Foto: PMRJ

A crise da educação em tempo de coronavírus

Artigo publicado no jornal Foice&Martelo Especial nº 06, de 14 de maio de 2020. Confira a edição completa

Na rede pública do Rio de Janeiro, desde o dia 16 de março que as atividades escolares foram suspensas presencialmente. Já em 13 de abril se iniciaram as atividades remotas oficiais, propostas (leia-se: impostas) pelo governador Wilson Witzel e pelo secretário Pedro Fernandes.

Nesse período, vários foram os relatos de dificuldade de acesso, e os governos não estão medindo esforços em disponibilizar o acesso, o problema é que todas as medidas estão sendo realizadas através de parcerias com empresas privadas, como por exemplo a Google, que oferece a plataforma, as operadoras de celular, que “disponibilizaram” mais de 750 mil chips de celular e as redes de TV que vão oferecer janelas para a exibição de conteúdos. O pior é que não sabemos exatamente quanto isso vai custar para os cofres públicos (leia-se; bolso do trabalhador). Tanto que o ministério público intimou a não realizar a imposição do EAD e exigiu uma prestação de contas oficial sobre os gastos e contratos feitos.

Até aí nenhuma novidade, afinal, todos sabemos que nas crises do capitalismo quem mais lucra são as grandes empresas, enquanto a classe trabalhadora é que amarga pagar esse alto preço. Assim, não bastassem as mais de 10 mil mortes confirmadas, as milhões de pessoas sem suporte e auxílios negados, temos o feito emocional e psicológico negativo desse cenário.

Os relatos que temos recebido de nossos é alunos é preocupante. Além das inúmeras dificuldades de acesso à plataforma, vários são os casos que afirmam crises de ansiedade, depressão, tristeza profunda, medo, dispersão e todo tipo de reação que sabemos ser comum num período como esse, mas que deve ser cuidada bem de perto.

Se por um lado os estudantes estão sofrendo, com os educadores não é diferente, afinal, muitos de nós também têm dificuldades de acessar a plataforma, de trabalhar em casa ao mesmo tempo que cuida da família e com o medo que a própria situação gera, em especial o medo de adoecer, de morrer ou de perder alguém querido. Para piorar esse cenário, as decisões estão sendo tomadas de cima para baixo; não foram os professores que decidiram a plataforma, a metodologia, os prazos etc. Não decidimos nada, tudo foi “jogado em nosso colo”. Na prática, cada professor faz o que acha melhor, como se a educação fosse uma decisão individual de cada professor e não fruto de um amplo e profundo debate, científico, com metodologia, procedimentos e objetivos bem estabelecidos.

Nesse contexto, o sindicato parece que sumiu. Ou melhor, está presente, mas “a distância”. Sua orientação inicial era para que os professores não acessassem as plataformas remotas, porém, essa decisão foi feita de “cima para baixo” e sem convencer e mobilizar a categoria. Na prática, a maioria dos professores isolados e com medo de represálias acabaram acatando a decisão das direções escolares, que é a mesma do governo. Ao perceber isso, o sindicato mudou a orientação para: acessem o sistema para ver as dificuldades e denunciá-las. Isso gerou ainda mais confusão, porque nem sustentou a posição de boicote ao sistema e nem orientou como deveria ser feto o acesso. Na prática, os professores ficaram sem saber o que fazer.

O que deveria ser feito era abrir formas e meios de discussão com a categoria, por exemplo, convocando assembleias locais, regionais, e elegendo delegados, para que a categoria discutisse, participasse da decisão, e das assembleias saísse uma resposta da categoria. Bem como a organização de uma luta que arrancasse da burguesia direitos, e não apenas se limitasse a criticar a situação, por mais que possam estar corretas as críticas ao EAD.

Nesse cenário, a bandeira “educação, pública, gratuita e PARA TODOS” é ainda mais urgente, afinal, cerca de 2,8 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos estão fora da escola (UNICEF 2018), quando o ensino é obrigatório nessa idade. Sem falar dos casos de privação parcial, onde, por exemplo, os jovens estão nas escolas, mas são analfabetos ou estão em atraso escolar, o que chega a 13,8% da faixa, que tem um total de 43.384.308 de pessoas.

Se antes  da pandemia milhões de jovens proletários já não tinham o direito à educação, hoje esse processo se agudiza, e se ilude quem acha que o EAD é a solução ou mesmo quem acha que devemos esperar passar a pandemia para dar nossas “aulas normais”. Nada mais voltará ao normal, tudo que é sólido se desfaz no ar. Há um processo de destruição das forças produtivas, que além de matar pessoas, pretende destruir o pouco de avanços que conquistamos na educação. Ou seja, o que se coloca é uma luta que aponte que o problema é o sistema capitalista. Se para os reformistas nesse momento devemos “esperar a tempestade passar”, para os revolucionários é nesse momento de abrir a luta pela revolução socialista ou eles arrancam nossas poucas conquistas.

Hoje, não lutamos apenas por acesso irrestrito e universal à educação, por mais que muitas organizações desistiram dessa bandeira histórica e se limitaram a lutar por “qualidade”. Nossa luta nesse momento é para que não morram trabalhadores em massa, o que implica uma política de assistência e de cumprimento do isolamento; medidas que o presidente se recusa a assumir. Nesse sentido, precisamos lutar para que a classe trabalhadora consiga ficar em casa, para que o isolamento se abrevie, e isso exige acesso à alimentação, energia elétrica, água potável, e mesmo acesso à internet, visto que hoje a internet além de entretenimento é também veículo para a informação da população. E esses serviços básicos nunca serão para todos se as empresas forem privadas, porque para a burguesia o lucro está acima mesmo da vida da classe trabalhadora.

É preciso criar comitês pela educação e pelo fora Bolsonaro, onde toda a comunidade escolar se organize e defina um plano emergencial de superação da pandemia, e isso se esbarra com o próprio sistema capitalista e com seus lacaios, como Bolsonaro.