“Quem paga a banda escolhe a música!” – novamente essa máxima se fez verdadeira. Desta vez foi no Fórum Social Mundial Palestina Livre (FSMPL), ocorrido de 28/11 a 01/12 últimos, em Porto Alegre, RS.
Financiado majoritariamente pelo Governo Brasileiro, o evento acabou em tumulto, sem o menor consenso, com manobras e tentativas de falsificação por parte da direção da CUT e do PCdoB, corte de microfone, impedimento de tradução do árabe da declaração do representante do Comitê Nacional Palestino e outros. Mas isso não impediu que uma declaração final falsa fosse apresentada à imprensa por representantes do Governo Brasileiro, da CUT e do PCdoB. O Comitê Nacional Palestino, a UDEP (União Democrática de Entidades Palestinas do Brasil), o Mopat (Movimento Palestina para Todos), o MST, nós da Esquerda Marxista e outros denunciamos isso. O que eles tentam passar pela imprensa é só a posição deles. Nada disso foi aprovado, muito menos por consenso. Buscou-se referendar a posição do Governo Brasileiro sobre a questão palestina, mesmo esta não sendo majoritária entre os movimentos, entidades e militantes da causa palestina do mundo todo.
Em Setembro deste ano, na 66ª Assembleia Geral da ONU (21/09/2012), a presidente Dilma declarou:
“Lamento não poder saudar nesta tribuna o ingresso pleno da Palestina na Organização das Nações Unidas. O Brasil já reconhece o Estado palestino como tal, nas fronteiras de 1967, de forma consistente com as resoluções das Nações Unidas. Assim como a maioria dos países dessa assembleia, acreditamos que chega o momento de termos a Palestina aqui representada a pleno título.”
Em seguida afirmou que reconhecer “o direito legítimo do povo palestino à soberania e à autodeterminação” é decisivo para as possibilidades de paz no Oriente Médio.
“Apenas uma Palestina livre e soberana poderá atender aos legítimos anseios de Israel por paz com seus vizinhos, segurança em suas fronteiras e estabilidade política em seu entorno regional”, disse. “Venho de um país onde descendentes de árabes e judeus são compatriotas e convivem em harmonia – como deve ser.”
Ocorre que, todos, inclusive Dilma, sabem que não é possível garantir ao povo palestino o “direito legítimo à soberania e à autodeterminação” constituindo um Estado Palestino que respeite as “fronteiras de 1967” (definidas por Israel após a “Guerra dos 6 dias” quando Israel dizimou as forças aéreas do Egito, Síria e Jordânia com ataques surpresa).
Não é possível garantir ao povo palestino o “direito legítimo à soberania e à autodeterminação” sem garantir o direito de retorno de todos os 6 milhões de refugiados palestinos que foram expulsos de suas casas em 1948, em 1967 e dia após dia até hoje. E, óbvio, não é possível garantir o direito de retorno dos refugiados às suas casas quando a maioria esmagadora delas se encontra dentro das fronteiras do Estado de Israel, hoje sendo ruínas ou tendo outras construções em seu lugar. Ou seja, enquanto houver o Estado de Israel não há possibilidade de soberania e autodeterminação para o povo palestino.
Afinal, que soberania pode haver para um povo que é preso, em parte reduzida e fragmentada de seu próprio território, por um muro de 8 metros de altura que corta a Palestina por mais de 700 km, vigiado e controlado militarmente pelo Estado de Israel?
A política de “Dois Estados”, delineada desde os Acordos de Oslo, em 1993, quando nesta cidade da Noruega o governo de Israel e Yasser Arafat, presidente da OLP (Organização pela Libertação da Palestina), coordenados pelo presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, assinaram um acordo, expressa a capitulação definitiva de Yasser Arafat e a cúpula do Al-Fattah, que se concretizava na aceitação da divisão da Palestina e da existência do Estado de Israel, na criação de um governo chamado “Autoridade Palestina” e na criação de três zonas sobre o território palestino. Uma Zona A sob controle da nova “Autoridade Palestina”, uma Zona B com controle civil da Autoridade Palestina e militar do Estado de Israel e uma Zona C sob controle total de Israel.
Foi esse acordo que impulsionou o crescimento do Hammas, que o recusava por este reconhecer o Estado de Israel e deixar Jerusalém sob seu controle. No acordo rifava-se pela primeira vez, por parte de um “representante” palestino, a bandeira histórica do “Direito de Retorno dos Refugiados”. Agora, em meio aos ares das revoluções nos países árabes e após anos de experiência com esse acordo, ele é desprezado pelo povo palestino, ou seja, está naufragando, e uma operação mundial se iniciou para salvá-lo. O Governo Brasileiro é só mais um dos servos do imperialismo-EUA nesta operação.
