2024: o ano da desilusão. Em 2025, vamos transformar a desilusão em organização e luta

Os fogos de Copacabana

Segundo as “autoridades”, a praia de Copacabana reuniu milhares para assistir aos shows da virada e a queima de fogos no Réveillon do Rio de Janeiro. Para satisfazer o “novo público evangélico”, além das atrações principais, foi montado um palco dedicado à música gospel.

Sim. Um palco religioso em uma festa considerada “pagã”, pois janeiro é o mês destinado ao deus romano Janus, aquele com as duas faces, que simboliza o início e o fim, a transição. Apesar da excentricidade, nada tenho a comentar além disso. Entretanto, a maior notícia da festa não foram as performances dos artistas, gospels ou não. O destaque ficou para a queima de fogos que deu totalmente errada.

Em outras palavras, os fogos explodiram e geraram tanta fumaça que, além de não ser possível ver as luzes e explosões coloridas que encantam e divertem o carioca e os turistas, o cheiro da pólvora se espalhou até a rua Barata Ribeiro, a mais de 500 metros da praia. Coitados dos moradores que ficaram com suas casas cheias de fumaça de pólvora. Nada agradável.

Para comemorar a tão bela festa e a altíssima taxa de lucros dos hotéis, que tiveram 98% de ocupação, o prefeito Eduardo Paes anunciou suas metas para 2025. Depois de fazer a maldade de aumentar a carga horária dos professores sem aumentar os salários – e isso, caso seja perguntado, foi decisão do prefeito passado. Agora é um novo mandato, com novas metas – Paes tem como uma de suas principais metas criar uma força de segurança municipal armada. Tudo isso porque a Câmara de Vereadores, já alarmada com os “incidentes violentos” envolvendo a guarda municipal, recusou a proposta de armamento. Assim, o prefeito, do alto de seus mais de 60% dos votos, diminui o salário dos professores e aumenta a perspectiva de repressão.

Para o povo, menos educação e mais porrada. Assim funciona o governo burguês de Eduardo Paes, saudado por todos, da direita mais ou menos bolsonarista ao PT. Para completar o quadro do Rio de Janeiro, só mesmo a posse na Câmara dos Vereadores, durante a qual Carlos Bolsonaro (PL), que presidia a sessão, aplaude Anielle Franco, irmã de Marielle Franco – vereadora do PSOL assassinada pelos grupos de extermínio no RJ com ramificações que sobem para políticos do alto escalão. Sim, a mistificação é completa.

A economia e o emprego vão “bem”, o povo não

Quando Lula assumiu em 2022, o Brasil parecia viver um novo momento. A gasolina baixou o preço, a carne também e uma pequena esperança agitou corações e mentes. Dois anos depois, a pequena lua de mel transforma-se em uma desilusão, ainda que não em revolta.

Sim, é verdade. Os números oficiais do desemprego nunca foram tão baixos, apesar de ser um dado que esconde o grande aumento do trabalho precarizado e informal, e mesmo com todos os gritos furiosos dos jornais burgueses, o PIB cresceu mais que o previsto e o déficit do governo federal foi menor que o previsto, mas os jornais e analistas gritam querendo mais sangue e suor dos trabalhadores.

Enquanto isso, o Ministro Haddad, aquele que nunca chamou nem as centrais sindicais pelegas para conversar, vira e mexe está em jantares e eventos com empresários e banqueiros. E qual o resultado? O famoso pacote Lula/Haddad que reduz a correção do salário mínimo para caber no “arcabouço fiscal”, o novo nome do teto de gastos. Assim, em dois anos, se corta do salário mínimo um valor equivalente a R$ 12 bilhões.

Para se ter uma ideia do que isso representa, um acordo entre a Gol Linhas Aéreas e a Receita Federal, celebrado no fechar do ano, levou a um desconto de R$ 4,5 bilhões em multas e juros devidos pela companhia por atraso em impostos. Isso sem contar os benefícios fiscais concedidos a grandes empresas brasileiras, agronegócio, multinacionais e bilionários que chegam perto de US$ 1 trilhão.

