Algumas centenas de manifestantes organizados podem ir mais longe do que dezenas de milhares sem orientação alguma. E isso se fez mais uma vez evidente no ato contra o aumento das tarifas em São Paulo, na última terça-feira, 11/06.
Por que milhares de pessoas estão saindo às ruas em São Paulo?
Todos os dias, milhões de trabalhadores e jovens acordam cedo e se acotovelam para conseguir espaço dentro de vagões de trem e metrô e dentro dos ônibus da cidade de São Paulo. Enfrentam horas de trajeto para chegar aos seus locais de trabalho e estudo, submetidos a condições que lembram às das sardinhas numa lata em conserva. Depois enfrentam as mesmas dificuldades para voltar para casa, para descansar e voltar ao mesmo combate no dia seguinte. E assim é, dia após dia.
Então, em maio deste ano, o Governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o Prefeito Fernando Haddad (PT), muito sensibilizados com a rotina do povo, anunciaram juntos que aumentariam as tarifas de Metrô/CPTM e ônibus no dia 1º de Junho em São Paulo, de R$ 3,00 para R$ 3,20.
Isso já era esperado do governo estadual tucano, mas a medida anunciada pelo prefeito petista recém-eleito causou perplexidade entre jovens e trabalhadores que votaram no PT em 2012 esperando mudanças. Haddad tentou justificar dizendo que há 2 anos e meio não havia reajuste da tarifa de ônibus na cidade, e com a inflação do período a prefeitura teria que aumentar o subsídio (dinheiro repassado às empresas privadas de ônibus).
Mas as tarifas de ônibus aumentaram de R$ 0,50 em 1994 para R$ 3,00 em 2011, sendo que se fosse aplicada apenas a inflação do período, elas teriam o valor de R$ 1,50 hoje. O último aumento (Jan/2011) aplicado pelo então prefeito Kassab (PSD) fez a tarifa subir de R$ 2,70 para R$ 3,00 – quase o dobro da inflação no período.
As tarifas do metrô em São Paulo subiram do valor de R$ 0,80 em 1995 para R$ 3,00 em 2012, sendo que se fosse aplicada apenas a inflação do período, as tarifas teriam o valor de R$ 1,84 hoje.
Os professores da rede estadual fizeram 3 semanas de greve no final de abril e o governo estadual tucano não cedeu nada. Os professores da rede municipal de São Paulo fizeram outras 3 semanas de greve em maio e Haddad também não cedeu. Por que governantes do PT e PSDB têm aplicado a mesma política?
O que ocorre é que o prefeito do PT teve sua campanha financiada pelos empresários e não pelos trabalhadores. Agora, defende os interesses de quem pagou suas contas. Isso faz parte da política de colaboração de classes que a direção do PT leva a cabo, incluindo a coalizão do Governo Dilma com o PMDB, PSB, PP, PSD, etc. É a mesma política que levou em São Paulo à coligação do PT com o PP de Maluf. E é a mesma política que leva agora Haddad a aumentar a tarifa de ônibus (alegando que houve inflação) e negar reajuste salarial aos servidores municipais (esquecendo da mesma inflação). É a mesma política do PSDB porque quem financia as campanhas do PSDB e do PT hoje são os mesmos: as grandes empresas e corporações capitalistas.
Dito e feito, desde o dia 02/06 as tarifas de ônibus, metrô e trem passaram a custar R$ 3,20 em São Paulo. Há quem diga que vinte centavos não deveriam ser motivo para indignação e revolta, mas, óbvio, não se trata disso. A tarifa anterior já era insuportável para uma grande parcela trabalhadora da população que, sem ter como pagar a passagem, se limita a usar o transporte público para ir e voltar do trabalho, perdendo o direito de se locomover para além disso, inclusive de utilizar os equipamentos públicos de saúde, educação, cultura, lazer que a cidade oferece. Neste contexto, qualquer centavo a mais poderia causar revolta.
Este não é um problema localizado em São Paulo. Na maior parte das cidades o transporte público está privatizado e as prefeituras aumentam as tarifas em benefício das empresas privadas de ônibus. Transporte público é um direito e, assim como outros serviços públicos, deveria ser gratuito, gerido pela administração pública e não por empresas privadas, subsidiado pela arrecadação geral, como é feito com a saúde pública, educação pública, etc. A Tarifa Zero já é realidade em várias cidades do mundo, inclusive em algumas cidades do Brasil, como Agudos ou Potirendaba, ambas no estado de SP.
