Direção do PSOL abre caminho para adesão ao governo Lula-Alckmin

O Diretório Nacional do PSOL reunido no último sábado (17/12) discutiu e aprovou resoluções sobre o balanço da participação nas eleições de 2022, a relação do partido com o governo Lula e a relação da bancada parlamentar do PSOL com o novo governo.

A Esquerda Marxista lançou em 22/11 uma carta aberta ao Diretório Nacional do PSOL caracterizando como um grave erro a decisão da maioria da Executiva Nacional do partido de compor o governo de transição, chamando a direção nacional do PSOL a corrigir este erro, decidindo pela não participação do PSOL no governo Lula-Alckmin, governo de união nacional com a burguesia, mantendo-se independente para organizar um polo de luta pelas reivindicações de jovens e trabalhadores e de resistência aos inevitáveis ataques do futuro governo, deixando claro que o PSOL deverá combater em frente única contra ataques da extrema-direita golpista ao governo (ver aqui a íntegra da carta aberta).

O maior bloco que compõe a direção do partido chama-se PSOL Popular, e é composto pelas tendências Primavera Socialista (da qual faz parte o atual presidente do partido, Juliano Medeiros) e Revolução Solidária (da qual faz parte Guilherme Boulos). Estes grupos defendem a entrada total do PSOL no governo Lula-Alckmin. Um outro bloco, o PSOL Semente, composto pelas organizações Resistência, Insurgência e Subverta, estava, a princípio, contra a entrada do partido no governo. Somando os votos dos membros do PSOL Semente com as de outras correntes de oposição, formava-se uma maioria na direção para bloquear a entrada do PSOL no governo Lula-Alckmin.

A iminente derrota fez com que o PSOL Popular manobrasse nas palavras, apresentando uma resolução intitulada “PSOL com Lula contra o bolsonarismo e pelos direitos do povo brasileiro” (ver resolução completa aqui) que, na prática, permite a entrada de militantes do partido no governo Lula-Alckmin, inclusive assumindo um ministério, ao mesmo tempo que diz que “o PSOL não terá cargos na gestão que se inicia”. Esta manobra foi suficiente para os membros do PSOL Semente recuarem, defendendo e votando junto com o PSOL Popular uma resolução que, de fato, não garante a independência do PSOL frente ao governo Lula-Alckimin, ao contrário.

Durante a campanha eleitoral, Lula prometeu criar um ministério dos povos originários, as articulações já indicavam que este seria o ministério a ser ocupado pelo PSOL no novo governo. A mesma resolução do DN do PSOL que diz que o partido não terá cargos no novo governo, afirma:

Ainda assim, compreendemos que a indicação de Sonia Guajajara, como liderança do movimento indígena, para o ministério dos povos originários é uma conquista de extrema importância para uma luta tão atacada por Bolsonaro e deve ser respeitada pelo partido.

Portanto, Sonia Guajajara, deputada federal eleita pelo PSOL em São Paulo este ano, candidata a vice-presidente pelo partido nas eleições de 2018, seria a exceção a ser “respeitada”. A resolução do DN do PSOL segue:

Destacamos que o PSOL preserva sua autonomia de organização e, portanto, os filiados que, no caso de convidados, optem por ocupar funções no governo federal, devem se licenciar dos espaços de direção partidária. A eventual presença nesses espaços não representa participação do PSOL.

Em tese o PSOL não indica militantes para cargos no governo, mas filiados podem ser convidados… Com esta resolução ambígua, o bloco comandado por Boulos e Juliano Medeiros, mesmo não tendo maioria para aprovar a participação do PSOL no governo, conseguiu fazer passar um texto que permite que membros do PSOL participem do governo, mesmo que “não representando o partido”.

Mas eles pretendem ir além. Na defesa da resolução, Juliano Medeiros admitiu:

Eu preciso pontuar aqui primeiro a nossa posição, a posição do PSOL Popular, da Primavera Socialista, da Revolução Solidária, de lideranças como Toninho Vespoli, Gianazzi e outros companheiros e companheiras que defendem a posição de entrar no governo. Nós sabemos que essa posição não é majoritária e por isso recuamos em nome da unidade do PSOL. Nós temos consciência de que esta não é a posição majoritária do PSOL, mas eu preciso registrar uma diferença fundamental, nós não achamos que a entrada do PSOL no governo representaria um risco para o PSOL, quem acha isso desconfia das qualidades do PSOL. Nós não temos medo de governar. O PSOL Popular vai continuar pra governar, governar com governos do PSOL e governar em unidade com a esquerda quando for possível.