Então, para pagar a dívida aos bancos e manter a farra dos bilionários, é preciso cortar na carne do proletariado mais pauperizado, dos aposentados, dos que necessitam de assistência social. Lula, pelo que dizem os que convivem com ele, está desiludido com a comunicação do governo que não consegue explicar que tudo isso foi feito para ajudar o povo. A FEBRABAN (Federação dos Bancos), ao contrário da lenda que percorre na “esquerda parlamentar”, vai fundo no apoio ao pacote:

“Considerando o contexto desafiador da crescente trajetória da dívida pública e sem entrar nos detalhes do efeito das medidas anunciadas nos gastos – análise que a Febraban ainda irá se aprofundar –, o Pacote Fiscal está na direção correta. Ele indica a urgência da adoção de medidas adicionais ao arcabouço fiscal, sem as quais não conseguiremos ter um ambiente estrutural de juros menores, menos pressão na inflação e no câmbio.” https://portal.febraban.org.br/noticia/4223/pt-br/

O “povo”, a maioria dos trabalhadores e proletários, da pequena burguesia, por outro lado, está sentindo na sua carne os efeitos de toda a política que vem sendo conduzida. Além de manter todas as reformas feitas pelos governos anteriores – trabalhista e previdenciária – que cortam na carne do proletariado, o governo aprovou uma reforma tributária que vai aumentar o tributo sobre o consumo (o novo valor será entre 27% e 29%), enquanto que o famoso tributo sobre os milionários virou um traque de “no máximo 10%”. E isso na propaganda porque, na realidade, nada foi encaminhado. Então não é de estranhar que a maioria dos brasileiros ache, em pesquisa realizada, que sua vida vai piorar e que a economia vai piorar.

Se Biden não convenceu ninguém com seus “números positivos” da economia enquanto o proletariado via a realidade de trabalhar mais e ter menos bens de consumo, menos renda efetiva, aqui a vida é a mesma. Sim, a carne e a gasolina estão mais altas do que quando Lula tomou posse e não há indícios que isso vá mudar.

Lula se desilude com o povo, mas se 65% acham que o governo não está bom, pelo menos 16% que votaram nele estão desiludidos. E isso sem contar a parte da burguesia que votou em Bolsonaro e que está muito satisfeita com o atual governo…

O mundo “desiludido”

Biden até tentou se recandidatar, mas teve que ser substituído às pressas por Kamala Harris. E ela não emplacou! Por quê? Porque o movimento que levou os Democratas de volta ao poder após o governo direitista de Trump levou uma política tão ruim quanto a dele e não houve mágica de propaganda que mudasse isso. Não adiantou denunciar a “tentativa de golpe” de Trump se os Democratas deram o maior golpe de todos: venderam ilusões que a vida ia melhorar. Mas no mundo atual a vida, sob o capitalismo, não pode melhorar para as grandes massas.

Trotsky (ah, essa mania de citar os antigos, mas juro que não ficarei nos comunistas, o último filósofo é mais antigo ainda) escreveu certa vez que o desenvolvimento científico e tecnológico, sob o capitalismo, só traria mais miséria e morte. A crise climática de hoje, a crise dos agrotóxicos, a possibilidade da extinção da vida humana colocada claramente pelo nosso “progresso científico” mostra a verdade desta afirmação.

As novas armas e seu uso indiscriminado para atacar a população civil, em Israel (mais evidente) e na Guerra na Ucrânia (mais do lado da Rússia que parece possuir mais meios para tal, apesar de Zelensky chorar e gritar por tais tipos de armas para seus doadores), mostra que tais acordos não passam de uma farsa gigantesca. Aliás, a própria “justiça burguesa” se mostra uma farsa.

No Brasil, mantem-se a matança generalizada entre a proletariado negro para colocá-los “no seu lugar”, ou seja, criar um estado de medo generalizado que impeça revoltas, sem que a polícia que toma estas atitudes seja responsabilizada, a maioria absoluta de policiais absolvidos das acusações de homicídio. Nos EUA, os ataques frios e direcionados feitos pela polícia dos EUA aos negros, isoladamente, e aos migrantes, em ações que envolvem milhares de pessoas, tem o respaldo da justiça, com raros casos que tomam repercussão nacional e levam à condenações.

E o proletariado, sem opção viável que o representasse, votou pela “alternância” de poder, como se algo fosse mudar! Mas a troca vai levar a um governo com uma tendência mais dura ainda do que o anterior (e, se não trocasse, o efeito seria parecido ainda que não igual). De toda forma, Trump pretende, se possível, abrir caminho para resolver a crise da burguesia dos EUA, não do mundo.

