A indignação paira no ar e qualquer ato ou faísca pode levar a uma explosão. Afinal, Bolsonaro acumula declarações e atos que deixam a burguesia muitas vezes em pânico, com medo da explosão. Suspender a compra de uma vacina do coronavírus (que ainda não tem aprovação, diga-se de passagem), preparar a privatização das Unidades Básicas de Saúde em plena pandemia, dizer que vacina obrigatória só para o seu cachorro e por aí vai. Enquanto isso, os mortos se acumulam e devem chegar a 160 mil ainda esta semana.
Sim, a burguesia, a nível mundial, tenta conter as explosões revolucionárias apelando para eleições ou para a “participação popular” em plebiscitos. Em alguns casos, onde a fraude ultrapassou o limite, como em Belarus, as greves e manifestações não param, apesar da repressão.
Em outros, como na Colômbia, Nigéria, Tailândia, no momento, não há uma perspectiva eleitoral. No Equador, seguramente a burguesia se pergunta se consegue adiar a crise e deixa-la ser “resolvida” nas eleições de fevereiro de 2021.
Olhando o panorama em seu conjunto, podemos dizer que a onda revolucionária de 2019, parcialmente contida depois da crise do coronavírus, volta com força. Mas a burguesia, que antes se interrogava sobre aumentar a repressão ou conciliar, tenta novamente a cartada da conciliação e chama seus velhos parceiros — os reformistas de todas as cores e espectros — para ajudá-la nesta tarefa.
Assim, depois de Evo ter renunciado por um golpe de estado na Bolívia, o seu partido volta a ganhar as eleições. Mas as negociações – das quais os detalhes não vieram a público – levaram à presidência o ex-ministro da economia. Este frisa em suas entrevistas que Evo não participará de seu governo e Evo, para ajudar a tranquilizar tudo, declara que agora é somente um agricultor como sempre foi.
Chile – a saída “institucional”
No Chile, a situação é mais complexa. As manifestações de 2019 não foram contidas pela crise do coronavírus e continuaram em 2020. A saída do “plebiscito” nunca foi o pedido das massas, que queriam a derrubada do governo. Este, por sua vez, esperava ser derrotado, mas não esperava o número final (quase 80% de votos por uma nova constituição).
De qualquer forma, o conjunto dos reformistas, principalmente sindicatos e os partidos socialistas e comunistas, aderiram à saída “institucional” de uma nova Constituinte. A principal reivindicação desses partidos foi a “paridade” entre homens e mulheres na nova assembleia. Foi deixado de lado, propositalmente, a exigência de fim do governo Piñera com a instalação da Constituinte e também do fim de todas as leis de repressão. Além disso, a direita terá poder de veto na nova constituição caso obtenha um terço dos votos. Ou seja, tudo foi feito para impedir que a maioria acachapante de votos contra o regime e contra o governo consiga se expressar na nova Constituinte.
EUA – da revolta contra o racismo às eleições
As eleições presidenciais nos EUA não têm o princípio de “um homem, um voto”. A maioria é “acertada” por um colégio eleitoral que representa os diferentes estados. E dois partidos, Democratas e Republicanos, representam normalmente a burguesia.
Somente durante o início do século 20 que um partido socialista conseguiu bons resultados em termos eleitorais. Hoje, a maioria dos ditos “socialistas” ou “comunistas” procuram seu local dentro do Partido Democrata, como Sanders (que surgiu como “independente” e “socialista”). O Partido Democrata tem o voto e a confiança da maioria dos sindicatos. Mas, nas últimas eleições, uma boa parcela da classe trabalhadora votou em Trump para expressar seu descontentamento com o partido e também com os sindicatos, que, em geral, seguem fazendo acordos favorecendo os patrões. A classe operária não tem um partido que a represente enquanto tal, ainda que reformista.
É nesta situação que se desenvolve o atual combate eleitoral, enquanto paira no fundo a revolta contra o racismo, que é continuamente reacendida por atos como o último assassinato de um homem negro com transtorno mental, com 11 tiros por dois policiais em Filadélfia.
Paradoxalmente, a revolta das massas, se conseguir ser direcionada pela burguesia para as urnas, pode levar a um estado em que as explosões serão maiores depois destas. Uma grande maioria acha que Trump prepara-se para fraudar as eleições, inclusive por indicar uma juíza para o Supremo Tribunal as vésperas das eleições. O número de votos antecipados supera em muito os resultados de qualquer outra eleição dos EUA. E até no Texas (um dos estados mais reacionários) o Partido Republicano arrisca-se a perder as eleições. Caso Trump ganhe, ainda que sem fraude, o seu governo será um governo de crise.
E se Biden ganhar, a situação não melhora para a burguesia. Ainda que este possa se esconder atrás do judiciário que tem maioria de direita pró-Trump, as ilusões se transformarão em reivindicações e estas em manifestações e greves massivas. A onda revolucionária chegou nos EUA e nada indica que as eleições poderão refreá-la, apenas podem adiar.
De volta ao Brasil
A “esquerda” como um todo (para chamar pelo nome correto, os reformistas), PT, PSOL, PCdoB, sindicatos, procuram um acordo com a direita democrática para se ter um governo mais “palatável”, menos instável.
O problema é que as contas do coronavírus começam a chegar e elas são altas. Como pagar a dívida, depois das doações de trilhões de dólares para os bancos de diferentes formas (compra de títulos podres, redução do depósito compulsório etc)? Somente com suor e lágrimas da classe trabalhadora.
A emissão de dinheiro encontra seus limites, e a queda do valor do real frente ao dólar, que já chega a quase 12% este ano, tem sua repercussão, queira ou não a burguesia e seus economistas, na inflação. Ou seja, no aumento generalizado de preços (ver artigo nesta edição).
Mas, muitos se perguntam, por que não chegamos ao Chile? A burguesia faz esta pergunta muito mais que a classe operária, que olha com desconfiança todo chamado da direção que reflui assim que cresce o movimento. E como a burguesia teme qualquer marola que balance o navio, quando o líder do governo sugere uma nova constituinte, é atacado por todos os lados.
E, se olharmos bem, ele fez exatamente o que a esquerda deveria ter feito no Chile. Mirou, não na forma, mas no conteúdo: temos que acabar com uma constituição que tem muitos direitos. Para seu azar, o momento da burguesia é outro, e a cartada da conciliação é o jogo da vez, ao invés da rodada de repressão pura e simples.
As eleições municipais não resolverão nada, e disso têm consciência tanto os trabalhadores como a burguesia. Em poucos lugares os trabalhadores e jovens procuram uma saída, ainda que esta seja um conciliador notório como Boulos em São Paulo. Mas os grandes lances da luta de classes ainda estão por vir.
E para preparar estes lances, para organizar a luta dos trabalhadores e jovens, convidamos a todos que querem combater pelo socialismo e pelo comunismo a se unirem à bandeira do marxismo, na Esquerda Marxista e na CMI.