O candidato Mercadante e a cultura em São Paulo

Senador procurou contemplar a fala geral da necessidade de políticas para cultura. Mas é preciso avançar do atual estágio de cultura terceirizada e privatizada para uma política pública de cultura comprometida com as necessidades da classe trabalhadora.

Realizou-se no último dia 13 de julho, no Centro Cultural Rio Verde, em São Paulo, um encontro do senador e candidato ao governo de São Paulo pelo PT, Aloísio Mercadante com artistas e movimentos culturais.

Evento mal organizado, a começar pela escolha do espaço, de difícil acesso, mal servido por transportes públicos e ainda pequeno e insuficiente para acomodar a todos os presentes.

Talvez os organizadores tenham subestimado o potencial do tema cultura, que certamente interessa a muito mais pessoas que eles pretendiam atingir.

Havia representantes do movimento Hip Hop, das rádios comunitárias, de cooperativas e associações, ongueiros e poucos militantes que ajudaram a construir o PT.

As falas iniciais dos presentes abordavam expressões vagas e genéricas como “necessidade de políticas públicas de cultura”, sem especificar o que seriam tais políticas.

Em uma das poucas falas com conteúdo político, o companheiro Jerry, da Associação Brasileira das Rádios Comunitárias, queixou-se da criminalização dos movimentos sociais e populares, questão que não foi sequer tocada na resposta do candidato.

Membros do movimento Hip Hop aproveitaram essa fala para queixar-se da falta de espaço na mídia tradicional, que exige “jabá” para execução das músicas dos artistas e não abre espaço para o movimento. O jabá consiste simplesmente em uma quantia em dinheiro paga para às rádios pelas gravadoras, para que essas rádios executem música ou artista determinado pela gravadora em sua programação. Faltou levar a discussão até o fim para entender que tal prática se dá porque as rádios consistem simplesmente em meios de produção de comunicação privados, logo nunca atenderão qualquer interesse que não seja da classe que detém os meios de produção.

Em outro momento, foi criticada a lei de renúncia fiscal, alegando que a mesma não contempla os trabalhadores da área cultural, apenas os interesses de grupos privados. A lei de renúncia fiscal consiste em um mecanismo pelo qual uma empresa, ao invés de pagar impostos (dinheiro público), pode investir em algum produto que possa ser definido enquanto produto cultural. O mecanismo gera incríveis distorções, a começar da transferência do poder de decisão do que merece investimento de dinheiro público (o dinheiro não é das empresas, é dinheiro de imposto que deixa de ser arrecadado) para a esfera privada e não para o setor público. Em poucas palavras: é o Estado transferindo uma procuração para as empresas explorarem uma área (no caso, a cultura), concomitantemente omitindo-se acerca da criação de políticas públicas efetivas na área, que permitam o tratamento da cultura enquanto direito básico de todo e qualquer cidadão.

A resposta do senador foi de que este mecanismo não deve acabar. A justificativa seria que já há tão poucos recursos públicos para a cultura, que as leis de incentivo fiscal seriam positivas, mas deveriam ser “disputadas” pelos presentes.

Fala contraditória com o compromisso assumido no início de sua fala, de implementar ao longo do seu governo a dotação orçamentária fixa para a secretaria de cultura, adiantando-se à aprovação da PEC 150, que destinaria aos estados da federação, 1,5% dos impostos para as pastas de cultura. Todos sabemos que a falta de recursos para a cultura deve-se a falta de dotação orçamentária própria e fixa, além dos constantes contingenciamentos de verba sofridos por estas pastas, porque o governo brasileiro tem preferido salvar os capitalistas e banqueiros da crise ao invés de investir em serviços públicos de qualidade em educação, saúde, moradia, transportes e cultura. A PEC 150, que destina ainda 2% para o ministério federal de cultura e 1% para as pastas de cultura do município, é uma das muitas emendas constitucionais que se encontra parada no senado e congresso, pela falta de comprometimento do governo federal em aprová-la. Assim como a mudança da jornada de trabalho para 40 horas semanais, parada no senado federal já há dezoito anos! Questão que também deve ser discutida em um programa de cultura, ou alguém tem dúvida que os trabalhadores precisam de tempo livre para poderem usufruir e produzir cultura ? Enquanto isso, pacotes de ajuda a banqueiros, redução e isenção de IPI (imposto sobre produtos industrializados) para as montadoras, sem exigência de qualquer contrapartida, são aprovados em caráter de urgência.

Em nossa intervenção, a Esquerda Marxista reforçou a necessidade de acabar com as leis de renúncia fiscal, uma vez que elas não atendem interesses dos trabalhadores da cultura, nem dos demais trabalhadores de outras categorias, apenas aos interesses de alguns poucos grupos privados, como os bancos que montam institutos e centros culturais estampando e propagando suas marcas com dinheiro que, se fosse para os impostos, permitiria o atendimento dos serviços públicos de qualidade não apenas na cultura, mas na educação, saúde e transporte público.

Ressaltamos que, se o compromisso de implantar a dotação orçamentária fixa na secretaria de cultura em 1,5% do orçamento constitui um avanço, o indicativo da UNESCO é que este valor deva ser, no mínimo, 2%. Necessário se faz avançar ainda mais! Ressaltamos que a renúncia fiscal não constitui uma política pública mas uma forma de privatização da cultura, um mecanismo que favorece apenas o setor dos empresários burgueses, distorção que poderia ser corrigida através do investimento direto do Estado em iniciativas artísticas e culturais de interesse público, investimento que pode se dar através da existência de recursos para a área, com a dotação orçamentária fixa.