Para tal, ele quer realmente “renunciar” de vez ao papel de policial do mundo e tratar de defender os interesses da burguesia nativa de uma forma agressiva. A postura antes da posse é de abrir uma guerra comercial e, se for necessário, conquistar diretamente territórios. E ele o proclamou abertamente, citando o Canal do Panamá, a Groelândia e, pasmem se forem capazes, o Canadá! Sim, a burguesia americana sente que é possível e que podem ser necessárias guerras que a beneficiem diretamente e o mais perto possível de casa para serem as mais baratas possíveis.

Ele as fará? Saberemos em breve. Tudo dependerá, em primeiro lugar, da necessidade de lucro e de mercado da burguesia dos EUA da qual Trump é um dos seus mais legítimos representantes. Mas essa necessidade não é absoluta e a reação do proletariado e da juventude podem arruinar os planos de Trump. Para evitar isso, ele necessita aumentar a repressão e a cooptação ideológica dos trabalhadores. “America First” e fora os imigrantes.

Assim que a luta antirracista e anticapitalista do final dos anos 60, quando cresceu o Partido dos Panteras Negras, o movimento liderado por Martin Luther King que procurava se ligar às greves e manifestações dos trabalhadores e Malcon X, se radicalizava ao sair do seu antigo grupo e assumir novas posições políticas de unificação do proletariado, a polícia política do EUA (o FBI) tratou de interromper tudo isso.

Os assassinatos de líderes dos Panteras Negras, a prisão de outros, o assassinato de King e de Malcon marcaram a brutal repressão que destruiu aquele vaga. Em seu lugar a Fundação Ford e o Partido Democrata escreveu a política de “racialismo”, do “identitarismo”, de “valorizar o negro” que levou a nova divisão da classe operária. Trump só fez aproveitar-se desse movimento incentivando os “valores tradicionais” contra as políticas identitárias e culpando-as pelos percalços que o proletariado como um todo sofria. E teve êxito nisso, porque os Democratas não tinham solução para nada. O identitarismo não resolveu nenhum problema, o racismo aumentou ou se manteve e as frações negras e brancas do proletariado continuam sofrendo.

Mas Trump não é um político qualquer, ele precisa aumentar a repressão, e por isso novos inimigos foram inventados e cuidadosamente cultivados: os estrangeiros e imigrantes. Junto com a guerra comercial, uma talvez guerra “quente” por territórios, teremos também a “guerra aos imigrantes”, a maior deportação da história. Evidentemente que para fazer isso, surge também uma nova força que obedecerá às ordens do presidente, remodelando o que se convencionou a chamar de direitos democráticos dos EUA. Uso dos militares em território interno dos EUA? Uma nova polícia federal armada e obedecendo somente ao presidente se os militares se mostrarem reticentes? Em outras palavras, uma força que será treinada militar e politicamente contra o proletariado que começara atacando os imigrantes, mas que rapidamente será usada também para a “repressão a desordem” que hoje é tarefa das forças policiais municipais.

A política de que o “inimigo são os outros” funciona tanto a nível externo quanto interno rumo a bonapartização do estado em terras Yankees, como nunca foi feito antes. Mas, repetimos, tudo depende da reação do proletariado e isso a burguesia teme. Por isso os planos de Trump muitas vezes parecem palavras vazias que não conseguem ser postas em prática. A greve da Boeing e dos Portos nos meses finais de 2024 mostra que a vida não será tão doce quanto a burguesia gostaria que fosse.

As massas reagem

Depois de dezenas de anos governando o país com mão de ferro, o governo Assad caiu como um copo de vidro que alguém esbarrou e quebrou. Uma ofensiva feita por um dos grupos islâmicos no final do ano levou a queda de várias cidades importantes e a uma corrida de dias em direção a Damasco. O exército de Assad simplesmente abandonava as posições e corria igual ratos.

Em menos de um mês, Damasco caia e o novo governante demorou alguns dias para anunciar o novo governo. Sem muita clareza do que fazer conclama a criar um novo exército, transformava a sua milícia no “exército oficial”, emitia decretos para respeitar todas as religiões e de terrorista denunciado como parte do “Estado Islâmico” tornava-se em “líder democrático” que respeitava todos.

