Professores da USP manifestam-se por uma estatuinte da USP, que certamente colocará em xeque o Reitor e o governo, se realmente democrática e soberana.
Com o atual reitor, notamos a aceleração da fratura social e política da USP; para haver paz e concórdia, precisamos caminhar para uma estatuinte!
As razões da militarização do campus da USP transcendem os limites e dados recentes a partir dos quais tem sido discutida.
Por que não propor a mudança do teor ermo e rural do campus por sua urbanização efetiva, o aumento de cursos noturnos etc.?
Em vez disso, a reitoria traz coturnos, controles e revistas, rasantes de helicópteros, que rasgam o pensamento e a escuta (que atenção resiste à rotação das hélices?), e bombas; logo virão cães… Insiste em ações de respostas e sequelas imprevisíveis. Já se tem os vultos cauta e justamente encapuzados dos nossos estudantes contra a reitoria ditatorial e policialesca.
Por que a insistência no trauma, na indignidade, no modo custoso e descabido? A verdade é que a militarização, ou terceirização da segurança, deriva da privatização em curso da USP.
Combina-se ao sucateamento, no campus, do hospital, da moradia estudantil e do transporte, aos cursos pagos e escritórios externos. Com que fim? Recordemos.
O primeiro ato da gestão Serra foi criar a Secretaria de Ensino Superior, englobando as universidades estaduais e a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), com orçamento de grande estatal, superior ao de Estados.
O pacote privatista cindia pesquisa e ensino, sediava a pesquisa em ilhas, associando-a a empresas, substituía o ensino presencial por telecursos e submetia o todo a critérios empresariais.
Resultou em greves por todo o Estado, na primeira ocupação da reitoria da USP (maio-junho, 2007) e na demissão do secretário Pinotti. O governo, porém, não desistiu. Passou a priorizar a liquidação do movimento que obstou o primeiro carro-chefe da campanha de Serra à Presidência. Fez a reitoria nomear um investigador de polícia como diretor de segurança da USP no final do ano de 2007.
Os furtos no campus seguiram, mas o alvo era outro: em 2008, a reitoria demitiu um dirigente sindical, apesar da imunidade constitucional do cargo, e implantou a estratégia de processos administrativos e penais seriais contra os sindicalistas e estudantes.
À rádio Bandeirantes, o reitor afirmou, em 2010, que a USP era como os “morros do Rio” e que requeria uma intervenção como a do Haiti. Hoje, cinco dirigentes sindicais encontram-se em vias de demissão, até por “crime de opinião”, e 25 estudantes, às portas da expulsão, com base em artigo que proíbe a difusão de ideias políticas no campus; com as prisões recentes dos 73, ascende a quase cem a lista dos estudantes perseguidos.
De fato, a USP, sem acesso universalizado -ao contrário de universidades públicas da Argentina e do México-, ainda não se pôs, como deve, a serviço da sociedade como um todo. Está, no entanto, a sociedade ciente do processo em curso e disposta a prosseguir na dilapidação e cessão a grupos privados do enorme potencial da universidade?
O reitor Rodas acelera vertiginosamente a fratura social e política da USP. É preciso caminhar para uma estatuinte, sem o que não haverá concórdia e paz.
Os problemas da USP, inclusive os de malversação e de uso obscuro de bens, são em sua raiz políticos, e se reproduzem por um regimento herdado do autoritarismo, que fere toda ordem democrática.
Sua solução passa, como a do país, pelo sufrágio universal, pela abertura social, pela preservação da gratuidade, pela multiplicação de cursos noturnos e pelo incentivo a pesquisas em diálogo real com as necessidades nacionais.
FRANCISCO ALAMBERT é professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP).
FRANCISCO DE OLIVEIRA é professor emérito da FFLCH-USP.
JORGE GRESPAN é professor da FFLCH-USP.
LINCOLN SECCO é professor da FFLCH-USP.
LUIZ RENATO MARTINS é professor da Escola de Comunicações e Artes da USP.
MARCOS SOARES é professor da FFLCH-USP.
Ao que se sabe, e se tem como empírico fato, a sociedade civil tal como está organizada está há muito servindo como máquina exclusiva da dita social-democracia – o eufemismo contemporâneo para o capitalismo democrata neoliberal, de Roosevelt a Thatcher, e sem propósito outro senão o livre acúmulo de capital por indivíduos e, por conseguinte, seus conglomerados.
O que se assiste não apenas aqui em nosso país é senão o cada vez menos lento e mais constante esfacelamento desse mesmo sistema autopredatório – acaso não é que grande parte dos sistemas políticos neoliberais do pós-segunda guerra estão agora em crise, conquanto sistemas tidos como capitalistas de estado (vide tanto Canadá como Venezuela; tanto Rússia como China) estão sendo menos afetados.
Coincidência, não é – afinal, não havendo de início Estado forte, quem senão a livre especulação haveria de prevalecer sobre os interesses dos povos?…