Foto: Carolina Barbosa, JAV

Entrevista com servidor da UFRJ sobre cortes, fechamento e perspectivas de luta

Entrevistamos um servidor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sobre a situação da universidade em seu processo de fechamento devido a anos de cortes e sucateamento e também sobre os meios de luta para impedir que a maior e mais antiga universidade federal do país feche as portas. Participe da campanha UFRJ FICA! BOLSONARO SAI! Envie sua moção!

LIBERDADE E LUTA: Sabemos que a UFRJ tem sofrido praticamente uma década de cortes permanentes em seu orçamento e que esses cortes levaram à precarização dos serviços e a incêndios em diferentes locais e equipamentos da universidade. O que esses cortes significaram para os servidores da UFRJ? Ao longo desses anos, houve avanço da terceirização e redução de contratos de servidores, por exemplo?

SERVIDOR UFRJ: A redução do orçamento impacta a Universidade como um todo, porém os que mais rapidamente sentem são os trabalhadores terceirizados, que têm seu trabalho intensificado com as demissões realizadas para se ajustar ao novo orçamento reduzido, tem seus contratos reduzidos e tem seus direitos atacados. om as mudanças de empresas prestadoras de serviços, muitos são “reaproveitados” pela nova empresa e ficam sem direito a férias por anos seguidos. Os trabalhadores sofrem com atrasos de salários e de benefícios como vale refeição, vale-transporte e acabam pagando para ir trabalhar. Os servidores também têm tido perdas financeiras de adicionais em seus contracheques.

No que se refere a novas contratações de servidores administrativos e de docentes, têm sido realizados nos últimos anos concursos para o quadro efetivo, porém não em vagas suficientes para dar conta da demanda.

A terceirização aumentou. São poucos os cargos, com servidores já em vias de se aposentarem, das atividades consideradas “meio”, como motoristas, por exemplo. Hoje, a maioria de serviços, tais como limpeza, vigilância, motoristas, refeitório, são realizados por trabalhadores terceirizados, alguns sofrendo assédio do tipo “não quer trabalhar, tem quem queira”, caso o trabalhador se posicione sobre suas condições de trabalho e direitos.

LIBERDADE E LUTA: Como os estudantes têm sido prejudicados por esses constantes cortes em termos de aprendizado, pesquisa e extensão?

SERVIDOR UFRJ: Os constantes cortes fazem parte de uma política consciente para deteriorar os direitos sociais e fortalecer a iniciativa privada na educação superior. Visa-se ao sucateamento para entregar as instituições de ensino superior à iniciativa privada, como foi com o SUS; e o projeto de lei Future-se já deixa isso claro. O tripé ensino, pesquisa e extensão está cada vez mais enfraquecido. São poucas as bolsas acadêmicas e de extensão e as experiências de campo são cada vez menores por falta de recursos. As bolsas, tanto acadêmicas quanto assistenciais, são poucas e muito disputadas, criando concorrência entre os estudantes, que estão todos e todas no mesmo barco. Cada vez mais se reduzem as possibilidades para o estudante vivenciar tudo que a vida e o ambiente universitários podem proporcionar Essa é a consequência da redução das verbas destinadas às bolsas de pesquisa de agências como Capes e CNPq, este, por exemplo, que, em 2021, apenas terá recursos para pagamento de 13% das bolsas aprovadas.

LIBERDADE E LUTA: O fechamento da UFRJ é uma notícia lastimável e é um ataque imperdoável desferido pelo governo Bolsonaro contra a ciência e a educação. Esse ataque não atinge somente aqueles que estudam na universidade e trabalham nela, mas também atinge a sociedade. De que maneira? Por que a luta contra o fechamento da UFRJ e das universidades públicas é uma luta de todos os trabalhadores?

SERVIDOR UFRJ: A Universidade é um espaço que serve a toda a sociedade, não apenas se limita à sala de aula, sendo a educação pública, gratuita e para todos uma luta de todos os trabalhadores como direito ao conhecimento acumulado pela humanidade A UFRJ, com a limitação do orçamento,  já informou que serviços serão interrompidos, como pesquisas de duas vacinas em fase de testes, fechamento de leitos do Hospital Universitário, produção de álcool em gel, continuidade de obras já iniciadas (são comuns os “esqueletos” de obras iniciadas e sem previsão para terminar), aumento de investimentos na assistência estudantil (como Moradia e Restaurantes Universitários,  ampliação de acervo, ampliação de bibliotecas, continuidade de pesquisas importantes que atendem a toda a sociedade).  A luta pela permanência da UFRJ, e de outras universidades federais que seguirão com as mesmas dificuldades, é a defesa pelo direito da educação pública, gratuita e para todos; valorização da pesquisa; da ciência; a defesa do público contra o privado.

LIBERDADE E LUTA: Recentemente o deputado Anderson Morais (PSL-RJ) protocolou um absurdo projeto de lei que prevê a extinção da UERJ e a transferência de suas vagas para instituições privadas. Como isso se relaciona com o fechamento da UFRJ, com o obscurantismo do governo Bolsonaro e com a crise do capitalismo?

SERVIDOR UFRJ: Mais uma vez fica clara a proposta de favorecer a iniciativa privada na educação superior notadamente em momentos como a atual crise capitalista. Essa atitude desse deputado membro do ex-partido de Bolsonaro, revela o obscurantismo do governo Bolsonaro, que faz parte do retrocesso reacionário da própria burguesia em sua fase imperialista e de crise do capitalismo, em que, antes, a burguesia que se apoiava na ciência e na educação como formas de se desenvolver e fortalecer o capitalismo, porém hoje a burguesia converte a educação e o desenvolvimento tecnológico e científico em ataques aos trabalhadores e em uma busca para impedi-los de acessar o conhecimento que os levará a superação deste modo de produção, conhecimento desse como um trabalho coletivo.   Mas isso não é novidade na história brasileira: desde a ditadura militar se favorece o “mercado da educação; também por Fernando Henrique Cardoso, que criou o que hoje conhecemos como Fies; e por Lula, que ampliou e consolidou o incentivo às instituições privadas de ensino, com aporte de verba pública em ações como ProUni e Fies, em vez de aplicar tais recursos nas universidades públicas, sejam federais ou estaduais, como a Uerj.

LIBERDADE E LUTA: Por fim, como podemos impedir o fechamento da UFRJ e das federais? Como essa luta se vincula com a luta para pôr abaixo o governo Bolsonaro e com a luta em defesa da educação pública, gratuita e para todos?

SERVIDOR UFRJ: Pela organização política revolucionária dos estudantes, docentes, servidores administrativos e prestadores de serviço em defesa de seus direitos e empregos. Porém essa luta não pode ser desarticulada, deve-se se unir para pôr abaixo o governo Bolsonaro, pois ele é servil ao sistema capitalista, que apenas se preocupa com o lucro, mesmo que tenha que fazer retroceder os direitos e as instituições democráticas (mesmo que burguesas); para substituir o governo que está a serviço da burguesia por um governo dos trabalhadores, que exista para atender necessidades humanas. Para isso, é fundamental participar da manifestação de 19 de junho e permanecer no combate pela defesa da educação pública, gratuita e para todos de forma organizada, por meio da divulgação, participação e fortalecimento do Encontro Nacional Abaixo Bolsonaro, que ocorrerá em 10 de julho.