Na noite de quinta-feira (6/7), foi aprovada a Reforma Tributária do governo Lula-Alckmin por ampla maioria na Câmara dos Deputados. Com 382 votos a favor, 118 contra e três abstenções, o agronegócio e os banqueiros comemoraram. As abstenções foram de Glauber Braga, Fernanda Melchionna e Sâmia Bomfim, em desacordo com a orientação da liderança do PSOL, que indicou o voto a favor da aprovação.
Assim como o Arcabouço Fiscal, a Reforma Tributária segue a cartilha do capital. O discurso pregado é de que ela tornará mais simples a legislação tributária brasileira – que de fato é extremamente complexa e com muitas distorções – e de que ela busca controlar a chamada “guerra fiscal” entre os estados brasileiros.
No entanto, simplificar leis não significa que elas tragam algum benefício ou avanços para a classe trabalhadora, pois o grosso da tributação continua sendo aplicado nos itens de consumo, onde os tributos são “iguais” para todos, ou seja, trabalhadores e patrões “pagam” o mesmo tributo quando compram um bem de consumo. Na prática, isso significa que o proletariado paga muito mais que a burguesia.
A nova tributação sobre jatinhos e lanchas já foi feita para ser contornada pelos ricos. Qualquer um que tenha propriedade rural pode colocar um jato como de uso comercial e será isento. Afinal, como os fazendeiros compram aqueles SUV caras? Contando com isenção de impostos por serem “produtores rurais”. Quem praticar a pesca “desportiva” também terá isenção em suas lanchas e iates. E o pobre que tem uma pequena canoa pra pescar o seu sustento, mas que não tem advogado para preencher milhares de formulários, vai acabar sendo taxado.
A Reforma Tributária deixa evidente a quem está beneficiando e quais são os interesses que estão por trás dela. A bancada governista e parte da oposição falavam em beneficiar os mais pobres com isenção de impostos para os itens da cesta básica, mas isso ficou para ser regulamentado por lei complementar futuramente. Por outro lado, Luiz Carlos Trabuco Capri (Bradesco) e Milton Muluhy Filho (Itaú) elogiaram a aprovação e a redução do “custo Brasil”, leia-se redução do custo do trabalho. Traduzindo para a linguagem proletária, esta Reforma reduz o salário indireto. Outros empresários lembraram que agora é hora de desonerar a folha. Afinal, onde passa boi, passa boiada.
Toda a discussão a respeito dos impostos sobre a renda ou sobre os lucros das empresas ficou para um futuro distante. E a taxação de grandes fortunas não passou nem perto do debate. Dito de outra forma, nada foi alterado nos impostos em que quem ganha mais paga menos e quem ganha menos paga mais. Ao contrário, impostos como PIS e COFINS, que são direcionados para a Previdência Social, serão substituídos por outros novos impostos, com destinação geral, ou seja, serão usados para pagar a dívida pública.
Dois pontos para estarmos atentos
Hoje, os itens da cesta básica estão isentos dos impostos federais. Assim, se a lei complementar que definirá a tributação da cesta básica não estiver definida a favor das isenções fiscais, e se não estiver aprovada pela Câmara e pelo Senado, os trabalhadores passarão a pagar mais impostos na cesta básica, a partir do dia em que a Reforma Tributária entrar em vigor. A devolução de tributos em bens essenciais (cashback), se funcionar da mesma forma que funciona a devolução do Imposto de Renda, significará uma devolução irrisória, frente ao valor que os mais pobres pagam na sua cesta de bens. Devemos ter em conta também que sempre existiu uma grande burocracia para que seja devolvido ao trabalhador qualquer centavo dos cofres do Estado burguês. Qualquer um que faz a declaração do Imposto de Renda sabe muito bem disso: paga muito e recebe de volta – quando recebe – um valor irrisório frente ao que foi descontado do salário.
A Reforma Tributária também prevê um Fundo de Desenvolvimento Regional, estimado em R$ 50 bilhões, mas as diretrizes e normas dele também serão definidas por lei complementar. O Conselho Federativo da Reforma será formado por governadores, prefeitos e representantes dos partidos políticos. Não precisamos ter uma bola de cristal para deduzir que este fundo será administrado nos interesses da casta política para manter seu controle político nas regiões mais pobres do país. Muito menos é possível garantir que estes recursos serão utilizados no interesse dos trabalhadores e camponeses, ao contrário, provavelmente será uma grande fonte de corrupção.
