“Outra crise global? Nunca mais voltará a acontecer”, disse Sir John Gieve, vice-governador do Banco da Inglaterra para a estabilidade financeira, um dos que presidiram há uma década o maior crash econômico desde os anos 1930.
No entanto, ninguém deve se deixar enganar pela promessa de Sir John neste décimo aniversário desde o início do crash financeiro de 2007. Foi um momento em que os trabalhadores perderam seus empregos, salários foram reduzidos e lares foram retomados. Para salvar os bancos, o Northern Rock e outros foram nacionalizados pelo contribuinte. Trilhões de libras foram utilizados para resgatar o sistema capitalista – e ainda estamos pagando o preço hoje.
Para a classe trabalhadora, a crise não parece ter terminado, apesar dos enormes lucros que estão sendo recolhidos pela classe dos patrões. Agora, uma nova crise se aproxima.
Acúmulo de nuvens de tempestade
Lord Alistair Darling, o ex-chanceler trabalhista, advertiu que a “lição de há dez anos é que algo que pode começar aparentemente de uma pequena ondulação na água pode se converter em mares tempestuosos muito rapidamente”.
Jack Lew, o ex-secretário do tesouro dos EUA, adiciona: “Todos sabemos que crises virão no futuro, o que não sabemos é quando e como”.
Mas o “quando e como” estão agora surgindo diante de nossos próprios olhos. A acumulação do próximo crash é estranhamente similar a do último.
Consideremos esse cenário. Uma montanha de crédito barato caçando investimentos produtivos. Banqueiros e financistas determinados a aumentar seus lucros através da compra de bilhões de dólares de empréstimos de risco e empacotando-os novamente em investimentos complexos com camadas múltiplas de dívida. As agências de classificação creditícia, como Moody’s e S&P, as classificam como triplo “A”. O capital caçando por todo o mundo, formando bolhas especulativas onde quer que vá.
Essa não é uma descrição dos acontecimentos de 2006 ou 2007. Essa é uma descrição dos acontecimentos de hoje.
“Armas financeiras de destruição em massa”
Essa é a visão a que chegou o Financial Times – dificilmente um jornal Bolchevique – em um artigo chamado “Sequelas da Crise Financeira Global”. O artigo revela como os reguladores financeiros estiveram violando a lei durante anos – e ainda estão – e que todos os fatores agora estão presentes para inaugurar uma nova crise.
Em vez de investir seu dinheiro em construções, fábricas, máquinas e no emprego de trabalhadores, os banqueiros e capitalistas estão investindo seu dinheiro em pedaços de papel rentáveis, com nomes estranhos como Obrigações de Empréstimos Garantidos.
Esses elegantes pedaços de papel são simplesmente agrupados em empréstimos de qualidade duvidosa. A maioria tem o status de “lixo”, como foi o caso antes de 2007. No entanto, o risco é deliberadamente minimizado e eles recebem oficialmente um selo de aprovação triplo “A” pelas agências de crédito. Quanto maior o risco, maior o retorno! Ou, nas palavras do Financial Times, quanto mais “opaco, mais lucrativo”.
Em maio, houve duas ofertas de Obrigações de Empréstimos Garantidos (CLO, em suas siglas em inglês), no valor de mais de 1 bilhão de dólares cada uma e estima-se que 75 bilhões de dólares em CLOs serão negociados até o fim do ano. Antares Capital recentemente fechou um acordo de 2,1 bilhões de dólares que foi o maior nos EUA desde 2006 e o terceiro maior na história.
No entanto, no final, esses instrumentos financeiros se tornarão tóxicos e sem valor. Nas palavras de Warren Buffet, o bilionário dos fundos de cobertura, eles não são nada mais do que “armas financeiras de destruição em massa”.
Especulação e apostas
Mas, preocupam-se os especuladores? Por que deter o carrossel quando todos estão participando dele? Recentemente, Ashish Shah, diretor-gerente de Madison Capital Funding, uma subsidiária da New York Life, disse em um painel de especialistas em CLO que eles não deveriam se preocupar demais sobre inadimplências. “O apetite pelos ativos é feroz”, disse ele.
