Pelo fim da escala 6×1! Pela redução da jornada de trabalho! Pela vida além do trabalho!

Nas últimas décadas, as relações de trabalho no Brasil retrocederam no que diz respeito aos direitos dos trabalhadores. São inúmeras as medidas de desregulamentação e flexibilização da legislação trabalhista e de avanço da terceirização e outras formas de contratação que levam à precarização das condições de trabalho e, portanto, transformam a vida do trabalhador num inferno na Terra.

Para conseguir uma vaga no mercado de trabalho formal, ou seja, com registro em carteira e direitos garantidos pela CLT, é necessário passar por um verdadeiro funil e se submeter a jornadas extenuantes por um salário cada vez mais mínimo. Exige-se do candidato um grau de escolaridade, experiência, conhecimentos e habilidades cada vez maiores para vagas em empregos cada vez mais precários e mal pagos.

E, muitas vezes, esses empregos oferecidos são as únicas alternativas para milhões de jovens que ingressam no mercado de trabalho a cada ano. Para não ficarem desempregados, milhões de jovens trabalhadores se veem obrigados a renunciar a seus estudos, lazer, cultura, esporte, família e outros compromissos unicamente para trabalhar, para ficar à disposição dos patrões.

Dedicam todo seu tempo de vida ao trabalho, em busca de um salário para sobreviver. Trata-se, portanto, de uma nova forma de escravidão: a escravidão assalariada!

O autor do Manifesto Comunista, Karl Marx, explicou no livro “O Capital” que o sistema capitalista funciona exatamente dessa forma. Os donos dos meios de produção (a burguesia) exploram a força de trabalho de bilhões de seres humanos (o proletariado), para acumular e ampliar seu próprio capital e patrimônio. Por isso que bilhões de pessoas passam dificuldades, enquanto um punhado de bilionários domina a política e a economia. Dito de outra forma, a produção da riqueza existente depende do trabalho de todos, mas o lucro gerado é apropriado de maneira particular. E, portanto, quanto maior a exploração, maior o lucro privado.

E segundo a lei da oferta e demanda, quanto maior o número de pessoas em busca de emprego, menor será o salário e menores serão os direitos. A burguesia pode pagar um salário mínimo e fazer o proletário trabalhar longas horas por dia porque sabe que pode encontrar outro facilmente para substitui-lo. Por isso que a valorização do trabalho depende da união dos trabalhadores. A burguesia coloca os trabalhadores para competir entre si, enquanto a solução para nossos problemas está em nos unirmos.

A burguesia é uma classe parasitária da sociedade, pois sua riqueza e poder advém da exploração dos trabalhadores. Cabe a nós trabalhadores fazermos uma revolução para derrubar esse regime de escravidão e conquistarmos a abolição.

A jornada de trabalho no Brasil

A luta para fixar a jornada de trabalho existe desde os primórdios do movimento operário. Através de uma campanha desenvolvida pela II Internacional1, seus partidos e sindicatos, levantou-se a bandeira da jornada de trabalho de 8 horas por dia, para ter 8 horas de estudo e 8 horas de descanso.

No Brasil, também houve greves e lutas trabalhistas nesse sentido e as primeiras leis limitando a jornada de trabalho datam da década de 1930, mas somente em 1943 foi definida na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Por fim, a limitação da jornada de trabalho em 8 horas diárias, 44 horas semanais, com no máximo duas horas extras por dia, foi estabelecida na CLT pela Constituição de 1988 e vigora até hoje.

Porém, hoje em dia, a jornada de 8 horas já se tornou anacrônica e extenuante, devido ao aumento do ritmo, intensidade e produtividade do trabalho. É possível produzir tudo que necessitamos, trabalhando poucas horas por dia, se dividirmos o trabalho entre todos, para que ninguém fique desempregado. É o que o Trotsky chamava de “escala móvel das horas de trabalho”. Mas, para isso, é necessário retomar a luta pela redução da jornada de trabalho e derrotar a burguesia, se apoiando nos exemplos e conquistas obtidas pelos trabalhadores no Brasil e no mundo.

A jornada de trabalho oficial na França, por exemplo, é de 35 horas semanais, com no máximo duas horas extras por dia. E é evidente que a França não ficou menos rica após adotar essa jornada de trabalho porque a produtividade compensa as horas não trabalhadas. É verdade que essa conquista tem sido atacada nos últimos anos e hoje é possível, em alguns casos, estender a jornada para até 44, 46 ou mesmo 48 horas semanais, mas a regra geral continua a ser 35 horas semanais.

