Lições da III Internacional sobre a tática da Frente Única (Parte 2)

3º Congresso

Ocorrido em junho de 1921, o 3º congresso se deparou com novas questões. A enorme abrangência da III Internacional, conquistada no último ano, era inédita. Já contava com mais de 50 seções, com grandes partidos de massa na Europa, o que impunha problemas de tática, de atuação e de organização. Além disso, neste período ocorreu também o arrefecimento do processo revolucionário e a reação da burguesia, que se encontrava em contradição insolúvel. Um expediente utilizado pela burguesia naquele momento foi a entrega da gestão dos seus negócios aos seus confiáveis lacaios socialdemocratas. Era o caso da Alemanha, da Áustria, da Tchecoslováquia e da Hungria. A crise econômica, após a ilusão dos acordos de Versalhes, impôs derrotas ao proletariado mundial, inclusive em lutas defensivas.

Era um momento desfavorável para a III Internacional, que necessitava construir-se frente às direções reformistas. A palavra de ordem “ir às massas” foi adotada porque a III Internacional reconheceu que, para enfrentar a união da burguesia com os socialdemocratas, não bastava a simpatia das massas, mas era necessário que os comunistas se tornassem eles próprios a sua direção. Em suma, era necessário arrancar as organizações operárias de massas das mãos dos elementos reformistas. Por outro lado, diante do avanço dos ataques da burguesia, estava evidente para os trabalhadores, ainda que de forma imprecisa ou mesmo confusa, a necessidade da unidade das organizações que se reivindicavam da classe trabalhadora. Os partidos comunistas deveriam chamar os sindicatos e os partidos operários para ações comuns em favor dos interesses imediatos da classe trabalhadora, ao mesmo tempo em que ganhavam a confiança das massas diante da traição das direções reformistas.

Se por um lado no período anterior os comunistas eram ainda apenas uma fração clarividente no movimento operário, as derrotas dos operários nos anos recentes demonstraram que era necessária uma luta enérgica contra a burguesia, fazendo um chamado à unidade das organizações operárias. A tática da frente única, que neste congresso da III Internacional adquiriu uma atenção especial, tinha a função de desmascarar a traição dos reformistas em aliança com a burguesia e demonstrar, na luta prática, a disposição de combate dos comunistas – em consonância com a adoção desta tática em ocasiões anteriores, porém em um novo contexto de luta de classes. O resultado da aplicação das recomendações do 3º congresso foi a ampliação da influência da III Internacional: atingiu mais de 60 seções, com 3 milhões de militantes e 700 jornais diários.

O documento daquele congresso que expressa o método da Frente Única é o de “Tese sobre a tática”. De acordo com este documento, a tarefa mais importante dos comunistas naquele momento era conquistar a influência sobre a maior parte da classe operária. O documento inicia esboçando as conquistas da tática da frente única desde o 2º Congresso. Na Alemanha os comunistas passaram de uma pequena tendência a um grande partido de massas revolucionárias. Na Tchecoslováquia e na Polônia a frente única nas ações de massas e sindicatos permitiu que os comunistas se tornassem os dirigentes do movimento operário. Na França os comunistas conquistaram a maioria do Partido Socialista. Na Inglaterra o crescimento foi tanto que os epígonos do comunismo fecharam as portas do Partido Trabalhista. Por outro lado, toda estratégia sectária em outros países não promoveu outra coisa além do isolamento dos comunistas.

A partir disso o 3º congresso estabeleceu as medidas a serem adotadas pelos comunistas em diferentes países. Nos EUA, o Partido Comunista Unificado da América tinha o dever de buscar se reunir às grandes massas operárias. Na Inglaterra a principal tarefa do Partido Comunista era justamente tornar-se um partido de massas. Neste caso o 3º congresso ressaltava que o trabalho constante e cotidiano dos comunistas no âmbito das organizações de massas, como os sindicatos, é que posiciona os comunistas acima das críticas oportunistas dos reformistas. Isso também era recomendado para a Tchecoslováquia e Alemanha. No caso italiano, o Partido Comunista deveria ligar-se às organizações de massas a fim de deslocar os proletários de suas direções reformistas e protegê-los da influência do fascismo. Já o Partido Comunista Francês, além de dirigir-se às massas que migravam do socialismo para o comunismo, deveria combater energicamente o antiparlamentarismo em suas fileiras.

