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Saúde: OSs, privatizações e luta dos trabalhadores

O presente artigo é uma contribuição de um apoiador da Esquerda Marxista e contém posições exclusivas de seu autor.

Da Redação

Recebi o convite de meu irmão e companheiro de jornada Anderson Benac, para elaborar um artigo crítico reflexivo, sobre as Organizações Sociais de saúde – OSS[1] que estão envolvidos no gerenciando da saúde. As mesmas possuem um quartel de processos licitatórios, da qual milhões de reais de dinheiro público são desviados, como vemos nos noticiários que levaram a prisão do Secretário Estadual de saúde do RJ em 2020. Ocorrem um superfaturamento, onde há altos valores para manutenção de serviços, escopo e afins. Cito como exemplos que nesses contratos, o salário da categoria profissional assistente social e psicólogo que estão em R$ 7.000 reais, mas na realidade é pago somente o valor de R$ 4.000 reais pela venda da força de trabalho desses profissionais. Um lucro de R$ 3.000 fazendo esses trabalhadores qualificados receberem menos do que um salário-mínimo necessário do DIESSE (hoje equivalente a R$ 5.421,84). Para onde vai esse valor? Para o bolso do Governador? O mesmo já foi sofreu Impeachment, mas todo o sistema continua operando. Para o Prefeito ou Secretário de saúde para redes de licitações fraudulentas? Ou para a naturalização da corrupção?

É sempre bom lembrar que o ex Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que esteve diante de todo gerenciamento, atualizações de dados e informações a população sobre os cuidados da pandemia Covid-19. Chegando a 76% de aprovação de sua gestão, o mesmo sempre esteve alinhado aos interesses do capital, numa política de sucateamento, desmonte e deslegitimação dos princípios da Reforma Sanitária[2], que originaram na implementação do SUS, Sistema Único de saúde, mas sem luta pela manutenção da saúde pública, assim abre-se espaço para novos contratos de saúde privada, fortalecendo ainda mais o capital.

Nos dias atuais verifica-se uma imensa exclusão de pessoas sem acesso ao trabalho, aos bens de consumo e a cultura. Resultante da crise do sistema que sobrepõem o lucro em detrimento do bem-estar humano. Eu como Assistente Social, da qual meu projeto ético político é de rompimento ao conservadorismo, sei do meu protagonismo emancipatório de sujeito de direitos. Estou alinhado ao fomento do rompimento do senso comum da meritocracia e sim na promoção da justiça e equidade social, para a formação de uma agenda da qual a sociedade seja mais justa e igualitária, rompendo com o capitalismo.

Para melhor entendimento desse contexto histórico, conceituo a questão social. A mesma tem a ver com a emergência da classe operaria proletária no cenário político nas lutas por direitos atinentes ao trabalho. Essa historicidade, ganhou materialidade “objetividade” e protagonismo “subjetividade”. Servindo como base do surgimento do serviço social. O legado dos direitos conquistados da classe trabalhadora está sendo desmontados nos governos liberais em que uma nítida regressão da cidadania que tende a ser reduzida as suas dimensões civil e política erondindo a cidadania social.  Trabalhadores fora do mercado formal, portanto sem as garantias de proteção social no ideário liberal, confronta com as práticas igualitárias transformando direitos em favor ou ajuda, desqualificando as políticas sociais.

Teóricos como Mészáros (2002), Antunes (2011) e Pochmann (2007) fazem a crítica do capital x trabalho em Marx.  Os mesmos construíram um arcabouço teórico metodológico em análises reflexivas que ficam muito restritas ao mundo acadêmico e a intelectuais estudiosos da teoria política.  É preciso que a teoria chegue ao chão de fábrica.  Isto é, na discussão sindical que se fragilizou e perdeu sua identidade em nossa sociedade neoliberal, ocorrendo a redução da consciência de classe; no controle social, articulando o debate para transformação de uma sociedade mais justa e igualitária, fazendo com que o capitalismo perca seus tentáculos. E observamos a dificuldade das direções dos maiores sindicatos hoje em organizar uma greve geral para derrubar Bolsonaro.

