A Comuna de Paris instituiu, pela primeira vez, um governo operário. Mesmo que por um breve período e com uma dura repressão após a derrota, a experiência francesa serviu como referência para toda organização do movimento operário posterior. A influência da Comuna sobre as revoluções seguintes é evidente e a mais rica dessas experiências não poderia ser diferente: a Revolução Russa de 1917.
Os congressos da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), fundada em 1864, expressam o desenvolvimento da consciência da jovem classe operária europeia. As crises políticas estabelecem um quadro de instabilidade política.
Na França o início da guerra com a Prússia é um novo elemento para o descontentamento. As ações desastrosas do exército francês diante dos prussianos, muito melhor organizados, inflama a população contra o governo. As sucessivas derrotas terminam com a rendição francesa. As imposições aos derrotados são severas e mergulham ainda mais o povo em um ódio contra seus governantes.
Esse ambiente instável gerou a fagulha para que os operários tomassem em suas mãos as rédeas do governo. Em 1871 Paris tinha dois milhões de habitantes, dentre os quais ¼ era formado de operários. Embora se concentrassem em pequenas fábricas, esses proletários deram início à primeira tentativa de tomada de poder pela classe operária. Com todas as confusões teóricas e organizativas que se pode esperar de algo que é experimentado pela primeira vez, a Comuna de Paris mostrou que era possível que os explorados tivessem controle sobre o seu destino.
A Revolução Russa iniciada em fevereiro de 1917 teve elementos dessa confusão da Comuna no princípio. Mas havia então os bolcheviques que, experimentados de uma tentativa de tomada de poder em 1905 e sob a liderança de Lenin e Trotsky, impuseram uma estrondosa vitória contra os inimigos da classe operária. Puseram fim a uma monarquia doente e a todos os burgueses e conciliadores que combateram contra a classe operária.
Assim como na França em 1871, o povo russo sofria as consequências de uma guerra que impunha uma terrível condição de vida. Enquanto as altas classes russas nadavam em um mar de fartura, o exército sofria no front, o povo passava fome pela falta de recursos. O regime apodrecido precisava ser enterrado.
Se os franceses estavam em sua maioria em pequenas fábricas, os operários russos, mesmo que pouco numerosos em relação ao campesinato, estavam em um dos maiores aglomerados industriais do início do século XX. Mas se fevereiro de 1917 na Rússia tem elementos semelhantes a março de 1871 na França, os bolcheviques em Outubro de 1917 trataram de fazer completamente diferente, adotando táticas ofensivas e decididas contra a burguesia para tomar e manter o poder.
Vale ressaltar a influência da experiência da Comuna para a concepção do funcionamento de um Estado controlado pelos trabalhadores. Influência que se expressa na obra de Lenin O Estado e a Revolução. No livro, Lenin se refere a medidas adotadas pela Comuna, o teto do salário dos funcionários do Estado igual ao de um operário especializado, a revogabilidade dos mandatos, etc., como exemplos da democracia operária.
As comparações entre os dois eventos históricos são diversas, mas certamente há duas que figuram em polos antagônicos que não podemos deixar de citar. De um lado temos o “renegado” Kautsky. Em oposição a ele está Trotsky, organizador do Exército vermelho e uma das principais lideranças da Revolução Russa.
Karl Kautsky, como todo reformista, utiliza a calúnia e a deturpação histórica para atacar a vitória do proletariado russo ao afirmar: “num aspecto importante, a Comuna de Paris sobrepujou a República Soviética: a Comuna foi obra de todo o proletariado; todas as correntes socialistas delas participam, nenhuma foi excluída nem se omitiu.” (A ditadura do proletariado, 1918). Como todo traidor, Kautsky tenta justificar com o véu da defesa da democracia suas posições reacionárias. A história está repleta de homens como ele.
Ao escrever a respeito das posições de Kautsky em sua obra Terrorismo e Comunismo ou O anti-Kautsky, Trotsky nos fornece um rico material de estudo e comparação entre esses dois importantes momentos da história do movimento operário.
É fundamental considerar que mesmo separados por poucas décadas a Comuna de Paris e a Revolução Russa se desenvolveram em situações distintas, tal como assinala Trotsky: “Os operários russos não passaram, como os operários franceses, pela longa escola da democracia do parlamentarismo, escola que, em certas épocas, foi um fator importante na cultura política do proletariado. Mas, por outro lado, o amargor das decepções e o veneno do ceticismo não tiveram tempo de depositar-se na alma da classe operária russa”.
Trotsky e Lenin combateram a morte à posição de todos os Partidos que defendiam uma revolução burguesa na Rússia. Aprenderam com as revoluções do passado, com destaque para a Comuna de Paris, para construir o caminho da vitória do proletariado. E se Kautsky afirma que correntes socialistas foram excluídas no processo revolucionário que se estabeleceu, é justamente porque se colocavam em oposição aos interesses do proletariado, em defesa de uma “revolução democrática burguesa”.