As rachaduras na coalizão interclassista de Trump estão se transformando em um abismo. Guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, o fracasso da guerra comercial de Trump, uma economia que caminha lentamente rumo ao desastre e a inflação persistente fragmentaram a base trumpista. Agora, o escândalo de Jeffrey Epstein ameaça destruí-lo.
O tráfico sexual de crianças tem sido uma das principais preocupações dos apoiadores de Trump desde o início. Durante anos, Trump, oportunisticamente, cedeu a teorias da conspiração como “Pizzagate” e “QAnon”. Acima de tudo, seus apoiadores apontaram o escândalo de Epstein como prova cabal da depravação do establishment. Sua principal exigência: divulgar a lista de clientes de Epstein e expor as elites. Como Kash Patel disse em 2023: “Vistam suas calças de menino grande e nos digam quem são os pedófilos.” Trump prometeu fazer exatamente isso.
Agora, ele deu uma reviravolta completa. A linha oficial da Casa Branca é: Epstein se matou. Não há lista de clientes. Vamos lá, não há nada para se ver aqui.
Trump em pânico
Há alguns meses, a procuradora-geral Pam Bondi afirmou com segurança que a lista de clientes estava em sua mesa. Agora, ela está recuando e afirma que o que queria dizer era que o arquivo Epstein, em geral, estava em sua mesa. Ela alega que não pode divulgá-lo porque está cheio de pornografia infantil… e que, a propósito, a lista de clientes nunca existiu.
Quando o Departamento de Justiça divulgou um vídeo da cela de Epstein com um minuto de filmagem cortado, a desculpa de Bondi foi que se tratava de uma falha técnica totalmente normal. Patel, que agora é o diretor do FBI de Trump, também adotou a mesma linha.
Trump está em pânico. Quando um repórter perguntou sobre Epstein, ele respondeu de forma defensiva: “Você ainda está falando sobre Jeffrey Epstein? Isso é inacreditável… Não acredito que você está fazendo uma pergunta sobre Epstein.”
Tempestade
Alguns dias depois, ele publicou um discurso atipicamente longo no Truth Social. “Bondi está fazendo um ‘TRABALHO FANTÁSTICO’… temos um ‘governo PERFEITO’”, declarou, antes de acusar “Obama, a corrupta Hillary, Comey, Brennan e os perdedores e criminosos do governo Biden” de fabricar os arquivos de Epstein. Finalizou implorando aos apoiadores reunidos em torno da sigla Maga (Make America Great Again) que se mantivessem unidos e “não desperdiçassem tempo e energia com Jeffrey Epstein, alguém com quem ninguém se importa”.
Mas muitas pessoas se importam, e houve dezenas de milhares de comentários em resposta. Uma pequena amostra é suficiente para revelar a raiva fervente, embora distorcida, da classe trabalhadora, destruindo o Maga:
Eu me importo com os líderes mundiais e bilionários escapando impunes de seus crimes.
Não podemos nos chamar de uma nação de leis quando pessoas que abusam de crianças podem andar em liberdade só porque são ricas e poderosas.
Não vivemos em condomínios fechados e não temos o luxo de guarda-costas para manter nossas famílias seguras.
Os americanos… estão CANSADOS desse “só nós” de duas camadas, porque eles têm dinheiro e podem se dar ao luxo de controlar políticos.
Você não entende o MAGA. Você não criou o MAGA. O MAGA criou você.
Os comentários superaram os likes, indicando uma discordância generalizada com a publicação. No jargão das redes sociais, Trump foi “racionado” — algo que nunca havia acontecido com ele no Truth Social antes.
Mesmo que o que Trump, Bondi e Patel dizem seja verdade, e o caso Epstein seja uma conspiração exagerada, o fato de tantos apoiadores ferrenhos do Maga não acreditarem mais neles é um sinal de uma catástrofe iminente para o regime instável e errático de Trump.
Desastre nas pesquisas
Trump prometeu “drenar o pântano”. Agora, alguns na base do Maga veem Trump como a mesma besta-fera do “Estado Profundo” (Deep State) que ele foi eleito para destruir. Para eles, ele está realizando um enorme acobertamento para proteger a si mesmo e seus amigos bilionários pedófilos. Muitos citam o que Trump disse à New York Magazine sobre Epstein em 2002: “Ele é muito divertido de se conviver. Dizem até que ele gosta de mulheres bonitas tanto quanto eu, e muitas delas são bastante jovens.”