Isso pelo menos é verdade. Com taxas de juros historicamente baixas, os fundos de pensão, companhias de seguros e outras instituições estão ansiosos por taxas de retorno tão altamente lucrativas. No entanto, tudo isso é especulação do mercado, um simples jogo, embora em um nível muito mais elevado.
As restrições legais, como a lei Dodd-Frank nos EUA, deveriam por um fim a tudo isto depois do último crash, mas, independentemente do que diga a lei, os capitalistas e financistas simplesmente a contornaram. De fato, as autoridades financeiras permitiram deliberadamente que as agências de crédito contornassem a lei. Não se permite que nada se interponha no caminho do dinheiro, não importa quais sejam as consequências. Em qualquer caso, como 2007 mostrou, o estado resgatará quaisquer perdas… somente para os muito ricos, naturalmente.
Castelo de cartas
Mais uma vez, as rachaduras começam a aparecer. Dizem-nos que tudo estará OK desta vez. No entanto, não vai ser este o caso. Promessas similares foram feitas sobre os riscos crescentes no início dos anos 2000, logo antes de começarem a se propagar como um vírus aos grandes bancos e casas financeiras, como a AIG, e os mercados começarem a descontrolar-se, contribuindo para a maior recessão econômica desde os anos 1930.
De fato, a situação é muito mais grave desta vez, visto que a economia mundial já se encontra em situação lamentável. Qualquer choque súbito no sistema poderia levar todo o edifício abaixo, sob os pés dos banqueiros e especuladores financeiros, levando a outra Grande Depressão.
Praticamente, todos os tipos de dívida dos EUA – soberana, corporativa, sem garantia familiar/pessoal, empréstimos para compra de automóveis e dívidas estudantis – encontram-se em alturas recordes. Os estadunidenses agora devem 1 trilhão de dólares em dívidas de cartão de crédito, e uma quantidade aproximadamente equivalente em empréstimos estudantis e em empréstimos para compra de automóveis, que, como a qualidade das hipotecas subprime [de alto risco], que desencadeou a crise financeira de 2008, são principalmente de baixa qualidade creditícia (e, portanto, de alto risco). Hoje, as obrigações totais de dívida pública e privada estão estimadas em 350% do Produto Interno Bruto dos EUA.
O sistema está quebrado
Mas esse não é só um problema dos EUA. Globalmente, o panorama é igualmente precário, com uma dívida obstinadamente alta na Europa, aumentando na Ásia e crescendo nos mercados emergentes mais amplos. “Há uma década do início da crise financeira, o mundo reúne os ingredientes de uma nova crise da dívida”, adverte o Financial Times.
Com a desaceleração do comércio mundial e com o protecionismo aumentando, as contradições do sistema capitalista inevitavelmente quebrarão essa armação de andaimes cambaleantes.
Em última análise, tudo o que esse sistema anárquico pode produzir agora é crise, cortes de austeridade, congelamento de salários, perdas de emprego e diminuição do nível de vida da classe trabalhadora. Como Marx explicou há muito, o sistema de lucro significa riqueza crescente de um lado e miséria crescente do outro.
É hora de se colocar de volta na agenda política a transformação socialista da sociedade. O final desse sistema de crise de uma vez por todas está muito atrasado. Isso poderia ser alcançado por um governo socialista , que exproprie, sem indenização, os bancos e as grandes empresas que dominam a economia. Para garantir a prestação de contas, estes devem ser administrados sob o controle e gestão democráticos dos trabalhadores.
Isso nos permitiria planejar a economia e usar os seus recursos para aumentar rapidamente o nível de vida de todos. Não mais caridade para os ricos e os banqueiros, essas pessoas já despojaram suficientemente a classe trabalhadora. Poderíamos usar a moderna tecnologia e automação (desta vez trabalhando para nós e não contra nós) para reduzir dramaticamente a semana de trabalho, acabar com o desemprego e proporcionar às pessoas tempo para se envolverem na administração da sociedade.
O socialismo pode abrir um futuro brilhante e próspero para a humanidade, purificado das guerras, da fome e da opressão. Junte-se a nós para lutar por isso.
Tradução Fabiano Leite.