Gigantes da internet se mobilizam contra leis de censura nos EUA

A censura da internet e a luta entre dois setores da burguesia.

Quem acessou o Facebook, no dia dezoito de janeiro, pôde observar que um de seus fundadores, Mark Zucherberg, publicava em seu perfil, uma mensagem que dizia que o congresso Norteamericano não poderia aprovar uma “lei mal pensada”. Segundo Zucherberg e outros sete mil sites, que protestaram nesse dia, as Leis SOPA e PIPA, que estavam em pauta no congresso do EUA, limitariam a liberdade na internet.

Participaram também do protesto sites como Twitter, Mozilla, WordPress e outros. A Wikipédia saiu do ar por 24h, nos Estados Unidos, e publicou uma mensagem que dizia: “Imaginem o mundo sem conhecimento livre”. Jimmy Wales, cofundador da Wikipédia, disse, em entrevista que a política para a internet não deveria ser ditada por Hollywood. O Google pôs uma caixa preta no logo de seu site, demonstrando seu repúdio à lei.

Os dois projetos, conhecidos como SOPA (Stop Online Piracy Act, ou Lei para Parar com a Pirataria Online) e Pipa (Protect Intellectual Property Act, ou Lei para Proteger a Propriedade Intelectual), têm apoio das indústrias cinematográfica (MPAA, na sigla em inglês), fonográficas (RIAA, sigla em inglês) e de softwares.

Essas empresas pretendem proteger seus produtos e lucros com essas leis. Para elas, baixar um filme e compartilhá-los com os amigos é um crime igual a roubar um DVD de uma loja.

O que dizem as leis?

Segundo a Reuters, caso fosse aprovada, a Lei SOPA permitiria que o Departamento de Justiça Norteamericano investigasse, perseguisse e desconectasse qualquer pessoa ou empresa acusada de disponibilizar material na internet que o direito autoral não lhe pertencesse. Resumindo, a lei seria uma maneira de impedir as pessoas de baixar, compartilhar e remixar qualquer conteúdo, como música, vídeos, filmes ou imagens.

Os provedores de domínios, sites de busca e empresas de publicidade americanas, que ficam todos nos EUA, seriam obrigados a bloquear os serviços de qualquer site que esteja sob investigação do Departamento de Justiça dos Estados Unidos por ter publicado material que viola os direitos de propriedade intelectual. Caso não façam serão eles os punidos.

O outro Projeto de lei, PIPA, propõe penas de até cinco anos de cadeia para pessoas acusadas por compartilhar materiais “pirateados” dez ou mais vezes ao longo dos seis meses. Os sites acusados de “permitir ou facilitar a pirataria” também seriam punidos. Estes podem ser fechados e banidos de provedores de internet, sistemas de pagamento e anunciantes, em nível internacional. Em tese, um site pode ser fechado apenas por manter laços com algum outro site suspeito de pirataria.

Outras consequências das leis

Haveria também uma espionagem dos provedores de internet, e-mail, blogs gratuitos, mensageiros instantâneos e redes sociais que vetariam todo o conteúdo publicado pelo usuário, que não fosse autorizado e eventualmente o bloquearia.

Outro problema é que muitos hackers e ativistas, que usam tecnologias para navegar de maneira anônima, alegam que as leis os prejudicariam muito, pois eles seriam vistos como ilegais.

Políticos recuam devido à pressão

Após as pressões dos sites e toda a polêmica em torno do fim da liberdade na internet, o congresso Norteamericano retirou os projetos de pauta. O parlamentar Lamar Smith, que apresentou o projeto SOPA, decidiu suspender a legislação “até que haja um consenso maior por uma solução”.

Os projetos de leis e sua retirada de pauta são resultados da queda de braços entre dois setores da burguesia que lutam por sua sobrevivência. Segundo a BBC, os analistas afirmam que os protestos do dia dezoito foram um teste para as indústrias do Vale do Silício. Afinal, elas enfrentam uma indústria mais velha e mais organizada, que a de mídia e de entretenimento.

Em entrevista a Folha de São Paulo, Greg Frazier, vice-presidente executivo da Associação Cinematográfica dos EUA (MPAA, na sigla em inglês), mostra os interesses do setor que representa em criminalizar as pessoas e sites que fazem downloads ilegais.

Segundo Fraizer, “… pouquíssimas pessoas diriam que é normal entrar em uma videolocadora, colocar um DVD no bolso e sair andando. Todos reconhecem que isso não se faz porque é errado”.

Para ele, sair com o DVD de uma locadora é o mesmo que baixar um filme. “… já que se pode sentar diante de um computador em casa, no trabalho ou na faculdade, baixar um filme ilegalmente e achar que isso não vai afetar ninguém, que está tudo bem. Bom, o caso é que não há diferença entre um exemplo e outro”, afirma o membro da Associação Cinematográfica.