Haddad, em entrevista ao jornal O Estado de SP, defendeu que a presidente Dilma Rousseff (PT) municipalize a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que incide sobre combustíveis, para subsidiar o transporte público e baratear a passagem – coisa que já vinha sendo discutida entre uma série de prefeitos antes dos atuais protestos – e comentou que zerar a tarifa é inviável em São Paulo, pois exigiria R$ 6 bilhões anuais.
Mas quando Haddad diz isso, está considerando manter o sistema atual de concessão às empresas privadas. Entretanto, essas empresas superfaturam o custo do transporte para obter lucro. Se são canceladas as concessões e é recriada uma empresa pública de transportes, como a antiga CMTC, o custo é bem menor. E se for feita uma pequena reforma tributária na cidade, por exemplo, implantando o IPTU progressivo (além da municipalização do Cide), é possível custear a Tarifa Zero, conforme projeto do próprio PT na gestão da Prefeita Luiza Erundina – e vale dizer: projeto reapresentado pela Esquerda Marxista no ano passado através da nossa candidatura a vereador pelo PT em São Paulo!
Mas para isso, Haddad teria que enfrentar os empresários do transporte em São Paulo. Apoio da população ele teria, como mostram os mais de 15 mil manifestantes nesta última terça. Entretanto, infelizmente não parece ser este o caminho escolhido por Haddad e a atual direção do PT. Agora em junho vencem os contratos de concessão do transporte público a empresas privadas em São Paulo, e a disposição da prefeitura é de renová-los pelos próximos 15 anos!
Sem organização coletiva democrática e objetivos claros, não haverá vitória!
A luta contra o aumento das passagens tem sido vitoriosa todas as vezes que consegue mobilizar as massas. É o que acabamos de ver em Porto Alegre, Teresina, Goiânia, etc. onde o aumento da tarifa foi revertido após uma série de manifestações massivas.
Nessas cidades, manifestações desordenadas com muita gente podem obrigar a prefeitura a recuar. Mas São Paulo é muito grande. Estamos falando da maior cidade do hemisfério sul. São quase 12 milhões de moradores, e quase 20 milhões os que transitam pela cidade diariamente. Para causar pressão real, é preciso mais do que apenas juntar alguns milhares e andar por aí. Algumas ações diretas foram realizadas, mas o planejamento, decisão e execução dessas ações ficaram restritos a um pequeno número de ativistas do MPL. Os milhares de manifestantes ficaram a reboque deste pequeno grupo. Se as massas não se apropriarem da direção e formulação dos atos, o movimento irá cansar, dispersar e, muito provavelmente, será derrotado.
Depois do anúncio conjunto do governador e prefeito de que aumentariam as tarifas de metrô e ônibus em São Paulo, começaram a eclodir pequenas manifestações contrárias em várias partes da cidade.
No dia, 27/05, liderados pelo MPL, cerca de 200 jovens ocuparam o Terminal Pirituba sem pagar a tarifa. A manifestação teve início às 7h da manhã em frente à escola estadual Ermano Marchetti, de onde estudantes e moradores partiram em marcha pelo bairro. No viaduto da Av. Raimundo Pereira de Magalhães, os manifestantes queimaram uma catraca, simbolizando que a luta por um transporte verdadeiramente público é a luta pelo fim da cobrança de tarifa.
Após sair do Terminal Pirituba a manifestação seguiu em direção à subprefeitura, atravessou a estação da CPTM e encerrou o ato na Avenida Mutinga.
Na manhã de 28/05, partiu do Parque Dom Pedro, um ato contra o aumento das passagens organizado em conjunto por estudantes da escola estadual São Paulo e pelo Movimento Passe Livre. Mesmo sob intensa chuva, cerca de 100 pessoas se reuniram em frente à escola com faixas e cartazes e ocuparam o viaduto da Rangel Pestana. Em seguida, a passeata ocupou o Terminal Parque D. Pedro – maior terminal de ônibus urbanos da cidade -, onde foram distribuídos panfletos para a população e para os trabalhadores do terminal. A notícia de que a tarifa ia subir soou como uma surpresa desagradável para muitos passageiros. Os manifestantes deixaram claro que essa luta não é só contra o aumento, mas contra todo tipo de tarifa no transporte público: por isso, simbolicamente, uma catraca foi queimada no interior do terminal.
