Foto: Juliana Pesqueira, Amazônia Real

Amazonas: a pandemia, a vacina e a luta de classes

Novamente o Amazonas se tornou uma amostra de como a pandemia de Covid-19 revela todas as engrenagens sórdidas do sistema capitalista e sua completa incapacidade de garantir à classe trabalhadora condições mínimas de vida.

Já afetado por uma primeira onda devastadora entre março e maio de 2020, a partir de dezembro o estado viu um aumento significativo nos casos, internações e mortes pela doença. O sistema de saúde pública, já extremamente precarizado, não suportou a demanda e entrou em colapso rapidamente. Além da limitada estrutura física, as equipes de saúde estão esgotadas.

Enfermeiras, técnicas de enfermagem e auxiliares denunciam em vídeos gravados pela população o descaso com os pacientes e as precárias condições de trabalho que enfrentam. Um grupo de profissionais chegou a fazer um protesto durante a troca de turnos de um dos maiores hospitais de Manaus.

Os hospitais privados, que em todo o Brasil retiram recursos do SUS e recebem isenções fiscais, foram os primeiros a fechar as portas para novas internações. A caução cobrada para uma vaga de UTI particular chegou a R$ 100 mil e as famílias ricas da cidade fizeram fila para enviar seus doentes de jatinho a grandes centros médicos em São Paulo, como o Hospital Sírio-Libanês e o Albert Einstein.

Imagens do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes mostraram filas enormes para o embarque de passageiros. Sabendo com antecedência do caos que tomaria a cidade, empresários se mudaram com toda a sua família para outras cidades e até mesmo outros países.

Com o esgotamento do oxigênio, os cilindros que antes eram vendidas a R$ 500 chegaram a custar R$ 5 mil. Sem qualquer ajuda do governo, os pedidos de solidariedade se multiplicaram nas redes sociais e uma rede de voluntários, principalmente jovens, se mobilizou para levar alimentos, EPIs e outros artigos que estavam faltando nas unidades (os profissionais pediam até mesmo pilhas para repor nos aparelhos).

Se a população precisa tirar dinheiro do seu bolso para suprir as necessidades da rede estadual de saúde enquanto o governo diz não poder fazer nada, para que ele serve?

A revolta e o ódio contra o governador Wilson Lima (PSC) e o prefeito David Almeida (Avante) tomaram conta da cidade e mesmo a chegada da vacina se converteu em mais combustível na fogueira. Isso porque diversas denúncias mostraram que pessoas sem qualquer atuação no atendimento aos pacientes estavam sendo imunizadas.

A lista inclui duas irmãs da família Lins – uma das mais ricas de Manaus – e o filho de um deputado estadual, os três recém-formados em Medicina e nomeados às pressas pelo prefeito como “gestores de projetos”. Além desses nomes, a secretária de saúde, o secretário de limpeza pública, um casal dono da empresa que fornece alimentação para os hospitais e até o motorista do governador foram vacinados.

A justiça ordenou que a prefeitura divulgasse a lista de vacinados, mas diversos CPFs informados eram inválidos e uma grande parte dos nomes não eram nem médicos, nem enfermeiros e constavam na categoria “outros”.

Enquanto a crise na saúde não dá qualquer sinal de trégua, a crise econômica se aprofunda. Milhares de trabalhadores já foram demitidos e outros tantos tiveram redução de salários. Os mais afetados são os do comércio, que em sua maioria dependem das comissões de vendas para compor o seu salário.

Com a suspensão do auxílio emergencial federal em dezembro, milhares de famílias passaram o mês de janeiro sem qualquer renda e correm o risco de ter a mesma sorte em fevereiro. Enquanto isso o auxílio municipal prometido por David Almeida em campanha e o auxílio estadual anunciado por Wilson Lima ainda não foram liberados, deixando os trabalhadores na miséria.

Os patrões, pouco preocupados com a segurança de seus empregados, fazem pressão para a reabertura do comércio mesmo com a ocupação de leitos estando acima de 98%. O sindicato de metalúrgicos, dirigido pelo PT, nada fez para parar a indústria e proteger a vida dos trabalhadores o sindicato de comerciários é uma piada que só serve para fazer acordos patronais.

Todos esses acontecimentos mostram o nível da luta de classes e como em situações de crise as contradições do sistema capitalista se tornam ainda mais aguda. A verdade é que, dentro dos limites do sistema, os governos são incapazes de dar uma resposta à altura para a pandemia: lockdown completo, emprego e renda para todos, testagens em massa e vacinação para todos.

O que vemos é uma tentativa de lançar paliativos na esperança de que o vírus perca força e as propagandas possam dizer novamente que o “Amazonas venceu a pandemia”. Mas nada disso é capaz de apagar da memória das pessoas a perda de seus familiares e amigos, a destruição de suas condições de vida e ódio que se inflama contra as lideranças do Estado burguês.

Foto: Márcio James, Amazônia Real

O que falta para essa revolta explodir?

Infelizmente, sem uma direção de classe capaz de agitar a consciência dos trabalhadores e apontar um caminho revolucionário para a solução de nossos problemas, isso pode demorar bastante. O medo da doença e a precariedade econômica se tornam freios à mobilização popular, que mesmo tomando as ruas encontra novas barreiras nas lideranças traidoras que fazem de tudo para canalizar a revolta por vias seguras e “democráticas”.

Enquanto PT, PCdoB e a direção do PSOL apostam suas fichas em um impeachment que depende da aprovação de um congresso reacionário e a serviço da burguesia, mais de mil brasileiros morrem todos os dias pela ação ativa de Bolsonaro e sua gangue. É preciso derrubar esse governo através da mobilização popular, é preciso abrir caminho para a transformação definitiva da sociedade, é preciso acabar com o capitalismo.