Foto: Pedro Ventura, Agência Brasília

Crise do capital e pandemia: o desemprego catarinense

A atual crise capitalista tem seu início há pouco mais de uma década, sendo impossível imputar somente à pandemia de covid-19 a recessão econômica, o caos social e a evidente falência deste sistema. Entretanto, obviamente que esta situação se agravou, e tende a piorar, com a crise sanitária internacional, em especial nos países atrasados e dominados como o Brasil. De todo modo, a crise material obriga as classes dominantes a tentar mascarar a inviabilidade deste modo produtivo.

Inúmeras justificativas são proliferadas pelos setores reacionários da sociedade e até mesmo das direções da classe trabalhadora, que apontam uma infinidade de responsáveis pelas tragédias, mas há também aqueles que simplesmente mentem, como o governo de Santa Catarina, o 7° estado mais rico da federação. Em especial, podemos ver isto na manifestação de Paulo Eli, Secretário de Estado da Fazenda de SC, no último dia 16 de março. Nesta ocasião, Eli afirmou que, só em janeiro de 2021, o estado criou 32.077 empregos formais, portanto, torna-se desnecessária a criação de um auxílio ou seguro desemprego para a população. Inclusive, diz que, por estarmos em um suposto pleno emprego, o estado é um “importador de mão-de-obra”: de venezuelanos a paulistas. Por isso, defende que seria incoerente garantir tal direito aos trabalhadores, pois isto os “acomodaria”, deixando-os em casa ao invés de trabalhar. 

Contudo, a partir dos estudos dos economistas Lauro Mattei e Vicente Hainen, ambos da UFSC e do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense, vemos as inconsistências deste discurso do Secretário de Estado da Fazenda. Atualmente em Santa Catarina, o trabalho formal, baseado na legislação trabalhista, representa 60% do total de postos de trabalho, sendo um estado que, historicamente, possui altas taxas de empregos formais, principalmente se comparando com a média nacional. Ainda no comparativo deste quesito, o estado também esteve à frente das demais unidades federativas durante a pandemia, em 2020. Isto na prática, não foi resultado de um sucesso administrativo do governo Moisés ou do “natural empreendedorismo catarinense”, como gosta de vender a classe dominante local. Deveu-se a referida dimensão do mercado formal do estado; do fraco desempenho de estados mais ricos; da menor dependência catarinense dos setores de serviços e comércio; da retomada do emprego na indústria; e da maior participação de micro e pequenas empresas, que praticamente foram os únicos empreendimentos que retomaram o emprego formal no país, mesmo sem incentivo federal, que destina-se apenas ao grande capital. Este cenário demonstra como os governos burgueses vendem mentiras, pois o crescimento catarinense na pandemia é praticamente nulo, sendo de 0,37%. 

Assim, na realidade, o que ocorreu foi a queda generalizada dos demais estados do país, que possui no Executivo o governo ultraliberal e reacionário de Bolsonaro, que dentre outros crimes durante a pandemia, foi capaz de liberar um pacote de R$ 1,2 trilhão em recursos para o capital financeiro para manter a “liquidez do sistema”, isto é, os interesses e ganhos dos donos do poder burguês. No estado catarinense, se podemos falar de relativo crescimento, é justamente na industrial, que nunca parou, nem mesmo flertou com um lockdown, mesmo com lucros históricos para os patrões, como na joinvilense Tupy, que no quarto trimestre de 2020, superou os ganhos do mesmo período de 2019: R$ 86 milhões ou 18,7% a mais.

O estado possui uma população de 7.271 milhões de pessoas no qual 6.211 milhões estão na chamada “idade de trabalhar” (acima de 14 anos). Dentre este montante, são 3.666 milhões consideradas força de trabalho e 2.545 milhões que estão sem procurar emprego, sendo 136 mil com potencial de trabalho e 2.406 sem potencial de força de trabalho. Dentre os que 3.666 milhões, a divisão dá-se da seguinte maneira: 3.471 milhões ocupados e 196 mil procurando empregos, enquanto os ocupados se subdividem em 2.506 milhões de trabalhos formais e 965 de trabalhos informais (PNAD Contínua, 2021). Esses números, representando o último trimestre de 2020, mostram que a taxa de desemprego em Santa Catarina é de 5,3%, o mesmo de 2019, ratificando a mentira da geração de emprego, inclusive porque o total de empregados no estado, entre formalizados e informais, caiu ao longo de 2020 em 224 mil pessoas. 

