Pneus queimados em frente à Fiesp, na Avenida Paulista, poucos dias antes da aprovação da Reforma Trabalhista. Foto: MTST

Greve geral se faz com pneus queimados, trancaços e ocupações?

Um aspecto da fracassada greve geral do dia 30 de junho ainda não foi analisado. Está certo que as direções das centrais sindicais abortaram a mobilização. Mas ainda assim a imprensa burguesa teve farto material para bombardear os trabalhadores em suas casas. Das telas dos aparelhos televisivos crepitavam fogueiras de pneus, pequenos grupos fechando ruas e rodovias, e bolinhos de gente faziam ocupação em alguns prédios públicos e privados.

Esse comportamento vem aumentando desde o ano passado por movimentos e organizações que tomaram as ruas para combater o impeachment e depois para protestar contra o governo de Michel Temer. Desenvolveu-se por ocasião dos ditos “ensaios” para greve geral, dos dias de paralisação pontuais e até mesmo dos atos já distantes em defesa de Dilma Rousseff. Chamando as queimas, trancaços e ocupações de “ações diretas”, seus protagonistas ressaltam como justificativa a necessidade de causar impactos para sensibilizar a sociedade.

Destaca-se nessas práticas o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). Esse tem sido seguido por uma curiosa combinação de elementos. Claro que existem anarquistas e adeptos da tática Black Bloc. Vários jovens e trabalhadores desorganizados também unem-se às iniciativas. Mas algo muito sintomático está na participação de muitos dirigentes sindicais. Temem a mobilização de suas bases, e ficam apavorados diante do recuo das lideranças das centrais. Contentam-se em eles mesmos substituírem aqueles que supõem liderarem. A essa combinação original, somam-se grupos e organizações de esquerda que contribuem com a confusão causada por esse tipo de ação.

Como sentido político, essa orientação aparentemente “prática” corresponde a conceber como possível substituir o papel político das mobilizações de massa pelo impacto de ações de pequenos grupos em “pontos chave”. Pressupõe que os objetivos perseguidos pelo movimento dependem mais da ousadia de seus integrantes do que de sua capacidade de atrair setores sociais que não responderam a sua convocação.

Bloqueio com pneus na madrugada do dia 30 na entrada de Florianópolis. Foto: Intersindical Sindical

O chamado das manifestações do dia 30 de junho respondia a uma pauta baseada nos objetivos de barrar as reformas trabalhista e previdenciária e de derrubar o presidente Michel Temer. Qualquer protesto tem o sentido de expressar uma certa medição de forças sociais e exerce uma pressão política sobre os canais institucionais estabelecidos. Foge da norma institucional burguesa justamente porque alerta até que grau pode abalá-la, e em última instância destruí-la. Uma greve geral exerce esse sentido para toda a sociedade, em todos os seus níveis.

Pela tensão de interesses envolvidos em uma greve geral, e pela sua submissão às forças burguesas e concepções profundamente reformistas, as centrais jogaram a toalha antes mesmo da batalha. Já os grupos que seguiram as práticas do MTST tampouco ajudaram a esclarecer a classe trabalhadora sobre o que era necessário fazer para elevar a pressão social. Suas demonstrações pirotécnicas e aventuras vanguardistas alimentaram o discurso da mídia burguesa para eliminar o apoio passivo daqueles que assistiam, ouviam ou liam as notícias.

Além disso, prestaram um papel deseducador para a verdadeira vanguarda de trabalhadores e jovens, aquela que promoveu a série que teve seu pico na greve geral de 28 de abril. Essa camada mais consciente e ativa da classe trabalhadora está chegando a conclusões já aprendidas por gerações anteriores. Está enfrentando toda a resistência e bloqueio dos mesmos dirigentes políticos e sindicais que deveriam oferecer esse aprendizado das lutas, dos acertos e derrotas já vividas.

Mas para oferecer um caminho correto, o MTST e seus seguidores precisariam eles mesmos serem capazes de observá-lo. Uma análise marxista da situação e das lições do passado se faria fundamental. Sem isso, não identificam as tarefas para superar os bloqueios colocados hoje. Sem acessar as massas, sem conseguir colocá-las em movimento, aplicam o princípio anarquista do terrorismo individual. Valem-se para isso de uma retórica radical que encanta a um público nada desprezível, nutrido da falência teórica e política a que o PT levou o movimento do proletariado brasileiro.

Abaixo divulgação do MTST sobre a ocupação que fizeram do aeroporto de Congonhas, em São Paulo no dia 30:

Neste vídeo abaixo, o MTST protagoniza em 10 de julho uma queima de pneus em frene à Fiesp, na Avenida Paulista, pouco antes da aprovação da Reforma Trabalhista:

O terrorismo individual representa uma resposta política diante da prostração, da impotência para mobilizar amplas massas para ações coletivas. Surgida como uma resposta à burocracia das organizações e dirigentes estabelecidos, essa orientação política, em sua nomenclatura moderna de “ação direta”, corresponde ao equivalente político do mesmo burocratismo, só que invertido. Isso porque responde à existente alienação da ação de massas alienando-se das massas e de sua dinâmica.

Essa questão teórica, já enfrentada diversas vezes pelo proletariado em seu movimento de resistência contra o capital, está colocada por trás dos pneus queimados, dos trancaços, ocupações e da retórica radical. Os trabalhadores, jovens e dirigentes de sindicatos, entidades e movimentos deveriam prestar atenção nisso. Sem atenção à teoria, as melhores intenções levam a desastres.

Apenas a ação de massas da classe trabalhadora e da juventude oferece um caminho seguro. Não só para revogar a reforma trabalhista, derrotar a previdenciária e derrubar Temer e esse podre Congresso Nacional, mas como também para fazer um mundo novo nascer. Ajudar a vanguarda que desperta a aprender o mais rápido possível essa antiga lição deveria estar no centro da ação dos companheiros, se querem contribuir para superar os bloqueios burocráticos e políticos colocados, para o movimento estar à altura das tarefas atuais.