E mais à frente avisa:

Mas essa é uma disputa que vamos fazer, tem Congresso no ano que vem e vamos dar o combate em torno dessa concepção de PSOL.

Na reunião da direção nacional foi apresentada uma resolução contrária a esta, que se posicionava pela independência do PSOL e contra qualquer participação de filiados do partido no governo Lula-Alckmin. Esta resolução recebeu 6 votos de membros da direção (das correntes Luta Socialista, Comuna e APS). O deputado federal Glauber Braga e a Esquerda Marxista apoiaram esta resolução. Na resolução aprovada pela maioria, 53 votos, foi apresentado um destaque que propunha que os filiados que ocupassem cargos no governo não deveriam apenas se licenciar dos cargos de direção, mas também se afastar do partido. Esse destaque recebeu 29 votos contra 32 votos pela manutenção do texto original. Dos votos do PSOL Semente, os membros da Insurgência votaram junto com a esquerda do Diretório e quem garantiu maioria para o PSOL Popular nesta votação foram os outros dois componentes do PSOL Semente, Resistência e Subverta. Aliás, quem fez a defesa da manutenção do texto original foi um dirigente da corrente Resistência.

O Diretório Nacional aprovou ainda, por maioria (31 x 26 e 4 abstenções), uma resolução sobre a relação da bancada parlamentar com o futuro governo, que define que “Este cenário [de forte representação institucional do bolsonarismo e seu peso nas ruas] exige uma localização pública do partido em apoio ao governo Lula no Congresso Nacional” (ver resolução completa aqui). Desta vez a Insurgência votou junto com o PSOL Popular e as 4 abstenções foram da Resistência.

Em nossa carta aberta à direção nacional do PSOL, explicamos:

É preciso aprender com as lições da história. Na Itália, depois que o antigo Partido Comunista, o partido de massas da classe trabalhadora italiana, se transfigurou em Partido Democrata, os que resistiram a esta capitulação lançaram o Partido da Refundação Comunista (PRC) que, proporcionalmente, era maior do que o PSOL é hoje aqui. Mas, a direção do PRC cometeu o erro de participar do governo encabeçado pelo Partido Democrata em coalizão com a burguesia. O resultado foi a total desmoralização deste partido que hoje não é capaz sequer de eleger deputados.

O PSOL deixou de atrair a filiação de uma base militante jovem por conta de sua adaptação às instituições burguesas, à conciliação de classes e à uma política reformista. Deu um passo para apagar o caráter de classe do partido constituindo a federação com a Rede, um partido pequeno-burguês que aplica uma política burguesa. Deixou de se apresentar como uma alternativa de esquerda revolucionária ao bolsonarismo ao não lançar candidatura própria, e apoiar Lula desde o 1º turno. As decisões desta reunião da direção nacional do PSOL significam, na prática, para os olhos de jovens e trabalhadores, que o PSOL será parte do governo Lula-Alckmin, por mais que uma resolução em alguma parte diga o contrário. O PSOL dá um passo a mais para enterrar qualquer possibilidade de ser um instrumento para a reorganização da classe trabalhadora brasileira.

Mas este combate ainda se dará no Congresso do PSOL no ano que vem. Até lá, a cada projeto de lei contra os interesses da classe trabalhadora que a bancada do governo estará chamada a votar favoravelmente, estará colocado para os parlamentares do PSOL votar contra o governo e para a militância do partido ir às ruas contra o governo. Óbvio que diante de ataques da extrema-direita ao governo, o PSOL deve se colocar em frente única contra a extrema-direita. Mas o que temos visto é que a direita que está dentro do governo é a que tem as melhores condições de atacar os trabalhadores neste momento. É contra esta direita que o PSOL deve ajudar os trabalhadores e a juventude a lutar. Mesmo quando for o Lula a desferir o ataque.

Serão os desenvolvimentos dessa equação que definirão os rumos do PSOL. A Esquerda Marxista seguirá seu combate pela independência de classe do partido, agora em direção ao Congresso partidário de 2023. É necessária a unidade de todos que defendem um PSOL independente da burguesia e do governo de coalização com a burguesia na luta para impedir que o congresso aprove a entrada do PSOL como partido no governo Lula-Alckmin.