Toda recomendação de luta pela influência de massas tem como base a disputa nos sindicatos. Esta disputa só poderia ser feita na medida em que os comunistas conectassem os interesses mais imediatos da classe trabalhadora à conquista do poder pelo proletariado. Naquele momento, as tendências e partidos socialdemocratas e centristas representavam a divisão do proletariado a fim de manter suas áreas de influência, enquanto os comunistas representavam a união do proletariado frente à burguesia.

Outro alerta importante deste documento da III Internacional para o combate em frente única diz respeito ao emprego das lutas por reivindicações parciais. Segundo o documento, a vanguarda da classe operária deveria formular, no seio das organizações de massas, os objetivos concretos de combate. Indicando as necessidades vitais da classe trabalhadora, os comunistas poderiam desmascarar as traições das direções. Mesmo quando os socialdemocratas advogam pelas reformas básicas, o fazem sob a tática pacifista de negociação com a burguesia, o que se tornou impossível sob o capitalismo. Logo, toda reforma só é possível na medida em que se rompa com este regime. Este engodo consciente por parte dos reformistas deve ser denunciado.

Em lugar do programa mínimo dos reformistas e dos centristas, a Internacional Comunista coloca a luta pelas necessidades concretas do proletariado, um sistema de reivindicações que em seu conjunto destroem o poderio da burguesia, organizam o proletariado e constituem as etapas da luta pela ditadura do proletariado

Ou seja, além da tática da frente única, é possível identificar aqui o mesmo método empregado por Trotsky na fundação da IV Internacional, o programa de transição.

Neste contexto, o dever dos partidos comunistas era ampliar, aprofundar e unir as diversas lutas de reivindicações concretas. A partir destas lutas unificadas poderia-se propor palavras de ordem mais gerais até a tomada do poder. Estas lutas de massas levariam à organização os elementos mais conscientes do proletariado.

O 3º congresso abordou também a condição dos desempregados na frente única de massas. Os socialdemocratas e os dirigentes reformistas abandonaram os desempregados à assistência social do Estado, caracterizando-os como lumpen-proletariado. O dever dos comunistas seria compreender o fator revolucionário que representava o exército industrial de reserva. Os comunistas deveriam aliar a vanguarda do proletariado aos desempregados a fim de evitar que os elementos mais avançados destes se lançassem em atos isolados e desesperados. Assim, os comunistas elevam a luta sindical de luta de uma categoria à luta de toda a classe.

Para concluir este documento, o 3º congresso resumia as tarefas em cada caso concreto. Onde o partido comunista tivesse influência de massas, deveria incitar ações massivas. Onde o partido comunista não tivesse este tamanho, deveria buscar construir ações com outros partidos de massas e prevenir desde o início a classe trabalhadora sobre as futuras traições destas tendências não-comunistas. E quando se consumar a traição, o partido comunista não pode hesitar em continuar as ações pelas reivindicações imediatas. Além disso, o partido comunista deveria atrair as camadas médias do proletariado e os trabalhadores agrícolas junto das ações dos trabalhadores industriais.

Outro documento que aponta lições para a frente única é aquele intitulado “Tese sobre a estrutura, os métodos e a ação dos partidos comunistas“. Além de apresentar uma rica explicação sobre o papel do centralismo no partido, o texto aborda também as tarefas de propaganda e agitação. O 3º congresso ressalta que a força da propaganda comunista advém do seu conteúdo revolucionário. Assim, voltando-se às massas menos conscientes do dever revolucionário, os comunistas devem buscar fazer-se entender de acordo com a situação concreta desses trabalhadores. Por mais rebaixada que seja a reivindicação local, os comunistas não devem jamais virar as costas aos trabalhadores, mas construir palavras de ordem que conectem estas lutas imediatas com a derrota do regime da propriedade privada.

“[…] em vez de se opor por princípio a todo contrato de salário do trabalho operário, eles devem, antes de tudo, levar diretamente a luta pelas modificações materiais do texto desses contratos, apoiados pelos chefes de Amsterdam [reformistas]. […] Não se deve esquecer que é justamente esse o objetivo dos capitalistas e seus cúmplices de Amsterdam: amarrar as mãos dos operários através de cada contrato de salário. Por isso é evidente que o dever comunista é expor esse objetivo aos operários”.