A marcha seguiu até a Praça da Sé, onde, em assembleia, decidiu-se por seguir até a Prefeitura e lá queimar a catraca novamente. Mesmo com a chuva engrossando, o ato assim o fez, e lá os manifestantes permaneceram por mais meia-hora, cantando e dançando o funk: “Dança Haddad, dança até o chão / Aqui é o povo unido contra o aumento do busão”.
No fim da tarde do dia 28/05, sob frio e chuva, cerca de mais 100 pessoas se uniram em frente à prefeitura para o Ato-Vigília convocado pela Esquerda Marxista, contra o aumento das tarifas. O Sindicato dos Trabalhadores Vidreiros do Estado de SP esteve presente com um carro de som, onde os manifestantes puderam fazer suas palavras de ordem ecoar por toda a região do Viaduto do Chá, Praça do Patriarca, etc.
Das 17:30 até as 20:00 foram distribuídos cerca de 5 mil panfletos e coletadas milhares de assinaturas contra o aumento das tarifas. No panfleto o texto concluía com um chamado para o Grande Ato contra o aumento das tarifas convocado pelo MPL para o dia 06/06 a partir das 17:00 em frente ao Teatro Municipal.
No primeiro grande ato contra o aumento, na quinta-feira passada (06/06), cerca de 5 mil pessoas se reuniram em frente ao Teatro Municipal entre 17:00 e 18:00. Após uma curta caminhada, a multidão parou em frente à prefeitura e entoou palavras de ordem. Logo após, o ato seguiu em passeata pelos calçadões do Vale do Anhangabaú. Então, algumas dezenas de ativistas do MPL pararam os carros que trafegavam pelas pistas da junção da Av. 9 de Julho com a Av. 23 de Maio, logo abaixo do Viaduto do Chá. Enquanto os poucos ativistas do MPL queimavam catracas de papelão no meio da pista, impedindo o trânsito dos automóveis, a maioria esmagadora dos milhares de manifestantes observava tudo ao lado, na calçada. Os manifestantes não entraram na via junto com os ativistas do MPL pois, além de estarem com medo, despreparados, não sabiam do plano. Não tinham participado daquela decisão. Foram levados até ali e se depararam com uma situação que não previam.
Não temos nada contra interromper o trânsito de automóveis. Quando o povo sai às ruas, deve ocupá-las mesmo. Mas desde que isso seja a vontade e decisão consciente da maioria dos manifestantes. Não era o caso. O resultado disso foi que a Tropa de Choque da PM (Polícia Militar) lançou bombas de gás lacrimogêneo contra a multidão que estava na calçada observando as barricadas em chamas que foram montadas nas vias. Despreparados, os milhares de jovens se dispersaram imediatamente atordoados pelo gás e as poucas dezenas de ativistas que estavam bloqueando as vias ficaram sozinhos e foram facilmente reprimidos pela PM, com balas de borracha, spray pimenta e cassetetes. A PM agrediu covardemente esses ativistas e levou pelo menos 15 presos. Um dos manifestantes apanhou de 5 policiais até ser deixado inconsciente convulsionando no canteiro central da via.
A multidão dispersa se reaglutinou em grupos menores. Um grupo voltou à frente da prefeitura e passou a observar tudo de cima do Viaduto do Chá, impotente. Logo um batalhão da tropa de choque passou por ali agredindo todos que estivessem por perto, lançando gás lacrimogêneo pelas ruas e calçadões do centro, até dispersar completamente os manifestantes. Outro grupo com algumas centenas de pessoas, seguiu em direção à Av. Paulista e lá tratou de bloquear a via também. Novamente houve repressão da PM.
