Foto: Carolina Antunes/PR

Os patrões fizeram as contas e escolheram o lucro

Na última semana, Bolsonaro enfrentou uma queda de braço com grande parte dos governadores sobre o isolamento imposto através do fechamento de bares, restaurantes, escolas e, em alguns casos, comércio e serviços. Após uma reunião em que parecia pedir trégua, o presidente fez um pronunciamento em rede nacional condenando as medidas, dizendo tratar-se de um exagero e que a doença Covid-19 não passa de uma “gripezinha”.

A questão central na manutenção ou não do isolamento é o forte impacto que essa medida necessariamente tem sobre a economia. Para Bolsonaro, “o Brasil não pode parar”. Para ouvidos acostumados à luta de classes a mensagem é clara: a vida e a saúde dos trabalhadores valem menos que o lucro da burguesia e dos bancos.

Após o pronunciamento, diversas organizações patronais passaram a fazer pressão sobre seus respectivos governos para que suspendessem as medidas de “isolamento horizontal” e passassem a tomar medidas de “isolamento vertical”. O segundo trata-se de um devaneio burguês em sua tentativa de justificar a volta ao trabalho a despeito dos riscos. O que defendem é que sejam isolados somente aqueles que fazem parte do grupo de risco, ou seja: idosos, diabéticos, hipertensos, fumantes, asmáticos, pacientes em tratamento contra o câncer, grávidas, portadores de HIV e outras doenças imunodepressoras, portados de doenças autoimunes e assim a lista segue.

Como isolar um número tão grande de pessoas que inevitavelmente terão contato com indivíduos saudáveis, mas que podem transmitir o vírus? Essa resposta não foi dada e nem é do interesse deles.

Os custos econômicos

Embora a burguesia tenha no coronavírus uma desculpa conveniente, a pandemia apenas catalisou uma crise que já era gestada há anos. Desde a grande queda entre 2015 e 2016, o crescimento do PIB brasileiro tem oscilado mês a mês, mas não passa de 1% ao ano. Em 2019, o crescimento pífio de 1,1% só reforça essa tendência.

Para 2020, a expectativa do governo no dia 20 de março era de crescimento de 0,02%. No entanto, no dia 28 o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, afirmou que essa projeção deve ser revista para baixo. A corretora de ações XP Investimentos já fala em retração de 1,9% do PIB.

Em seu último relatório trimestral de inflação, o Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central utilizou um gráfico para mostrar que, quanto mais fortes são as medidas de contenção, mais profunda e prolongada é a recessão que elas provocam. O gráfico é retirado de um estudo do Centro de Pesquisa em Política Econômica, de Londres, intitulado “Mitigando a crise econômica da Covid: Agir rápido e fazer o que for necessário”(tradução livre).

O estudo sugere que a queda no crescimento do PIB mundial provocada pela paralisação econômica seria capaz de fazer a grande crise de 2008 parecer pequena. Para atenuar os seus efeitos, seria necessário assegurar os salários de todos os trabalhadores, realizar empréstimos e incentivos fiscais às empresas e dar “ajuda” ao sistema financeiro, leia-se mais dinheiro público para os bancos. 

Em um mundo onde as políticas de austeridade destruíram sistematicamente os direitos dos trabalhadores, é bem provável que somente as duas últimas sejam aplicadas.

Outra medida apontada pelo estudo e que requer atenção é a importância que o FMI e o Banco Mundial terão para dar “assistência” às economias afetadas. A tirar pela crise de 2008, essa assistência deverá ser paga com o suor e o sangue dos trabalhadores, que veem seus salários e direitos reduzidos ao mesmo tempo em que a inflação e a privatização corroem o seu poder de compra.

De fato, uma das conclusões do relatório do Copom não deixa dúvidas de quem vai pagar a conta: “O Copom enfatiza que perseverar no processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para permitir a recuperação sustentável da economia”.

Os custos políticos

Não devemos nos enganar com a aparente estupidez de Bolsonaro nem com a suposta benevolência dos governadores. Cada um desempenha um papel no sistema burguês, que está sendo posto nu diante de todos.

Bolsonaro foi eleito com a ajuda da burguesia para realizar as reformas que Dilma e Temer não foram capazes. A classe dominante pode até fazer vista grossa às suas grosserias, às patetices de seus ministros e aos seus ataques à imprensa, mas não vai tolerar qualquer enfraquecimento no ritmo dos ataques.

A expectativa de um desempenho econômico desastroso coloca em xeque a capacidade de Bolsonaro de realizar essas reformas e coloca dúvidas sobre a capacidade de Paulo Guedes de conduzir as políticas econômicas necessárias para salvar as empresas e jogar o peso da crise nas costas dos trabalhadores. Daí seu desespero para convencer a população de que “o Brasil não pode parar”.

Já os governadores sabem que o colapso do sistema de saúde e uma crise na segurança pública com o aumento do desemprego e da carestia vão cair como uma bomba em suas mãos. Uma das principais consequências da epidemia é o aumento da demanda dos leitos de UTI, estes que foram sistematicamente fechados na última década seguindo a política de destruir o SUS para dar dinheiro aos planos de saúde. Os hospitais e os planos privados não serão capazes de absorver a demanda e inevitavelmente vão direcionar pacientes à rede pública. É o cenário de uma tragédia.

No entanto a pressão da burguesia tem sido forte, principalmente nos estados mais ricos, e alguns governadores já cederam, como é o caso de Santa Catarina, Mato Grosso e Rondônia. A resposta das massas deve continuar, principalmente com o aumento no número de mortos e infectados, levando a luta de classes no Brasil a um novo patamar.

Para a burguesia não importa quantas vidas serão perdidas com a doença, ela tem trabalhadores de sobra para contratar a salários reduzidos no lugar daqueles que morrerem. Ela sabe também que um golpe econômico do tamanho do que se espera vai minar qualquer vislumbre de recuperação econômica da última década e acelerar todas as crises que já estavam se formado para os próximos anos.

O que o coronavírus escancara é a podridão do sistema capitalista e a sua incapacidade de dar o mínimo que os trabalhadores precisam para uma vida decente. Cabe a nós destruí-lo e criar um mundo novo sem patrões nem generais!