Ou seja, não se trata de rebaixar o programa das palavras de ordem, mas de buscar elevar o nível de consciência desses proletários, procurando incorporá-los ao movimento revolucionário. Em cada assembleia e conferência sindical o dever dos partidos comunistas é apresentar seus próprios programas e palavras de ordem e enviar seus quadros mais preparados para convencer as massas operárias. Além disso, a propaganda e a agitação comunistas devem ser feitas em qualquer tipo de organização operária, como círculos de estudos, sociedades esportivas, teatrais etc. Em resumo: voltar-se para as massas.

Este documento também apresenta recomendações sobre a luta sindical em cada país. Em todos os casos, o 3º congresso alerta que jamais deve-se permitir que as massas trabalhadoras desiludidas com as direções reformistas se abstenham de participar de suas organizações. Isso representaria um retrocesso no nível de consciência desses operários. O dever dos comunistas é chamá-los a integrarem estas organizações e combaterem as direções traidoras. Para o Partido Comunista Francês, por exemplo, recomenda a colaboração amigável com os melhores elementos do sindicalismo-revolucionário. Deve-se impulsionar a formação de núcleos de militantes do partido nos organismos onde houver pelo menos três deles. E apontar sempre os defeitos das ações dos socialistas revolucionários. Para o caso italiano, recomendava a ação cotidiana e sistemática nos sindicatos, revelando o caráter vacilante dos dirigentes. No caso inglês, todo militante comunista deveria atuar em algum sindicato a fim de orientá-lo em direção ao comunismo. “Nada deve ser negligenciado para estabelecer a ligação mais estreita com as massas”. Nos EUA, em nenhum caso os comunistas deveriam deixar a Federação do Trabalho, ainda que esta fosse um organismo reacionário. Ao contrário, deveriam entrar nos antigos sindicatos e revolucioná-los. Também recomendava a colaboração com os mais avançados da IWW, sem deixar de combater os erros da organização. Já no caso alemão, o partido tinha as melhores condições para conquistar gradualmente os sindicatos. Recomendou-se combater toda estratégia que levasse à saída dos sindicatos, além de resistir às tentativas de isolamento dos elementos comunistas, e assim lutar pela conquista da maioria dos sindicatos.

Já para os sindicatos cuja direção fosse dos comunistas, os chamados Sindicatos Vermelhos, o 3º congresso recomendava duas tarefas: ação direta e frente única nos comitês. Por ação direta, a III Internacional entendia todo tipo de pressão direta exercida pelos operários sobre os patrões e o Estado: boicote, greves, ações de rua, ocupação de fábricas etc. Já a frente única nos comitês dizia respeito à substituição das simples representações sindicais locais pela criação de comitês de fábricas. Para tanto, os comunistas deveriam mobilizar toda a massa de operários na eleição deste comitê, e não restringir a sua composição apenas aos comunistas. E nestes casos o núcleo comunista deveria buscar influenciar esses comitês.

Por fim, o documento aborda expressamente a tática da frente única. A caracterização da questão começa pelo reconhecimento da condição unificada da burguesia e do seu aparato que reúnem em seus recursos armas, dinheiro e as direções traidoras da socialdemocracia. Frente a isso, a Internacional Comunista só dispunha da união da massa do proletariado em frente única. Ante à violência da burguesia, as massas podem paralisar a produção e bloquear o seu acesso às armas. Para esta conquista das massas, os elementos comunistas devem disputá-las sendo sempre a fração mais decidida.

“É preciso mostrar à massa que só os comunistas lutam pela melhoria de sua situação e que a socialdemocracia e a burocracia sindical reacionária estão dispostas a deixar o proletariado na condição de presa da fome em vez de levá-la ao combate”.

Esta união só pode se dar na luta cotidiana, na luta pelos interesses mais elementares da classe trabalhadora.

“Às massas! Formem a Frente única do proletariado”

4º Congresso

Realizado em novembro de 1922, marcava o 5º aniversário da revolução Russa. Os principais temas debatidos foram a atuação da Internacional nos países do imperialismo, e as questões agrária, sindical, de educação, de juventude e a questão do oriente.

