Imagem: Fred Ozanan

Fundo Eleitoral 2022: avança a integração dos partidos ao Estado

A Lei de Diretrizes Orçamentárias aprovada pelo Senado por 40 votos contra 33, em 15 de julho, aumentou de R$1,8 bilhões para R$5,7 bilhões a verba destinada ao Fundo Eleitoral de 2022. Os deputados aprovaram por 278 votos contra 145. Agora o Congresso está em recesso, mas, depois da votação, uma fração da mídia e políticos burgueses esbravejaram contra esse aumento astronômico. A pressão fez com que Bolsonaro declarasse que “em respeito ao povo brasileiro” a verba será de “somente” R$4 bilhões – o dobro do que foi disponibilizado ao pleito de 2020. Além desse valor, os partidos receberão mais R$ 1 bilhão pelo Fundo Partidário. Apesar do discurso de Bolsonaro, seus filhos e a bancada governista votaram o aumento original de 15 de julho.

Diante da fragilidade de seu governo, Bolsonaro joga dos dois lados. Sua bancada vota no projeto que alegra a todos os partidos políticos, principalmente o “Centrão”, de onde busca um apoio mais substancial, e depois vão todos às redes sociais com um discurso hipócrita dizendo que são contra o aumento.

O fato é que o Fundo Eleitoral nada mais é que um instrumento da própria burguesia para atrelar financeiramente os partidos políticos que se reivindicam da classe trabalhadora ao Estado burguês, trata-se de um ataque à organização política da classe trabalhadora.

A quem interessa o Fundo Eleitoral?

Criado em 2017, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) foi colocado em prática pela primeira vez nas eleições de 2018, quando custou R$ 1,7 bilhão. Em 2020, o valor passou para R$ 2 bilhões. Uma parcela é dividida entre todos os 33 partidos existentes. Depois, uma parte um pouco maior divide-se entre os partidos que contam com ao menos um deputado. Metade do valor é proporcional ao tamanho da bancada na Câmara de Deputados e outra parte à bancada no Senado. Ou seja, quanto maior a bancada de um partido, mais ele receberá do Estado para se manter no balcão de negócios da burguesia.

Para dar um exemplo, o Partido dos Trabalhadores (PT) receberá cerca de R$ 563 milhões se o valor se mantiver conforme aprovado na LDO (em 2020, Bolsonaro já disse que vetaria o aumento da verba e não o fez). Foi com a verba do fundo partidário que o PT pagou a Lula um salário de R$ 20 mil em 2020, para consultoria política, para Dilma R$ 18 mil, e custeou também um documentário sobre o movimento Lula Livre.

Neste ano, o voto contrário do PT à LDO foi por discordar de outras partes do orçamento, como o reajuste do salário-mínimo, mas não do aumento do Fundo Eleitoral. Ao que o senador Styvenson Valentim (PODEMOS-RN) lembrou que o PT e o PSL receberiam as maiores fatias do fundo, Paulo Rocha (PA), líder da bancada petista no Senado, reafirmou:

“Nós não somos culpados disso. O PT não tem o que esconder no País. Nós sempre brigamos, é a nossa proposta desde o início. O financiamento de campanha tem que ser financiamento público para assegurar o mínimo de democracia. Senão, aquele que tem poder econômico maior ganha”.

No início do Partido dos Trabalhadores a independência financeira foi garantida por milhões da classe que buscavam criar no Brasil o primeiro partido operário independente – vendendo estrelinhas, jornais e filiando de porta em porta. Mas com a degeneração do PT, o partido passou a se tornar cada vez menos dependente dos trabalhadores e mais do dinheiro de empresários, chegando a colocar como vice de Lula em 2002 um empresário (!), e defender declaradamente o financiamento público de campanha, sempre com argumentos tão hipócritas quanto os de Bolsonaro.

Uma forma de financiamento das campanhas, comum em outros países e proibida no Brasil pela CLT varguista, é o apoio dos sindicatos. Na Grã-Bretanha, por exemplo, os trabalhadores decidem em assembleia qual candidato querem apoiar e aprovam uma contribuição da categoria.

