Contra a direita franquista, votar em Unidos Podemos – Lutar pela república e o socialismo!

A eleição de 28 de abril tem uma enorme transcendência. Existe uma grande preocupação com a possibilidade do retorno da direita ao governo, reforçado pela extrema-direita de Vox, e é obrigação dos militantes e eleitores de esquerda fazer de tudo para impedir.

Os trabalhadores, a juventude, as mulheres trabalhadoras e os trabalhadores imigrantes só podem esperar mais ataques a suas condições de vida por parte de um governo respaldado pelos patrões, a Igreja e um aparato de Estado neofranquista cada vez mais afastado da sociedade. A direita no governo agravaria o conflito catalão para cegar os olhos das famílias operárias com seu nacionalismo espanhol franquista, e reforçaria a repressão em todos os lugares contra nossos direitos de expressão, reunião e manifestação.

Contudo, um setor da burguesia é consciente de que um “trifachito[1] – possível somente com uma abstenção elevada – aumentaria a instabilidade social com suas políticas ultrarreacionárias e repressivas, radicalizando à esquerda milhões de trabalhadores e jovens. Prefeririam um governo “mais amável” como PSOE[2]Ciudadanos[3], mas este último já mostrou sua disposição em pactuar com PP[4]Vox[5]. Desse modo, os setores mais inteligentes da classe dominante veem com igual preocupação o 28A, como milhões de trabalhadores, mas desde seu próprio ponto de vista de classe.

Como derrotar o “trifachito

Sim, devemos votar massivamente para fechar a passagem da direita. Mas para arrancar da rotina e do ceticismo milhões de trabalhadores e jovens que hesitam em votar, não bastam apelos morais, devem ser revestidos com um programa radical claro que dê alternativas a seus problemas e lhes faça ver a utilidade de votar.

Pode ter um fechamento de questão entorno do PSOE, ao ser visto por muitos como a maneira mais fácil de derrotar a direita. Mas outros tantos milhões não votarão nele ou ficarão em casa, porque não viu mudanças substanciais com um governo que passou sem piedade ou glória durante seus nove meses de duração. É impossível mudar as condições de trabalho sem revogar, no mínimo, a reforma trabalhista do PP, de que não trocaram sequer uma vírgula. Nada mudou na política repressiva do Estado. A Lei da Mordaça[6], com 20 mil acusados até a agora, mantém-se intacta. Os aluguéis e o preço da luz seguem tão altos como há nove meses, ou até mais. Alcançou-se um acordo agonizante para manter o poder aquisitivo das aposentadorias em 2019 por uma única vez, mas vozes do interior do PSOE propõem, como a direita, elevar ainda mais a idade mínima para a aposentadoria. Sánchez disse que aceitará o déficit público fixado por Bruxelas e manterá o gasto público em 40% do PIB, abaixo, inclusive, dos 41% com Rajoy[7] e distante dos 47% da União Europeia. Isto significa que se manterão os ajustes no gasto social e não se reverterão os cortes praticados pelos governos de Zapatero[8] e Rajoy. As 110 medidas de seu programa eleitoral são meras boas intenções, com um compromisso vago de cumprimento “gradual”, sem se comprometer a revogar nenhuma das leis reacionárias aprovadas por Rajoy, só as retocar.

Sánchez é coerente em seu compromisso com os interesses do capitalismo espanhol. Em meio à estagnação econômica e à elevada dívida pública, não há margem para grandes concessões em favor das famílias trabalhadoras, salvo desafiando fortemente os interesses dos ricos e grandes empresários. E Sánchez não vai fazê-lo. Por isso foi bastante grave o fato de os dirigentes da Unidos Podemos (UP)[9] terem depositado tantas esperanças no governo do PSOE durante meses, no que pediram insistentemente para participar.

Não ao cretinismo parlamentar

Os dirigentes da UP caíram em certos cretinismos parlamentares nestes meses. Pensavam que podiam introduzir mudanças substanciais nas condições de vida das famílias trabalhadoras sem se basearem na força organizada da classe trabalhadora. Não entenderam que a mobilização social era essencial, não só para pressionar Sánchez e encurralar socialmente o bloco da direita no parlamento, como para ganhar a simpatia das camadas baixas da pequena burguesia e de trabalhadores atrasados, que constituem a base eleitoral fundamental da direita e que só podem ser atraídas por quem demonstre mais força na rua.

Lamentavelmente, a UP não tomou iniciativa alguma no movimento operário para mobilizar contra a precariedade no trabalho, nem para exigir a nacionalização do setor elétrico ou a favor de expropriar as centenas de milhares de imóveis vazios de fundos especulativos para que fossem destinados a aluguel social, ou para mobilizar a juventude estudantil pela gratuidade da Universidade Pública.

Não houve respostas às provocações da direita franquista contra a saída da múmia de Franco do infame “Vale dos Caídos”. Poderia ter sido organizada uma marcha massiva de todo o país a Madrid para reforçar a decisão do governo e exigir a recuperação de todos nossos mortos que permanecem nas valas. Tampouco se promoveu uma plataforma nacional contra a repressão que coordene e unifique a luta de todos os afetados pela Lei da Mordaça e casos como os de Alsasua e, inclusive, contra a repressão do republicanismo catalão.

