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A “democracia” em ação e o apoio internacional

O Globo do dia 11/01/23 traz em seu editorial:

“Em conversa pelo telefone depois do ataque da minoria radical bolsonarista na Praça dos Três Poderes, Biden declarou “apoio incondicional” à democracia brasileira. O isolamento dos terroristas que assaltaram Brasília não é apenas um fenômeno doméstico. Declarações de vários chefes de governo e de representantes de órgãos multilaterais demonstram a existência de uma ampla rede internacional contrária à tentativa de golpe… Não convém a ninguém uma crise de grandes proporções em um país responsável por uma fatia considerável das exportações globais de alimentos. Por seu tamanho e influência, o Brasil também poderia espalhar instabilidade pela América do Sul.

A responsabilidade de defender a democracia no Brasil é, e sempre será, tarefa intransferível dos brasileiros. Mas parece evidente que existe um ambiente internacional favorável. “

Muito bem, tanto os EUA quanto todos os órgãos “multilaterais”, como a OEA, a ONU e outros não citados, são a favor da “democracia” no Brasil.  Ao contrário de 1964, quando os EUA organizaram o golpe, agora eles são contra. Ao contrário do que aconteceu no Chile, na Nicarágua, na Colômbia em outros anos e mais recentemente na Venezuela, eles agora são contra o golpe. E O Globo fica satisfeito com isso, com o apoio dos EUA ao governo. Cabe a nós perguntar: por quê?

Por que eles são democratas? Ao que parece este não é um bom exemplo. Eles intervieram no Iraque e no Afeganistão e não parece que o resultado seja a democracia. Eles não mexem com a Arábia Saudita e não parece que lá seja um pais democrático. A Ucrânia tem nazistas no seu governo e os EUA estão lá apoiando. Enfim, pela democracia não é um bom motivo.

Por sorte nossa, O Globo desvenda parte do mistério: ter uma conturbação num país que é responsável por boa parte da produção mundial dos alimentos e que poderia se estender para o resto da América Latina não seria bom para os negócios. Em ultima análise se trata disso: qual governo no Brasil é melhor para os negócios?

Em certo sentido, os bolsonaristas fizeram um favor inestimável a Lula. Até o governador de São Paulo, bolsonarista de carteirinha, foi lá na reunião de governadores e foi o segundo a falar, prestando apoio à “democracia” e a Lula. Todos os poderes, até o inefável Lira Presidente da Câmara dos Deputados e candidato à reeleição estava lá. Todos juntos em defesa do Estado Democrático de Direito. Que é bem representado pela decisão de Alexandre de Morais que destitui o governador do DF.

Sim, o governador pode ter compactuado com o ato, mas já tinha sido afastado da área de segurança que passava a ser controlada diretamente pelo governo federal. Então por que afastá-lo de outras funções, já que poderia esperar?

E o afastamento é interessante. Quem substitui Ibaneis? A vice que é amiga de Michele e Damares, uma bolsonarista raiz, ao contrário do governador que parece ser somente um oportunista que ainda não tinha visto direito para onde estavam soprando os ventos.

A decisão de Morais vai além disso. Proíbe caravanas a Brasilia. Qualquer caravana. Ou seja, a esquerda se quiser fazer um ato, uma manifestação pelo reajuste salarial dos servidores vai ter dificuldades.

Enquanto isso Lula tem mais um motivo para agradecer aos bolsonaristas. O Twitter e o 99, aplicativos de transporte, anunciaram a demissão de quase todo seu pessoal no Brasil. A Riachuelo anuncia o fechamento de uma fábrica no Ceará e a demissão de 2.000 pessoas. Os trabalhadores de aplicativo anunciam uma greve para o dia 25 em defesa da contratação pela CLT. E o que o governo faz diante disso tudo?

Pega o Cristo no museu e leva para o Planalto, reúne-se com os governadores, continua a distribuição de cargos e fala em ajudar os miseráveis. Mas os miseráveis estão indo à luta e o governo nada têm a dizer para eles, como no caso dos trabalhadores dos aplicativos. Os que não eram miseráveis estão sendo demitidos e vão ser os próximos. E todo o noticiário, toda a atenção, é para com os bolsonaristas.

E, lembrando, a situação vai além disso. Afinal, a PM é bolsonarista e ajudou a invasão. E alguém acha que isso vai mudar? O governo tenta “limpar” a Polícia Militar ao invés de atender o clamor dos estudantes: “Não acabou? Tem que acabar! Eu quero o fim da Polícia Militar”

E com relação às Forças Armadas a situação é pior ainda. O Ministro da Defesa é amigo pessoal de Bolsonaro, direitista convicto e declarou que os acampamentos eram “manifestações democráticas”. Apesar disso tudo, ele foi nomeado por Lula e continua lá. Depois que o Batalhão Presidencial não fez o trabalho dele de preservar o Palácio do Planalto (que é responsabilidade deste batalhão e não do governo do DF).

E quem vai responsabilizar os comandantes de todos os quartéis do Exército que permitiram os acampamentos e continuam permitindo? E o comandante do Exército no DF que impediu a PM de entrar no acampamento no domingo à noite depois de todo o quebra quebra e na prática protegeu os baderneiros?

A decisão de Alexandre de Morais vai atingir o movimento dos trabalhadores. A propaganda feita por Felipe Neto e Janones na internet de denunciar os “golpistas” só servem para criar um ambiente policialesco que vai se voltar rapidamente contra todo o movimento dos trabalhadores e contra a esquerda.

Somente a mobilização dos trabalhadores e da juventude, a sua organização independente, vai garantir nossos direitos. O aumento da repressão só servirá para a burguesia e seus cupinchas. Por isso, a nível mundial, todos os governos aplaudem a “democracia” brasileira, que aproveita a baderna feita pela direita para reforçar o aparato repressivo do Estado e impedir as manifestações dos trabalhadores.