Administrada por uma fundação privada, a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) passa por uma crise de repercussão internacional, na qual os músicos enfrentam a administração da fundação e seu maestro burocrata.
No dia 09/04, ocorreu ato inesperado em concerto da Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB), ao menos para a fundação de direito privado gestora da orquestra (FOSB) e o maestro e diretor artístico dela, Roberto Minczuk: ele foi vaiado pelo público por 20 minutos e os membros da Orquestra Sinfônica Brasileira Jovem, convocados para substituir músicos recentemente demitidos, retiraram-se do palco, inviabilizando o concerto.
Minczuk, apoiado pela FOSB, impôs recentemente aos integrantes da OSB, que passassem por audições, como condição para garantir seus postos de trabalho. A divulgação das audições se deu no período de férias dos músicos e ao mesmo tempo se divulgou um programa de demissão “voluntária” e anúncios de provas nos EUA e Europa, com músicos locais, para preenchimento de postos de trabalho ainda ocupados pelos músicos brasileiros.
Segundo a FOSB, a OSB só atingirá um nível de excelência artística com a presença de músicos estrangeiros, porque Minczuk afirmou “não haver garantia de qualidade nos cursos oferecidos pelas escolas de música brasileiras”. Em fevereiro deste ano, em assembléia, 56 músicos da OSB decidiram não participar das avaliações, porque estas visavam apenas humilhá-los e promover demissões em massa. Quem duvida da avaliação, favor reler o parágrafo que contém a justificativa do maestro para as audições.
Entidades internacionais, como a Organização de Orquestras Sinfônica do Canadá, a Associação Regional de Músicos de Orquestra (ROPA, seção do sindicato nacional dos músicos dos EUA), manifestaram-se contra as audições e explicaram como criar uma orquestra de excelência artística: boas condições de trabalho, melhoria dos salários, jornadas de ensaios compatíveis com a necessidade de formação individual (além da prática conjunta nos ensaios, músicos devem realizar a manutenção das técnicas, em suas “horas vagas”), recolhimento de INSS, FGTS, plano de saúde, questões que jamais ocorreram aos burocratas da FOSB e o burocrata da batuta, como vamos chamar o Sr. Minczuk.
O violinista norueguês, Olé Bohm, manifestou-se por carta:
“Eu estou horrorizado como a administração está tratando seus músicos. Isto nunca poderia acontecer na Noruega, onde nós temos um sindicato muito forte. Em uma orquestra os músicos contribuem em diferentes níveis para a obtenção de um resultado. (…). O maestro tem que aceitar os músicos à sua disposição e mostrar capacidade para aprimorá-los.” (grifo nosso)
Mais cartas foram produzidas e músicos de prestígio internacional como Nelson Freire e Cristina Ortiz recusaram-se a participar de concertos com a OSB, até que a crise fosse resolvida.
Mesmo com todos os apelos e solidariedade de classe de músicos do mundo inteiro (a questão foi debatida em Amsterdã, na Segunda Conferência internacional de Orquestras Sinfônicas, entre 07 e 09/03, gerando documentos de solidariedade à OSB), em repúdio à ação, o burocrata da batuta e a fundação (que pretende afundar a orquestra) decidiram demitir por “justa causa” os 41 músicos que se recusaram a participar das audições. Não cancelaram os concertos de 09/04 e determinaram que os músicos da OSB Jovem completariam as vagas. Músicos demitidos organizaram protesto, tocando nas escadarias do teatro, outros músicos dirigiram-se ao concerto apenas para vaiar o burocrata da batuta, e os assinantes da temporada (sim! O concerto não foi cancelado porque havia ingressos vendidos) encontravam-se insatisfeitos por pagar por uma orquestra profissional e ouvir uma orquestra de profissionais estressados e assustados com estudantes pressionados.
Em carta aberta, músicos da OSB Jovem justificaram sua ação como solidariedade aos demitidos, “profissionais, amigos e mestres”. Ato importantíssimo, que demonstra a coragem deles, sua solidariedade de classe e coloca uma possibilidade de organização e avanço para a categoria musical de todo o Brasil, a partir do exemplo prático.
Um verdadeiro e responsável diretor artístico valoriza os músicos trabalhadores da orquestra, porque são eles que produzem a música que é ouvida pelo público. Buscar “excelência artística” transferindo tal responsabilidade a cada indivíduo que compõe a OSB, sem melhorar suas condições de trabalho demonstra a visão de arte e vida deste burocrata da batuta.
A crise da OSB não é só uma crise interna, reflete a crise geral de todas as orquestras brasileiras, que reflete a crise econômica do capital. Quando orquestras são patrocinadas por empresas privadas, através de leis de renúncia fiscal, devem submeter-se à lógica do capital na sua administração. Elas liberam dinheiro que deveria ser revertido para impostos (renúncia fiscal), apenas se suas marcas forem associadas a outra marca forte, no caso a orquestra. A contratação de nomes estrangeiros ajuda a vender ingressos e assinaturas de temporadas e a trazer recursos de empresas, que não ligam para arte, mas querem lucro e propaganda.
A luta da OSB passa pelo fortalecimento dos sindicatos dos músicos ao redor do Brasil e do necessário comprometimento de suas direções com as lutas dos trabalhadores da música, para sua organização.
A solução das formas precárias de contratação e das formas de gestão autoritárias como a da OSB, passam pela modificação das linhas de financiamento das orquestras, que devem deixar de ser privadas, afinal de contas, os recursos investidos são públicos, deveriam pagar impostos.
A Esquerda Marxista apóia a luta dos músicos da OSB, a coragem dos músicos da OSB Jovem e manifesta-se pela necessidade de investimento direto do Estado em cultura! Cultura é direito e deve ser provido por recursos públicos.
- Todo apoio à luta dos músicos da OSB e à coragem dos músicos da OSB Jovem!
- Pela imediata recontratação dos 41 músicos demitidos e fim das audições que visam substituir os atuais músicos por músicos estrangeiros!
- Afastamento imediato do diretor artístico da OSB, o Sr. Roberto Minczuk!
- Afastamento de todos os membros do corpo diretor da FOSB, que votaram favoravelmente às demissões!
- Pelo fortalecimento dos sindicatos de músicos!
- Pelo reconhecimento dos músicos enquanto trabalhadores e cumprimento dos seus direitos!
- Fora os patrões dos sindicatos! Queremos sindicatos que representem o músico trabalhador e seus interesses de classe!
* Mario Conte é músico, diretor do SIMPROIND (Sindicato dos Músicos Profissionais Independentes) e militante da Esquerda Marxista.