Criado em novembro de 2014, o Movimento Brasil Livre (MBL) atingiu certa popularidade durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff e, mais recentemente, nos casos da exposição QueerMuseu, financiada pelo Santander, e da performance de um artista nu no Museu de Arte Moderna (MAM). Contudo, não são apenas as pautas “polêmicas” que explicam a fama desse movimento. Além do suposto mistério que envolve o seu financiamento, o MBL possui um claro programa de defesa do capital. Kim Kataguiri, um dos seus membros, apresentou uma parte desse programa ao jornal burguês El País: “Acreditamos em uma agenda de país que trate da diminuição da máquina pública, defenda a política de privatizações, proponha a independência do Banco Central, reformas como a reforma trabalhista, reforma previdenciária, reforma tributária; uma revisão do pacto federativo, entre outros”. O conjunto de suas propostas foi apresentado no documento elaborado pelo Primeiro Congresso Nacional do MBL, em 2015.
Mas é apenas isso que explica o crescimento do movimento? Não. O dinheiro, que não tem sua origem revelada pelos membros do MBL, garante a divulgação do programa usando uma propaganda agressiva através de um discurso populista recheado de mentiras. No “Manifesto por um Brasil Livre”, falam que são “BRASILEIROS” buscando eliminar as diferenças entre o que passa fome e o que quer criar uma ração com as sobras das empresas alimentícias para os famintos. Também alegam que lutam e torcem pelo Brasil “independente de qual seja o governo”, o que obviamente é pura demagogia. Nos vídeos de seus representantes, discursam como se estivessem falando para o povo e em defesa de seus interesses, mas não consideram nesse povo a imensa maioria de trabalhadores que serão afetados pelas Reformas da Previdência e Trabalhista, nem os professores que, além dos direitos retirados pelas reformas, serão calados caso a Lei da Mordaça seja aprovada. Uma coisa é certa, eles sabem qual é o discurso que “está pegando” e querem usar isso para jogar contra a classe trabalhadora.
Polarização e luta de classes
A origem e ação do MBL se explicam pela própria conjuntura atual. A crise econômica mundial resultou em um aumento dos ataques da burguesia, na tentativa de se salvar, ao proletariado. Quando a burguesia brasileira percebeu que o PT não era mais capaz de segurar as massas, ela tratou de descartar esse partido e, contrariando a própria burguesia internacional, realizou o impeachment de Dilma, criando movimentos para dar uma falsa legitimidade ao processo levado pelo Congresso Nacional. Foi nessa mesma onda que surgiu o Movimento Vem pra Rua, por exemplo, que coincidentemente também foi seriamente contestado pela origem nebulosa de seu financiamento. O que a classe dominante brasileira precisava era de um governo capaz de garantir a aprovação de todos os ataques aos direitos trabalhistas etc. e que fosse capaz de reprimir todos os que fossem às ruas para combater as reformas.
Com os seus objetivos iniciais concluídos, o MBL começou um processo de transformação. Foi quando, em novembro de 2015, aprovou o seu programa político defendendo a privatização da saúde, da educação, dos bancos, dos serviços de saneamento básico, projetos como Escola Sem Partido, a militarização das escolas em “áreas de risco” (leia-se bairros operários e favelas) e uma série de outras medidas de defesa do sistema capitalista.
Para pôr em prática o programa, militantes se lançaram ao parlamento. Um de seus representantes é o vereador de São Paulo, Fernando Holiday (seu nome real é Fernando Silva Bispo), eleito pelo Democratas (DEM). Fernando é um cara que chama a atenção não só pela forma raivosa que costuma se pronunciar, mas por ser um negro que é contra as cotas. Apesar de, corretamente, afirmar que as cotas reforçam o racismo acaba em um discurso individualista de defesa da meritocracia afirmando que os negros não podem se “vitimizar” dizendo que existe racismo. E contraditoriamente, defende o capitalismo, regime que criou o racismo para justificar a colonização da África, em um primeiro momento, e, posteriormente, perpetuou essa ideia para dividir os trabalhadores brancos dos trabalhadores negros. Fernando cumpre um papel semelhante ao personagem interpretado por Samuel L. Jackson no filme Django Livre (2012). Ele é o negro que trabalha para o senhor branco e defende o regime de seu senhor.
