Como se trai uma revolução? Parte 3

Artigo publicado no jornal Foice&Martelo 133. Clique aqui, para assinar, receber e ler online o conteúdo completo de todas as edições.
Leia a Parte 2

Os marxistas são aqueles que seguem o caminho escarpado e difícil da luta de classes. Que combatem “não só o pântano como aqueles que se desviam para o pântano!”1. Dentre as distintas organizações e partidos “de esquerda” que se posicionaram em relação à Venezuela, o PT foi um dos contrários ao golpe imperialista e que não se perderam na crítica à “ditadura” de Maduro. Entretanto, o que poderia ser uma defesa da revolução em curso na Venezuela, trata-se, na verdade, da preservação de um suposto capitalismo mais democrático e de um combate seletivo ao imperialismo norte-americano.

Comecemos com a explicação do partido, por meio de artigo de Breno Altman, de 23 de fevereiro2, sobre o que motiva o golpe:

“De olho nas riquezas naturais da Venezuela, especialmente o petróleo, e disposto a recuperar protagonismo na América Latina, frente à coalizão russo-chinesa, Donald Trump aposta na desestabilização, no cerco e na derrubada de um governo soberano.”

As riquezas naturais venezuelanas realmente interessam aos EUA. Mas a questão não é somente essa, nem da recuperação do “protagonismo” diante da Rússia e China, e sim de esmagar um processo revolucionário que há anos sacode o país. Além de desferir um golpe na Revolução Cubana que perderia seu principal aliado econômico.

A questão central para o imperialismo hoje é retomar o controle do que atualmente está nas mãos da burocracia venezuelana, destruir todas as conquistas da revolução e de impedir qualquer levante no próximo período. Neste aspecto, até a camada da burguesia que não “fecha” com Trump está de acordo.

Há também uma dose de hipocrisia ao combater a possibilidade de intervenção militar quando Gleisi Hoffmann, presidente do partido hoje, afirma que “Quando o ex-presidente George W. Bush quis comprometer o Brasil na guerra contra o Iraque, o ex-presidente Lula reagiu com altivez: ‘Nossa guerra é contra a fome’.”3

E o que foi a intervenção do Brasil no Haiti iniciada em 2004, durante o governo do ex-presidente Lula? Uma intervenção que orienta as tropas a pararem de economizar munição não parece ser muito útil no combate à fome. Também há nas declarações do PT um certo esquecimento de que Lula foi chamado de “o cara” por Barack Obama, justamente por ser uma ferramenta muito útil ao imperialismo. A questão é que a origem de classe do PT não permite que seus dirigentes assumam suas posições reacionárias abertamente.

Tratando de hipocrisia, vale abrir um pequeno parênteses para destacar o papel da mídia burguesa, especialmente da rede Globo, que rotineiramente fala da “ditadura” venezuelana com um enorme pesar, alegando o sofrimento do povo, mas que, ao mesmo tempo, entende como normal quando uma pessoa se autoproclama presidente do  país.

O rechaço do PT ao ataque dos Estados Unidos à Venezuela não significa a escolha tática de pôr fim à ameaça mais imediata à revolução, mas de defender o governo Maduro usando como único argumento a legitimidade do mesmo, de maneira completamente acrítica. Ao tentar resolver o problema dentro dos marcos do capitalismo – o PT nem menciona a palavra revolução em seus artigos -, acabam por fazer a defesa das mesmas posições do Movimento Esquerda Socialista (MES) e do próprio Maduro:

“(…) somente será possível uma saída democrática se os EUA e seus aliados renunciarem à intervenção e ao golpismo, aceitando mesa de diálogo proposta por México e Uruguai, que já conta com a aquiescência do governo venezuelano.” (Breno Altman, 23/2)

“A saída, a solução pacífica para a crise venezuelana, que tem impacto na América Latina, é a negociação política, é conversar com todos os lados. Papel que o Brasil deveria estar fazendo, como já fez com sucesso, e não colocando mais lenha na fogueira.” (Gleisi Hoffmann, 14/1)

Ao fim e ao cabo, podemos perceber que nas mais distintas cores, o que convencionamos chamar de esquerda acaba por defender posições muito parecidas sobre a Venezuela. E há quem diga que a “esquerda” está muito fragmentada. Ora, não quando o assunto é a defesa do capital e a falta de confiança na classe trabalhadora. Tanto o sectarismo de “Nem Maduro, nem Guaidó!” quanto a política de conciliação com a burguesia servem apenas para enterrar a Revolução Venezuelana.

Aqueles que se negam a ir pelo pântano seguem em defesa da revolução venezuelana, explicando a necessidade de combater o golpe e de construir um partido da classe trabalhadora que irá derrotar o imperialismo, a burocracia e expropriar os grandes meios de produção.