A CUT e a deseducação da classe trabalhadora
Funcionando como um braço do Estado brasileiro e não como a defensora dos direitos da classe trabalhadora, a CUT lançou a “Nota da CUT em apoio à aprovação da Reforma Tributária”. Nela, de forma escandalosa, tenta-se vender a ilusão de que esta Reforma é importante para os trabalhadores: “Em nota assinada pelo presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre, a Central reforça que a aprovação é um passo relevante para corrigir problemas históricos do sistema tributário brasileiro que se traduzem em uma maior carga tributária para os mais pobres” . Isso é uma falácia. O que foi aprovado não beneficia os trabalhadores, pelo contrário, apenas deseduca criando ilusão e beneficia os já milionários.
De forma hipócrita, a direção da CUT difunde que a desoneração da cesta básica consiste em uma vitória, que nem mesmo foi garantida, como explicado acima. Trabalha ainda com o imaginário popular de que taxar o dono de um jatinho é mais importante do que taxar os bancos. Ou seja, a direção da central se presta a um serviço lamentável de desorientar e deseducar os trabalhadores.
Como votou cada bloco
A extrema direita votou contrária à aprovação por pura demagogia e para marcar posição, pois esta Reforma Tributária não é muito diferente da Reforma Tributária de Paulo Guedes, apresentada no governo Bolsonaro. Além de ter semelhança com a primeira apresentada ainda no governo FHC, na década de 1990. A extrema direita exigia mais tempo para avaliar a PEC 45 e, em geral, reivindicava a redução de impostos para mais alguns setores burgueses. Ainda assim, 20 deputados do PL, partido de Bolsonaro, votaram a favor, porque também era de seu interesse e porque conformam uma ala que quer se diferenciar do bolsonarismo.
A Reforma foi aprovada pelos partidos que compõem a base do governo Lula-Alckmin e pelos partidos do Centrão, que cada vez mais compõem o governo, mas com margem de manobra para manter suas chantagens. Todos os deputados do PT e PCdoB votaram a favor. Todos comemoraram a aprovação como se fosse um evento histórico, que virá para resolver mais de “70 anos de distorções tributárias”, que pretensamente acabará com a guerra fiscal entre os estados, tornará o Brasil mais competitivo – ou seja, reduzirá os salários indiretos –, atrairá mais investimentos, gerará milhões de empregos, entre outros fogos de artifícios. Tudo isso para justificar que a Reforma não foi feita contra o interesse da classe trabalhadora.
Já no PSOL, contrariando a euforia do líder da bancada, Guilherme Boulos, e do presidente do partido, Juliano Medeiros, houve três importantes abstenções, de Glauber Braga, Fernanda Melchionna e Sâmia Bomfim, que não se dobraram à euforia da direção do partido. Com seus votos, eles alertaram que não há nada a se comemorar em uma Reforma que é apoiada pelos bancos e pelo agronegócio, e que não garante minimamente um alívio nos tributos dos itens mais consumidos pela camada mais pobre da população. Saudamos os companheiros e nos aliamos a essa denúncia:
Há algo de bom para os trabalhadores?
Como dissemos anteriormente, tanto o Arcabouço Fiscal quanto a Reforma Tributária são exigências da classe dominante e estão dentro da cartilha do capital. O Arcabouço mantém a austeridade fiscal e os limites do gasto público, a Reforma Tributária chega já bem atrasada para tornar a legislação tributária brasileira um tanto mais racional aos empresários, mas não toca no fundamental, que é o controle dos recursos monetários e financeiros nas mãos do Estado burguês. A direção do PSOL, ao apoiar tal Reforma, mostra que a integração do partido ao governo de união nacional com a burguesia leva o partido a tomar posições pró-burguesas.
Como dissemos em outros documentos, a perspectiva da economia mundial para os próximos anos é de recessão. Para deter a alta da inflação os bancos centrais de muitos países estão aumentando as taxas de juros. Isto é uma receita acabada para mais sofrimento para a classe trabalhadora.
Nosso compromisso é com a nossa classe, a classe trabalhadora.
Não podemos ter ilusão que a Reforma Tributária trará mais emprego e mais investimentos. Pelo contrário, ela é uma pequena garantia de que os bancos e o agronegócio, aconteça o que acontecer, estão com seus negócios bem estruturados. Por isso, a comemoração. Para os trabalhadores, a única saída é o controle democrático dos grandes meios de produção e utilizar o excedente desta produção no benefício da própria classe trabalhadora.
Você é um comunista? Você quer lutar pela transformação da sociedade? Junte-se a nós.