Mas não é preciso ir muito longe. Algumas categorias profissionais no Brasil possuem acordos coletivos que estabelecem jornadas de 40, 36 ou até mesmo 30 horas semanais. Evidentemente, foram obtidas após muitas décadas de luta e tais conquistas encontram-se permanentemente sob ataques da patronal.

Outro exemplo do que a luta dos trabalhadores é capaz de alcançar vem do Movimento das Fábricas Ocupadas, impulsionado pela Esquerda Marxista, que se inicia com a ocupação das fábricas Cipla e Interfibra pelos trabalhadores em 2002, localizadas em Joinville/SC e que se estendeu para a Flaskô em Sumaré/SP e outras empresas pelo Brasil, até sofrer com uma intervenção judicial-policial em 2007, organizada por entidades patronais, com o apoio do governo federal do PT na época.

Um dos motivos que levou a burguesia a atacar esse movimento foi que os próprios trabalhadores, que dirigiam as fábricas sem os patrões, organizaram a redução da jornada de trabalho num primeiro momento para 40 horas semanais com sábado livre e depois para 30 horas semanais, sem redução dos salários! Um exemplo que teve um profundo impacto sobre a consciência de milhares de trabalhadores, mas antes que pudéssemos organizar a luta para a redução da jornada de trabalho em outras empresas, a burguesia e o governo Lula atacaram o Movimento das Fábricas Ocupadas. Porém, o legado permanece.

A escala de trabalho 6×1

A CLT da Constituição de 1988 estabelece ainda que o trabalhador tem direito a 24 horas de descanso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos. E que as empresas devem pagar em dobro para os trabalhadores que são convocados a trabalhar aos domingos e feriados e, além disso, são obrigadas a conceder outro dia de descanso remunerado na semana como compensação.

Porém, várias empresas, de diferentes ramos, da indústria, comércio e serviços, estão autorizadas a funcionar aos domingos e feriados e podem legalmente adotar o trabalho aos finais de semana e feriados sem precisarem pagar em dobro. São obrigadas apenas a conceder as 24 horas de descanso semanal, mas não necessariamente aos domingos. E aí que entra a famigerada escala de trabalho 6×1.

Os trabalhadores cumprem as 44 horas semanais de trabalho durante seis dias e descansam no sétimo, numa escala de revezamento definida arbitrariamente pelo empregador. Assim, muitas vezes, o trabalhador não sabe ao certo quais dias do mês ele terá folga ou qual dia da semana ele poderá descansar. Sem falar que tirar folga em dia de semana nunca é a mesma coisa que tirar folga no final de semana. O descanso aos sábados e domingos tem uma qualidade superior do que de segunda a sexta.

Portanto, essa escala desorganiza a vida do trabalhador e prejudica o necessário descanso para recuperar suas energias. Sem descanso adequado e colocado quase que permanentemente à disposição do empregador, o trabalhador rapidamente se esgota física e emocionalmente. Sente que não tem tempo para nada, a não ser trabalhar, e se frusta porque seus sonhos, desejos, vontades e compromissos pessoais, sociais e familiares são sacrificados no altar da exploração.

Essa situação se agrava nas grandes cidades por causa das condições do transporte público. Os trabalhadores perdem horas do dia para ir e voltar de suas casas ao trabalho.

Outro agravante é o famigerado banco de horas. Hoje em dia, pouquíssimas empresas pagam horas extras após a oitava hora de trabalho. A grande maioria das empresas transfere esse tempo a mais para o banco de horas do empregado. E todo trabalhador sabe a dificuldade que é negociar a utilização dessas horas com os gerentes e os patrões. Quase nunca o trabalhador utiliza essas horas para descanso. Várias vezes, elas são utilizadas numa emergência ou eventualidade e aí, para não ter o dia descontado do salário, o tempo é abatido do banco de horas.

Há outros tipos de escala de trabalho permitidas pela legislação, que podem ser consideradas melhores ou piores do que a escala 6×1, dependendo do ponto de vista. Porém, destacamos os problemas ocasionados pela escala 6×1 porque, como veremos, ela está sendo questionada por um movimento espontâneo de trabalhadores, que busca proibi-la de ser aplicada.