No documento de “Resolução sobre a tática da Internacional Comunista“, há importantes lições de frente única. Porém, antes é necessário compreender a caracterização que a Internacional faz do período do 4º congresso. O documento inicia pelo diagnóstico da decadência do capitalismo em seu período imperialista:

O quadro geral da ruína da economia capitalista não é atenuado em absoluto pelas flutuações inevitáveis próprias do sistema capitalista, tanto em suas decadências quanto em sua ascensão. […] O 3º Congresso, bem antes do começo da expansão industrial atual, havia previsto que no futuro mais ou menos próximo, com a precisão possível, como uma onda superficial sobre o fundo da destruição crescente da economia capitalista“.

Além disso, ressalta a situação política internacional marcada pelos movimentos de independência nacional, como na Índia, no Egito, na Irlanda e Turquia. Esses eram exemplos do potencial revolucionário das colônias e semicolônias contra as potências imperialistas. O documento demonstra também a falência dos acordos do pós-Primeira Guerra Mundial, que não só não pacificaram os conflitos entre as grandes potências como também geraram novos antagonismos.

Fato é que apenas os operários da Rússia conseguiram aproveitar o quadro de debilidade das burguesias imperialistas e tomaram o poder. Assim, apesar deste cenário acima descrito, as demais burguesias conseguiram se restabelecer, especialmente graças ao apoio dos reformistas e alavancar uma nova ofensiva contra os operários. Diante disso, onde houver luta de classes, o método a ser empregado é o da Frente Única. “O dever dos partidos comunistas de todos os países consiste em estender e aprofundar as numerosas greves econômicas que irrompem em todas as partes“, desmascarando as traições da socialdemocracia e elevando a independência e a consciência revolucionária das massas.

Outro ponto central do período que foi abordado era a questão da ascensão do fascismo. No momento de efervescência da luta de classes, onde mesmo a pequena burguesia se voltava contra a burguesia, esta não podia mais contar apenas com as forças de repressão regulares. Neste caso, lançou mão da criação de milícias para reprimir toda mobilização operária. A diferença do fascismo para a repressão regular da burguesia, conforme caracteriza o documento, reside no fato de que são elementos armados contrarrevolucionários com base nas massas, no campo e na pequena burguesia e até em setores do proletariado. São movimentos que mobilizam as decepções legítimas com a democracia burguesa para se alimentar. Novamente, para combater o fascismo o 4º congresso também recomenda a frente única.

Existia também a possibilidade de no futuro a burguesia voltar a se apoiar na estratégia “democrática pacifista” e para isso contar com a sustentação dos reformistas unificados. Neste caso também o objetivo dos comunistas continua sendo a conquista da influência sobre a maioria da classe trabalhadora. Nos países do imperialismo esta determinação era mais direta: conquistar a maioria dos trabalhadores dos EUA e Europa. Já nos países semicoloniais, o 4º congresso recomendava criar um embrião do partido comunista que defendesse os interesses gerais do proletariado e, além disso, dar apoio a todo ativismo nacional revolucionário dirigido contra o imperialismo, a fim de tornar-se a vanguarda deste movimento e elevar o nível de consciência acima do nacionalismo. Ou seja, atuar em frente única.

Outro ensinamento importante ainda neste documento diz respeito à caracterização que faz de um governo proletário, as nuances possíveis de um governo operário e como os comunistas devem se comportar em cada caso. O 4º congresso caracteriza um governo proletário como aquele que se empenha em armar o proletariado, desarmar a burguesia e as suas organizações e reunir nas mãos dos operários o controle sobre a produção. Adverte que em certas circunstâncias os comunistas devem formar governos com partidos e organizações não comunistas. Mas apenas na medida em que tiverem a garantia de que as medidas acima serão adotadas pelos governos. Tudo isso, entretanto, precisa ser centralizado pela Internacional Comunista, além de manter o vínculo com as massas operárias e total independência de agitação e propaganda.

