Como que um presente de grego natalino, o governo João Dória (PSDB), às vésperas do fim de ano, lança dois ataques frontais aos servidores de São Paulo. O primeiro deles é a reforma da previdência estadual que já tramita na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP). O segundo, tão violento quanto, prevê mudanças que poderão piorar ainda mais o já lamentável plano de carreira dos professores.
Em meio a tudo isso, a APEOESP, sindicato oficial dos professores do estado de SP, deflagra “greves” todas as terças-feiras e nos dias em que ocorrer votação. Frente a tamanhos ataques e a tão afrontosa proposta de luta, qual deve ser a resposta da categoria? Antes de tudo, é preciso compreender a amplitude dos ataques.
A Reforma da Previdência
A Reforma da Previdência estadual tramita na ALESP por meio da PEC 18/2019 e do PLC 80/2019. Nestes dois documentos o que se prevê é, basicamente, a proposta de Bolsonaro já aprovada para os servidores federais:
Idade mínima: de 65 anos para homens, 62 para mulheres; 60 para professores e 57 para professoras (5 anos a mais para homens e 7 anos a mais para as mulheres, maioria absoluta na categoria docente da rede).
Contribuição: 40 anos para conseguir 100% da aposentadoria.
Redução do valor da aposentadoria: se antes o servidor receberia pela média salarial dos últimos cinco anos, agora recebá pela média dos 30 anos.
Aumento da contribuição previdência: de 11% para 14%, ou seja, confisco de mais 3% do nosso salário.
Limite de aposentadoria: o máximo aceito será o limite do INSS.
Acúmulo de aposentadoria: a aposentadoria é reduzida a quase nada. Vejas as simulações: Aposentadoria de até 1 salário mínimo, recebe 80%; aposentadoria de 1 a 2 salários mínimos, recebe 60%; aposentadoria de 2 a 3 salários mínimos, recebe 40%; aposentadoria de 3 a 4 salários mínimos, recebe 20%; aposentadoria acima de 5 salários mínimos, recebe 10%.
Pedágio: via de regra, o governo cobrará pedágio de 100% do tempo que falta para se aposentar. Alguns casos podem se aposentar antes ou depois, mas para aqueles que vão entrar ou que entraram recentemente, o sistema de pedágio não valerá de nada e o servidor deverá sofrer todas as mazelas propostas pelo governo.
Em suma, Dória é a expressão exata do governo Bolsonaro no Estado de SP, aplicando o mesmo projeto, com as mesmas propostas contra os servidores.
“Nova carreira”
Ainda aguardamos o Projeto de Lei do governo para termos mais detalhes sobre essa medida. Porém, um ponto ao menos é certo: o governo vai excluir gradativamente a remuneração por vencimento, substituindo-a pela remuneração por subsídio. E o que isso significa?
O governo argumentará que a diferença entre vencimento e subsídio é formal, sendo o primeiro resultando em uma folha de pagamento complicada e a segunda sendo mais “moderna” e simples. Porém, não é bem assim.
Outras categorias no país, como a do judiciário federal, e dos servidores municipais em alguns setores, já recebem por subsídio. No caso dos servidores estaduais, em especial professores, isso significa abrir mão de quinquênios, sexta-parte, gratificações (inclusive por trabalho noturno), auxílio deslocamento (ALE), evoluções acadêmicas e não acadêmicas (verticais), evoluções por prova de mérito (horizontais – mesmo que sejamos contra elas), adicional produtividade dentre outros. Caso o professor aceite a adesão à proposta do governo, tudo isso desaparecerá da sua folha de pagamento, sendo substituído por uma parcela única, o subsídio.
O governo, obviamente, argumenta: no plano de carreira atual você chegariam a, no máximo, pouco mais de 7 mil, enquanto na nova proposta poderiam alcançar 10 mil reais em 30 anos, com evoluções bienais. E para tornar mais atrativa a proposta, o governo aumenta o valor da remuneração, quando em forma de subsídio de R$ 2.585,00 para R$ 3.500,00, podendo chegar a 4 mil reais em 2022. Obviamente isso faz crescer os olhos frente ao mísero salário base que, líquido, chega a pouco mais de 2 mil reais para uma jornada de 40 horas. Porém, não é hora para imediatismo.