Outra característica da mudança do MBL aparece na defesa da moral e dos bons costumes. Mais visível nos casos dos Museus, mas também na defesa do projeto Escola Sem Partido. A estratégia do movimento é simples, sempre tentam fazer o máximo de barulho em cima dessas pautas. Elas chamam mais a atenção, viram manchete de jornal rapidamente e, ganhando ou perdendo, o MBL aparece.
No entanto, há uma questão extremamente importante dessa transformação: eles começaram a utilizar, mesmo que momentaneamente, métodos fascistas de combate aos movimentos sociais. Em outubro de 2016, quando os estudantes do Paraná ocuparam suas escolas, o MBL decidiu combater o movimento desde o início. Os discursos iniciais evocavam um ódio aos estudantes, chamados de baderneiros, vândalos etc. Porém, a questão se transformou em uma ação fascista quando o MBL decidiu convocar pessoas contrárias às ocupações para retirar os ocupantes a força das escolas. No dia 27 de outubro, mobilizaram cerca de 50 pessoas para retirar os jovens que estavam no Colégio Estadual Professor Lysímaco Ferreira. A iniciativa só foi derrotada graças à mobilização da comunidade ao redor da escola que apoiava o movimento. Os apoiadores do MBL fugiram e chamaram a polícia no local.
Em Joinville, a Liberdade e Luta chamou uma atividade para falar sobre a importância de a juventude defender a Revolução Venezuelana, em setembro desse ano, e os membros do MBL da cidade divulgaram uma montagem expondo a militante que daria informe e chamando as pessoas para impedirem a realização da atividade. Essa mobilização se limitou à internet e eles não atingiram o objetivo.
Utilizar os métodos da classe trabalhadora
O que o MBL está tentando criar é uma organização de combate ao movimento estudantil e operário. Em nome de um projeto de privatização e corte de direitos, eles pretendem utilizar todos os métodos possíveis. Dinheiro há, e por mais que não seja possível confirmar quem é que está financiando esse movimento – como explicou Kim ao EL País, “O MBL é o movimento político mais perseguido do Brasil. E, portanto, como entidade privada, não tornamos público o balanço financeiro, em respeito à privacidade e integridade de nossos colaboradores, membros e doadores” –, uma questão é certa: não são os trabalhadores que os financiam.
Enquanto a burguesia possui todos os recursos necessários, toda a superestrutura da sociedade ao seu favor, nós só temos uma arma para combatê-la: a nossa própria organização. Não se combate o MBL com ofensas na internet ou declarando ódio ao movimento aonde quer que esteja, muito menos subestimando eles. Se combate essa organização com os métodos operários. Organizando as lutas, enquanto classe, e, quando necessário, enfrentando fisicamente o MBL em uma tática de Frente Única com o conjunto das organizações do movimento dos trabalhadores do país.
Não podemos esquecer um importante episódio da história do movimento operário brasileiro, ocorrido na década de 1930, na Praça da Sé, em São Paulo. O Movimento Integralista Brasileiro, organização fascista da época, foi esmagado pela classe operária quando o conjunto de organizações operárias da época os enfrentou e eles tiveram que fugir dos trabalhadores. O episódio conhecido como A Revoada dos Galinhas Verdes (por causa da cor do uniforme dos integralistas) é uma importante lição para os dias de hoje.
O MBL está convicto de que é preciso atacar os trabalhadores para salvar o capital. Nós precisamos enfrentá-los, nos defender dos ataques e lutar pelo fim deste sistema. O combate a essa organização se dá na arena da luta de classes e nela não há apenas brasileiros, há os que exploram e os que são explorados. O MBL tem um lado e quer salvar um regime moribundo, que só tem a oferecer miséria, fome, guerra e exploração. Os jovens, ao lado dos trabalhadores, precisam enfrentar esse movimento reacionário e lutar para construir um mundo novo, sem opressores, nem oprimidos. A vitória dos trabalhadores será a derrota do MBL. A derrota do capital se dará somente com a vitória do socialismo.