Cobramos também uma alternativa a atual política de governo do estado de São Paulo para a área de cultura, que vem privatizando os equipamentos de cultura (museus, teatros, escolas de música, dança, artes em geral, oficinas e casas de cultura, por exemplo) e os corpos estáveis do estados (orquestras, corais, corpos de balé, etc.), ao passar a gestão dos mesmos para associações ou fundações de direito privado, OSs e ONGs, através de contratos diretos de convênios, sem qualquer tipo de licitação. Essas privatizações, sobre a forma de terceirização dos serviços públicos, têm precarizado contínua e progressivamente as condições de trabalho de todos os trabalhadores da cultura e afetado negativamente todos os serviços oferecidos aos cidadãos nessa área. Um triste exemplo desta política é o tradicional festival de inverno de Campos do Jordão, cuja gestão foi transferida para a Associação Santa Marcelina, ligada a uma faculdade de música privada. Essa associação hoje tem contratos para gerir também escolas de música, como a Universidade Livre de Música Tom Jobim e o Conservatório Estadual de Tatuí e caminha para o monopólio da exploração do campo da educação musical no estado de São Paulo.

Ao final de nossa fala, saudada e aplaudida pelos presentes, entregamos ao senador o manifesto dos trabalhadores da cultura da Esquerda Marxista do PT, com nossas propostas concretas para a área, entregue ao senador e a várias pessoas presentes. O mesmo segue transcrito abaixo.

Em sua fala de resposta o senador evitou responder diretamente às questões que apresentamos, preferindo falas que contemplassem algumas demandas corporativas de outros presentes. Também chamou a todos para “combater” a mídia tradicional através da internet, dizendo que “a militância inteligente hoje se faz através de ferramentas como o twitter, não mais panfletando nas ruas”. O problema que o senador não atentou é o de quantas pessoas hoje no Brasil tem acesso à internet, o que demonstraria quantas e quais pessoas podemos atingir por estas ferramentas.

Nós, militantes que ajudamos a construir o PT desde sua fundação e ainda lutamos por um partido dos trabalhadores não comprometido com a burguesia, sabemos que a militância tradicional, nas ruas e no corpo a corpo, absolutamente exclui o uso de novas tecnologias e meios de difusão, mas sabemos muito bem para onde essa exclusão da militância organizada das campanhas tem nos levado. Combatemos essa política de alianças do PT com os partidos burgueses, que impede que o partido se comprometa com um programa de governo com a classe trabalhadora, promovendo políticas públicas de educação, saúde, cultura e transporte para a classe trabalhadora, aquela que produz de fato toda a riqueza deste país.

MANIFESTO DE TRABALHADORES DA CULTURA EM APOIO ÀS CANDIDATURAS DE ROQUE E MIRANDA

Nós, trabalhadores da cultura que assinamos este manifesto, declaramos apoio às candidaturas petistas de José Carlos Miranda para deputado estadual (13633) e Roque Ferreira para deputado federal (1328), por serem candidaturas que entendem os mandatos parlamentares como pontos de apoio à luta dos trabalhadores, e na área da cultura, desde já se colocam ao lado da categoria na luta por suas reivindicações.

Nas eleições desse ano, nosso voto é também para os demais candidatos do PT (Dilma, Mercadante e Marta). Os patrões e seus candidatos querem aprofundar sua política de privatização, sucateamento dos serviços públicos e ataques aos direitos dos trabalhadores. É hora de votar no PT para barrar a direita!

A luta dos trabalhadores da cultura deve seguir sempre unida à luta de toda classe trabalhadora. Queremos condições dignas para o exercício de nossa profissão e que o acesso à cultura não seja um privilégio de poucos, mas o direito de todos garantido pelo Estado. Nossas propostas seguem resumidas abaixo e são o norte do programa de cultura dos candidatos Roque e Miranda:

  • Dotação orçamentária fixa para a cultura e nunca inferior ao indicativo da UNESCO (2% do orçamento geral) para as pastas de cultura de municípios, Estados e federação. Criação de pastas de cultura e capacitação de pessoal qualificado, onde não existem.
  • Uso e destinação consequente das verbas garantidas no orçamento, através de formulação de plano de cultura enquanto política de Estado e não de governo. Pela formulação de programas garantidos por lei, executados por meio de editais democráticos e transparentes.
  • Recursos, condições técnicas e materiais aos trabalhadores da cultura prevendo a criação de corpos estáveis, assim como a manutenção dos já existentes, com contratação por meio de concursos públicos. Sempre através dos recursos públicos, comprometendo o Estado com políticas culturais.
  • Revitalização dos equipamentos culturais (teatros, museus, casas de cultura, etc) existentes e mapeamento de espaços ociosos para ocupação dos mesmos enquanto equipamentos culturais de utilidade e interesse público.
  • Por um governo do PT comprometido com os trabalhadores da cultura e de todas as categorias, sem alianças com patrões e seus partidos! Por um governo socialista dos trabalhadores!

    Pelo fim das leis de renúncia fiscal! Investimento direto do Estado em cultura já! Contra a privatização da cultura! Mais cultura, menos mercadoria!

    Pela responsabilidade do Estado de prover o acesso à cultura, quer na fruição quer na produção, enquanto direito de todos os cidadãos, assim como educação, saúde e moradia!

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