Foto: Automotive Rhythms, Flickr

EUA: o United Auto Workers e a luta por um novo contrato de trabalho

Hoje o UOL publicou uma pequena nota sobre a greve sob o título “Sindicato anuncia greve em três fábricas das grandes montadoras dos Estados Unidos”. Normalmente, aqui no Brasil, a grande mídia passa batida nesses assuntos de luta de classes.

Os trabalhadores do setor automotivo dos Estados Unidos toleraram décadas de erosão dos salários e de deterioração das condições de trabalho, enquanto as três grandes empresas automobilísticas – General Motors, Ford e Stellantis – aumentavam os seus lucros. Mas estes trabalhadores agora estão dizendo “basta!”. Como resultado, 150 mil trabalhadores sindicalizados do setor automotivo estão se preparando para uma greve, à medida que o seus contratos com aquelas empresas se aproxima da data de expiração em 14 de Setembro.

Ao explicar aos filiados sua reação à proposta de contrato da Stellantis através de uma videoconferência com todos os filiados em agosto, o recém-eleito presidente da United Auto Workers (UAW), Shawn Fain, jogou sua cópia de contrato direto na lata de lixo. “Não acompanhamos a inflação nos últimos 20 anos, pois fecharam 65 fábricas”, disse Fain. “Os salários regrediram nos últimos 16 anos, retrocederam a 10 dólares por hora; enquanto isso, os salários dos CEOs aumentaram 40% somente nos últimos quatro anos.”

Fain e sua chapa reformista venceram a primeira eleição direta da liderança sindical por membros do UAW no início deste ano, depois que escândalos de corrupção forçaram a renúncia de dois presidentes anteriores do UAW.

Uma das principais táticas dos patrões neste ataque de longo prazo aos membros do UAW tem sido a introdução de sistemas salariais escalonados que reduziram significativamente a remuneração para novas contratações e tornaram a segurança no emprego precária. “Pretendemos eliminar todos esses níveis de trabalhadores e todas essas diferentes escalas salariais”, prometeu Fain.

Citando a necessidade de ganhos de competitividade ante as empresas que utilizam trabalhadores com salários mais baixos, as empresas automobilísticas extorquiram uma série interminável de contratos de concessão desde o colapso da economia capitalista do pós-guerra, em meados da década de 1970. Com a ameaça de fechamento de fábricas e de perda de empregos pairando sobre as suas cabeças, e na ausência de uma liderança combativa no topo, os trabalhadores concederam devoluções significativas ao longo dos anos. Contudo, desde a Grande Recessão de 2008, tornou-se claro que a paciência e a aceitação relutante na linha de montagem deram lugar a sentimentos mais militantes.

“Precisamos apenas nos lembrar de nossas raízes”, disse Fain, relembrando os dias de fundação do UAW para inspirar os trabalhadores do setor automotivo no tipo de luta que será necessária para reverter essas décadas de concessões – e ele não está errado nesse ponto.

A organização dos trabalhadores da indústria automobilística na década de 1930 foi construída através de uma dura luta e de muitos sacrifícios por parte dos trabalhadores. Esses esforços foram pontuados por batalhas campais defensivas contra ataques de bandidos contratados pelas empresas e da polícia, e incluíram ocupações pacíficas de fábricas por milhões de trabalhadores nas greves de 1936-37 que consolidaram o poder do sindicato dos trabalhadores do setor automotivo.

Também se deve notar que foram os trabalhadores comunistas e socialistas que desempenharam os principais papéis na condução dos trabalhadores à vitória na década de 1930. Eles sabiam que para os trabalhadores derrotarem os gigantes automobilísticos e os seus acionistas ricos, era necessária uma visão clara de que os interesses dos trabalhadores e dos proprietários eram completamente opostos entre si.

Quando são forçados à luta pela intransigência dos patrões, os trabalhadores podem vencer com base na máxima unidade e fazendo apelos à classe trabalhadora e ao movimento operário em geral. A tarefa dos trabalhadores em greve é deter a produção e, para o conseguir, devem compreender que o governo, a polícia e os tribunais não são neutros ou “pró-trabalhadores”, e estão, em última análise, do lado dos patrões.

À medida que a situação se intensifica, a questão colocada a Shawn Fain e à nova direção do UAW é a seguinte: Vocês estão prontos para ir até o fim nesta batalha? Se estiverem dispostos, podemos ter certeza de que a base responderá com entusiasmo. E uma vitória da luta de classes para os trabalhadores da indústria automobilística desencadearia uma onda de greves ainda mais ampla do que a que temos visto nos últimos anos. Mas não há garantia de que a direção seguirá esse caminho.

Um teste para a nova direção do UAW

Além das três grandes, existem outras empresas automobilísticas com instalações de produção e distribuição nos EUA. No total, a indústria do automóvel representa 3% dos quase US$ 26 trilhões do PIB do país.

