Resolução Política do Comitê Central da Esquerda Marxista
Os resultados do segundo turno das eleições municipais reforçam o que já analisamos após o primeiro turno: o fracasso dos candidatos bolsonaristas, o derretimento do PT nos principais centros urbanos, além de um relativo crescimento eleitoral do PSOL.
Pela primeira vez, desde 1985, o PT não governará uma capital. Disputou o segundo turno nas capitais Recife e Vitória, perdeu nas duas. No total, de 630 prefeitos eleitos em 2012, o partido passou a 256 em 2016, e 183 este ano. A razão política central desta derrocada são as seguidas traições do PT que o fizeram ser visto como um partido do sistema, igual aos outros, em particular pela juventude.
Já o fracasso dos candidatos bolsonaristas nas principais cidades culminou com a derrota de Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro, no segundo turno. O mau desempenho dos candidatos apoiados pelo presidente revela a própria debilidade política de seu governo. Após quase dois anos de mandato, o demagógico discurso antissistema de Bolsonaro tem caído por terra para a própria base que o elegeu em 2018.
A imprensa burguesa e seus analistas enfatizam a vitória do “centro” e a “despolarização” no cenário político. De fato, em termos de prefeitos e vereadores eleitos, o destaque fica para candidatos de partidos como DEM, PSDB, MDB, PP etc. Porém, isso deve ser relativizado com outros elementos: a persistente alta taxa de brancos, nulos e abstenções, e o voto depositado em candidatos burgueses que aparentam ser anti-bolsonaristas. É o caso de Eduardo Paes, no Rio de Janeiro, e também de Bruno Covas, em São Paulo, candidato apadrinhado pelo governador João Dória, que tem protagonizado embates com o presidente em meio à pandemia.
O crescimento da eleição de negros, mulheres, transexuais etc., também expressa uma reação às posições reacionárias da extrema-direita. Ao mesmo tempo, partidos e políticos, não só da burguesia, mas também da “esquerda”, desvinculam o combate à opressão, ao preconceito, de um conteúdo de classe e, adotando um discurso identitário, buscam ganhar votos pela candidatura ser feminina, negra, LGBT, afastando-se da discussão sobre o programa e a necessidade de uma política revolucionária, de unidade da classe trabalhadora, para pôr fim a toda forma de exploração e opressão.
O que existe e persiste como traço geral, entre a classe trabalhadora e a juventude, é um sentimento contra o sistema e contra o governo Bolsonaro. A capitulação dos partidos operários e das direções sindicais, a falta de um partido revolucionário com influência de massas, capaz de canalizar este sentimento em direção à derrubada do capitalismo, é que faz com que este ímpeto da base seja desviado para falsas opções burguesas.
O desempenho eleitoral do PSOL e os rumos do partido
A busca por alternativas à esquerda se expressou também no crescimento eleitoral do PSOL. O partido venceu a disputa em uma capital, Belém. Destaca-se também a chegada de Guilherme Boulos ao segundo turno na principal cidade do país, São Paulo. Nas capitais, o PSOL aumento sua bancada de vereadores de 22 para 33.
O PSOL foi utilizado como ferramenta eleitoral por parcelas de jovens e trabalhadores. Não significa, ao mesmo tempo, que esteja se construindo como um partido militante e de base operária, capaz de organizar e dirigir as lutas do proletariado por suas reivindicações imediatas e históricas. O PSOL hoje é bem diferente do que o PT foi no seu início (um partido operário independente). O PSOL é um partido cuja direção majoritária aplica uma política reformista e de conciliação de classes.