A III Internacional alerta também que nem todo governo operário é verdadeiramente um governo proletário, no sentido de não serem instrumentos revolucionários do poder operário. O 4º congresso reconhece as possibilidades de: a) um governo operário liberal (como o que havia naquele momento na Austrália e posteriormente na Inglaterra); b) governo operário socialdemocrata, como o que ocorria na Alemanha; c) governo de operários e camponeses, como havia nos Balcãs e na Tchecoslováquia; d) um governo operário com a participação dos comunistas; e e) o verdadeiro governo operário proletário, que tem na sua direção um governo comunista.  Os governos operários dos tipos a) e b) são governos de coalizão dissimulada entre a burguesia e as lideranças operárias contrarrevolucionárias. São expedientes que a burguesia adota em momentos de fragilidade a fim de mascarar o verdadeiro sentido burguês do Estado. Os comunistas não devem participar desses governos, mas ao contrário desmascará-los diante das massas. Estes governos devem servir aos comunistas como forma de acelerar o processo de decomposição do regime burguês.

Mesmo atuando no combate destas direções, porém, a III Internacional alerta que os comunistas devem marchar ao lado dos elementos da socialdemocracia ainda não convencidos da necessidade da ditadura do proletariado. Os comunistas podem até apoiar um governo operário não comunista, mas apenas na medida em que se utilizam deste espaço para explicar às massas as suas principais tarefas.

O 4º congresso produz também o documento de “Teses sobre a unidade da frente proletária“, onde analisa a situação de cada país e determina as medidas necessárias para implementação da frente única. A análise inicia pela apreciação de que os operários vinculados aos velhos partidos da socialdemocracia não admitem mais os ataques produzidos pelas suas direções reformistas contra os comunistas, porque os reconhecem como a fração mais combativa. Ainda que não estejam conscientes do programa da Internacional Comunista, estes operários propõem a necessidade de uma frente única proletária entre as suas direções e os comunistas. Em resposta os comunistas devem fazer o máximo possível pela unidade no âmbito das ações práticas, ainda que mantenham total independência de suas críticas. Os dirigentes reformistas pregam a unidade, mas praticam o contrário. O dever dos comunistas, mais uma vez, é desmascará-los.

O estudo de cada caso inicia pela Alemanha, onde o partido comunista apresenta a possibilidade de apoiar um “governo operário unitário”, disposto a combater a burguesia. Tal medida é aprovada pela Internacional Comunista com o objetivo de com isso ampliar a influência dos comunistas aos setores mais vastos do proletariado. No caso francês, para combater as traições da CGT, o papel dos comunistas é propor a unidade com as direções reformistas em todos os casos concretos de greve geral e manifestações revolucionárias de massas e assim desmascarar a sabotagem deles. Na Inglaterra, os comunistas devem fazer uma ampla campanha para que o Partido Trabalhista, uma federação de organizações operárias, admita os comunistas em suas fileiras. Na Itália, após ter denunciado veementemente o Partido Socialista, o Partido Comunista deve adotar a tática de unidade proletária nas ações concretas também a fim de ampliar sua influência. Neste caso objetivando ganhar para suas fileiras inclusive os elementos mais revolucionários do anarquismo e do sindicalismo. Nos EUA também é recomendado aos comunistas penetrar nas massas e serem os melhores defensores da unidade proletária no terreno das ações. O principal objetivo neste caso era ganhar os melhores elementos do I.W.W. Na Suíça, a campanha da frente única já surtiu efeito: a burocracia sindical foi obrigada a convocar um congresso extraordinário sobre o tema, o que permitirá aos comunistas desmascarar os dirigentes diante das massas. Todas estas ações, entretanto, possuem uma determinação precisa da Internacional Comunista: que as eventuais ligações com os socialdemocratas jamais retirem a liberdade de crítica dos comunistas.

Especial atenção tem o caso da Suécia, onde o partido comunista atinge minoria no parlamento enquanto os socialdemocratas atingem votação expressiva. Inclusive, tal votação permitia que, com o apoio da minoria parlamentar comunista, os socialdemocratas pudessem formar maioria para instituir um governo. Neste caso a III Internacional é expressa: o partido comunista não deveria omitir-se dessa tarefa. Porém, sem jamais perder sua independência e sua combatividade nas críticas, especialmente porque quanto maior o poder auferido pelos socialdemocratas, maior seriam as suas traições à classe trabalhadora.

