Por volta do meio-dia de 25 de janeiro, cerca de 427 empregados da Vale provavelmente se encontravam no refeitório ou em suas proximidades no setor administrativo da Mina Córrego do Feijão. Com certeza as conversas, animadas ou não, foram subitamente interrompidas pelo estrondo e todo horrendo ruído do rompimento e movimentação de 12 milhões de metros cúbicos de lama, de acordo com informações da Vale. Em questão de segundos a lama tomou conta de tudo e 148 empregados desapareceram, provavelmente com as vidas ceifadas e os corpos levados pela massa de lama, uma vez que refeitório e setor administrativo se encontravam abaixo da barragem de rejeitos.
Em questão de minutos o horror se arremeteu sobre parte da cidade de Brumadinho, que já totaliza a confirmação de 65 mortos e 288 pessoas oficialmente desaparecidas. Além das vidas humanas perdidas, milhares de animais, entre bovinos, equinos e demais animais domésticos, sem mencionar toneladas de peixes do rio Paraopeba, foram mortos em questão de horas ou em agonia sem fim, sendo carregados pela massa de lama que só ganha mais volume com a quantidade de detritos, troncos e mais lama que vai fazendo pelo caminho que percorre.
Essa tragédia deveria ter sido impedida, considerando a que também contou com a participação da Vale em parceria com a BHP, que controlavam a Samarco, empresa responsável pelo rompimento da barragem de rejeitos do Fundão, mina em Mariana, em 2015, proporcionando o maior crime ambiental e social do Brasil até então, com o vazamento de 43,7 milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos. A Vale, uma das operadoras da Samarco, além de não ser julgada pelo crime que cometeu em Mariana, segue pagando vergonhosas indenizações para uma parte ínfima dos atingidos pela tragédia.
Para além do horror de 2015, a Vale ampliou a capacidade de rejeitos da barragem do Córrego do Feijão em um processo no mínimo duvidoso, em que “a autorização foi obtida com licenciamento único e mais rápido, sem explicação, por meio de uma diminuição do potencial de risco da barragem, segundo pesquisadores”. Caso reste dúvida acerca do caráter criminal da tragédia de 2015, não há como negá-lo agora, com a complacência dos então governos de Temer e de Pimentel.
Crime que tem tudo para ficar impune pelo atual governo de Bolsonaro. Não bastasse as promessas de desmonte do Ministério do Meio Ambiente, do Ibama e do ICMBio, a área ambiental foi entregue para um condenado por improbidade administrativa exatamente por questões ambientais, que é o caso de Ricardo Salles, acusado de favorecer empresas mineradoras. O ministro, ao invés de defender a atuação dos órgãos de fiscalização ambiental e apontar a falta de recursos, principalmente recursos humanos para a realização da fiscalização, engrossou o ataque ao Ibama, alegando em entrevista que a tragédia “de Brumadinho demonstra que essa parte burocrática, o excesso de burocracia de fiscalização – ainda assim – não coibiu o problema”.
Desdobramentos ainda mais nefastos
Os impactos econômicos para o conjunto do país são virtualmente sérios. É preciso recordar a barbaridade dos acontecimentos de 2015 e seus desdobramentos sobre a bacia do rio Doce até os dias de hoje, para além das perdas de vidas humanas e os impactos ambientais e sociais que serão sentidos por todos numa das maiores bacias hidrográficas totalmente brasileiras. Um exemplo é o caso do rio São Francisco – responsável pelo abastecimento e a sobrevivência de boa parte dos mais de 2 milhões de habitantes só dos municípios que o margeiam. É só lembrar a importância que o São Francisco tem para a geração de energia elétrica, principalmente para o Nordeste brasileiro.
Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), a onda de rejeitos da barragem que se rompeu em Brumadinho será “amortecida” pelo reservatório da Usina Hidrelétrica Retiro Baixo, que está a 220 quilômetros do local do rompimento. Furnas também monitora a possibilidade de a onda de rejeitos atingir a usina de Três Marias. O Paraopeba deságua no rio São Francisco e tem essa hidrelétrica como primeira usina.
Contudo, não há garantia alguma do real volume que a massa de lama somada aos escombros que se desloca pelo rio terá quando chegar ao lago formado pela represa da usina de Retiro Baixo, praticamente na foz do Paraopeba. Vale lembrar ainda que a barragem da hidroelétrica foi calculada para represar água e não um volume tão grande de lama. Dependendo das condições em que a massa chegue, a abertura das comportas da represa será inevitável e é imprevisível o desdobramento na usina de Três Marias e no restante das oito hidrelétricas localizadas no curso do rio São Francisco.
Crimes do capitalismo e como combatê-los
As tragédias de Mariana e Brumadinho em Minas Gerais são a materialização da ganância que não conhece limites na exploração dos seres humanos e do ambiente. Enquanto o Estado burguês perdurar, por mais rigorosa que seja a fiscalização ambiental, o cálculo sempre será entre a possibilidade de lucros e de permissividade das autoridades públicas, representantes daqueles que têm as alavancas da economia sob seu controle.
Esses são horrendos crimes. Todavia, são somente mais alguns no corolário hediondo do capitalismo, a que se soma o desmatamento da Floresta Amazônica, a poluição desenfreada dos corpos hídricos e da atmosfera, só para se citar alguns crimes no âmbito ambiental. A única solução realmente fática para tudo isso é a derrubada do sistema capitalista por meio da revolução socialista e o estabelecimento de uma economia planificada que tenha como princípio o benefício da maioria e a manutenção do ambiente.
Para o fato concreto que se desdobra, a imediata prisão dos executivos da Vale e a reestatização da empresa sob o controle de seus trabalhadores. Também faz-se necessário um sério trabalho de auditoria e fiscalização das plantas mineradoras e de suas respectivas barragens de rejeitos. Isso seria o mínimo que qualquer governo realmente comprometido com seu povo e o ambiente do país teria que realizar.