O movimento Vida Além do Trabalho (VAT) é um movimento social que luta pelo fim da escala de trabalho 6×1, ou seja, reivindica mais dias de folga na semana para os trabalhadores e a redução da jornada de trabalho sem redução dos salários.
O VAT surgiu a partir do desabafo de um trabalhador, Rick Azevedo, em um vídeo publicado na rede social TikTok, que se tornou viral. A partir disso foi elaborado um abaixo-assinado online e organizado grupos de trabalhadores por todo o país, via redes sociais, para lutar pelo fim dessa escala extenuante de trabalho.
Essa conexão direta entre a realidade dos trabalhadores e seus anseios mais elementares fez com que o movimento ganhasse adesão rapidamente, alcançando, em apenas duas semanas, mais de 200 mil assinaturas de apoio. Atualmente, alguns meses após seu surgimento, o VAT conta com o expressivo número de mais de 1,2 milhão de assinaturas, mostrando o quanto essa causa é urgente e relevante.
A Organização Comunista Internacionalista (OCI), desde o primeiro momento, apoiou este movimento. É uma pauta histórica de nossa organização a luta pela redução da jornada de trabalho sem redução de salários. O Movimento das Fábricas Ocupadas, que dirigimos e impulsionamos a partir da ocupação, há 22 anos, das fábricas Cipla, Interfibra e Flaskô pelos operários, em defesa de seus empregos, conquistou com o controle operário a redução da escala e da jornada para 30 horas semanais, sem redução salarial! No entanto, a luta das fábricas ocupadas acabou porque o governo Lula, ao invés de estatizar as empresas e ajudar os trabalhadores, apoiou a repressão policial e judicial organizada pelos patrões em 2007.
Nosso apoio ao movimento VAT se traduziu na participação de nossos militantes nos grupos criados nas redes sociais para organizar e impulsionar o movimento nacionalmente. Estabelecemos um diálogo franco com o companheiro Rick Azevedo e demais membros que ele recrutou para constituir a coordenação nacional do VAT, apresentando nossas opiniões para que essa luta absolutamente legítima e necessária fosse vitoriosa. Alertamos sobre a importância da independência financeira do movimento para garantir sua independência política frente aos patrões, aos governos e também frente aos partidos e forças políticas oportunistas, reformistas e sectárias que atuam no movimento operário. Reforçamos ainda a importância de que a luta não se restringisse à internet, mas que ganhasse os locais de trabalho e as ruas, mobilizando os trabalhadores na base. Realizamos e ajudamos a organizar panfletagens, reuniões e atos do VAT em diferentes cidades pelo país.
A necessidade da democracia operária no VAT
Após os primeiros meses de existência, o VAT já estava com grupos formados em todos os estados, reunindo alguns milhares de ativistas, com mais de 1 milhão de assinaturas no abaixo-assinado.
É preciso debater com o conjunto dos ativistas que se engajaram na construção do VAT quais os próximos passos para avançar. Mas, para isso, é preciso organizar um processo democrático de discussão interna sobre os rumos do movimento que culmine na eleição de uma coordenação nacional para o VAT, que substitua a atual coordenação nacional formada de maneira improvisada, que só poderia ter um caráter provisório. No último período, importantes decisões para o movimento foram adotadas pelo companheiro Rick e a coordenação nacional por ele formada.
No dia 1º de maio, por exemplo, a Deputada Federal Erika Hilton anunciou que está apresentando uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) pelo fim da escala 6×1, de acordo com o movimento VAT. Algumas semanas depois, representantes do VAT foram convidados para participar de uma reunião em Brasília com a deputada e o Ministro do Trabalho, Luís Marinho, para apresentar a demanda de fim da escala 6×1.
No mesmo dia, estava ocorrendo uma marcha organizada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e outras centrais pela revogação das contrarreformas de Temer e Bolsonaro, porém, o próprio Rick avisou nos grupos que não iria participar dessa atividade e se concentrou em visitar os gabinetes dos parlamentares para pedir apoio à PEC da Erika Hilton.
Mas qual é o teor da PEC anunciada no dia 1º de maio e distribuída aos parlamentares na ida à Brasília? Por que o VAT não participou da Marcha das Centrais Sindicais? Quem tomou essas decisões e por quê?
Evidentemente, nós, da OCI, estamos a favor da apresentação de uma PEC do VAT no Congresso Nacional, mas havíamos sugerido que ela fosse feita por uma frente de parlamentares, para evitar que a proposta do movimento ficasse dependente de apenas um mandato. Porém, sem instâncias democráticas de decisões, a proposta foi ignorada.
Também questionamos a atual coordenação nacional para ter acesso ao teor da PEC da Erika Hilton e insistimos para que a proposta seja tornada pública. Esta é uma medida básica para a democracia e coesão interna do movimento. Os ativistas do VAT precisam saber o que a PEC do VAT propõe. Como defender a PEC nas panfletagens e ações do VAT sem saber o que exatamente está sendo proposto no lugar da escala 6×1?