A expressão máxima disso aconteceu numa cidade perto de Damasco, onde uma árvore de Natal (símbolo cristão) foi queimada por islâmicos (não houve notícia da autoria concreta) e a milícia que tomou o poder foi lá e reconstruiu a árvore em um dia! Sim, uma nova era de paz se abria.

A torcida de todos é que esse “novo governo” seja regularizado. Mas o novo governo, apesar da promessa de participação de todos, é feito somente por homens de confiança da milícia. Como eles tomaram o poder? Existem dezenas de explicações, mas a mais correta talvez tenha sido dada por Getúlio Vargas sobre o golpe (“revolução”) de 1930: “O cavalo passou encilhado e sem ninguém. Eu só montei”.

Parece que foi exatamente isso. Eles tiveram a audácia de avançar enquanto o governo anterior caía de podre faltando apenas um empurrão. A “toda poderosa” Rússia, que não consegue vencer a guerra na Ucrânia com todas as suas forças congeladas no pântano de uma invasão sem solução, não pode ajudar em nada. O “poderoso exército” russo está atolado, precisando de soldados coreanos. A marinha e a aviação totalmente ocupadas, precisando comprar mísseis e drones do Irã e da Turquia. Impedidos de repetir os bombardeios que no passado fizeram os rebeldes recuarem, e assim se foi um tirano. Nada está decidido no país.

Tudo muda, já disse um velho filósofo, menos o fato que dia sim e dia sim também, o estado sionista de Israel continua massacrando o povo palestino com a ajuda inestimável da burguesia Yankee que lhe destina mais de US$ 9 bilhões por ano para manter este massacre. Trump, que prometeu acabar com a guerra na Ucrânia no dia seguinte a sua posse, nada disse da guerra em Israel. Afinal, vamos mudar todo o “estado profundo”, menos a sua política racista, sionista, anti-imigração. Ironicamente, Biden deportou mais pessoas que Trump, alcançando mais de 700 mil em um ano, a maior deportação da história dos EUA. Isso tem que continuar e o “apoio a Israel” não mudará com Trump.

Tudo igual no mundo? Parece que não. As manifestações massivas em Moçambique, Sérvia, Georgia mostram o cansaço do povo com a burguesia e sua política. Quanto tempo esses governos no mundo inteiro serão tolerados? Quanto tempo o governo de Lula será tolerado? A derrubada parlamentar dos governos da Alemanha e da França, a renúncia do primeiro-ministro canadense, mostram que a burguesia têm dificuldades para governar da forma como está. A entrada das massas em movimento poderá modificar tudo. 

O papel dos comunistas

No Brasil e no mundo os comunistas internacionalistas, organizados na ICR (Internacional Comunista Revolucionária), lutam para ajudar as massas a se livrarem do capitalismo e caminharem em direção ao socialismo, ao comunismo. Para isso, em todos os países, conduzimos ações e participamos de todos os movimentos que lutam pelos direitos dos trabalhadores e da juventude, das greves e manifestações, ajudando os trabalhadores a se organizarem de forma independente da burguesia, a construírem verdadeiros sindicatos ou a modificar as direções sindicais burocráticas por outras mais a esquerda. Onde for possível, tentamos diretamente assumir a direção de sindicatos, de seções sindicais, de delegacias sindicais, de movimentos de massa.

Criamos e participamos de uma campanha contra a guerra, em defesa dos trabalhadores e da juventude, denunciando que o dinheiro destinado à guerra poderia estar melhorando a saúde e a educação de todo o proletariado, de toda a juventude. No Brasil, lançamos a palavra de ordem: “Abaixo a guerra e o capitalismo! Ruptura com Israel! Lute pelo comunismo!”. Participamos do movimento contra a Escala 6×1 e de todos os movimentos contra a privatização e destruição dos serviços públicos. Denunciamos as mortes feitas no proletariado negro pela polícia com a campanha “Ser negro não é crime”.

No mundo inteiro, convidamos a juventude e os trabalhadores que se identificam como comunistas a se juntarem à ICR com a campanha “Você é comunista? Então, organize-se”. Este é o convite que fazemos a todos vocês que estão cada vez mais indignados com o capitalismo e suas mazelas. Você é comunista? Junte-se a OCI, seção brasileira da ICR.