A reforma trabalhista de Temer

Sem dúvidas, uma das medidas que pioraram as condições de trabalho no Brasil foi a aprovação da Lei 13.647/2007 pelo Congresso, conhecida como Reforma Trabalhista. Essa proposta foi apresentada pelo impopular governo Michel Temer e mexeu com inúmeros direitos previstos na CLT.

Entre outras mudanças, autoriza o parcelamento dos 30 dias de férias remuneradas em até 3 vezes no ano. Essa flexibilização também prejudica a saúde física e mental dos trabalhadores, pois 10 dias de afastamento não são suficientes para guardar a devida distância do trabalho e se restabelecer. O ideal é o afastamento por 30 dias ininterruptos ou mais. Um trabalhador submetido à escala 6×1 que tira apenas um período de 10 dias de férias com certeza não consegue desfrutar adequadamente desse direito.

A reforma trabalhista ainda autorizou outras formas de contratação precárias, como o trabalho intermitente, o contrato de trabalho temporário e a jornada parcial. Essas formas de contratação, na prática, legalizam o subemprego e pressionam o mercado de trabalho a reduzir salários e direitos de trabalhadores registrados em empregos formais.

A reforma autoriza ainda que o negociado prevaleça sobre o legislado. Portanto, entre os trabalhadores com menor nível de sindicalização e organização sindical, os patrões podem impor cláusulas nos Acordos Coletivos até piores do que os parcos direitos garantidos na CLT, bastando a anuência dos sindicatos oficiais, muitas vezes desconhecidos dos próprios trabalhadores que dizem representar.

Movimento VAT: Vida Além do Trabalho

A partir da iniciativa de um influenciador digital chamado Ricardo Azevedo na rede social Tik Tok, está surgindo um movimento nacional que questiona a escala de trabalho 6×1, à qual milhões de trabalhadores brasileiros estão submetidos. São comerciários, operadores de telemarketing, frentistas, garçons, cozinheiros, padeiros, operários, farmacêuticos, motoristas, trabalhadores terceirizados de todos os ramos, etc e etc que fazem a economia girar, fazem o Brasil funcionar, produzem a riqueza, mas que não são valorizados e não tem seus direitos respeitados. Estão extenuados pelo trabalho e encontraram no movimento VAT proposto por Rick Azevedo uma oportunidade para fazer suas vozes serem ouvidas.

O movimento VAT teve início demandando o fim da escala de trabalho 6×1. A primeira iniciativa em andamento é uma petição online que, em menos de duas semanas, atingiu mais de 200 mil assinaturas! Agora o movimento já está reivindicando a redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais e uma escala 4×3 (4 dias de trabalho e 3 dias de descanso).

Além disso, para levar adiante o movimento VAT, estão se formando grupos em redes sociais por todos os estados e alguns milhares de panfletos já foram impressos, com o QR-Code da petição online, como forma de difusão da iniciativa.

Nós apoiamos e nos somamos a este movimento para ajudar a desenvolvê-lo da forma mais positiva possível, rumo à proibição da escala de trabalho 6×1 e além.

Para avançar e ganhar a adesão de mais trabalhadores, para além de defender o fim da escala 6×1, é importante também estabelecer vínculos entre os problemas enfrentados por quem trabalha na escala 6×1 com os problemas enfrentados por trabalhadores sob outras escalas e outras condições precárias de trabalho, num grande movimento pela revogação da reforma trabalhista de 2017, que retira direitos e legaliza práticas nefastas de contratação. Durante a campanha presidencial de 2022, Lula havia se comprometido a pelo menos “rever” esta contrarreforma que retirou direitos trabalhistas, mas nem isso ainda fez.

Por fim, o influenciador Ricardo Azevedo, em um de seus primeiros vídeos sobre o tema, pergunta:

“Quando é que nós da classe trabalhadora iremos fazer uma revolução nesse país relacionada à escala 6×1? Se a gente não se revoltar, não colocar a boca no mundo, se a gente não meter o pé na porta, as coisas não vão mudar!”

Concordamos com ele e estamos dispostos a ir até às últimas consequências nessa luta. Ao mesmo tempo, temos certeza que uma revolução da classe trabalhadora trará não só o fim da escala 6×1 como também o fim de toda a exploração e opressão e o início de uma nova época histórica: a do comunismo em escala internacional!

1 A II Internacional foi fundada pelo parceiro de Karl Marx, Friedrich Engels, e milhares de seus correligionários. Era uma organização revolucionária que agrupava os partidos operários de diferentes países e dirigia as lutas e ações dos movimentos sociais e sindicais para acabar com o capitalismo.