A direção do UAW enfrenta, portanto, um inimigo decidido. Nos anos pós-Segunda Guerra Mundial, os contratos do UAW definiram o ritmo para os trabalhadores em todos os EUA. Isto também era verdade no final dos anos 1970 e 1980. As devoluções concedidas pelo UAW naquela época deram um tom de recuo para o movimento operário. Toda a classe dominante norte-americana apoia os patrões do setor automobilístico. Uma greve dos trabalhadores contra as três empresas, particularmente uma greve de longa duração, que não pode ser descartada, teria impacto na economia como um todo.

As “Três Grandes” culparão o sindicato pela perturbação econômica, alegando que a concorrência das empresas não sindicalizadas restringe o que podem dar ao sindicato. As novas tecnologias, como os carros eléctricos e a automatização contínua nas fábricas, ameaçam os empregos existentes.

Se a direção do UAW quiser realmente romper com as devoluções do passado, deve adotar a perspectiva dos comunistas e socialistas da década de 1930. Primeiro, eles têm de iniciar uma campanha nacional explicando que a batalha por novos contratos não envolve apenas os membros do UAW. É uma batalha para conquistar uma vida melhor para toda a classe trabalhadora americana. Os trabalhadores da indústria automobilística precisam da ajuda do resto do movimento operário – e a sua vitória ajudará a todos os trabalhadores. Da mesma forma, uma derrota enfraqueceria toda a classe trabalhadora.

Os contratos não devem apenas eliminar níveis e proporcionar pensões, mas também proteger os empregos. Quaisquer automatizações ou avanços tecnológicos que conduzam à eliminação do emprego devem ser abordados através de uma combinação de reciclagem remunerada e da redução da semana de trabalho para todos os trabalhadores, sem qualquer redução no salário semanal – e sem qualquer dispensa! Quando os patrões do setor automobilístico gritam e dizem que isto é impossível, os dirigentes do UAW devem lembrar a todos que toda a riqueza da indústria automobilística provém do trabalho dos trabalhadores e não dos banqueiros e executivos.

Para construir a solidariedade e fortalecer o impulso, a direção do UAW deveria lançar uma campanha de organização em massa de todos os trabalhadores não organizados da indústria automobilística e de autopeças. Devem explicar que se aderirem ao sindicato, toda a força do sindicato será usada para garantir o reconhecimento sindical e um contrato que seja pelo menos tão bom quanto os contratos da General Motors, Ford e Stellantis.

Além disso, o UAW deveria unir-se ao Writers Guild, ao SAG-AFTRA, aos trabalhadores da Amazon, Starbucks e de outros lugares, que lutam pelo reconhecimento e por contratos sindicais. O UAW pode ajudar a criar comitês de trabalhadores que possam coordenar uma resposta e uma estratégia unificada para vencer. Se isto fosse feito de forma séria – e o UAW está numa posição perfeita para assumir a liderança nesta questão – a classe capitalista americana seria forçada a ceder. Confrontados com uma frente única bem organizada da classe trabalhadora, seriam eles que se curvariam para fazer concessões.

O fracasso da última direção do UAW foi causado pelo fato de terem restringido todas as suas decisões aos limites do sistema capitalista norte-americano em declínio. Os novos líderes do UAW devem romper com esse método. Eles devem regressar aos métodos de luta de classes da década de 1930. Essas lutas criaram laços de camaradagem entre os trabalhadores do setor automobilístico que os tornaram imbatíveis durante décadas. Este é o tipo de esforço militante e de base ampla que será necessário para reconstruir um movimento operário combativo nos próximos anos.

Apelamos a todos os trabalhadores do UAW que queiram que isto aconteça a juntarem-se aos comunistas da CMI. Juntos não só podemos lutar contra os patrões – podemos vencê-los!

Àqueles que se preparam para intervir nos piquetes caso uma greve seja convocada, aqui está um resumo das principais demandas levantadas pela liderança do UAW:

  • Eliminar os níveis;

Atualmente, as montadoras têm um sistema salarial escalonado. Os trabalhadores do primeiro nível ganham cerca de US$ 28 por hora, e os contratados depois de 2007 estão no segundo nível e ganham cerca de US$ 16 a US$ 19 por hora.

  • Aumentos salariais;

O UAW exige aumentos salariais de dois dígitos.

  • Restaurar o Cola [sigla para Cost of Living Adjustments, em português: Ajustes do Custo de Vida);

O UAW exige que os Ajustes do Custo de Vida (Cola) sejam restaurados.

  • Pensão de benefício definido para todos os trabalhadores;

Dado que as contratações novas e recentes não estão no plano de previdência tradicional.

  • Restabelecer benefícios médicos para aposentados;
  • O direito de greve por fechamento de fábricas;
  • Programa de proteção à família trabalhadora;
  • Tornar os trabalhadores temporários permanentes;
  • Mais folga remunerada;
  • Aumentar o salário dos aposentados.

TRADUÇÃO DE FABIANO LEITE.