No dia seguinte, 07/06, um ato foi chamado pelo MPL para se concentrar a partir das 17:00 no Largo da Batata, em Pinheiros – região rica da cidade. Novamente cerca de 5 mil manifestantes se reuniram, mas apenas os ativistas do MPL sabiam do plano decidido por eles mesmos. O Largo da Batata estava cercado de policiais. O MPL fez um acordo com a PM de qual seria o trajeto de uma passeata pacífica. A Polícia escoltou a passeata que ocupou 3 das 4 faixas de uma das pistas da Av. Brigadeiro Faria Lima. Depois, a passeata adentrou a Marginal Pinheiros. Milhares de pessoas caminhando pacificamente, entoando palavras de ordem e canções. A própria PM parou os carros para os manifestantes entrarem na pista. Mas, depois que toda a passeata havia adentrado a pista da Marginal Pinheiros, a PM atacou a manifestação por trás, com bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e foi varrendo a via. Transeuntes que estavam passando por ali apanharam da polícia sem saber porque. A delegação da Esquerda Marxista estava com a faixa da retaguarda do ato. Foi a primeira a ser atingida. Um dos camaradas foi atingido por uma bomba de gás nas costas. Foi mais uma ação covarde da PM.
Para o dia 11/06 o MPL chamou o 3º Grande Ato contra o aumento da passagem, com concentração às 17:00 na Praça do Ciclista (Av. Paulista x Rua da Consolação). Desta vez cerca de 10 mil pessoas se reuniram e começaram a descer a Rua da Consolação sentido centro, guiados pelo MPL, mas novamente sem saber qual era o objetivo e destino da passeata. No meio da multidão muitos perguntavam uns aos outros: “Onde estamos indo?”, “Para onde vamos?”. Por falta de organização, a massa seguia o MPL, que saiu à frente. Então começa uma forte chuva. Alguns manifestantes saem do ato em busca de abrigo. Mas em seguida voltam e muitos outros aderem. A manifestação ganha corpo debaixo de chuva e passa dos 15 mil quando, ao final da Rua da Consolação, adentra a pista da ligação Leste-Oeste, sentido leste. Uma grande marcha, bonita, como há muito São Paulo não via. Milhares de manifestantes molhados seguiram pelo acesso à Av. Liberdade, passaram pela Praça João Mendes e, quando todos deduziam que a passeata seguiria em direção à prefeitura, o MPL guia a massa para descer a Av. Rangel Pestana em direção ao Terminal Parque D. Pedro. Muitos manifestantes reclamam, pois entendem que o mais consequente a fazer seria ir à prefeitura, que é quem pode ceder à reivindicação central do movimento. Neste ponto, cerca de um terço dos manifestantes abandona a passeata e se dispersa, a maioria se dirigindo já individualmente ao metrô Sé, para voltar para suas casas. Os cerca de 10 mil que seguiram no ato, se deparam com um terminal de ônibus ocupado pela Polícia Militar, com batalhões da Tropa de Choque. Impotentes e sem saber o que fazer, os milhares ficam parados em frente ao Terminal Parque Dom Pedro. Alguns ativistas à frente do ato colocam fogo numa lixeira. A Polícia lança meia dúzia de bombas de gás lacrimogêneo e isso é suficiente para dispersar toda a multidão. Neste ponto a maioria abandona o ato. Cerca de mil pessoas se reagrupam na Praça da Sé e um ativista do MPL propõe marchar até a Av. Paulista. Assim o fazem e lá são reprimidos de novo, até que se dispersam por completo. Pelo menos mais 20 manifestantes são presos.
Isso mostra diversos problemas que têm uma raiz: falta de democracia na tomada de decisões dos atos. Muitos manifestantes inteligentes estão se colocando essa questão.
Algumas poucas bombas de gás lacrimogêneo não deveriam dispersar 10 mil pessoas. Mas o que mais cobrar dos manifestantes depois de terem cruzado a cidade caminhando para onde a maioria não sabia? Talvez se eles soubessem qual era o objetivo de estar ali em frente ao Terminal Pq. Dom Pedro, teriam resistido mais. Mas sem saber porque estar ali? Não são muitos os que aceitarão caminhar novamente sem saber qual o destino da passeata, tomar chuva, ser reprimidos e voltar pra casa para ouvir na TV que são baderneiros.