É uma ilusão sustentada por toda a “esquerda”, e pelos políticos vulgares em geral, que o financiamento público de campanha possa livrar o processo eleitoral da corrupção ou da influência do poder econômico. Seu real objetivo é pôr fim a uma prática histórica do movimento operário e a única forma da classe trabalhadora de manter seus partidos comprometidos com as reivindicações da classe e com a luta pela revolução.

O Fundo Eleitoral regulamentou o uso dinheiro público para financiar os partidos e candidatos, depois que ficou proibida a doação de empresas. Mas essa proibição não se aplica aos empresários. O dono da empresa pode doar muito dinheiro. O teto de gastos para presidente é de R$ 70 milhões e para deputado federal é de R$ 2,5 milhões! Mas para o trabalhador comum há um limite. Isso porque a doação é limitada a 10% da renda declarada. Esse dispositivo fez com que alguns apoiadores do PSOL fossem intimados pela justiça eleitoral por doarem R$ 50, R$ 100 reais e não terem renda formal comprovada.

Também é importante relembrar de onde vem o dinheiro público. São os trabalhadores, que em grande parte pagam os impostos quando recebem o salário ou compram itens básicos de sobrevivência. Os ricos não pagam praticamente nada. Em geral seus gastos aparecem como gastos das empresas que os lançam como custos e assim contornam impostos sobre lucros etc. Portanto, o dinheiro público é dinheiro dos trabalhadores. E a maior parte dele irá para partidos que atacam os direitos dos próprios trabalhadores. Uma das implicações direta dos Fundos Partidários e Eleitorais é evidente para qualquer trabalhador: menos dinheiro para os serviços públicos, para nosso salário indireto em saúde, transporte, educação, previdência, e dinheiro certo para partidos que ajudam eleger, por exemplo, Bolsonaro.

Uma ala de partidos que, pelo menos por algum tempo, tentavam aparecer à esquerda do PT, como o PSOL, PSTU, PCdoB, PCB, PCO, se limitaram a criticar a cláusula de barreira – que garante que os partidos menores recebam menos e os fazem entrar numa corrida desenfreada para elegerem mais deputados. Isso só demonstra o quanto esses partidos já estão financeiramente adaptados ao regime burguês e que já não dependem mais da classe trabalhadora para garantir a sua existência.

Acima de tudo, é preciso compreender o papel que cumpre o Estado na sociedade capitalista. Como explica Lenin, em “O Estado e a Revolução”:

Para Marx, o Estado é um órgão de dominação de classe, um órgão de submissão de uma classe por outra; é a criação de uma “ordem” que legalize e consolide essa submissão, amortecendo a colisão das classes. Para os políticos da pequena burguesia, ao contrário, a ordem é precisamente a conciliação das classes e não a submissão de uma classe por outra; atenuar a colisão significa conciliar, e não arrancar às classes oprimidas os meios e processos de luta contra os opressores a cuja derrocada elas aspiram.

Aqueles que realmente querem combater o capitalismo, lutar pelo socialismo, devem recusar qualquer dinheiro que venha do Estado e educar a classe trabalhadora a financiar seus partidos e representantes. É por isso que a Esquerda Marxista é uma das poucas, talvez a única, organização de esquerda no Brasil que não recebe nenhum centavo do Estado, o balcão de negócios da burguesia, nem de empresários. Nossa independência financeira é um princípio colocado em prática pelo esforço militante de venda de materiais, arrecadação entre nossos apoiadores e o autofinanciamento da nossa própria militância.

Referências:

https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/07/4937917-vergonha-do-congresso-em-meio-a-crise-fundo-eleitoral-tem-aumento-de-bilhoes.html

https://www.dw.com/pt-br/bolsonaro-indica-que-aceitar%C3%A1-dobrar-valor-do-fund%C3%A3o-eleitoral/a-58651037

https://www.extraclasse.org.br/politica/2021/07/partidos-terao-mais-r-39-bilhoes-para-campanha-eleitoral/

https://www.marxismo.org.br/reforma-politica-nosso-dinheiro-para-bolsonaro-iscas-para-a-esquerda-e-barreira-para-as-organizacoes-de-trabalhadores/