No bojo da discussão da PEC surgiu a ideia de uma escala 4×3 (4 dias de trabalho e 3 de descanso). Seria uma escala 4×3 realmente a melhor para os trabalhadores? De onde vem essa proposta? Quais as experiências históricas dos trabalhadores brasileiros e de outros países com relação à luta pela redução da escala e da jornada de trabalho? Além da escala, qual a proposta do VAT para a redução da jornada de trabalho no Brasil? Escala 4×3 e jornada de 36 horas? Se for isso, nós somos contrários porque implica numa jornada diária de 9 horas, o que quebra uma conquista histórica do movimento operário de dividir o dia em 8 horas de trabalho, 8 horas de estudo e lazer, e 8 horas de descanso.
Outro passo dado foi a decisão do companheiro Rick de lançar-se candidato a vereador no Rio de Janeiro pelo PSOL para as eleições deste ano. É, obviamente, seu direito lançar-se como candidato. No entanto, ao se apresentar como um candidato que representa o VAT, isso deveria ser parte de um processo coletivo e democrático no interior do movimento, ao menos com o conjunto dos ativistas do VAT no Rio de Janeiro, para que então se decidisse se era o caso de dar este passo, de que forma e com qual plataforma política.
As decisões a respeito dessas e outras questões importantes deveriam ser tomadas com o máximo de respeito às diferentes visões de mundo dos trabalhadores que constroem o VAT no dia a dia, em reuniões, plenárias, assembleias e outras instâncias democráticas e não ficar a cargo apenas da atual coordenação nacional.
As tarefas para o movimento avançar
Outro aspecto a ser discutido é o que propor aos trabalhadores e ativistas que participam do VAT e qual o intuito da luta. Se, por um lado, é importante ter uma PEC do movimento tramitando no Congresso Nacional e, para isso, é crucial pressionar os parlamentares a assinarem-na, principalmente os deputados que dizem representar os trabalhadores, por outro lado, não se pode considerar essa tarefa como prioritária.
O Congresso Nacional não é “a casa do povo”, é a casa da burguesia. A maioria dos deputados e senadores são patrões ou são financiados por eles para que defendam seus próprios interesses de classe, em detrimento dos interesses dos trabalhadores.
E para dobrar a resistência do Congresso Nacional e avançarmos na conquista de fim da escala 6×1, não basta conseguir mais assinaturas no abaixo-assinado. Historicamente, os trabalhadores somente conquistaram direitos através da sua própria mobilização, com manifestações de rua, greves gerais e revoluções que questionaram o poder dos patrões e seus políticos.
Por isso, a tarefa fundamental do movimento VAT consiste em avançar na organização dos trabalhadores que querem o fim da escala 6×1 em cada cidade, em cada categoria profissional e em cada local de trabalho para enfrentar os patrões, combinando a luta nacional com o combate por arrancar acordos e convenções coletivas que reduzam a escala e a jornada de trabalho. Quanto mais organizados e mobilizados por essa bandeira, maior será nosso poder em relação aos patrões e seu Congresso Nacional.
Inclusive, o próximo ato nacional do movimento VAT, convocado para o dia 7 de setembro, do qual participaremos, deveria servir a esse propósito. Para que os atos sejam vitoriosos é necessário convocar reuniões e plenárias preparatórias, formar comitês de luta pelo fim da escala 6×1, realizar panfletagens convocando os trabalhadores a participar e uma série de medidas organizativas capazes de envolver os ativistas e militantes em tarefas práticas de construção dos atos porque não basta apenas marcar um ponto de encontro e esperar que as pessoas participem. É preciso travar uma batalha para convencer e garantir a participação do maior número possível de trabalhadores e jovens.
Por um Encontro Nacional do VAT!
Para que o VAT concretize todo seu grande potencial de mobilização é preciso que a base que o compõe seja parte das decisões dos rumos do movimento. O VAT extrapolou a indignação inicial expressa por Rick em sua rede social e ganhou uma base de ativistas de diferentes origens, unidos na luta de frente única pelo fim da escala 6×1.
Por isso, apresentamos a necessidade de um Encontro Nacional do VAT que eleja uma coordenação nacional e adote resoluções que definam o programa e a estratégia do VAT, precedido de etapas municipais para eleger delegados e uma coordenação local, além de formar comitês de luta pelo fim da escala 6×1 por região ou categoria profissional que envolva todos os trabalhadores presentes.
Enfim, um Encontro Nacional construído democraticamente. Para ouvir e debater as propostas e estabelecer instâncias e decisões reconhecidas pelo conjunto dos ativistas do movimento, tanto a nível local quanto nacional. Assim, as lideranças eleitas por esse processo terão um mandato claro e decisões coletivas para basear suas ações e deverão prestar contas de seu trabalho aos comitês de base.
Chamamos a atual coordenação nacional e todos os trabalhadores e ativistas que participam dos grupos do VAT a debater essa proposta para estabelecermos os critérios e meios necessários para construir um vitorioso Encontro Nacional do VAT, capaz de transformar todo o potencial do movimento em uma poderosa força material na luta de classes.
É hora do movimento se consolidar e organizar os trabalhadores em comitês de base! É hora de um Encontro Nacional para eleger uma coordenação e definir democraticamente os rumos do movimento! É hora de pôr fim à escala 6×1!