Não temos dúvidas das boas intenções dos jovens que organizam o MPL. Mas cometem muitos equívocos e nossas críticas pretendem ajudar a superar esses equívocos. O MPL deveria socializar seus planos. E deveria apresentá-los ao conjunto dos manifestantes presentes em cada ato como uma proposta e não impô-los a uma “massa de manobra”. É preciso fazer uma assembleia no início de cada ato para decidir democraticamente a onde ir e o que fazer!
Mas, para realizar uma assembleia, onde qualquer um possa apresentar propostas e todos possam decidir votando, o MPL terá que aceitar algumas regras democráticas:
1. Os ativistas do MPL têm se mostrado avessos a votações. Dizem que tudo deve ser decidido por consenso. É por isso que acabam evitando abrir os planos para serem decididos por todos presentes no ato. Essa prática de “decidir por consenso” que já é bem questionável em contextos com pouca gente, torna inviável tomar decisões quando se trata de multidões. É preciso levar as propostas a voto e fazer a experiência com o a decisão da maioria.
2. Para propiciar que todos escutem as propostas apresentadas e possam se posicionar sobre elas, votando, é preciso que haja um microfone com amplificador e caixas de som. Não dá pra fazer no gogó e nem no jogral. Uma boa solução seria um carro de som ou caminhão de som. Vários sindicatos já se dispuseram a ceder para os atos, mas o MPL não aceita (e alguns anarquistas ameaçam até mesmo depredar os carros de som), pois entendem que a tecnologia do microfone é autoritária. Oras, autoritários são aqueles que, com este argumento, impedem que haja decisões coletivas por parte de todos os manifestantes. Ou o movimento amadurece, ou fracassará!
Outra questão importante é: O que propor quando há milhares de pessoas reunidas? Em vez de levar os milhares a uma ação direta (bloqueio de vias, por exemplo) que com certeza provocará repressão imediata da PM, por que não colocar a multidão toda em frente à Prefeitura, ou à Secretaria de Transportes do Estado ou do Município e exigir uma resposta das autoridades? Reunidos ali, se as autoridades não aparecem para negociar, poderíamos fazer nova assembleia e decidir o que fazer, como por exemplo ocupar a prefeitura, a secretaria de transportes, etc. Isso poderia levar ao atendimento de nossas reivindicações e não seria um ato isolado de alguns poucos manifestantes, mas a decisão coletiva dos milhares presentes.
Violência: de quem contra quem?
O dramaturgo e poeta alemão Bertolt Brecht certa vez escreveu: “Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem.”
A pequeno-burguesia brada que bloquear vias (com barricadas ou simplesmente com uma passeata de milhares) é uma violência contra o seu direito de ir e vir. Mas não seria o direito de ir e vir da maioria da população que é tolhido cada vez que a tarifa do transporte público fica mais cara? Contra essa verdadeira violência não se fala, não é?
Durante o ato da última sexta-feira, 07/06, o promotor de justiça Rogério Zagallo postou em seu facebook utilizando um aparelho móvel, a seguinte mensagem: “Estou há 2 horas tentando voltar para casa mas tem um bando de bugios revoltados parando a avenida Faria Lima e a Marginal Pinheiros. Por favor, alguém poderia avisar a Tropa de Choque que essa região faz parte do meu Tribunal do Júri e que se eles matarem esses filhos da puta eu arquivarei o inquérito policial. Petista de merda. Filhos da puta. Vão fazer protesto na puta que os pariu… Que saudades da época em que esse tipo de coisa era resolvida com borrachada nas costas dos medras…”. Esta absurda declaração pública de um promotor demonstra como se acirra a luta de classes. Os fascistas começam a mostrar suas asas e a declarar suas posições publicamente por um lado, e o povo sai às ruas aos milhares por outro.
Ironicamente, os mesmos que reclamam do trânsito congestionado por conta de uma manifestação, e aprovam a repressão da PM contra os “baderneiros”, quando vêem na TV as massas se manifestando por mudanças no Egito, na Grécia, na Espanha, na Turquia, logo comentam: “Lá o povo luta por seus direitos! Aqui no Brasil o povo é muito acomodado! Só quer saber de futebol!”. Esses nada mais fazem do que reproduzir o discurso dominante. Em todos os países do mundo, inclusive no Brasil, o povo trabalhador desperta para a luta à medida que suas condições concretas de qualidade de vida são questionadas ou atingem níveis insuportáveis, apesar dos anestésicos modernos, como o entretenimento de massas.