Tudo isso se expressou na candidatura do partido em São Paulo. Vale recordar que Boulos foi um dos que bloqueou a adoção da palavra de ordem “Fora Bolsonaro” por todo o ano passado. No primeiro semestre deste ano assinou o manifesto “Estamos Juntos” com políticos burgueses, cujo texto dizia “Esquerda, centro e direita unidos para defender a lei, a ordem…”. Durante a campanha buscou se desfazer da imagem de radical. Fez reuniões fechadas com investidores do mercado financeiro para tranquilizá-los. Ainda no primeiro turno declarou: “não esperem de mim demonização do setor privado”. No segundo turno formou uma Frente Democrática com a presença de partidos burgueses, PDT e Rede. Nos debates não se colocou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal e declarou que pretende manter o contrato com as Organizações Sociais, ou seja, a privatização de serviços públicos e precarização para trabalhadores terceirizados. Boulos não é um revolucionário, é um reformista, e assim explicamos o papel dos reformistas na nota após o primeiro turno:
“Entretanto, nenhuma ilusão deve ser destilada nestes candidatos e seus partidos. Combatemos estas ilusões publicamente. A história dos reformistas é por demais evidente para permitir a qualquer revolucionário consciente nutrir ilusões. A história recente mostra que as massas colocaram nas mãos de “reformistas de esquerda”, como Tsipras, Pablo Iglesias e Corbyn, suas esperanças, seus votos e seu apoio militante massivo. O resultado se conhece claramente. Cada vez que são confrontados à questão do Estado e do Capital, eles capitulam vergonhosamente. E isto é o mesmo quando são prefeitos, governadores ou presidente da república ou qualquer tipo de parlamentar. É preciso ter consciência de que estes reformistas, assim que eleitos, se transformam nos nossos piores inimigos, como sempre aconteceu. Eles temem e odeiam mais a revolução e os revolucionários do que o Capital e os capitalistas aos quais já se adaptaram há muito tempo”.
Chamamos voto em Boulos em São Paulo, assim como em todos os candidatos do PSOL para a prefeitura. O PSOL, mesmo sendo um partido reformista de esquerda, conseguiu, com algumas de suas candidaturas, expressar a insatisfação de setores importantes da juventude trabalhadora contra o sistema. Também chamamos voto no PT e no PCdoB onde não havia candidatura do PSOL, seguindo uma posição de classe: o voto em partidos operários (mesmo nos que se passaram para a defesa do capital) para derrotar os candidatos diretos da burguesia. No entanto, nossas críticas à política e ao programa destas candidaturas da “esquerda” foi feita publicamente, antes durante e depois das eleições. Os revolucionários combatem as ilusões no terreno das ilusões, de forma alguma são os que disseminam ilusões.
O que virá após as eleições
Os dados da pandemia mostram um aumento de casos e mortes no Brasil, os especialistas já falam em segunda onda ou repique. UTIs voltam a lotar. Governantes são obrigados a regredir em medidas de flexibilização do distanciamento. Tudo isso jogará mais combustível na crise econômica e política, com ainda menos margem de manobra para o governo conter os impactos econômicos. A dívida pública brasileira deve superar 100% do PIB em 2020.
Bolsonaro e Guedes comemoram o crescimento de 7,7% do PIB no 3º trimestre de 2020, mas isso ocorreu após uma queda de 9,6% no 2º trimestre e, em comparação com o 3º trimestre de 2019, houve queda de 3,9%. O desemprego segue crescendo, mesmo a taxa distorcida do IBGE conta o recorde de 14,6% de desempregados no 3º trimestre, além destes, são mais 13 milhões que desistiram de procurar emprego. A inflação também cresce, gerando o arrocho salarial dos trabalhadores.
A busca pela vacina contra a Covid-19 tornou-se a disputa entre grandes indústrias farmacêuticas mundiais, ao invés de uma cooperação internacional pela pesquisa e criação de uma vacina eficaz e segura no menor tempo possível, além de uma produção em larga escala para permitir a rápida vacinação de toda a população. Tudo isso, nós sabemos, o capitalismo é incapaz de proporcionar. É preciso uma economia planificada e controlada pelos trabalhadores.
