Imagem: MMA - Ministério do Meio Ambiente

Desmatamento na Amazônia cai, mas por que Lula não atende os servidores do IBAMA?

Assembleias regionais dos servidores de órgãos ambientais (IBAMA, ICMbio, Serviço Florestal Brasileiro e Ministério do Meio Ambiente) estão se reunindo com a pauta de greve. Há uma negociação permanente com o Governo que há 3 meses não avança. “Nenhuma resposta sobre a proposta de reestruturação, dentre outras reivindicações”, diz a nota da Associação Nacional dos Servidores Especialistas em Meio Ambiente.

No balanço de 2023 o Ministério do Meio Ambiente afirma que o desmatamento na Amazônia caiu 50,5%; os autos de infração por crimes contra a flora aumentaram 114%; os embargos subiram 73%, as apreensões, 72%, e a destruição de equipamentos, 153%. Essa queda do desmatamento na Amazônia evitou o lançamento de cerca de 250 milhões de toneladas de gás carbônico na atmosfera, quantidade similar às emissões da Colômbia. Lembrando que o desmatamento é responsável por cerca de metade das emissões do Brasil. Em 2023 o IBAMA realizou mais de 600 operações em terras indígenas; na TI Yanomami houve redução de 77% da área desmatada para abertura de garimpos; cerca de 40 aeronaves e quase 400 acampamentos de garimpeiros foram destruídos na TI Yanomami, além de centenas de motores, balsas e barcos usados ilegalmente. IBAMA e ICMbio ainda apreenderam 5 mil cabeças de gado ilegais em Unidades de Conservação e Terras Indígenas. [1]

Lembrando que mesmo diante desses resultados positivos, em 2023, a Amazônia atravessou uma crise ambiental colossal em que as cidades chegaram a ser desabastecidas de comida e água potável. O que se observa é um El Niño mais forte e uma dificuldade maior para suportá-lo. E em outros domínios, como na Caatinga e no Cerrado, a atenção do Estado é mais insuficiente e ineficiente.

Na Caatinga (que ocupa 10% do território nacional) o número de queimadas em 2023 foi o mais alto desde 2010. Foram mais de 21,5 mil focos de calor, um crescimento de 39% em relação a 2022, recorde de uma década. Há o impacto do El Niño com mais calor e menos chuva para o Nordeste. Contudo, segundo o coordenador do Mapbiomas, Washington Rocha, o fogo raramente tem origem de forma natural na Caatinga. Afirma:

“Pode-se dizer que as causas predominantes dos incêndios nessa região se devem a ações antrópicas, sobretudo por uso de queimadas para limpeza de áreas a serem preparadas para cultivo e que, devido ao manejo inadequado, torna-se incêndios. Mas há também relatos dos incêndios criminosos, aqueles que são deliberadamente provocados como forma de fomentar o desmatamento, para viabilizar novas áreas para agricultura ou pastagem”.

E Rocha explica que as áreas com maior atividade de desmatamento na Caatinga estão nas vizinhanças das fronteiras agrícolas e pecuárias, próximas a infraestruturas de geração de energias renováveis e também perto dos canais de transposição do rio São Francisco. [2]

No Cerrado, o balanço de 2023 também não foi bom. Nesse domínio das chapadas que abarca maior parte do agronegócio (soja, cana e gado) teve desmatamento recorde. Em 2023 no Cerrado se desmatou uma área de 7.828,2 km², alta de 43%. Somando Cerrado e Amazônia, no último ano, foi perdida uma área 8 vezes a cidade de São Paulo. É a primeira vez em cinco anos que a área desmatada no Cerrado (que ocupa aproximadamente 24% do território brasileiro) é maior do que na Amazônia (que ocupa cerca de 50% do território). [3]

A queda no índice de desmatamento da Amazônia no último ano, que explodiu durante governo Bolsonaro, é o que o Governo Lula apresenta como sua grande vitória na área ambiental. Mas isso só foi possível porque os servidores desempenharam um papel crucial. Sem eles, não seria possível obter esses resultados. Esses avanços ocorreram sem maiores investimentos, sem grandes mudanças estruturais, aumento de efetivo e sem aumento de verbas.

