Foto Lucas Figueredo, CBF

A crise na CBF e o governo Bolsonaro

Na última semana, publicamos um texto sobre a Copa América de 2021, negada por Colômbia e Argentina, mas aceita pelo governo Bolsonaro, a pedido da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Nas horas seguintes a crise estava instaurada na CBF, quando jogadores e a comissão técnica começaram a manifestar, internamente, desacordo com a realização da competição e o presidente da CBF, Rogério Caboclo, foi acusado de abuso sexual e moral por sua secretária. 

A primeira impressão dos que acompanharam a situação era que a insatisfação se dava devido à pandemia de Covid-19, mas, nos últimos dias, vimos que havia outras motivações mais importantes para os atletas. Em especial, se tratou da ausência de férias, especialmente para os atletas que trabalham na Europa; o desprezo ao presidente da CBF, responsável por forçar o evento no Brasil junto ao governo federal; a atual irrelevância da Copa América, que se tornou um torneio caça-níquel para a Conmebol, o governo Bolsonaro e o SBT, que ganhou a queda de braço com a Globo pelos direitos de transmissão; e a não participação nas escolhas de seu próprio trabalho, devido as resoluções unilaterais de Caboclo e Bolsonaro. Mesmo assim, qualquer ato de insubordinação de astros do principal selecionado de futebol do mundo seria significativo, porém, essa esperança que aflorou entre os torcedores logo foi frustrada. 

No início da crise, na última sexta-feira, 4 de junho, o Brasil voltou a disputar as Eliminatórias da Copa do Mundo do Qatar de 2022, vencendo o Equador por 2×0. Este é um campeonato possui um formato diferente da Copa América, sendo mais importante para as seleções, visto que os 4 melhores colocados disputam a Copa do Mundo e o 5° uma repescagem contra uma seleção da Oceania. A referida esperança por uma greve de jogadores aumentou justamente após o jogo contra o Equador, quando o volante Casemiro, capitão do Brasil e jogador do Real Madrid, concedeu uma entrevista ao jornalista da Globo Eric Faria, dizendo que “todos sabem” da posição dos jogadores e da comissão técnica, mas também demonstrando o medo que estes atletas têm das punições e das hierarquias, que os impedem de se pronunciar com maior tranquilidade e frequência. 

Embora isso não deva servir como desculpa para o afastamento destes milionários jogadores de futebol da realidade da classe trabalhadora, da qual eles são oriundos, é real o cerceamento e a perseguição de diretores de clubes e seleções, além dos contratos com patrocinadores. Essas imposições historicamente calam os atletas do esporte mais popular do mundo a se posicionarem politicamente.

Mesmo assim, toda essa crise instaurada na CBF irritou o governo Bolsonaro, que exigiu explicações de Caboclo. No domingo, 6 de junho, o jornalista André Rizek publicou uma matéria denunciando que, como resposta às exigências de Bolsonaro, Caboclo demitiria o treinador Tite na terça-feira, 8 de junho, após a partida contra o Paraguai, em Assunção. Por dirigir os jogadores, Tite está sendo alvo das gangues digitais bolsonaristas, dos filhos do presidente e do vice Hamilton Mourão, que fizeram discursos e publicaram montagens contra o treinador, inclusive chamando-o de “comunista”, “petista”, “puxa-saco do Lula” e os demais delírios desses reacionários. 

Na reportagem de Rizek, Caboclo afagaria Bolsonaro contratando Renato Portaluppi, que seria escolhido pela CBF não por sua capacidade profissional, mas por ser um bolsonarista de carteirinha. Desde 2018, se manifestou apoiador do governo e durante a pandemia, replicou alguns discursos negacionistas. Mudou sua posição apenas quando contraiu Covid-19 e passou por momentos difíceis com sua saúde. Ainda assim, segue um adepto do governo. 

Bolsonaro e Rogério Caboclo na abertura da Copa América 2019 – Foto: Marcos Corrêa, PR

Contudo, o que seria a cartada de Caboclo e de Bolsonaro não deu certo, porque o presidente da CBF foi afastado do cargo, devido às denúncias de assédio, logo após a publicação da matéria de André Rizek. O Conselho de Ética da CBF achou melhor retirá-lo por 30 dias para se defender das acusações e não manchar mais a imagem da entidade. Mas este afastamento tem tudo para ser definitivo, pois a vítima entregou os perversos áudios dos assédios de Caboclo para investigação e, após uma reportagem de Gabriela Moreira e Martín Fernandez, do Globo Esporte, o conteúdo dos abusos tornou-se público. 

Embora o governo Bolsonaro não tenha conseguido a demissão de Tite e a permanência de Caboclo, conseguirá a atuação do elenco principal do futebol brasileiro na Copa América. Os jogadores argentinos e uruguaios, que haviam se manifestado contrários à competição, também terão de disputá-la após suas federações igualmente confirmarem a presença. 

Os jogadores brasileiros justificam suas insatisfações com uma declaração, divulgada na terça-feira, após Paraguai x Brasil, por meio de suas contas no Instagram. Nesta postagem, criticam a organização da competição por “razões humanitárias e profissionais”. Focam as críticas apenas à Conmebol para que não haja desconforto com a CBF e o governo federal, inclusive frisando que não se trata de uma “discussão política”, como se isso fosse possível. Afirmaram que são trabalhadores, mas como um argumento de respeito às hierarquias, como obediência. Finalizaram dizendo serem contra a Copa América, mas que nunca irão negar vestir a camisa da seleção brasileira. Ou seja, uma nota irrelevante, que buscou evitar mais atritos entre eles e o comando da CBF e o governo federal. Uma posição que dá razão às críticas do ex-atacante e dirigente da Democracia Corintiana, Walter Casagrande, que, após o aceite à disputa, chamou os jogadores de “covardes”. 

Com tudo isto, visto que a copa será realizada em Brasília, Rio de Janeiro, Cuiabá e Goiânia, a única certeza que temos é que as ruas estarão pulsando no próximo mês com os gritos de Fora Bolsonaro, a partir da estreia do torneio, no dia 13 de junho. Já marcado na agenda, o ato nacional de 19 de junho precisa ser efetivamente construído, convocando todos os jovens e trabalhadores, que possuem condições de saúde, para formar os blocos com a Liberdade e Luta e a Esquerda Marxista. 

Nestes atos, tanto nas cidades sedes da Copa América, quanto em todo o restante do país, precisamos também divulgar amplamente o Encontro Nacional de Luta: Abaixo o Governo Bolsonaro! Por um Governo dos Trabalhadores, sem patrões nem generais! Esta é nossa tarefa neste momento, denunciando em todas intervenções a crise das instituições burguesas, que evidentemente atravessa todas as áreas, como estamos vendo também no esporte. Tais crises demonstram a decomposição irreversível deste sistema. Portanto, para que tenhamos todos nossos direitos conquistados, inclusive com o esporte, amador e profissional, sendo realmente popular e seus trabalhadores, os atletas, decidam sobre seus rumos, precisamos garantir a superação do capitalismo e a construção do socialismo.