Outro assunto abordado pelo Frazier é a remuneração do trabalho. Segundo ele, o problema dos downloads é que:

“A noção das pessoas que criaram esses produtos é que elas precisam ser recompensadas por isso. Isso vale para um repórter de jornal que está escrevendo uma matéria ou um diretor que está fazendo um filme. Se você não tiver remuneração pelas reportagens que escreve, provavelmente vai acabar não escrevendo muitas. Se você não acredita no valor da criatividade e da produção de conteúdo, você acredita em um sistema diferente do meu”.

A burguesia, como afirmava Marx, sempre tenta mostrar suas ideias como ideias de toda a sociedade. Assim, para justificar as leis ela tenta usar da lógica de que os donos da FOX, Universal, Warner e outros estão preocupados com a remuneração do trabalho desempenhado para produzir seus produtos.

Prova disso é o que disse Cary H. Sherman, presidente da Recording Industry Association of America, que representa os selos musicais. Segundo ele, as vendas de música nos EUA são menos da metade do que eram em 1999, quando o site de compartilhamento Napster surgiu. Sherman também afirma que o emprego direto no setor caiu pela metade, menos de 10 mil postos de trabalho. Ou seja, faz-se de coitadinho que está sendo “roubado” pelas pessoas que compartilham músicas, filmes e livros na internet. Criminosos segundo ele, que colaboram com a “pirataria”.

Compartilhar é piratear?

Não nos cabe aqui entrar no mérito legal, afinal a lei tende a sempre pesar para o lado da burguesia. Toda essa conversa de combate a pirataria faz parte de seu discurso hipócrita. Nós acreditamos que os artistas, jornalistas e escritores devem receber pelo seu trabalho.

A internet tem dado um duro golpe, não nos músicos, por exemplo, mas nas gravadoras. A rede tem até facilitado a divulgação de trabalhos desses artistas, que antes dela viviam a mercê das exigências das gravadoras. Agora, com Youtube ou Myspace, fica muito mais fácil.

Ao contrário do vice- presidente da Associação de Cinema dos Estados Unidos, nós estamos interessados em democratizar a cultura e acreditamos em uma sociedade diferente da dele.

Afinal, quem não gosta de ir ao cinema? O grande problema é o custo do ingresso. Isso impede grande parte da população de ter acesso. O mesmo com o CD de música: o preço impede as pessoas de compra, logo elas preferem baixar, além de ser mais cômodo devido a não ficar acumulando na estante.

Esses senhores que acusam grande parte dos internautas que baixam Cds, filmes ou livros de cometerem crimes são grandes reacionários, como toda burguesia. Só estão interessados em manter seus mercados e lucrar.

O que está em jogo é o controle da internet

A burguesia tem o controle do estado, do exército e da economia. A internet aparentemente foge de suas mãos. Isso a deixa furiosa, afinal é vergonhoso que o país mais poderoso do mundo tenha a página de sua polícia federal tirada do ar por um grupo de hackers.

Os acontecimentos relacionados ao Wikileaks e a primavera Árabe também a preocupa. A informação vai rapidamente de um lado a outro do mundo de maneira rápida, sem que eles possam impedir. Só isso não faz nenhuma revolução, mas ajuda. A revolução não virá pelo Twitter, mas poderá ser twittada.

A internet é um espaço muito importante para qualquer revolucionário, pois com ela podemos divulgar informações e fazer propaganda. Não acreditamos que com o cyber terrorismo, como faz os Anonymous nós poderemos transformar a sociedade. Como afirmava Leon Trotsky, dirigente da revolução Russa:

“Para nós o terror individual é inadmissível precisamente porque apequena o papel das massas em sua própria consciência, as faz aceitar sua impotência e volta seus olhos e esperanças para o grande vingador e libertador que algum dia virá cumprir sua missão”.

Tirar os sites do governo do ar, postar informações de políticos na web e outras coisas do gênero ajuda a desmascará-los, mas não põe fim ao capitalismo nem ao seu estado que nos oprime. Para nós a única maneira é que a classe trabalhadora tome o poder no mundo e tenha em suas mãos o controle dos meios de produção e do estado.

Novamente cito Trotsky: “Bons são os métodos e os meios que elevam a consciência de classe dos operários, sua confiança em suas próprias forças, sua disposição à abnegação e à luta” (Programa de Transição). Terrorismo online não tem muita utilidade para isso.

Nada podemos esperar da burguesia

Apesar de as leis terem sido tiradas de pauta, precisamos ficar atentos. Nada descarta um acordo entre os dois setores. A União Europeia assinou o ACTA (Sigla em inglês Anti-Counterfeiting Trade Agreement ou Acordo Comercial Anticontrafação), que pretende substituir as leis SOPA e PIPA.

A retirada do Megaupload e outros sites de download da rede demonstram que a não aprovação das leis não é um desejo um unânime da burguesia americana.

E apesar da sua declaração contrária à lei, o senhor Zucherberg já entregou vários dados pessoais ao governo americano. Também boicotou o Wikileaks e o movimento Ocupação de Wall street. Ou seja, a internet livre pode estar com dias contados.

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