Mesmo com a aprovação da vacina, o próprio Ministério da Saúde declara que não terá condições de vacinar toda a população em 2021, a perspectiva é vacinar apenas metade até o fim do próximo ano. Faltam até mesmo seringas para aplicar as vacinas. Isso, em meio a uma situação já convulsiva, tem o potencial de gerar uma explosão de revolta contra o governo. Na linha da defesa das vidas proletárias, a partir da confirmação de uma vacina eficaz e segura contra a Covid-19, devemos impulsionar a campanha pela disponibilização imediata de vacina gratuita para toda a população.
O mundo está em ebulição, mesmo em meio à pandemia temos visto manifestações de massa aflorando em diferentes países (EUA, Bielorrússia, Colômbia, Chile, Polônia, Peru, Guatemala etc.). Como já dissemos, uma gota d´água é capaz de fazer o copo transbordar também no Brasil. Um caso de violência policial, um ataque do governo, pode levar as massas às ruas. Para isso devemos estar preparados.
O “Fora Bolsonaro” capturado e desvirtuado pelas direções conciliadoras
Temos orgulho de já em março de 2019 termos lançado a consigna “Fora Bolsonaro” contra praticamente todas as tendências, partidos, dirigentes e organizações de esquerda. Os “Comitês de Ação Fora Bolsonaro” nos propiciaram entrar em contato com uma camada mais ampla de ativistas e construir a organização durante o ano. No entanto, é preciso constatar que, pressionadas pela base, as direções conciliadoras, que combateram por um largo período o “Fora Bolsonaro”, foram obrigadas a adotá-lo e, com isso, também desvirtuá-lo, não só do sentido que a Esquerda Marxista apresentou quando a lançou, mas do sentimento que as massas expressam quando gritam “Fora Bolsonaro” nas ruas.
PT, PCdoB e a direção do PSOL, ao adotar o “Fora Bolsonaro”, buscam dar o sentido de “Fora Bolsonaro em 2022”, na próxima eleição, com a possibilidade inclusive de se aliar com setores da burguesia para derrotar o candidato Bolsonaro. Nós, ao lançar o “Fora Bolsonaro”, dizíamos que era preciso derrubar o governo já, através da mobilização das massas, o que poderia abrir uma situação revolucionária no país.
Diante disso, o CC decide elaborar um manifesto que explique e denuncie esta manobra das direções, colocando que é preciso pôr abaixo agora este governo para interromper a catástrofe existente e que só pode se agravar com sua permanência até 2022. E para pôr abaixo o governo, a necessidade de construir a mobilização de jovens e trabalhadores, com manifestações de massa, uma greve geral para derrubar o governo, toda sua tropa e instituir um governo dos trabalhadores, sem patrões nem generais. Com este sentido, sem abandonar a palavra de ordem “Fora Bolsonaro”, devemos incluir cada vez mais, a partir do manifesto, a linha de abaixo o governo Bolsonaro.
Ao mesmo tempo, diante da desmoralização do PT, do PSOL sendo dominado pela linha pequeno-burguesa, reformista e de conciliação com a burguesia, aprofundando sua adaptação eleitoral e parlamentar, o CC decide apresentar ao movimento operário, à base da CUT e aos sindicatos, em seus Congressos e assembleias, a necessidade da construção/reconstrução de um partido da classe trabalhadora no Brasil, a exemplo do que foi o manifesto do Congresso de Lins e o PT em sua origem.
Lançando estas perspectivas políticas e levando as campanhas nacionais já decididas: “Ser Negro Não é Crime”, contra o retorno das aulas presenciais sem vacina e contra o orçamento de guerra de Bolsonaro para 2021, a organização deve intensificar o combate pela construção, com o recrutamento de novos militantes e o cumprimento dos objetivos financeiros estabelecidos. Estas são as tarefas centrais para encerramos com êxito 2020 e retomarmos o combate em 2021 com ainda mais força.
- Fora Bolsonaro! Abaixo o governo Bolsonaro! Por um governo dos trabalhadores, sem patrões nem generais!
Comitê Central da Esquerda Marxista
6 de dezembro de 2020