A TV e os jornais editam imagens e selecionam fotos para fazer parecer que as ações de uma minoria são a tônica da manifestação de milhares. Com isso, buscam atribuir aos manifestantes a responsabilidade de certos atos violentos. Mas em todos os atos dos últimos dias, as depredações só ocorreram depois das ações repressoras da Polícia.
Quando os manifestantes estão caminhando, cantando, exercendo seu direito de livre expressão e então são agredidos, não se pode esperar que não reajam. Depois de sufocar com gás lacrimogêneo, passar mal sem poder respirar ou enxergar, ficar atordoados com bombas de efeito moral, ou ainda sentir a dor dos cassetetes e balas de borracha, alguns manifestantes, sentindo-se impotentes de revidar contra a polícia (porque essa é a vontade da maioria), acabam quebrando o que vêm ao seu lado. Podemos não aprovar que ônibus e outros bens públicos sejam depredados, mas neste contexto, é perfeitamente compreensível.
Além disso, não podemos descartar que a polícia infiltre agentes provocadores que incitam os mais ingênuos à violência e à depredação justamente para dar pretexto e “legitimar” a ação repressora da polícia contra todo o movimento.
Depois de dispersar uma grande multidão de milhares de pessoas com bombas de gás lacrimogêneo, não é automático que essas pessoas sigam seu caminho individualmente de volta para casa. Uma parte faz isso, mas muitos se mantêm agrupados em aglomerações menores, de algumas centenas ou mesmo algumas dezenas de pessoas, numa tentativa desesperada de resistir à injustiça que é a repressão do Estado. Vários desses agrupamentos menores, ou por falta de clareza do que fazer, por nervosismo, ou por agentes provocadores infiltrados (ou ainda uma combinação disso tudo), acabam depredando o que aparece pela frente.
É isso que levou à depredação de lixeiras, bancas de jornal, bilheterias do metrô, etc. nos primeiros atos. Mas, já neste último ato, que foi bem maior, envolvendo partes das massas que nunca participaram de atos antes, as depredações ocorridas após a dispersão da multidão foram mais direcionadas. Muitas agências bancárias tiveram suas fachadas de vidro quebradas. O que expressa, mesmo que de maneira desorganizada, o ódio contra a classe dos capitalistas.
Outro fato que exige uma reflexão foi a depredação da fachada da sede nacional do PT, próxima à Praça da Sé. Mesmo que tenha sido um pequeno grupo (funcionários do PT disseram que cerca de 200 manifestantes ao fugir da repressão passaram pela rua do Diretório Nacional do PT, e alguns poucos dentre estes, pararam em frente ao PT começaram a atacá-lo), isso é significativo. Se a direção e os governos do PT aplicassem uma política em defesa dos interesses dos trabalhadores, será que passaria pela cabeça de algum manifestante depredar sua sede nacional?
Os responsáveis pela destruição de agências bancárias, a sede nacional do PT e vários outros bens públicos e privados são o Governo Estadual e a Prefeitura, que aumentaram as tarifas e colocaram a PM a reprimir quem ousou dizer que era contra. Não se pode culpar a população por reagir a essas imposições, agressões e violências do Estado.
A responsabilidade do PT, da CUT, da UNE e UBES
A indignação está aumentando e isso tem relação direta com a situação econômica. A crise está chegando e as medidas tomadas pelo governo – desoneração da folha de pagamento, investimentos em grupos privados, MP de entrega dos portos, privatizações (“concessões”) generalizadas, previsão de mais concessões e leilões de petróleo no próximo semestre – tudo isso não resolve nada e só acelera a chegada da crise. A bolsa cai, o dólar sobe e, mais importante que tudo isso, os preços dos alimentos sobem. Embora a inflação oficial esteja por volta de 6%, qualquer um que vá ao supermercado sabe que o preço da comida subiu 20%, 30% ou até dobrou, conforme o item. E isso é o que conta no bolso do trabalhador.
