Malucos, cachaceiros e outros apelidos mais

Lula, em entrevista à Folha de São Paulo, declarou que o “Brasil é governado por um bando de maluco”. Bolsonaro, respondendo, declara que “pelo menos não é um bando de cachaceiro”. E, se olharmos um pouco com atenção, os dois governos (Lula e Bolsonaro) parecem se assemelhar muito à descrição feita.

O governo Bolsonaro parece tomar uma série de decisões irrefletidas que geram a ira nos analistas burgueses e em parcelas cada vez maiores da burguesia. Já no dia 30 de abril, o editorial do Estadão criticava o governo. Com o título de “O risco Bolsonaro”, alertava que as declarações e medidas do governo (na Petrobras e no Banco do Brasil) destruíam o valor de mercado dessas empresas e ameaçavam os próprios bancos privados, que poderiam ser obrigados a reduzir juros como fizeram nos tempos de Dilma. O editorial termina com “Ou o presidente nega seus atos ou é incapaz de entender as próprias palavras. Qual dessas hipóteses é a mais preocupante?”.

Delfim Neto, ex-ministro da ditadura militar e ex-conselheiro de Lula, que provavelmente será denunciado como “marxista cultural” – uma piada de extremo mau gosto dado a sua ligação exatamente com os governos de torturadores que Bolsonaro tanto admira –, explica em sua coluna do dia 1º de Maio na Folha (intitulada Direita Incultural):

O encarregado da Educação Nacional insistiu, sob o olhar aprobativo do presidente, numa proposição inimaginável. Disse ele, “imagine uma família de agricultores cujo filho entrou na faculdade e, quatro anos depois, voltou com o título de antropólogo”, coisa absolutamente inútil. O que sugeriu o John Dewey tupiniquim? Que “o filho deveria ter estudado na faculdade de medicina veterinária”, coisa prática. Com tal aprendizado poderia prosseguir e melhorar a atividade de seu pai, na qual seu avô revelou ter o mesmo talento do seu tataravô!

Mas, afinal, que sociedade é essa? Talvez uma lamarckiana, onde o DNA, pela repetição geracional, reproduziria “homens-agrários-naturais”, condicionados geneticamente, como se reproduzem as “formigas operárias”.

O tom contra Bolsonaro vem subindo na crítica da burguesia e isso se reflete em um dos “editoriais temáticos” do mesmo Estadão, que se desespera com a possibilidade de explosões no campo decorrentes da proposta do presidente de absolver sumariamente os proprietários de terra que atirarem em “invasores”.

Bolsonaro dá azo para que se entenda seu discurso como uma carta branca para matar no campo em nome da defesa da propriedade. É uma enorme irresponsabilidade não refletir sobre os desdobramentos que tal despautério pode ter. Não se define o que é ou não é um ato cometido em legítima defesa pelo que diz o presidente da República. Que a temperança não falte ao Legislativo quando, e se, o tal projeto de lei chegar ao Congresso.

Jair Bolsonaro demonstra não compreender os limites do cargo que ocupa, tampouco os desdobramentos de tudo o que ele diz ou escreve desde sua eleição. Falta-lhe ainda, e isso é tanto ou mais grave, o conhecimento do papel que as instituições desempenham em um Estado Democrático de Direito como é o Brasil.

O problema para a burguesia é que esta é a verdadeira face de sua representação política: se a covarde burguesia nacional, totalmente submissa à burguesia imperialista e tendo que fazer face a uma classe operária forte, não consegue achar caminhos para a guerra, um segmento da pequena burguesia, inculto e estúpido, procura abrir caminhos a golpes de marreta para destruir a classe operária.

A reação do PT (secundada pelo PSOL e PCdoB), que procura de qualquer forma um acordo com a “burguesia democrática”, parece realmente a de um “bando de cachaceiro”. Ou seja, busca fazer o que a burguesia quer, mas repete aos altos brados que está defendendo a classe operária, enquanto força um acordo que desmonta uma fábrica da Ford no Brasil e desemprega os seus operários e ao mesmo tempo tenta negociar emendas no projeto da Reforma da Previdência em discussão no Congresso.

Mas este jogo tem limites, porque o ataque cerrado de Bolsonaro, onde as frases têm resultados (a perda de valor das estatais “favorece” a sua venda, desde que não ultrapasse alguns limites, as universidades e escolas estão ai para serem privatizadas etc) faz com que na base e no alto a indignação possa ir muito além do que imaginam os vãos arquitetos da “velha” e da “nova” política.

Embaixo, a raiva se expressa nos cânticos e gritos do carnaval e, em cima, começam a aparecer fissuras quando, por exemplo, o jornalista Luiz Nassif escreve um artigo no 1º de Maio intitulado “É hora de parar Bolsonaro”, pedindo o impeachment do Presidente.

Sim, Nassif não é um revolucionário, toda a sua argumentação é “em defesa da democracia”. Mas as porteiras começam a se abrir e a palavra de ordem que a Esquerda Marxista tem levantado, “Fora Bolsonaro”, pode galvanizar as massas quando os de cima não estão se entendendo.

O sonho de Nassif e de outros é que Mourão, defensor da ditadura e de medidas duras contra os operários seja mais “democrático” que Bolsonaro. Nós, desde já, alertamos: o que pode derrubar Bolsonaro não é uma articulação nas cúpulas, mas as massas nas ruas. E nos dirigimos à vanguarda que está se construindo neste combate para organizar suas forças e preparar as massas para derrubarem junto com Bolsonaro todo o conjunto podre de instituições que o sustentam.