Os servidores dos órgãos ambientais são fundamentais para monitorar as 336 Unidades de Conservação e as Terras Indígenas que existem no Brasil, como combate a incêndios e crimes ambientais. E a defasagem do efetivo é enorme, há uma queda de 36,5% de servidores nos últimos 15 anos. Hoje, o IBAMA opera com apenas 2900 servidores, a metade do efetivo. E quanto ao crime de desmatamento ilegal, ter poucos servidores é um enorme problema. Pois o desmatamento na Amazônia funciona com base na expectativa. Se a possibilidade de ser flagrado é baixa, o desmatamento aumenta. Se a expectativa de ser flagrado é alta, o desmatamento cai. Funciona assim porque os índices de ilegalidade no desmate são de mais de 95%. São, portanto, 3 fatores para definir o desmatamento: se o desmate será visto e reportado, se haverá alguma consequência quanto a punição e se será possível lucrar com a destruição da floresta. [4]

Nos primeiros dias de 2024, 1700 servidores do IBAMA e mais 600 do ICMbio, subscreveram uma carta ao Governo informando a suspensão de todas as atividades de campo: procedimentos autorizativos, emergências ambientais, fiscalização em Terras Indígenas, vistorias, pesquisas, ações contra o desmatamento na Amazônia, contrabando de madeira, licenciamento ambiental, prevenção e combate a incêndios florestais e liberação de exportações e importações.

Os agentes paralisaram as operações afirmando que a queda do desmatamento na Amazônia registrada em 2023 foi obtida com jornadas muito extensas, condições precárias de trabalho e perigo no combate ao crime no campo.

O presidente da associação do servidores ASCEMA, Cleberson Zavaski, declarou:

“Demos respostas efetivas em 2023, mas sempre com os mesmos servidores. O déficit é muito grande. Hoje o Ibama opera só com a metade do seu efetivo legalmente previsto (…). Temos um cálculo estimado de que teremos entre 2024 e 2025 cerca de mil aposentadorias só no IBAMA. Isso demonstra a gravidade da situação (…) Passamos por um período muito grave nos últimos anos com o governo de Jair Bolsonaro, todos sabem e reconhecem. Foi um período marcado por uma série de casos de assédio e perseguição. Mas esses servidores continuam enfrentando dificuldades antigas, relacionadas às condições de trabalho” (grifo nosso) [5]

As principais reivindicações dos servidores:

  • Reajuste salarial
  • Abertura de concurso em diversas áreas para contratação imediata
  • Reestruturação de carreira (sem atualização há 10 anos)
  • Gratificação por atividade de risco para os que estão em exercício no campo
  • Indenização por fronteira, dada para aqueles que atuam em regiões remotas

Os servidores do IBAMA e ICMBio estão participando das ações e mobilizações da Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal (CONDSEF) que está negociando com o governo deral por reajuste salarial. E as discussões nas bases e locais de trabalho, e instrumentos como a greve, são fundamentais nesse processo. Miremos no exemplo da classe trabalhadora argentina que se insurge hoje ocupando as ruas contra o plano de cortes e retirada de direitos do ultraliberal Javier Milei.

Uma vitória duradoura da luta dos servidores virá com a mobilização e unidade geral da classe trabalhadora para vencer a política de pagamento da dívida pública que consome 40% do orçamento e é aplicada por governo após governo. Uma unidade que se constrói com trabalhadores do setor privado, com estudantes e trabalhadores do campo.

REFERÊNCIAS:

[1] MMA. Governo retoma política socioambiental e climática em 2023. 31/12/23. https://www.gov.br/mma/pt-br/governo-federal-retoma-politica-ambiental-e-climatica-em-2023

[2] MAES, Jéssica. Número de queimadas na caatinga em 2023 foi o mais alto desde 2010. Folha de São Paulo. 02/01/24. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2024/01/numero-de-queimadas-na-caatinga-em-2023-foi-o-mais-alto-desde-2010.shtml

[3] MAES, Jéssica. Desmatamento cai pela metade na Amazônia e sobe 43% no cerrado em 2023. Folha de São Paulo. 05/01/24. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2024/01/desmatamento-cai-pela-metade-na-amazonia-e-sobe-43-no-cerrado-em-2023.shtml

[4] Ibama tem déficit de metade de especialistas em meio ambiente e categoria ameaça parar. Estado de São Paulo. 05/01/24. https://www.estadao.com.br/sustentabilidade/ibama-tem-deficit-de-metade-de-especialistas-em-meio-ambiente-categoria-ameaca-parar/

[5] PONTES, Nádia. Por que servidores antidesmatamento do Brasil ameaçam greve. DW. 05/01/24. https://www.dw.com/pt-br/por-que-servidores-antidesmatamento-do-brasil-amea%C3%A7am-greve/a-67895390