A opção de Doria pelo caminho da demagogia

Um prefeito varrendo as ruas da cidade em uma manhã ensolarada, vestindo-se de pedreiro para a imprensa, reproduzindo a vida difícil de um cadeirante andando em uma cadeira de rodas pela cidade, e mais recentemente: anunciando a criação de 20 mil empregos para moradores de rua. Mas não é a primeira vez que líderes políticos encarnam esses papéis. É a velha demagogia entrando em cena.

Por trás disso há o desejo de Doria por se anunciar como um herói das massas populares, negando a elas próprias seu papel histórico, trocando-as por uma vanguarda institucional. Sendo assim, reforça a ideia de que para que aconteçam grandes mudanças que beneficiem a maior parte da população será preciso um líder político burguês humilde, preocupado com a vida dos pobres, e com atitudes firmes. Às massas resta esperarem pelo seu próximo salvador – ou talvez próximo gestor.

Recentemente Doria conversou com entidades patronais e sindicatos com o objetivo de abrir 20 mil vagas para empregos na limpeza urbana destinadas à moradores de rua. Basta passar algumas horas na cidade de São Paulo para ver a pobreza espalhada na forma chocante de moradores de rua sujos e mal vestidos, muitos com questões psiquiátricas, por todos os lados.

Como resposta a isso, Doria propõe emprego com carteira assinada para 20 mil pessoas, que receberiam se encaixados nas condições, a incrível cifra de R$937 reais por mês. Típica proposta de um líder demagogo, já que para eles quando temos um problema, não importando sua fonte ou raiz, apenas importa a necessidade de um salvador que o resolva alimentando as massas com uma ilusão após outra.

Essa proposta dirige-se principalmente para duas classes. Primeiramente para a burguesia, que poderá confiar em Doria para parcerias público-privadas desse tipo para lidar com a miséria crescente em São Paulo. Depois, para a pequena burguesia, principalmente os setores intermediários e superiores, que além de caírem do conto da carochinha topam qualquer coisa para tirar das ruas os “indesejáveis”. Parte do proletariado de colarinho branco, com melhores condições de vida também cairão no discurso do bom gestor que limpará a cidade do pauperismo.

A verdade é que esses empregos não resolverão o problema. Os moradores de rua têm carteira de trabalho ou qualquer outra documentação? Quem ajudará eles a refazerem documentos para que possam se oferecer para as vagas? Para onde irão após a jornada de trabalho se não possuem casas e os albergues são péssimos? Se os albergues, agora renomeados pelo lindo nome “Espaço Vida”, são tão bons, por que estas pessoas estão nas ruas? Se fossem pagar por moradia, que tipo de casa conseguiriam alugar em São Paulo com 937 reais e ainda pagarem contas e terem acesso a alimentação e vestimenta (supondo que viver assim seja melhorar de vida)? Continuarão dependentes de um SUS precário para tratar agora doenças relacionadas ao trabalho exaustivo da limpeza urbana? E dinheiro para comprarem remédios? Como lidarão com os que necessitam de assistência psiquiátrica?

Ao final o resultado esperado é que nem metade dessas vagas sejam preenchidas. E mesmo que por um milagre todos os moradores de rua consigam trabalhar, poucos estarão em condição de permanência. A verdade é que o Estado burguês não tem condição alguma de fornecer assistência a essas pessoas para retirá-las da miséria que o próprio capitalismo lhes reservou espaço. A crise do capitalismo ainda levará milhares a situações semelhantes ou piores.

Líderes demagogos tendem a surgir de todos os cantos para oferecer a salvação ao sistema decadente por maquiagens bem elaboradas, geralmente planos bolados por burocratas experientes em sua equipe. De forma alguma manipulam o povo, o que fazem é apenas atender a expectativas geralmente ligadas ao estágio final de toda desilusão social: a espera de um messias. O aprofundamento incontrolável da crise do capitalismo irá retirar das massas a ilusão em soluções mágicas. A mesma crise que Dória se aproveita hoje, jogará amanhã ele e outros demagogos na lata de lixo da história.