Reforma é uma disciplina fiscal, contrarreforma se pauta no conjunto de medidas neoliberais, na destruição das conquistas democráticas duramente conquistadas. Com o processo globalizado da mundialização do capital (política monetária) balizadas pelo consenso de Washington[3] e aqui no Brasil pelo plano Bresser[4], tem como regra a privatização da coisa pública (Estado Mínimo). O Estado prioriza a política econômica com seus interesses privados do capital em detrimento da política social, abrindo espaço para precarizações nas relações de trabalho e ao emprego estrutural.

Conclusão

Vivemos em um cenário social de constantes transformações. A sociedade atual é resultado de uma série de lutas e conquistas históricas da população. Geralmente representada por grupos ou movimentos unidos por causas comuns em busca de maior representatividade e visibilidade social.

De acordo com Dagnino (2002), se fortalece em nosso país no final do século XX, elementos de uma nova cultura política, a cultura voltada nos debates, lutas pela democratização do Estado, participação em processos sociais e políticos na qual se esvazia devido a falta de consciência política.  Os modelos de atenção e gestão à saúde representam a forma de organização do sistema de saúde e suas práticas em resposta às necessidades da população. Os modelos são expressos em políticas, programas e serviços de saúde que estejam em harmonia com os princípios e diretrizes que estruturam o SUS.

Neste contexto, o programa de Políticas Públicas e Modelos de Atenção e Gestão à Saúde (PMA), desenvolvido pela Vice-Presidência de Pesquisa e Coleções Biológicas, tem como papel estratégico a indução do processo de aplicação dos resultados das pesquisas em soluções no campo das políticas públicas e modelos de atenção e gestão à saúde, buscando aperfeiçoar o desempenho do SUS e a melhoria das condições de vida e saúde da população.

Os planos de saúde têm seus fundos de reserva. O lucro de hospitais, casas de saúde particulares e laboratórios de exame são exorbitantes. Poucos grupos controlam a maioria dos laboratórios privados do país. Enquanto a maioria da população depende do SUS.

Na situação atual de crise, estatizar todo o sistema sob controle dos trabalhadores, com plena publicidade da situação real de ocupação de leitos, UTI, número de médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e pessoal de suporte é essencial.

É necessário lembrar que, em alguns locais que foram gravemente atingidos pela pandemia, como Itália e Espanha, grande quantidade dos trabalhadores da saúde contraíram a doença. Ou seja, a contratação e treinamento de mais pessoal qualificado é urgente! Defendemos a convocação de todos os aprovados em concursos públicos na área da saúde.

A solução dos grandes problemas na saúde que dificultam, entre outras coisas, a vacinação para todos, passa por estatizar todo o sistema de saúde – planos, laboratórios, hospitais! Quebrar a patente de todos os remédios, testes clínicos e outros necessários para a saúde. E para cumprir essa tarefa, só um autêntico governo dos trabalhadores seria capaz. Por isso, lutamos pelo fora Bolsonaro já!

Referências

ANTUNES, Ricardo. ADEUS AO TRABALHO?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade no mundo do trabalho. 15ª edição. São Paulo: Cortez, 2011.

DAGNINO, Evelina. Sociedade civil, espaços públicos e a construção democrática no Brasil: limites e possibilidade. In: DAGNINO, Evelina (org). Sociedade civil e espaços públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social em tempo de capital fetiche. São Paulo:     Cortez, 2008.

MESZÁROS, Istvan. Educação para além do Capital. São Paulo: Boitempo, 2008.

_______. A teoria da alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2006.

_______. O desafio e o fardo do tempo histórico. São Paulo: Boitempo, 2007.

NETTO J.P. CAPITALISMO MONOPOLISTA E SERVIÇO SOCIAL. São Paulo:     Cortez, 1992

POCHMANN, Márcio. Novos e Velhos Tempos do Trabalho. In: OLIVEIRA, Roberto Véras de (Org.). Novo Momento para as Comissões de Emprego no Brasil? São Paulo: a + comunicação, 2007.