O estudo de Mattei e Heinen ainda deixa claro que o abandono do mercado de trabalho por mais de 240 mil pessoas é a principal causa da manutenção da taxa de desemprego. Caso estes trabalhadores ainda estivessem na procura, a taxa de desemprego aumentaria, sem a possibilidade do governo tentar mascarar a situação, mas a exploração e o medo pela morte por Covid-19 retiraram esta massa de trabalhadores de tal busca, penando ainda mais na miséria do desemprego. Agregando os 136 mil trabalhadores em potencial, que estão em desalento ou simplesmente não foram incorporados aos postos de trabalho, o número chega a 330 mil pessoas, gerando uma taxa de subutilização, ou seja, desocupados + força de trabalho potencial + subocupados, de 10,8% ao fim de 2020. 

Além de tudo isto, a dita recuperação se dá, fundamentalmente, no trabalho informal, onde a exploração da força de trabalho é incomensurável, ainda mais em um contexto pandêmico, quando a burguesia vende a ideologia de que “todos devem fazer sacrifícios”. Evidentemente que o sacrifício é dos trabalhadores, nunca dos patrões, que não podem ver grandes quedas nas suas taxas de lucros. Para termos maior clareza da informalidade no estado, a taxa subiu de 34,6% para 36,5% entre 2019 e 2020. Evidentemente que toda esta crise afetou o poder de consumo da classe trabalhadora, com o rendimento real caindo 6,8% do fim de 2019 para o fim de 2020, se agravando, especialmente, para os trabalhadores mais pobres do estado, que recebem até dois salários mínimos. 

Estes dados expõem a real situação de Santa Catarina, desmentindo a propaganda do governo do estado, que em suas falsas oscilações de ser ora aliado de Bolsonaro, ora inimigo, possui o mesmo programa de ataque aos trabalhadores e de mantenedor dos lucros burgueses. O estado passa por um de seus momentos mais críticos da pandemia, com corpos se acumulando por todas as regiões e a população aguardando a vacinação geral. Ao mesmo tempo, temos de observar as disputas internas da classe dominante, como os processos de impeachment contra Carlos Moisés, e tais mentiras para iludir o povo trabalhador, que sente na pele a crise do sistema e precisa de uma direção para superar a incivilidade capitalista. 

Diante disto, nos cabe ajudar a organizar a classe trabalhadora e a juventude contra o desemprego, a fome, a contaminação e todos os ataques burgueses. Tanto na economia, quanto na crise sanitária, a única possibilidade de acabarmos com este estado de barbárie é com o controle operário de toda a sociedade. Para tanto, precisamos pressionar as direções operárias e estudantis exigindo uma greve geral histórica, capaz de derrubar os governos Moisés e Bolsonaro por completo, como passo fundamental para abertura de uma situação revolucionária e socialista. 

Junte-se à Esquerda Marxista e à Liberdade e Luta!

Referências:

MATTEI e HAINEN. Emprego e desemprego em Santa Catarina: o mundo fictício do governo estadual. NECAT/UFSC, 2021. Disponível em: https://necat.ufsc.br/emprego-e-desemprego-em-santa-catarina-o-mundo-ficticio-do-governo-estadual/>. Acesso em: 29 mar. 2021.

HAINEN. Razões para Santa Catarina apresentar o maior saldo de empregos formais entre os estados do Brasil em 2020. NECAT/UFSC. Disponível em: <https://necat.ufsc.br/razoes-para-santa-catarina-apresentar-o-maior-saldo-de-empregos-formais-entre-os-estados-do-brasil-em-2020/>. Acesso em: 29 mar. 2021.

InfoMoney. Com crise, Banco Central já anunciou R$ 1,2 trilhão de recursos para bancos, 2020. Disponível em: <https://www.infomoney.com.br/economia/com-crise-banco-central-ja-anunciou-r-12-trilhao-em-recursos-para-bancos/>. Acesso em: 29 mar. 2021.

Valor Econômico. Lucro da Tupy sobe 18,7$ no 4° trimestre, para R$ 86 milhões. Disponível em: <https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/03/04/lucro-da-tupy-sobe-187percent-no-4o-trimestre-para-r-86-milhoes.ghtml>. Acesso em: 29 mar. 2021.

HEINEN. Mercado de trabalho catarinense bate recorde de informalidade no 3° trimestre de 2020. NECAT/UFSC. Disponível em: <https://necat.ufsc.br/mercado-de-trabalho-catarinense-bate-recorde-de-informalidade-no-3o-trimestre-de-2020/>. Acesso em: 29 mar. 2021.