Como o governo Bolsonaro está privatizando a Atenção Primária em Saúde

Na última semana muito se falou sobre a “nova” medida do governo federal, que através do Decreto 10.530 assinado por Bolsonaro, sinalizou mais uma vez a intenção de tirar dos municípios a administração da Atenção Primária em Saúde (APS). Porém, apesar das centrais  sindicais, mídia e diversas figuras públicas tratarem o assunto como desconhecido até então, esse decreto apresenta a tentativa de fazer um estudo de viabilidade para colocar em prática um projeto já sancionado em 2019, que permite a transferência das atividades básicas em saúde à iniciativa privada. Diante da repercussão do caso, Bolsonaro revogou o último decreto, mas já sinalizando que nos próximos dias retomará a discussão.  

Uma das primeiras medidas do governo Bolsonaro na saúde foi a destituição do Programa Mais Médicos, em agosto de 2019, e a criação do “Médicos pelo Brasil”, que é essencialmente o antigo programa com algumas alterações. Mas a motivação governamental desde o início sempre foi  a criação de uma agência reguladora, ou seja, uma manobra para a privatização para o SUS. Com ataques ideológicos aos médicos cubanos e a propagação de falas absurdas como a de que “A ideia (do Mais Médicos) era formar núcleos de guerrilha no Brasil”, Bolsonaro e o ex-ministro da saúde Luiz Henrique Mandetta, criaram uma cortina de fumaça para iniciar a privatização da Atenção Básica, item importante na cartilha econômica de Paulo Guedes.

A Medida Provisória 890 que resultou na Lei Nº 13.958, de 18 de dezembro de 2019 instituiu o Programa Médicos pelo Brasil, no âmbito da atenção primária no Sistema Único de Saúde (SUS). Também autorizou o Poder Executivo federal a instituir o serviço social autônomo denominado Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps), criada através do Decreto 10.283 em março de 2020. Vista por alguns especialistas como o “cavalo de Troia” dentro do Programa Médicos pelo Brasil, a Adaps é uma agência do terceiro setor (SSA) juridicamente muito próxima das já conhecidas Organizações Sociais (OS), porém com dimensão nacional, um ente privado, apesar de ter sido criada pelo governo, que irá usurpar atribuições da União, estados e municípios em relação à Atenção Primária, um legítimo “presente de grego” que vai ampliar os cortes, a precariedade e afundar de vez o SUS. 

No entanto, para tornar atrativo o repasse da administração da atenção básica à iniciativa privada, era preciso tornar inviável essa administração pelos municípios, com isso, foi preciso antes desfinanciar ainda mais os fundos municipais. Surgiu assim o programa “Previne Brasil”, instituído pela Portaria nº 2.979 de 2019, aprovado em comissão tripartite, ou seja, com o aval de diversos conselhos de saúde, o programa trouxe um novo modelo de financiamento para a atenção básica, terminando com o PAB Fixo e oferecendo repasses apenas pelo número de usuários cadastrados nas equipes de saúde, e não mais pelo número total da população por município. A portaria rompe com o caráter universal do SUS, criando o princípio da seletividade na atenção básica, e fere diretamente a Estratégia de Saúde da Família. A diminuição de verbas causada pela portaria, além da Emenda Constitucional 95 que trouxe perdas bilionárias ao sistema de saúde, incentivam os gestores municipais a vislumbrar uma boa saída na entrega da administração da APS à Adaps. 

A MP890 foi apresentada em 1º de agosto de 2019, e serviu de incubadora para o projeto de privatização da Atenção Primária. No dia 4 de agosto de 2019, três dias após a apresentação da MP, aconteceu a 16° Conferência Nacional de Saúde, que reuniu mais de cinco mil pessoas entre elas diversas lideranças políticas, diretores de centrais sindicais e sindicatos de todo o país, e mesmo trazendo como temas principais “Saúde como direito, Consolidação dos princípios do SUS e Financiamento do SUS”, não foi dado início a nenhum embate para a derrubada da criação da Adaps. As direções em mais um ato de traição, se negaram a explicar e organizar os trabalhadores contra esse grave ataque à saúde da população. Só demonstraram “preocupação” com o assunto no último dia 26, quando o decreto trouxe notoriedade ao caso e inflou a discussão nas redes sociais. Mesmo assim, nada fizeram para mobilizar os servidores da saúde e demais trabalhadores para a derrubada do projeto.

O mundo inteiro assiste o aprofundamento da crise  do capitalismo, com enormes declínios nos investimento e repasses aos serviços públicos, suprimindo cada vez mais os direitos dos trabalhadores. No Brasil, ao mesmo tempo em que avança com austeridade sobre a classe trabalhadora, o governo Bolsonaro amplia a farra de incentivos fiscais bilionários às grandes empresas e destinou, durante a pandemia da Covid-19, cerca de R$ 1,2 trilhão aos bancos. Como nos governos anteriores, prioriza o pagamento da dívida pública, enquanto destroça o SUS, criando uma agência que tira do domínio público qualquer iniciativa e comprometimento com a saúde da população. 

Portanto, é preciso lutar pela revogação da Lei 13.958 e por todos os outros decretos e portarias que viabilizam a privatização da APS. Cabe a nós trabalhadores além de denunciar todas as estruturas putrefatas do Estado brasileiro, também denunciar as direções traidoras do movimento operário que se negam a fazer qualquer luta e inclusive omitem as informações aos trabalhadores. É necessário garantir que a saúde seja dever do Estado e direito de todos, isso só será possível através da luta organizada por um Governo Socialista dos Trabalhadores. 

  • FORA BOLSONARO, por um governo do trabalhadores sem patrões nem generais.