Congresso da CMI: mais uma vez, a questão nacional para os marxistas

Fonte de tensão e violência em países por todo o mundo, a questão nacional foi ponto de debate no Congresso Mundial da Corrente Marxista Internacional (CMI), realizado na Itália.

Fonte de tensão e violência em países por todo o mundo, a questão nacional foi ponto de debate no Congresso Mundial da Corrente Marxista Internacional (CMI), realizado na Itália. A mesa de discussão ocorreu na quinta-feira (28/7), com informe de Alan Woods. Abordando exemplos antigos e atuais, a atividade problematizou o assunto sob a luz da teoria socialista.
 
A questão nacional tem sido motivo de reflexão dos revolucionários desde a época em que Karl Marx e Friedrich Engels intervinham na Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT – 1ª Internacional). Eles explicavam haver outras formas de opressão, além da de classe, as quais deviam ser levadas em consideração. Destacavam, também, que nesses conflitos os revolucionários ficavam sempre ao lado do oprimido. Contudo, assinalavam que as bases econômicas sob as quais se assenta a sociedade capitalista levavam à necessidade de sempre observar as opressões sobre o prisma das classes sociais em luta.
 
Lenin recordava que a vitória do Partido Bolchevique em 1917 teve como um de seus eixos de êxito uma posição acertada sobre a questão das nacionalidades. Sua opinião, até o fim de sua vida, foi a defesa do direito à autodeterminação dos povos. Isso não implicava, contudo, um apoio incondicional à formação de múltiplas nacionalidades. Alan utilizou como ilustração a legalização do aborto, pois os marxistas defendem o direito de a mulher decidir sobre seu próprio corpo, contudo isso não significa que queiram que todas as mulheres façam aborto. Ao mesmo tempo que apontava o direito à autodeterminação dos povos, Lenin defendia a unidade dos trabalhadores e de suas organizações em todo o mundo, o que levaria à resolução da necessidade de separações territoriais.
 
Alan Woods lembrou o papel desempenhado pela burguesia em seu período revolucionário, que entre outras coisas superou as diferenças locais herdadas do feudalismo e possibilitou o desenvolvimento das forças produtivas, desempenhando um papel historicamente progressista. Contudo, ressaltou a análise de Marx sobre a opressão desempenhada pela Inglaterra sobre a Irlanda. Nesse caso, os fundadores do socialismo científico defenderam a independência dessa última, calculando a redução da repressão sobre os trabalhadores e o enfraquecimento do então império dominante do planeta.
 
Porém, nem sempre os marxistas tomam posição sobre os conflitos pela independência dos países. Em vários casos, as disputas sobre a questão levariam a um outro regime degenerado de dominação burguesa subordinado ao imperialismo. Portanto, o fato de os marxistas destacarem o direito à autodeterminação não significa que defendam a aplicação dessa medida em todos os caos. Tudo depende das linhas de classe que perpassam os movimentos vivos em torno desse debate, e das consequências da separação para o controle da burguesia sobre o proletariado.
 
A concepção revolucionária sobre as nacionalidades concebe que toda a federação deve se estabelecer sob condições igualitárias totais e por livre vontade. As melhores resoluções para esse assunto, de um ponto de vista histórico, deram-se por ocasião da Revolução de Outubro. As várias nações dominadas pelo império russo, assim como seus vizinhos títeres, foram libertadas do jugo opressor da “pátria russa”, e puderam decidir democraticamente seus próprios destinos e constituíram assim a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
 
Frisando as diferentes formas de encarar esse debate, Alan Woods avaliou o internacionalismo proletário como a melhor resposta, e não o nacionalismo burguês ou pequeno burguês, ou ainda a teoria estalinista do socialismo por etapas. Esses últimos, pelo contrário, levaram e continuam a promover desastres onde conseguem uma expressão. Entre os exemplos do passado abordados, citou Irlanda, Iugoslávia, Argélia, Índia, China, Indonésia, Palestina e os países coloniais. Trazendo a discussão para o presente, o dirigente da CMI utilizou como ilustração moderna o caso do Reino Unido, Oriente Médio, Iraque, Sudão, Catalunha, País Basco e Escócia.
 
Em todos os casos, Alan enfatizou que faz-se necessário a sensibilidade para ser firme nos princípios políticos e flexível nas táticas para intervir junto ao movimento real dos trabalhadores em cada país. E, em aqueles nos quais a indignação das massas encontra como canal de manifestação a busca pela separação, os marxistas precisam de uma tática acertada para expressar os interesses gerais do proletariado sem cortar seus laços com a vanguarda que enxerga de forma confusa seus problemas e as possíveis soluções.
 
Embora hajam muitas manifestações nacionalistas que tragam germes progressistas, pois esses movimentos são sempre contraditórios quando ganham caráter massivo, o desenvolvimento da sociedade histórica passa pelo inverso da criação de novas fronteiras nacionais. Como caracterizou Alan, o capitalismo desempenhou o papel histórico progressista de globalizar o mercado e interligar as nações, contudo, é incapaz de superar as fronteiras nacionais, utilizadas como instrumento para manutenção do regime social sob o qual se baseia. Trata-se de uma tarefa socialista possibilitar um acesso igualitário, justo e sob bases democráticas a todos os seres humanos às condições de abundância já existentes no planeta, independente de sua origem nacional, de pontos de vista individuais e coletivos.
 
Sem as situações de miserabilidade e de sofrimento em que vive o proletariado de todos os países do mundo, sob o jugo do capitalismo, as buscas apaixonadas pela determinação de novas fronteiras deixa de ser um fenômeno permanente. Isso porque não se farão mais necessárias linhas territoriais policiadas e controladas, visto que a humanidade poderá conviver em uma existência sem nenhuma limitação material ou espiritual, onde os povos poderão conviver e evoluir juntos, enquanto fraternidade. Ou seja, as condições sociais permitiriam a extinção de todas as características da pré-história de nossa espécie.