270 famílias foram despejadas do acampamento Novo Horizonte. Foto: ACidadeOn/Araraquara

Estado máximo na ação de reintegração de posse do acampamento Novo Horizonte

Uma ação de reintegração de posse no assentamento Monte Alegre, em Araraquara (SP), foi realizada em 19 de junho, com a retirada das famílias do acampamento Novo Horizonte. Após o evento pouco se debateu sobre quais foram os custos de tal “operação” e o interesse que recobre tais ações. No que se refere às “despesas”, o órgão responsável pela administração do assentamento (ITESP – Instituto de Terras de São Paulo) arcou com essa ação com um custo relativo à mobilização de equipamentos, transportes, estadias, almoço, entre outros, de R$ 385.264,00.

Esse valor representa apenas uma parte de todo o custo que envolveu outros órgãos do Estado e que até o momento não foram apresentados. Até para requererem seus animais que foram presos durante a operação as famílias terão de desembolsar valores relativos à unidade de animal que deverão ser pagos à empresa concessionária –  que também participou da ação, “resgatando os animais”. Com isso estimasse que o valor possa ultrapassar meio milhão de reais. Diante disso, fica a dúvida: quanto o Estado está disposto a pagar para não expropriar terras que não cumprem sua função social? Quanto está disposto a pagar para não conceder o direito e o acesso à moradia?

A ação protagonizada pela Policia Militar do Estado contou com grande contingente de policiais e veículos de apoio. Foram mais de 300 oficiais da PM, além de oficiais de justiça. Foram requeridos à PM do Estado os valores de gastos referentes à execução da ação de reintegração como logística, transporte e alimentação, no entanto sem retorno. Houve também a mobilização do Corpo de Bombeiros e da Guarda Civil para o contingente. As famílias se viram em meio ao caos e ao regime de exceção. O Helicóptero Águia foi utilizado para fazer o reconhecimento do local, e os trabalhadores se viram diante da espetacularização institucionalizada do Estado através do seu aparato de repressão.

O histórico crescente de repressão sobre as ações dos movimentos sociais e de toda forma de organização tem se tornado cada vez mais violento. O Estado se maximiza na conferência de direitos aos grandes, e na repressão aos pequenos.

Neste momento muitas famílias sofrem com o descaso por parte do Estado. Cobertos apenas por lonas e barracas, enfileiram-se à margem de uma estrada na esperança de terem suas reivindicações atendidas. O Estado gasta muito dinheiro para deixar as famílias em condições sub-humanas. Prefere os ver à margem de uma estrada, ao invés de conceder um pedaço de terra.

A construção do assentamento da fazenda Monte Alegre carrega em si um histórico de muitas lutas. Neste momento temos a dimensão e a perspectiva de o que pode sustentar tal movimento.

Em 1984 os intensos conflitos gerados na greve dos trabalhadores rurais na cidade de Guariba (15/05/1984) se voltaram contra as condições degradantes no corte da cana-de-açúcar da região. Nesse momento houve o protagonismo dos trabalhadores e as ações de ódio contra o modelo de exploração se intensificaram e se expandiram para diversas áreas da cidade, como à redução no preço pago pelo metro cortado da cana-de-açúcar, às condições degradantes a qual estavam expostos e outras necessidades, como a taxa cobrada sob o consumo de água implementada pela SABESP. Tudo isso serviu de combustível para o que explodiu com o estopim do início do movimento.

A conjuntura política nesse período se caracterizava pela ausência da liberdade e intensa repressão pelos aparatos do Estado. O conflito entre os trabalhadores e a PM resultou na morte de um trabalhador metalúrgico, Amaral Vaz Meloni. O ocorrido incendiou ainda mais o movimento que criou forma e ganhou espaço, sendo expresso pelo apoio de outros trabalhadores na adesão da greve na região: Barrinha (SP), Bebedouro (SP) e Morro Agudo (SP).

O conflito somente se normalizou após a negociação pela melhoria na qualidade do ambiente de trabalho e garantia de direitos fundamentais para os trabalhadores, como férias, descanso semanal remunerado, 13º salário, além de segurança e condições melhores no campo, como uso de E.P.I, condições regulares para transporte e locais adequados para higiene (banheiros).

Para além da reivindicação por melhora na qualidade do ambiente de trabalho, alguns membros persistiram na luta. Junto ao sindicato dos trabalhadores rurais, que já estava a partir daquele período se organizando. Ocuparam parte das terras onde se formou o assentamento 1, pertencente à região de Motuca, terras do Estado sob concessão da Companhia Agrícola Imobiliária e Colonizadora (CAIC) e formaram o primeiro acampamento da região.

“O assentamento Monte Alegre teve início de sua constituição em 1985, resultado do processo de mobilização de trabalhadores rurais, do Sindicato de Trabalhadores Rurais, com a mediação do extinto IAF e do Escritório Regional de Governo. Em julho de 1985 estes trabalhadores mobilizados ocuparam uma clareira de terra no interior da fazenda Monte Alegre, onde hoje se encontra o núcleo 1 do referido assentamento. As terras abrangidas pelo assentamento localizavam-se em uma área de horto florestal pertencente à CODASP/ Companhia Agrícola Imobiliária e Colonizadora – C. A. I. C., a qual durante mais de 40 anos serviu como área florestal para exploração de madeira.” (AMARAL. D; FERRANTE. V, 2007, p. 102)

A luta pela garantia e pelo direito à moradia e ao uso da terra combina-se nesse cenário com a luta dessas famílias. O conjunto de assentamentos da fazenda Monte Alegre é parte de um processo histórico, que envolveu a luta pela moradia e principalmente a manutenção e a garantia de direitos essenciais para manutenção das famílias campesinas. O movimento histórico ocorrido em Guariba foi resultado da unidade da classe trabalhadora que forjou o movimento.

O Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP) é a entidade representante do governo do Estado ao qual cabe o planejamento e a execução das políticas agrária e fundiária do Estado de São Paulo. Ele deveria repensar sua forma de distribuição de recursos e pautar-se pela necessidade e uso da terra, assim como explicita sua função perante o Estado. No entanto, até o momento é o responsável por deixar desabrigadas inúmeras famílias.

A ocupação de terras improdutivas ou que não cumprem sua função social deve estar sob o controle dos trabalhadores e para isso cabe reiterar a necessidade de sua organização no campo e da unidade na luta pelo acesso à moradia e expropriação de terras que não cumprem sua função social. Os trabalhadores do campo expressam nesse cenário a condição pela qual se busca sua emancipação e o fortalecimento da classe proletária.

Hoje os assentamentos da Fazenda Monte Alegre abastecem feiras e cidades de todo o seu entorno. O fruto do seu trabalho representa os produtos consumidos por diversas famílias e é em grande parte produto do esforço e da organização desses assentados. Assim como as demais que já estão estabelecidas, as famílias que ocupavam esse espaço estão à procura de produzir seu sustento e possuir uma forma de renda.

Acreditamos na importância da luta dos trabalhadores que se dispõem a lutar para conquista e manutenção de seus direitos, reconhecendo todo o trajeto que demarca a construção do assentamento Monte Alegre e a importância da terra e do trabalho para suas famílias.

  • Pelo direito à moradia, emancipação e unidade da classe trabalhadora do campo!
  • Pela reforma agrária e ocupação dos latifúndios!