas, e não a doença, os jovens (negros e pobres) continuarão sendo os que pagam por toda essa perversidade que é o sistema capitalista. O capitalismo é o pior Estado de calamidade que existe.
Quais as alternativas?
A única alternativa pra juventude e pra classe trabalhadora é sua organização. É necessário que toda a classe trabalhadora se reúna, em assembleias populares em bairros, fábricas e escolas. Nessas assembleias serão colocadas as demandas de toda a classe; educação pública e gratuita em tempo integral, saúde e transporte para todos, acesso a cultura e arte, emprego digno para todos, etc.
Precisamos combater todos os criminosos armados, seja do tráfico seja da polícia. Nossa juventude não pode continuar sendo assassinada e encarcerada, hora pelo Estado e sua polícia, hora pelo tráfico e suas drogas e ideologias. Queremos uma juventude livre e de luta.
Toda essa modificação só será possível com uma luta contra o sistema, contra o capitalismo. Para tanto precisaremos enfrentar a toda a direita: do presidente Temer ao Congresso Nacional, passando pelo Governador Dornelles (sucessor de Pezão e Cabral) e o prefeito Eduardo Paes.
- Pela dissolução da Policia Militar.
- Fim do massacre dos jovens negros. Abaixo o racismo.
- Abaixo a criminalização da juventude.
- Nem drogas, nem tráfico e nem UPP. Liberdade para a juventude.
- Fora temer e o Congresso Nacional.
- Por um assembleia popular constituinte, Por um governo dos trabalhadores.
- Pelo fim do capitalismo e pela construção do socialismo.
* Felipe Araujo é Professor da rede estadual, militante da Liberdade e Luta e pré-candidato a vereador pelo PSOL-RJ.