POCHMANN, Márcio. Transformações Contemporâneas no Emprego. In: DEDECCA, Claudio Salvadore; PRONI, Marcelo Weishaupt (Org.). Economia e Proteção Social: textos para estudo dirigido. Campinas: IE/UNICAMP, 2007.

Serviço Social e saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez, 2006.

Notas:

[1] Organizações Sociais de Saúde-OSS são instituições filantrópicas do terceiro setor, sem fins lucrativos, responsáveis pelo gerenciamento de serviços de saúde do SUS (Sistema Único de Saúde) em todo o país, em parceria com as secretarias municipais e estaduais de saúde. As relações entre o Poder Público e as Organizações Sociais de Saúde são instrumentalizadas e reguladas por meio de contrato de gestão, definido no Art. 5º, da Lei federal nº 9.637/98 como “o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como OS, com vistas à parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas mencionadas no art.1º”. Atualmente o Contrato de Gestão, no âmbito da saúde é regulado pela Lei Estadual nº 15.210/2013, de 19 de dezembro de 2013, posteriormente alterada pela Lei nº 16.155/17, de 05 de outubro de 2017. A qualificação como OSS no nosso Estado é concedida através da publicação de Decreto Estadual às Entidades que pleiteiam o título, desde que atendam aos requisitos legais e que tenham reconhecida expertise em gestão de saúde. Um dos instrumentos que fazem o acompanhamento das Organizações Sociais de Saúde-OSS é o relatório trimestral. O relatório trimestral é a consolidação dos dados fornecidos mensalmente pelas contratadas, além de também ser o produto final da avaliação trimestral dos indicadores assistenciais contidos nos contratos de gestão, realizados entre Secretaria Estadual de Saúde e Organização Social de Saúde. O instrumento é preconizado pela Lei 15.210/13 e alterações, e é utilizado como objeto de análise para instâncias de controle interno e externo, a exemplo a Comissão Mista de Avaliação e Tribunal de Contas Estadual. A validação destes relatórios é realizada pela Comissão Técnica de Acompanhamento Interno dos Contratos de Gestão, por meio de emissão de parecer, e análise conclusiva realizada através de parecer da Comissão Mista de Avaliação. A publicitação destas informações proporciona a melhoria do controle social e garante idoneidade ao processo de monitoramento e avaliação dos Contratos de Gestão.

[2] O movimento da Reforma Sanitária nasceu no contexto da luta contra a ditadura, no início da década de 1970. A expressão foi usada para se referir ao conjunto de ideias que se tinha em relação às mudanças e transformações necessárias na área da saúde. Essas mudanças não abarcavam apenas o sistema, mas todo o setor saúde, em busca da melhoria das condições de vida da população. Grupos de médicos e outros profissionais preocupados com a saúde pública desenvolveram teses e integraram discussões políticas. Este processo teve como marco institucional a 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986. Entre os políticos que se dedicaram a esta luta está o sanitarista Sergio Arouca. As propostas da Reforma Sanitária resultaram, finalmente, na universalidade do direito à saúde, oficializado com a Constituição Federal de 1988 e a criação do Sistema Único de Saúde (SUS).

