Holofotes para a retaliação à Lava Jato escondem aprovação da PEC 241/55

Atravessando crise seguida de crise, a Nova República aprofunda sua crise de legitimidade, que precipita seu desmoronamento político.

Foto: Gilmar, Renan e Moro em uma personificação dos conflitos entre as camarilhas burguesas. Crédito: Geraldo Magela/Agência Senado

Atravessando crise seguida de crise, a última expressa pela tentativa frustrada do Presidente do Senado Renan Calheiros em aprovar rapidamente a punição a juízes e procuradores, a Nova República aprofunda sua crise de legitimidade, que precipita seu desmoronamento político. Nesse baile de máscaras incessante, seus participantes dançam para não encarar o estado de decomposição das condições econômicas do país. Na imprensa burguesa, nenhum destaque para a aprovação em 1º turno no Senado da PEC 241/55, defendida com tanta paixão durante meses.

Na edição 94 do jornal Foice&Martelo, de 7 de setembro, o artigo “A lógica (repressiva) da proposta das ’10 medidas contra a corrupção’” mostrava a concepção de justiça do Ministério Público Federal. Transformadas em projeto de lei, as propostas trabalham com a premissa de que a lei é um estorvo para qualquer investigação e apuração de ilicitudes. Defendem um combate ao crime sem lei, apesar da lei ou ainda fora-da-lei.

Foram essas as medidas atacadas por deputados e senadores nesta semana, com a cobertura do Palácio do Planalto, mas sob a perspectiva da preservação de suas próprias cabeças e interesses. Vem do poeta Bocage a expressão da emenda pior que o soneto. Foi isso que os desmoralizados parlamentares tentaram fazer ao emendar a já má proposta sustentada pelos procuradores da Lava Jato. Saída da votação, a legislação burguesa vigente está mais antidemocrática e ainda mais refém dos interesses de camarilhas de personagens eleitos ou alçados a postos judiciais.

Todos os holofotes para essa briga entre setores burgueses, que expressam a disputa entre interesses divergentes da classe dominante, combinam-se no esforço da imprensa burguesa em reduzir o impacto político da aprovação da PEC 241/55 em 1º turno no Senado, nesta quarta-feira (30/11), mesma oportunidade em que foram abordadas as medidas sobre corrupção. Embora deixado em segundo plano, em sentido jornalístico esse assunto condiz muito mais com os interesses de milhões de brasileiros, por representar o rebaixamento contínuo das condições de vida do proletariado por no mínimo 10 anos.

A maioria da imprensa burguesa brada contra as manobras de autopreservação de seus representantes políticos, dando eco a discursos sinceros como o de Joaquim Barbosa, ao mesmo tempo em que assinala possíveis perigos que viriam com a punição de juízes e procuradores. Porém, todo o debate feito em jornais, sites e redes sociais tem se baseado no aspecto legal da sociedade brasileira.

Em seu aspecto real, as liberdades democráticas e outros direitos expressos na legislação vêm sendo violados há muito tempo, e em graus e extensão cada vez maiores. O agente primeiro desse movimento consiste na Polícia Militar. Acompanham esse corpo de homens armados uma legião de juízes de diversas instâncias, uma série de prefeitos, governadores e de câmaras municipais, que se combinam com as representações executivas e legislativas nacionais.

A principal discussão – que segue até hoje – é a aprovação da emenda sobre “abuso de autoridade”. A verdade é que a emenda passa longe dos principais problemas de abusos de autoridade que sofre o povo brasileiro, nas mãos da PM nos morros e favelas. A começar pelo direito mais elementar que o direito a viver, direito que é desrespeitado seja em tiroteios, em execuções, como aconteceu recentemente na Cidade de Deus no Rio de Janeiro, ou em mortes individuais, como o menino que foi fuzilado porque portava um celular na frente da mãe.

As crianças são tratadas como traficantes. Elas não podem levar cola e tesoura para a escola porque isso seria “material para manipular drogas”. Mulheres e adolescentes recebem xingamentos de vagabundas e putas todos os dias. Este é o dia a dia das favelas ocupadas pela PM e esse verdadeiro abuso está muito longe do que foi votado. Afinal, todos esses abusos estão tipificados em leis e regulamentos, mas continuam acontecendo, e os PMs continuam sendo absolvidos apesar de todas as provas e denúncias. A emenda, como era de se esperar, passa longe disso e trata de outras questões.

Sim, é um verdadeiro abuso que uma juíza jogue uma adolescente menor de idade numa cela para ser estuprada repetidas vezes e sofra como punição o afastamento do cargo por dois anos, continuando a receber seus salários durante o período. Ou seja, a punição é receber sem trabalhar. Ou que um juiz condenado tenha como punição a aposentadoria com proventos integrais. Mas também, infelizmente, não é disso que trata a emenda.

O que faz a emenda é contribuir para que todos posem de santos ou de cafetões. É fazer com que sejam punidos o juiz ou o procurador que seja julgado com intenções políticas ou pessoais ao conduzir o caso. Longe das questões concretas e reais pelas quais passa o mundo, mas bem perto de conseguir uma situação em que a chantagem entre os “grandes” se torne o meio normal de funcionamento da Justiça. O pacote das “Dez Medidas”, pacote autoritário e anti-democrático, foi destruído. O que o substituiu não é melhor e nada vai contribuir para os direitos dos trabalhadores e do povo pobre.   

Isso significa que os pactos firmados em 1988, culminando na formação da Nova República, encontraram seu esgotamento social e histórico, e tornam-se cada vez mais insuportáveis. A crise econômica atravessada o país, aprofundada pelas equivocadas atitudes da burguesia e de seus representantes, está acelerando a situação, tornando-a cada vez mais instável. A briga palaciana permanente consiste apenas em uma das expressões dessa situação, em que nenhum setor consegue estabilizar a situação, e aonde a crise social aparece imponente no horizonte.

É nesta situação que segue a tramitação da PEC 55, que só falta uma votação no Senado, que o Presidente do Senado tem aberto contra ele um processo por peculato, e que o governo promete enviar ao congresso mais um pacote tremendamente impopular, a Reforma da Previdência. O povo sofre, enquanto a burguesia e seus agentes enrolam-se com a economia real, com a produção industrial encolhendo e retornando ao patamar de 2008. O desemprego aumenta cada vez mais e uma pesquisa do IBGE mostrou que o trabalhador “informal” (aquele sem proteção das leis trabalhistas) ganha no máximo a metade do que ganha o trabalhador formal. A burguesia segue, com vaivéns e fintas, disposta a cobrar o máximo dos trabalhadores para retomar seus patamares de lucro em tempos de crise.

Os trabalhadores, no momento, encontram-se sem uma saída direta de mobilização. Eles abandonaram o PT, mas não conseguiram construir outro partido que se transforme em sua referência política. A CUT, apesar de continuar reunindo a maioria dos trabalhadores sindicalizados, esmera-se em procurar evitar que exista uma luta unificada, e lança bandeiras que não empolgam nem mobilizam (Volta Dilma ou eleições diretas para Presidente). As micro-centrais não oferecem uma alternativa viável. O resultado é que, no máximo, a juventude e suas vanguardas constituem um pelotão avançado nas mobilizações, como se viu em Brasília no dia da votação da PEC 55.

A Esquerda Marxista continua o seu trabalho de ajudar os trabalhadores a tomarem consciência de sua situação e de apresentar uma saída que possa unificar todos.

– Fora Temer e o Congresso Nacional

– Por uma Assembleia Nacional Popular Constituinte

– Por Um Governo dos Trabalhadores