É por isso que, como principal patrocinador do Fórum Social Mundial Palestina Livre, o governo Brasileiro, junto às entidades que estão sob sua influência (CUT, FEPAL, etc.), organizou tudo para que o FSMPL referendasse a política imperialista dos acordos de Oslo, ou seja: a política dos “Dois Estados”. No FSMPL isso aparecia nas falas de dirigentes da CUT, FEPAL e PCdoB, além de faixas e panfletos com os dizeres: “Estado da Palestina Já!”, reconhecendo e legitimando o Estado sionista de Israel que ocupa mais de 80% do território histórico da Palestina e deixando de lado a bandeira do “Direito ao Retorno dos Refugiados”.
É por isso também que, na Segunda-Feira após o término do FSMPL, as capas dos jornais brasileiros estampavam a foto de Mahmoud Abbas (Abu Mazen), presidente da chamada “Autoridade Palestina” sendo recebido por um amontoado de gente que comemorava o fato da ONU ter reconhecido o Estado Palestino como observador oficial na Assembleia Geral dos Povos.
O Imperialismo-EUA, através da ONU, do Governo Brasileiro e da mídia burguesa, faz de tudo para ocultar que, apesar de todas as sabotagens realizadas pelo próprio Governo Brasileiro, os milhares de militantes da causa palestina do mundo todo, presentes no FSMPL, em sua maioria não aceitam os acordos de Oslo.
Cada vez está mais claro para todos os ativistas da causa palestina que não haverá “Palestina Livre” com um Estado Palestino títere ao lado do Estado de Israel controlando muros, fronteiras e espaço aéreo. Isso só servirá aos sionistas para ganhar tempo e manter sob controle o povo trabalhador composto por palestinos e israelenses que vivem em Israel. Cada vez está mais claro que a saída é a luta por um Estado único, laico e democrático sobre todo o território histórico da Palestina, com direitos iguais para todos, independente da religião ou origem, e garantia do direito de retorno de todos os refugiados.
E nós, marxistas, sabemos que essa luta só poderá se dar no bojo de uma luta revolucionária contra o Estado de Israel, que só será vitoriosa quando as forças operárias da Palestina e de Israel se unirem contra o seu opressor comum, num movimento de massas, com os métodos próprios da classe operária (que nada têm a ver com os métodos terroristas do Hammas, que hoje só servem de pretexto para o governo israelense atacar os assentamentos palestinos). Neste processo de Revolução Permanente estará colocada a questão da luta pelo poder de classe, a luta pelo socialismo, abrindo a via para a única solução duradoura para a questão palestina, que é a constituição de uma Federação Socialista dos Povos do Oriente Médio.
Ao fim e ao cabo, é a isso que serve levantar a reivindicação transitória de um Estado único, laico e democrático sobre todo o território histórico da Palestina, com garantia do direito de retorno de todos os refugiados.
Apesar de tudo, a simples realização de uma edição do Fórum Social Mundial com o tema “Palestina Livre” já foi uma vitória. Os sionistas pressionaram para que o FSMPL não fosse realizado. O governo brasileiro, a direção da CUT e a FEPAL (PCdoB) sabotaram a participação da maioria dos convidados das entidades e movimentos que divergiam da política de dois Estados (só enviaram passagens para os convidados que compartilhavam da política de “dois Estados” deixando mais de uma centena de dirigentes e intelectuais fora do FSMPL). Chegaram a falsificar a declaração final do FSMPL, trocando o texto que havia sido acordado entre os membros do comitê organizador no Brasil e o comitê na Palestina. Mas mesmo assim, milhares de ativistas do mundo inteiro saíram mais integrados para seguir o combate. Entretanto, para que essa vitória sirva para alguma coisa, é importante que os ativistas da causa palestina aprendam com a experiência: não é possível ter independência política para nos reunirmos e decidirmos o que quisermos sem independência financeira. Urge organizar um encontro internacional e atividades internacionais em defesa da causa palestina com total independência dos Governos títeres do imperialismo e da burguesia.
Para saber mais como foi o FSMPL e ler a íntegra da carta do MST que denuncia a falsificação da declaração final, leia “Manobras, boicote e falsificação no Fórum Social Mundial Palestina Livre”: http://bit.ly/UFtTDJ