[3]O Consenso de Washington foi a forma como ficou popularmente reconhecido um encontro ocorrido em 1989, na capital dos Estados Unidos. Nesse encontro, realizou-se uma série de recomendações visando ao desenvolvimento e à ampliação do neoliberalismo nos países da América Latina. Essa reunião foi convocada pelo Institute for International Economics, sob o nome de “Latin Americ Adjustment: Howe Much has Happened?”, e envolveu instituições e economistas de perfil neoliberal, além de alguns pensadores e administradores de países latino-americanos. Em linhas gerais, não foi preconizada nenhuma medida “inédita” durante o Consenso de Washington, que recebeu esse nome do economista John Willianson em função de sua ampla aceitação pelos países da América Latina, exceto, até então, Brasil e Peru. As ideias desse encontro – tidas como um “receituário”, e não como uma imposição – já eram proclamadas pelos governos dos países desenvolvidos, principalmente EUA e Reino Unido, desde as décadas de 1970 e 1980, quando o Neoliberalismo começou a avançar pelo mundo. Além disso, instituições como o FMI e o Banco Mundial já colocavam a cartilha neoliberal como pré-requisito necessário para a concessão de novos empréstimos e cooperação econômica. O objetivo dos pontos dessa reunião, segundo o próprio John Willianson, era o de “acelerar o desenvolvimento sem piorar a distribuição de renda”. Dessa forma, as recomendações apresentadas giraram em torno de três ideias principais: abertura econômica e comercial, aplicação da economia de mercado e controle fiscal macroeconômico.

Dentre as premissas básicas colocadas no Consenso de Washington, podemos destacar:

a) Disciplina fiscal, em que o Estado deveria cortar gastos e eliminar ou diminuir as suas dívidas, reduzindo custos e funcionários.

b) Reforma fiscal e tributária, em que o governo deveria reformular seus sistemas de arrecadação de impostos a fim de que as empresas pagassem menos tributos. d) Abertura comercial e econômica dos países, diminuindo o protecionismo e proporcionando uma maior abertura das economias para o investimento estrangeiro.

e) Desregulamentação progressiva do controle econômico e das leis trabalhistas.

Apesar de o Brasil ter sido um dos poucos países que não aceitaram de imediato essas medidas, foi um dos que mais rapidamente as aplicou, em um processo que conheceu o seu ápice ao longo da década de 1990. A principal ação do governo brasileiro nesse sentido foi a implantação da política de privatizações, em que empresas estatais dos ramos de energia, telecomunicações, da mineração e outros foram transferidas para a iniciativa privada. O Consenso de Washington tornou-se, dessa forma, uma verdadeira “receita de bolo” para a execução das premissas neoliberais em toda a região latino-americana, que acatou as suas ideias principalmente pela pressão e influência exercidas pelo governo dos Estados Unidos e por instituições como o FMI, o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD).Grupos e movimentos de esquerda e estatistas direcionam frequentes críticas ao consenso, sobretudo por considerarem que as suas ideias teriam sido direcionadas para atender aos interesses norte-americanos em toda América Latina, além de beneficiar as elites locais, favorecendo a concentração de renda nos países da região. Em oposição, esses grupos apontam que a solução para os países do sul seria adotar uma política inversa à preconizada em Washington, com uma maior intervenção do Estado na economia, além da ampliação e fortalecimento das leis trabalhistas.

[4] O Plano Bresser veio após o Plano Cruzado, que recebeu este nome quando alternou o Cruzeiro para o Cruzado para moeda nacional na época. O Cruzado foi o primeiro dos planos econômicos feitos na tentativa de travar a inflação e foi realizado em duas versões. No contexto histórico, o Brasil havia passado décadas antes por uma série de investimentos públicos para se criar um estado desenvolvimentista, principalmente nos governos militares. Isso levou a uma inflação alta e inercial, quando a economia cresce à custa de altas inflações. O Plano Cruzado foi marcado pelo congelamento de preços e pelo reajuste dos salários sempre que a inflação passava dos 20% ao mês, conhecido como “gatilho salarial”. O objetivo era aumentar o poder aquisitivo da população visando um aumento do salário real. Nesta mesma época o Brasil declarou moratória de sua dívida externa, quando ela deixa de ser paga com os seus respectivos juros. A justificativa principal era a reduzida disponibilidade de reservas cambiais. O fracasso do Plano Cruzado veio com o excesso de demanda que deixou as prateleiras vazias e uma consequente crise econômica, além de a inflação voltar aos dois dígitos.