É importante ter claro que os acréscimos salariais por tempo de serviço são direito conquistados e garantidos, inclusive para a aposentadoria. Na proposta do governo, em 15 níveis, não sabemos o grau de rigidez e os critérios avaliativos que serão utilizados. Assim, a evolução pode exigir algo inalcançável para a maioria da categoria, tornando os 10 mil possíveis somente a uma ínfima parcela da categoria. Ou seja, abrir mão das vantagens por tempo de serviço será abrir mão de direitos duramente conquistados e ficar à mercê da boa vontade do governo Dória para conseguir avançar na carreira.
Outro ponto: nos Projetos de Lei e e na Emenda Constitucional, o governo estabelece como limite o máximo para a aposentadoria o teto do INSS. Isso significa que, mesmo que um servidor chegue ao pico da carreira, se aposentará com pouco mais que a metade disso. Isso na fase da vida em que mais precisará. Em suma, essa proposta é mais uma fraude, desta vez pintada em cores mais vivas, mas que, essencialmente, significa mais um ataque estrutural aos professores.
Nossa luta e a APEOESP
A APEOESP é dirigida pela Articulação Sindical do PT, que também dirige a CUT. Em todo o ano de 2019, esta direção se dedicou o mais avidamente possível para derrotar o grito das ruas por FORA BOLSONARO. Em todos os atos e paralisações contiveram como puderam a radicalização da base. Infelizmente, correntes da oposição seguiram o mesmo caminho. Em seu lugar, chamaram o Lula Livre, agora temporariamente concedido pela burguesia, mas para que ele sirva de estepe em caso de explosão social. E já começou em seu pronunciamento dizendo que não é hora de dizer “Fora Bolsonaro” e que devemos respeitar o mandato fraudulento desse candidato a Bonaparte.
Somado às traições deste ano, temos o histórico de derrotas sindicais da APEOESP que trouxeram ainda mais descrédito para a entidade. Porém, não acaba por aí. A direção da entidade, impulsionada pelo mandato parlamentar da presidente Bebel, tem direcionado a luta para o terreno institucional, tirando a luta do nosso terreno, das escolas, das ruas, e direcionando para uma efêmera pressão parlamentar. Nada mais equivocado.
Depois de aprovar as “Assembleias permanentes”1 em Outubro, a direção da APEOESP “INOVA” de novo nas táticas de traição à categoria, criando “a greve de um dia permanente”. Há que se ter muita imaginação e ingenuidade política para não perceber que isso é preparar mais e maiores derrotas futuras. É uma proposta de desmobilização.
A direção, se quisesse mobilizar, convocaria paralisações semanais com o intuito de impulsionar a categoria e aumentar a adesão às assembleias durante a semana, até conseguir deflagrar uma greve com apoio da base. Na pior das hipóteses, poderíamos começar 2020 em greve a partir da preparação feita nessas paralisações neste fim de ano. Porém, mobilizar e organizar vitórias da categoria não são objetivos da direção da APEOESP há tempos.
Assim, nesta trágica situação da entidade, não é de estranhar que a base da categoria procure soluções individuais para seus problemas, ao invés das coletivas. É por isso que a proposta ardilosa do governo Dória ganha espaço em nosso seio. Porém, é preciso ter claro: não há saída individual para a classe trabalhadora.
Como bem explicou Lenin, a única arma da classe trabalhadora por sua emancipação é sua organização. Nossa saída só pode ser coletiva. Assim, apesar dessa direção traidora, é nosso dever nos organizar e lutar em defesa dos nossos direitos e pela derrubada daqueles que querem destruí-los. E devemos exigir da APEOESP todos os meios necessários para que isso ocorra.
É por essa razão que o coletivo Educadores pelo Socialismo defende o FORA BOLSONARO e o FORA DÓRIA. A APEOESP deve abraçar essas bandeiras em defesa de nossos direitos, e aglutinar mais categorias, também sob ataque, a partir dessa linha. Além disso, deve mudar completamente o ângulo de intervenção e se voltar, não ao putrefato parlamento burguês, mas à classe trabalhadora, aos professores, pais e alunos. Organizar pela base, propor as bandeiras corretas e avançar na luta pelo socialismo, esta é a única forma de mobilizar e impor derrotas à burguesia e seus representantes até sua derrocada final.
Essa é a nossa luta, junte-se a nós!
1 A direção da APEOESP aprovou as assembleias permanentes, que seria uma autorização para se efetivar uma assembleia ao sinal do primeiro ataque. Uma medida estúpida, pois é dever da direção do sindicato convocar assembleias sempre que o governo atacar a categoria. Não seria necessária nenhuma deliberação quanto a isso. Ou seja, desvelado o sentido, só sobra o engodo, que é o significa essencial desta “inovadora” proposta.