A resposta nas ruas
Contundente e comovente foi a reivindicação pela aparição com vida de Santiago Maldonado em toda a Argentina. De norte a sul, de leste a oeste do país, uma multidão se mobilizou para exigir do Governo Nacional que pare de encobrir o sequestro feito pela gendarmería[1].
Santiago Maldonado desapareceu no dia 1º de agosto depois da violenta repressão em Lof Cushamen, na província de Chubut, pelas mãos da gendarmería.
[table id=6 /]Realizava-se lá um protesto do povo mapuche, que vem sendo violentamente assediado pelo Benetton Group (que deu caminhonetes e logística para a repressão), pelas mineradoras e pelas petroleiras, que procuram desalojá-los de seus territórios para engordar seus negócios.
A operação foi comandada por Pablo Noceti, chefe de gabinete do Ministério de Segurança do Governo Nacional. A gendarmería começou a disparar, perseguindo os habitantes da comunidade Cushamen e emboscando-os em um rio; Santiago Maldonado não conseguiu cruzá-lo e o pegaram.
Isso constitui um caso claro de terrorismo de Estado que o governo de Mauricio Macri vem encobrindo de maneira obscena. Esse episódio foi demais para centenas de milhares de trabalhadores e jovens num país em que a burguesia e o imperialismo estadunidense deixaram 30 mil detidos desaparecidos no marco da última ditadura militar de 1976.
Foi assim que em 1º de setembro aconteceram as manifestações por todo o país. Em Buenos Aires, meio milhão de pessoas encheram a Praça de Maio e seus arredores. Toda a área da praça, a Diagonal Norte, a Diagonal Sul e a Avenida de Maio estavam abarrotadas.
Organizações políticas, sindicais, universitárias, estudantis, culturais, de vizinhança, sociais, de Direitos Humanos, juntamente com milhares de milhares de trabalhadores sem militância orgânica foram os que deram tão magnífica reposta popular.
O ambiente que se respirava era de tristeza, mas de muita raiva e de ânimo para a luta. A luta de massas é nossa melhor arma.
Nós, camaradas da Corrente Marxista Internacional, estivemos participando das mobilizações onde estamos presentes.
Devemos seguir mantendo a luta na rua, mobilizando-nos e pressionando o Estado para que diga o que fez com Santiago Maldonado.
A resposta do Governo
A covarde e criminosa resposta do governo do Cambiemos[2] à mobilização foi uma operação política.
Assim que a marcha dispersou, a polícia lançou uma repressão contra aqueles que ficaram nos arredores da Praça de Maio. A entrada na praça de um falso grupo de anarquistas, ridiculamente caracterizados, que começaram a se comportarem de maneira violenta deu o pretexto à polícia para reprimir.
Podem-se ver diversos vídeos, fotos e outros materiais que circulam pelas redes como policiais à paisana estavam infiltrados na marcha e, no momento da repressão, eram vistos com fardas da Polícia da Cidade de Buenos Aires.
Cassetetes, gás lacrimogênio e spray de pimenta foram parte dessa caça que lançaram as forças de repressão, com 31 detidos e vários feridos.
No momento em que este artigo era escrito, os detidos ainda não haviam sido postos em liberdade e há jornalistas que foram detidos com suas câmeras nas mãos (no dia 3 de setembro foram libertados 30 pessoas, somente uma ficou detida por problemas com sua documentação). Foram detidas inclusive pessoas que não participaram da mobilização e estavam por acaso no lugar.
Com essa ação brutal fizeram um espetáculo no horário nobre das 21 horas, onde os meios de comunicação da burguesia colocaram em funcionamento sua maquinaria para desvirtuar a contundência da reivindicação e mostrar os manifestantes como violentos, radicalizados, agressivos.
Procuram assim deslegitimar e satanizar o protesto social com o único objetivo de seguir manobrando para ocultar a responsabilidade do macrismo nesse novo caso de sequestro na Argentina.
Esse fato acontece num momento de aumento na violência da ação repressiva do Governo, encorajado por um resultado relativamente favorável nas eleições e com a necessidade de ir preparando o ambiente face à segunda etapa de ajuste que vem logo após as eleições legislativas de outubro.
Em decorrência da crise capitalista mundial, empresários, latifundiários e banqueiros precisam aprofundar o ajuste sobre a classe trabalhadora quase como uma questão de sobrevivência, em que seu próprio sistema os envolve.
O macrismo enquanto representante conjuntural desses setores tem esta tarefa à sua frente. É daí que surge a necessidade por parte do Governo de fazer ser aceito o aparato repressivo e preparar o ambiente para neutralizar aqueles que se sabe que resistirão ao ajuste com luta política.
O ajuste não passa sem repressão e a classe dominante está afiando seus dentes.
Nesta sexta-feira, dia 1º de setembro, todas as forças vivas da Argentina estiveram nas ruas enfrentando politicamente o Estado em mobilizações unificadas que deram lugar a múltiplos atos.
Não existe poder igualável ao das massas quando se põem a marchar. Sem dúvida as mobilizações populares são uma mostra massiva de força na rua que sacode o tabuleiro político em qualquer lugar.
Trata-se de conseguir com que essa força se organize e se arme programaticamente para terminar com as feridas abertas da sociedade capitalista que precisa da repressão para perpetuar a desigualdade. É para isso que seu Estado existe.
[1] Organização militar nacional argentina que cumpre funções de polícia em cidades menores (Nota do Tradutor – N.T.).
[2] Coalizão política formada para o lançamento da candidatura de Macri à presidência da Argentina em 2015 (N.T.).
Artigo publicado na página El Militante, da seção argentina da Corrente Marxista Internacional Corriente Socialista Militante, sob o título “Santiago Maldonado: Desaparición forzada en Argentina, el Estado es responsable” , publicado em 4 de setembro de 2017.