Um exemplo que o documento apresenta é do caso russo, onde por mais de uma década (1905-1917) os bolcheviques combateram abertamente os reformistas, os mencheviques. Porém, em vários momentos estabeleceram acordos com eles. Em todas as oportunidades em que os bolcheviques foram empurrados para acordos com os mencheviques, foi porque as massas queriam realmente testar se de fato o programa dos mencheviques lhes afastava da revolução. Os bolcheviques sempre acataram com a frente única, de acordo com os métodos aqui expostos. E os bolcheviques só saíram finalmente vitoriosos porque sempre fizeram a unidade pela base, e assim a experiência prática permitiu aos comunistas que ganhassem os melhores elementos do movimento operário, inclusive das fileiras mencheviques.

Assim, sempre que os elementos da socialdemocracia rechaçam as propostas de ação comum com os comunistas, devem ser denunciados às massas. Mas se, ao contrário, forem obrigados a aceitar a unidade na ação, aí o dever dos comunistas é aprofundar as lutas contra a burguesia. Por fim, para o sucesso da frente única, além de uma forte organização, a Internacional Comunista considera indispensável a exemplar formação teórica de seus quadros.

O documento de “Teses sobre a ação comunista no movimento sindical” analisa as questões sobre este tema naquele período e mais uma vez reafirma a tática da frente única. O 4º congresso reflete a respeito da ofensiva do capital nos últimos dois anos, que resultou em sindicatos debilitados perdendo muitos associados. Além disso, a colaboração permanente entre socialdemocratas e a burguesia levou à decepção progressiva da classe trabalhadora. Como reação o proletariado assume tentativas de criar novos agrupamentos, além da dispersão e resignação de grande número de operários conscientes. Para conservar sua influência, os dirigentes de Internacional de Amsterdam expulsam correntes inteiras de suas organizações de massas. Levam inclusive à cisão em alguns casos para não se verem na condição de minoria. Assim atuaram na França, na Tchecoslováquia e na Alemanha. São meios de debilitar a força revolucionária da classe trabalhadora que se volta contra eles. Deste modo atuaram também os anarquistas, porém sob a bandeira da irreal “autonomia sindical”. A Internacional Comunista alerta que na verdade a suposta autonomia sindical faz parte da doutrina burguesa que receita aos proletários que restrinjam suas lutas a objetivos corporativos, meramente econômicos e não de classe.  O dever dos comunistas diante disso é desmascarar a estratégia neutralista dos anarquistas, que só tem por objetivo dividir o proletariado e como consequência frear as lutas revolucionárias.

Diante de todo este cenário, o dever dos comunistas nos sindicatos é formar um bloco com os operários revolucionários de outras tendências, onde as ações desta unidade sejam coordenadas pelos comunistas. Era a hora, mais do que nunca, de defender ao máximo a unidade sindical, sob pena de que tal fragmentação colocasse os proletários numa situação em que a burguesia poderia retomar as conquistas mais elementares do movimento operário. Assim, por exemplo, aos países onde havia duas centrais sindicais paralelas, como na Espanha, na França e na Tchecoslováquia, o programa dos comunistas era pela fusão destas organizações. Nenhum sindicato reformista poderia se manter sem a presença de um comunista, que deveria estar presente em todas as organizações. Tal unidade deveria se dar com ações de unidade prática em cada país e em cada setor da indústria. Nos lugares onde a expulsão já se processou, o dever dos comunistas é prevenir a dispersão destes elementos, criar sindicatos dos expulsos, com programas concretos e combatendo pela reintegração destes elementos. Em hipótese alguma deveriam permitir que os expulsos ficassem isolados.

O 4º congresso avança também no tema das questões coloniais no documento de “Teses gerais sobre a questão do oriente“. Neste espaço a III Internacional analisa como os acordos realizados após a primeira guerra na repartição do mundo foram atropelados pelo movimento revolucionário de independência de diversas colônias. Assim, o nível de sucesso do movimento operário nestes processos depende da sua capacidade de superar as reivindicações pequeno-burguesas e conduzir um programa proletário. A III Internacional apoia todo movimento nacional-revolucionário contra o imperialismo. Adverte também que acordos provisórios com a democracia burguesa podem ser indispensáveis em certos momentos; contudo, a defesa de reivindicações parciais como a república democrática independente, outorga de direitos hoje privados às mulheres etc., só têm lugar enquanto a correlação de forças não permitir a aplicação do programa sovietista. São bandeiras que neste momento inicial permitirão a fusão das massas camponesas e semiproletárias com o movimento operário.