Os Ministros podem se desdobrar em desculpas, Dilma pode programar uma “agenda positiva”, mas a verdade é que aquilo que está doendo no bolso do trabalhador só pode ser enfrentado com medidas duras de enfrentamento contra o patronato e o imperialismo, entretanto, este governo, com o PT entranhado nas alianças com a burguesia, não é capaz disso.
Para a maioria dos dirigentes do PT a ordem é defender o “nosso campo”, “nossas alianças” contra o PSDB, que é a “reação”. Entretanto, na hora de anunciar o aumento das tarifas em São Paulo, o Prefeito Haddad, do PT, juntou-se ao Governador Alckmin do PSDB. Na hora de criticar os manifestantes e defender a PM, Haddad novamente encontra-se junto com Alckmin.
Depois, quando a grande imprensa comemora a queda de Dilma nas pesquisas, os dirigentes do PT não conseguem explicar nada e apenas reclamam do ‘partido da imprensa’. É preciso que o Governo Dilma rompa as alianças com o PMDB, PP, PSD, PSB e todos os partidos capitalistas, para fazer um governo dos trabalhadores baseado na CUT, UNE, MST.
Está claro que o MPL é um grupo muito imaturo e despreparado para organizar manifestações do tamanho e amplitude que estão tomando os atos de São Paulo. As milhares de pessoas dos 3 atos transbordaram em muito a capacidade do MPL de organizar suas ações.
Mas o MPL segue à frente pela ausência de uma direção organizada. Vários outros grupos organizados têm participado dos atos, como o PCO, PCR, PSOL, PSTU, Levante Popular da Juventude e mesmo a Esquerda Marxista. Mas são todos grupos pequenos e que ainda não gozam de autoridade política diante das massas.
Os que têm autoridade política e que seriam escutados pelas massas estão ausentes e omissos. É o caso da CUT e seus sindicatos, da UNE, a UBES e do próprio PT. Os secretários estadual e municipal da JPT (Juventude do PT) publicaram na manhã do dia 10/06 uma nota apoiando o movimento e convocando os petistas a participarem do ato do dia 11/06. Ótimo, mas ainda não é suficiente! O PT deveria exigir a exoneração do promotor que incitou o assassinato dos manifestantes! A CUT, UNE, UBES, CMP deveriam exigir a soltura imediata de todos os manifestantes presos!
Está convocado um novo ato para o dia 13/06 às 17h em frente ao Teatro Municipal. As entidades de massa da juventude e dos trabalhadores têm responsabilidades e as devem assumir integralmente! Embora tenham dirigentes ligados ao PT, não podem dar guarida ao prefeito e deixar o movimento à deriva e sob a condução combativa, mas equivocada do MPL.
Há muita confusão! Os organizadores da manifestação conduzem a luta de maneira fechada, sem politizar o movimento e sem permitir que haja um debate democrático e com isso uma elevação do grau de consciência para que o movimento possa adquirir uma organização que lhes permita aumentar sua força e organização.
Lançar o movimento para ações diretas que se desdobram em enfrentamento com a polícia sem abrir uma via de negociação com o Governo do Estado e a Prefeitura, levará a seu desgaste.
A unidade com o MPL é uma tarefa que apenas a CUT, a UNE e a CMP podem garantir. Se essa unidade se realizar certamente o movimento crescerá e a vitória estará mais próxima!
Os trabalhadores e jovens estão vendo atentamente o que se passa nos países árabes e na Europa. Os ventos do Egito, Grécia, Espanha, Turquia começam a soprar nas nossas cidades. Mas para levar isso ao seu melhor desenvolvimento para o povo trabalhador, é preciso organização! É isso que buscamos fazer construindo a Esquerda Marxista!
· Que a CUT e a UNE levem um caminhão de som para o próximo ato, dia 13/06, às 17h em frente ao Teatro Municipal!
· Que com este caminhão de som seja organizada uma assembleia para decidir o trajeto da passeata e seu desfecho!
· Abaixo a repressão da PM! Pela imediata soltura de todos os manifestantes presos!
· Que Haddad e Alckmin revoguem o aumento das tarifas!
· Todo apoio ao movimento contra o aumento das tarifas!
· Pela remunicipalização do transporte público! Tarifa Zero!