E havia condições. Bastou que se expressassem massivamente os magníficos movimentos dos aposentados e da mulher, ainda sob o governo de Rajoy, para que se transformasse em cenário que conduzisse à queda do governo do PP. Em que situação estaríamos hoje, se movimentos similares fossem impulsionados sob os aspectos anteriormente citados, no último ano e meio, e que têm um potencial mobilizador explosivo?

A falta de alternativa programática e de luta na rua explica a falta de motivação eleitoral que temos visto estes meses. UP não deve ser um mero aparato eleitoral, temeroso das ações de massas na rua que possam adquirir um caráter massivo e radical, de atuar como alavanca que organize e desenrole tais movimentos.

UP deve mudar de rumo

UP atravessa uma situação delicada. Podemos estar pagando o preço de sua guinada à direita e ao institucionalismo que reduziu sua militância drasticamente. Com um progressismo vago como ideologia, deixou de entusiasmar amplos setores da classe trabalhadora. A ala da direita do Podemos, encabeçada por Íñigo Errejón, responsável mais que ninguém desta situação, iniciou sua marcha do Podemos para lançar seu próprio movimento depois de 28A, como em Madrid capital e região, onde o espaço da UP se apresentará fragmentado na eleição de maio em suas alas de esquerda e de direita. Entre a militância da IU[10], onde a direção aceitou sem repreender todos os zig-zags dos dirigentes do Podemos, existe uma insatisfação cada vez maior para a coalisão eleitoral, como o demonstra a queda do apoio nas consultas internas à militância, de 84,5% em 2016 para 61,5% agora. A mesma coalizão se dividiu na Galícia, Catalunha, Navarra, Astúrias e País Valenciano, por interesses de aparato. Também nos parece não acertada a eleição do nome Unidas Podemos, uma jogada linguística alheia à fala comum de mulheres e homens, que dá munição aos reacionários e não aporta nada à luta contra a opressão da mulher. Corretamente, o companheiro Pablo Iglesias está radicalizando seu discurso e proposta nessa campanha eleitoral, para se diferenciar de Sánchez, acusando-o de covarde, mas por que não se fez isso ao longo destes 10 meses? UP teria ganhado em coerência e estaria mais fortalecida.

Não temos dúvidas. Lucha de Clases chama o voto massivo à UP, como farão milhões que não veem uma alternativa no PSOE. Mas se UP quer recuperar o apoio e voltar a entusiasmar milhões, deve mudar radicalmente o rumo e o programa, e essa campanha eleitoral oferece uma oportunidade única.

Não basta votar

UP não deve se posicionar como acompanhante do PSOE em um governo limitado a conceder algumas migalhas, mas oferecer uma alternativa própria de governo a favor das famílias trabalhadoras. Como propomos em outro artigo[11], deve dotar-se de um programa que abarque, desde as demandas mais imediatas até a mais genérica, que ponha as principais alavancas da economia (grandes empresas, bancos e latifúndios) a serviço do povo, como propriedade coletiva para planificar a economia em interesse da maioria; devemos demolir o regime e o velho aparato de Estado neofranquista, a serviço das 200 famílias da oligarquia, para construir uma República democrática, socialista, que ofereça ao conjunto dos povos da Espanha uma união voluntária em pé de igualdade e que seria a antessala de um movimento revolucionário e socialista no restante da Europa e no mundo inteiro.

Essas ideias e programa revestiriam milhões que, finalmente, encontrariam um grande ideal por que lutar e mostrariam a maneira concreta com que podemos transformar realmente esta sociedade para acabar com o capitalismo caduco e bárbaro.

[1] Acordo entre a direita e a extrema-direita por meio de seus partidos PP, Vox e Ciudadanos, que saiu vitoriosa na eleição da Andaluzia por conta da grande abstenção (Nota do Tradutor – N.T.).

[2] Partido Socialista Obrero Español – Partido Socialista Operário Espanhol (N.T.).

[3] Partido de la Ciudadanía – Partido da Cidadania, de centro-direita, fundado em 2006 (N.T.).

[4] Partido Popular, de direita (N.T.).

[5] Partido de extrema direita, fundado por membros egressos do Partido Popular (PP) em 2013 (N.T.).

[6] Ley de Protección de la Seguridad Ciudadana – Lei de Proteção da Segurança Cidadã (Lei Orgânica nº 4/2015), que criminaliza manifestações, impondo multas contra a participação e organização de protestos (N.T.).

[7] Governo de direita do PP de 2011 a 2018, marcado por austeridades e ataques aos direitos dos trabalhadores (N.T.).

[8] Governo do PSOE de 2004 a 2011 (N.T.).

[9] Coligação política entre Podemos e Izquierda Unida (Esquerda Unida – IU) e coligações regionais na Catalunha, Galícia e País Basco (N.T.).

[10] Izquierda Unida – Esquerda Unida, partido que, juntamente com o Podemos, faz parte da coligação Unidos Podemos (N.T.).

[11] Leia Espanha: fracassa o governo medíocre de Sánchez.

Editorial da Lucha de Clases nº 56, revista da seção espanhola da Corrente Marxista Internacional, sob o título “Contra la derecha franquista, votar Unidos Podemos – ¡Luchar por la república y el socialismo!”, publicado em 28 de março de 2019.

 Tradução de Nathan Belcavello de Oliveira