O documento também aborda a questão da frente anti-imperialista. Na medida em que as burguesias nativas necessitam estabelecer compromissos com o capital estrangeiro, e tais movimentos são prejudiciais para as massas, a palavra da frente única anti-imperialista irá desmascarar as vacilações dos defensores do nacionalismo burguês. Além disso, é fundamental alertar às massas que a revolução colonial só triunfará com a revolução proletária nos países mundial. Nesse sentido, é necessário que estes movimentos devotem todo apoio ao comunismo internacional e à república dos sovietes. Assim os comunistas devem impedir qualquer tentativa de repartição do movimento entre as classes dirigentes locais e o imperialismo; mas buscar garantir para o proletariado o máximo de conquistas que permitam a sua organização e os seus interesses de classe. Ou seja, além da frente única pautada na independência política dos comunistas em direção às massas, visualiza-se aqui a compreensão da necessidade de revolução permanente e do internacionalismo proletário.

Outro alerta é sobre o fato de que a burguesia tenta promover a cisão da classe com a distinção entre trabalhadores nacionais e imigrantes. O dever dos comunistas é reunir ambos no mesmo espaço sindical. Nesse sentido, os operários das metrópoles devem solidarizar-se com medidas concretas nas lutas dos operários coloniais.

Já a “Resolução sobre a internacional das juventudes comunistas” aponta a necessidade de frente única entre os trabalhadores jovens e adultos. A III Internacional alerta que a burguesia se utiliza da juventude para rebaixar salários, furar greve e desempregar os adultos. A burocracia sindical reformista colabora para este cenário.

“A Internacional Comunista proclama a necessidade absoluta da criação da frente única entre a juventude operária e a classe operária adulta. Exorta os partidos comunistas e a todos os operários do mundo a apoiar energicamente as reivindicações da juventude operária na luta contra a ofensiva do capital, contra o militarismo burguês e contra a reação”.

Nesse sentido, os comunistas devem apoiar todo movimento de juventude, garantindo sua participação na vida política dos partidos. A juventude comunista por sua vez deve voltar-se para as massas da juventude operária, por meio da sua propaganda econômica, das ações concretas nos problemas cotidianos da juventude, e dirigindo a juventude em apoio à luta da classe operária adulta. A III Internacional expressa o combate para permitir que os jovens acessem os sindicatos e que suas reivindicações estejam inseridas nas reivindicações operárias como um todo.

Herança da III Internacional

Sob a direção de Stalin, a III Internacional torna-se um instrumento da política externa soviética rebaixada teoricamente ao nível de engodos como a teoria de “socialismo em um só país”, ou das “revoluções por etapas”. Além disso, o aparato da internacional também foi utilizado para  concretizar a perseguição e assassinato de Trotsky, e teve suas atividades encerradas quando Stalin rifa a III Internacional em um acordo com Roosevelt no pós-Segunda Guerra Mundial.

Um dos exemplos mais flagrantes desta degeneração que destruiu o principal organismo internacional da classe trabalhadora mundial foi o apoio da direção da III Internacional estalinizada aos acordos com os reformistas na Inglaterra que enterraram a greve geral de 1926. Há também o caso chinês, onde no explodir revolucionário dos anos 1925 e 1927, ao invés de o partido comunista chinês ser orientado a voltar-se para as massas, foi instruído a submeter-se ao partido nacionalista burguês Kuomintang. Essas são flagrantes rupturas com as determinações do 4º congresso.

Em oposição a esta degeneração, a Oposição de Esquerda, liderada por Trotsky a partir do exílio, sempre pregou pela frente única, pela revolução permanente e pelo internacionalismo proletário. Os casos mais exemplares foram as recomendações de Trotsky ao Partido Comunista Alemão de frente única com os socialdemocratas a fim de conter a ascensão do nazismo. Pode-se citar também as recomendações de Trotsky para o caso Espanhol, que  foram no mesmo sentido de frente única. Por fim, no documento de fundação da IV Internacional, o Programa de Transição, pode-se visualizar a continuidade dos métodos de construção adotados pela III Internacional em seus 4 primeiros congressos e que foram brevemente expostos neste texto.