Pesquisas recentes da YouGov revelaram que 67% dos entrevistados não estão confiantes de que “todas as pessoas ligadas a Jeffrey Epstein, supostamente responsáveis por crimes sexuais, serão investigadas minuciosamente”. E 79% dos americanos, incluindo 75% dos republicanos, querem que todos os documentos sobre Epstein sejam divulgados ao público. Dois terços da população acreditam que o governo Trump está deliberadamente encobrindo evidências sobre o caso Epstein, incluindo metade dos republicanos!
Fracasso após fracasso
Mesmo antes do fiasco envolvendo Epstein, o índice de aprovação de Trump já estava em queda. Entre os menores de 30 anos, sua aprovação caiu de 53,1% em novembro de 2024 para 28,9% no início de julho. Os jovens do movimento MAGA são os mais indignados com esse escândalo. Na Cúpula de Ação Estudantil da Turning Point USA, sete mil estudantes aplaudiram ruidosamente quando perguntados se se importavam com Epstein.
Trump já vinha tropeçando em quase todas as outras questões. Seu fiasco na guerra comercial começa a se refletir no aumento dos preços. A inflação subiu para 2,7% em junho — e o pior ainda está por vir. Atualmente, 51% dos norte-americanos acreditam que a economia está piorando, em comparação com 37% no início de seu mandato.

Enquanto isso, seu “Big Beautiful Bill” não agrada a ninguém além dele mesmo. Bilionários como Elon Musk detestam o fato de que a medida adicionará trilhões à dívida, enquanto apenas 30% dos cidadãos comuns acreditam que ela terá um efeito positivo no país. Já 54% afirmam que terá um impacto negativo, e 47% dizem que os afetará pessoalmente de maneira negativa. Muitas das regiões que votaram em Trump estarão entre as mais prejudicadas pelos cortes nos programas de auxílio-alimentação e no Medicaid.
Além disso, Trump envolveu os EUA na “guerra de 12 dias” entre Israel e Irã, quase desencadeando mais uma das “guerras eternas” que ele havia prometido serem coisa do passado. Na Ucrânia, não apenas fracassou em pôr fim à guerra imperialista por procuração contra a Rússia em 24 horas, como havia prometido, como agora está enviando ainda mais armamentos ao país.
Ele também enfrenta dificuldades na questão migratória. Depois de agradar sua base com os ataques violentos do ICE, Trump agora fala em “anistia” para alguns imigrantes indocumentados. Ele tenta desviar a atenção de seus fracassos utilizando bodes expiatórios e atacando imigrantes, mas, ao mesmo tempo, está sob pressão de bilionários do agronegócio e do setor hoteleiro que não querem perder o acesso à mão de obra barata que exploram.
Guerra civil no Maga
Para muitos apoiadores do Maga, a traição de Trump no caso Epstein representa uma linha vermelha, um limite intransponível. Votaram nele por vê-lo como o único homem disposto a enfrentar o establishment odiado, responsável por décadas de declínio nos padrões de vida. Como disse Marjorie Taylor Greene: “Eu simplesmente acho que é um soco no estômago quando pessoas comuns vão para a cadeia o tempo todo, quando cometem erros ou fazem algo errado, e então sempre parece que as elites ricas e poderosas escapam impunes.”
A incapacidade de Trump de manter sua base unida não é um fracasso pessoal, era algo inevitável desde o início. O Maga é uma coalizão composta por classes sociais em conflito, e a paz entre elas é impossível nesta época de decadência do capitalismo. O Maga ainda não acabou, mas o escândalo de Epstein marca um ponto de inflexão em seu processo de desintegração.
Há uma fúria crescente da classe trabalhadora contra os capitalistas. Na ausência de uma alternativa revolucionária, parte dessa revolta encontrou uma expressão distorcida no trumpismo. No entanto, mais cedo ou mais tarde, ela se manifestará em explosões de luta de classes. Estão surgindo oportunidades promissoras para os Comunistas Revolucionáriosda América se conectar com essa raiva e organizá-la como uma força capaz de derrubar, de uma vez por todas, este sistema podre.
TRADUÇÃO DE FABIANO LEITE.
Organização Comunista Internacionalista (Esquerda Marxista) Corrente Marxista Internacional