Por que as organizações de esquerda negociam os atos Fora Bolsonaro com as instituições burguesas?

No dia 21 de julho diversas organizações de esquerda se reuniram no 11° Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (BPM/M) para negociar a realização do Ato Fora Bolsonaro no 24J em São Paulo. Além das organizações de esquerda, dentre elas o PCdoB (UJS), o PCB, o PSTU (CSP-Conlutas) e o PCO, participaram da reunião o PSDB, representantes da PM, da GCM, da CET, do Metrô e outros órgãos.

Muita gente entendeu que se tratava da PM impondo as condições de realização do ato e criticou a reunião. As direções reformistas e oportunistas tentam dar a aparência de que esse tipo de acordo é comum, porque existe uma série de restrições para a realização de manifestações em vias públicas. Na prática, elas ajudam a fomentar ilusões nas instituições e leis burguesas que recaem especialmente sobre a esquerda e a classe trabalhadora.

Essas direções, que já estão adaptadas ao Estado burguês, reúnem-se com o braço repressivo da burguesia para acordar o dia, o horário e o trajeto da manifestação. Nessa reunião, em amplo consenso, os participantes da negociação definiram todos os pormenores para a realização do ato. Nesse caso, não se tratava de uma imposição da PM de como a manifestação deveria ser realizada. Pelo contrário, as direções de esquerda combinavam os limites da manifestação, para que, se fugisse ao seu controle, a PM estava autorizada a reprimir os manifestantes em comum acordo com essas organizações.

Os representantes das organizações de esquerda e os representantes do Estado burguês só não negociam entre as partes quando as massas fogem ao seu controle e impõem sua vontade, mas ainda não era o caso. Por isso, combatemos na perspectiva de que as massas trabalhadoras imponham sua vontade contra as suas direções que atuam como um freio para a revolução social e que hoje pretendem canalizar o ódio ao governo Bolsonaro pelas vias institucionais do impeachment e das próximas eleições.

Lênin, combatendo os esquerdistas, explica que não se deve rejeitar qualquer compromisso “por princípio”. Todo operário sabe que algumas negociações e compromissos são necessários para preservar e, inclusive, avançar a luta revolucionária. Em uma greve, por exemplo, quando o patrão se vê cercado por todos os lados de trabalhadores e decide negociar com os grevistas, deveríamos então não fazer nenhum compromisso para sair da greve? Todo trabalhador sabe que não é possível continuar uma greve infinitamente sem uma perspectiva de onde o movimento quer chegar.

“O político que queira ser útil ao proletariado revolucionário deve saber distinguir os casos concretos de compromissos que são mesmo inadmissíveis, uma expressão de oportunismo e de traição, e dirigir contra tais compromissos concretos toda a força da crítica, todo esforço de um desmascaramento implacável e de uma guerra sem quartel (…)” (Lênin, “Esquerdismo, doença infantil do comunismo”).

Isso é bastante compreensível no caso de uma greve, em que os trabalhadores buscam unir suas forças para pressionar o patrão. Mostra a força da mobilização e da organização dos trabalhadores para conseguir uma negociação mais favorável e alcançar suas reivindicações. Mas, certamente, não é esse o caso quando as direções de esquerda se reúnem com a PM para “negociar” as manifestações, buscando controlá-las nos limites da institucionalidade, ou seja, nos limites dos interesses da burguesia. Esse é o motivo dessas “negociações”.

Por outro lado, o PCO criou mais uma confusão política ao tentar se colocar como a única organização de esquerda que combate a presença dos partidos de direita nas manifestações. Em outro texto explicamos qual é o papel e o sentido desse “empenho”.

A ata da reunião, disponibilizada na íntegra pelo PCO, segue o rito de sempre. A PM explica as leis que regem os atos e manifestações em vias públicas, cumprindo o seu papel de ser o braço armado do Estado burguês, onde a liberdade de expressão não passa de uma “liberdade controlada” pelos aparatos de repressão da burguesia.

Na reunião, todas as organizações se colocaram como “oposição” ao governo Bolsonaro, inclusive o PSDB. O problema levantado pelo PCO é que o PSDB defende outra ideologia e, por isso, não poderia participar da manifestação. Há uma decisão judicial que proíbe duas manifestações ideologicamente contrárias acontecerem concomitantemente no mesmo dia, horário e local. Com base nisso, o PCO pretendia criar um fator para que o PSDB não participasse do ato.

Nesse ponto da reunião, coube a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), à Defensoria e à Ouvidoria mediar as relações políticas entre o PCO e o PSDB. Em vez de ajudar as massas a compreender que o PSDB não defende os interesses dos trabalhadores e participa dos atos Fora Bolsonaro com o único objetivo oportunista de se construir para as próximas eleições como oposição à Bolsonaro, o PCO poderia ter criado uma situação em que o ato ficaria inviabilizado, com base nas leis burguesas que controlam a “livre expressão”. Ou seja, o problema foi a atuação do PCO, mas isso não é nenhuma novidade. A sua direção deu um giro do ultra-sectarismo para o ultra-oportunismo: de sectários contra todas as organizações de esquerda, passaram a defender a política de Lula (PT) e a ajudar a fomentar ilusões em seu programa de conciliação de classes, agindo como um verdadeiro escudo à burocracia do PT e atacando todas as outras organizações de esquerda. O mais contraditório é que justamente Lula e a direção do PT estão no centro da defesa da “Frente Ampla” para derrotar Bolsonaro, o que inclui, naturalmente, para eles, os partidos de direita.

No fim da reunião, o PSDB agradeceu a cordialidade do PCO (!) e todas as organizações de esquerda presentes tiveram que assinar um documento onde consta que o PCO e PSDB têm a mesma ideologia! Não podemos deixar de alertar, mais uma vez, que o ultra-esquerdismo do PCO, combinado com doses de oportunismo, é um veneno para o movimento operário.

Apenas as massas mobilizadas podem derrotar o governo Bolsonaro e abrir caminho para um governo dos trabalhadores, na luta pelo socialismo. A tarefa mais importante para os revolucionários é ajudar as massas trabalhadoras a forjar a sua direção revolucionária independente da burguesia e de seu Estado, com base em um programa marxista e radical capaz de destruir o capitalismo. Para os trabalhadores e jovens que rompem com a política burocrática e conciliatória dos grandes aparatos de esquerda, dos ultra-esquerdistas e ultra-oportunistas em geral, e querem construir uma direção revolucionária, chamamos a conhecer a Esquerda Marxista e a integrar nossas fileiras.

Abaixo o governo Bolsonaro! Por um governo dos trabalhadores sem patrões nem generais!